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Processo n.º 523/2005
2.ª Secção
Relatora: Conselheira Maria Fernanda Palma
Acordam, em Conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, a
Relatora proferiu a Decisão Sumária de fls. 301 e ss.
O recorrente vem agora requerer aclaração nos seguintes termos:
A., recorrente nos autos supra identificados, vem requerer a aclaração do douto
despacho que decidiu não conhecer do objecto do recurso, porquanto:
1º
O arguido interpôs recursos para a Relação de Coimbra, onde questionou a
constitucionalidade de uma dimensão normativa de forma não subordinada ao
recurso quanto à matéria de facto.
2°
Havia já sido dado por provado pela douta sentença de 1ª instância, que o
arguido é motorista e que para desempenhar normalmente a sua actividade
profissional precisa de conduzir.
3°
A formulação em I) das conclusões de recurso: «(...) aplicada por um período
tal, que conduza em termos práticos à perda do emprego (...]», como é bom de
ver, visava permitir e permite, a análise da questão de direito, mesmo em caso
de decaimento do recurso quanto à matéria de facto, interposto para a Relação de
Coimbra.
4º
Não é claro, o sentido com que o douto despacho interpretou as expressões supra
sublinhadas.
Nestes termos, requer V. Excia. se digne esclarecer o supra referido.
O Ministério Público pronunciou‑se nos seguintes termos:
1°
A decisão reclamada é perfeitamente clara e insusceptível de dúvida objectiva
sobre o que nela se decidiu.
2°
Não colocando o reclamante qualquer dúvida quanto ao sentido e fundamentos de
tal decisão, é evidentemente inadmissível o uso do incidente de aclaração.
Cumpre apreciar.
2. Na Decisão Sumária aclaranda, entendeu‑se o seguinte:
4. Nos presentes autos, o recorrente impugnou, junto do tribunal recorrido, a
dimensão normativa segundo a qual é possível aplicar a pena acessória inibição
de conduzir por 12 meses a um arguido que, por força de tal pena, perde o seu
emprego, quando o crime cometido não foi praticado no exercício da profissão.
O tribunal recorrido considerou expressamente que tal dimensão normativa não foi
aplicada, já que nada nos autos permite afirmar que o arguido perde o emprego,
por força da pena aplicada.
O recorrente interpôs então recurso de constitucionalidade, impugnando a
dimensão normativa segundo a qual pode ser aplicada a referida pena de inibição
de conduzir a arguido cuja profissão é motorista e que não cometeu o crime no
exercício dessa profissão.
Ora, é manifesto que a dimensão normativa impugnada perante o tribunal a quo
difere substancialmente da dimensão normativa que o recorrente submete à
apreciação do Tribunal Constitucional. Com efeito, aquela dimensão normativa
resulta de uma interpretação que abrangeria a perda do emprego do arguido por
força da pena aplicada. A dimensão agora impugnada resulta, por sua vez, de uma
interpretação que admite a aplicação da pena a um arguido que necessita da carta
para o exercício da sua profissão (já não estando, porém, em causa a perda do
emprego).
Por outro lado, a dimensão normativa impugnada perante o tribunal a quo não foi
aplicada pela decisão recorrida. Já a dimensão normativa constante do
requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade não foi impugnada
antes da prolação da decisão recorrida (podendo manifestamente tê‑lo sido).
Não se verifica, portanto, o pressuposto processual do recurso da alínea b) do
nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, consistente na suscitação
durante o processo da questão de constitucionalidade normativa que o recorrente
pretende submeter à apreciação do Tribunal Constitucional.
O reclamante não coloca qualquer dúvida quanto ao sentido e fundamento da
Decisão Sumária. Nessa medida não é, desde logo, admissível o recurso ao
incidente de aclaração. Por outro lado, como se pode verificar na passagem
transcrita da Decisão Sumária, ela é particularmente clara quanto à relevância
no contexto da questão suscitada do “efeito prático” da perda do emprego
alegadamente decorrente da aplicação da sanção de inibição de condução.
Não haveria, assim, nada a aclarar, já que a Decisão Sumária é globalmente
perceptível.
3. Em face do exposto, indefere‑se a presente aclaração.
Custas pelo requerente, fixando se a taxa de justiça em 15 UCs.
Lisboa, 12 de Outubro de 2005
Maria Fernanda Palma
Benjamim Rodrigues
Rui Manuel Moura Ramos