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Processo n.º 690/05
Plenário
Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto
Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional:
I. Relatório
1.Eugénio Saraiva Pinto, na qualidade de mandatário da lista de candidatos à
eleição para a Assembleia de Freguesia de Moimenta da Serra (concelho de
Gouveia), proposta por um grupo de cidadãos eleitores e sob a designação
“Moimenta Sempre Mais”, apresentou, em 5 de Setembro de 2005, na Secretaria
Judicial do Tribunal de Gouveia, recurso para o Tribunal Constitucional, nos
termos do artigo 31.º da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais (LEOAL),
na sequência da decisão do juiz daquele Tribunal de 2 de Setembro de 2005 que
indeferiu a reclamação apresentada contra o despacho do mesmo, proferido em 25
de Agosto de 2005, que rejeitara a referida lista de candidatos com fundamento
em que não fora proposta pelo número mínimo legal, de 50 proponentes.
Pode ler-se no recurso dirigido ao Tribunal Constitucional:
«a) Ao ser notificado para suprir as irregularidades detectadas na candidatura
que apresentou, o ora recorrente percebeu que apenas tinha que fornecer nomes
completos de 5 candidatos, apresentar nova lista com 7 efectivos e pelo menos 3
suplentes e completar o número de proponentes em falta (no caso concreto eram
13);
b) Embora reconheça agora que o pedido que lhe foi feito reclamava a
apresentação de uma única listagem de 50 cidadãos a proporem os candidatos
efectivos e suplentes que posteriormente se indicaram, é perfeitamente
expectável que um cidadão médio, com a formação pessoal e académica como a do
recorrente, tivesse a leitura que ele tem no despacho judicial e que procedesse
como ele procedeu;
c) Isto porque, referindo-se tal despacho a declaração “adicional” e constando
já dos autos uma declaração inicial, ficou com a ideia clara de que deveria
juntar apenas e tão-só uma lista com os proponentes que faltavam para completar
o mínimo legal;
d) Incorreu, pois, em erro de percepção ou de leitura ostensivo e só por isso
não sanou devidamente as irregularidades que se pretendiam supridas;
e) Tal erro equivale ao erro de cálculo previsto no art.º 249.° do C. Civil, que
pode e deve ser rectificado;
t) Tanto assim que a actuação global do recorrente e das pessoas que propõem e
pertencem à lista traduz uma vontade indiscutível de apresentar uma candidatura
e de a sujeitar a sufrágio eleitoral;
g) Essa vontade e a evidência de que a apresentação de uma declaração posterior
de apenas 13 proponentes se deveu a um lapso resultante de uma errada
compreensão da notificação judicial, deveria ter levado o Tribunal a notificar
novamente o recorrente concedendo-lhe oportunidade para corrigir o lapso ou a
deficiência cometida;
h) Esta possibilidade não é afastada pela Lei Eleitoral e, como tal, é
permitida;
i) Para além disso, era e é a que melhor se adequa aos sensíveis interesses em
jogo, como sejam o exercício inalienável de direitos constitucionais que nenhuma
razão de ordem formal e muito menos de pormenor pode ou deve limitar;
j) Todos os proponentes apresentados – os primeiros 37 e os segundos 13 – sabem
quem são todos os candidatos efectivos e suplentes indicados, tendo sido
intenção de todos propor esta candidatura, que tem apoios expressivos e é, de
resto, encabeçada pelo actual presidente de junta;
k) Entre outros, afigura-se que o Tribunal recorrido violou o art.º 249.° do C.
Civil, os artigos 48.° e 49.° da C.R.P. e o art.º 26.°, n.º 1, da Lei
Eleitoral.»
2.No processo eleitoral para a Assembleia de Freguesia de Moimenta da Serra o
grupo de cidadãos intitulado “Moimenta Sempre Mais” apresentara uma lista de
candidatos integrada por três candidatos efectivos (Rui Manuel dos Reis Pais,
Carlos Fernando Duarte Pais e Orlando Óscar Alves Ferreira) e vários suplentes
(dos quais os quatro primeiros eram, respectivamente, José Henriques Marques,
Januário Francisco Almeida Carvalho, José António Esteves Soares Marujo e Maria
Helena Marques Gonçalves). A declaração de candidatura apresentada, com
declaração de elegibilidade, de não duplicação de candidaturas ao mesmo órgão
autárquico e de aceitação do mandatário, apesar de assinada por todos os
candidatos, no seu início identificava como declarantes apenas os três
candidatos efectivos então indicados. Por sua vez, foram juntas declarações de
propositura assinadas por 37 cidadãos eleitores, com indicação do seu nome
completo, número do bilhete de identidade, número do cartão de eleitor e unidade
geográfica de recenseamento e assinatura, ordenados num formulário em cujo
cabeçalho se dizia que os subscritores declaravam “apoiar a lista do grupo de
cidadãos eleitores à eleição da Assembleia de Freguesia, sob a denominação de
Moimenta Sempre Mais, constituída pelos seguintes candidatos efectivos: Rui
Manuel dos Reis Pais, Carlos Fernando Duarte Pais, Orlando Óscar Alves Ferreira”
(nomes manuscritos dos três candidatos efectivos então indicados).
Em 22 de Agosto de 2005, foi proferido o seguinte despacho pelo juiz do Tribunal
Judicial de Gouveia, apreciando a existência de irregularidades processuais na
apresentação da referida lista proposta por um grupo de cidadãos eleitores:
«(…)
6.
Moimenta da Serra
Grupo de cidadãos Moimenta Sempre Mais
De acordo com os dados fornecidos pelo STAPE, a freguesia de Moimenta da Serra
tem 628 eleitores, o que significa que nas eleições para a Assembleia de
Freguesia deverá haver 7 candidatos efectivos e 3 candidatos suplentes.
Esta é uma das várias irregularidades verificadas na lista ora em análise, não
sendo certamente a mais grave.
Efectivamente, apesar de a lista de candidatos mencionar apenas 3 efectivos,
sendo os restantes suplentes, a verdade é que o número de efectivos poderá ser
preenchido com recurso aos candidatos suplentes, que são em número suficiente.
Embora o artigo 23.º, n.º 9, da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais,
determine que as listas deverão conter a discriminação dos candidatos efectivos
e dos candidatos suplentes, por efeito da aplicação da norma do artigo 27.º, n.º
2, do mesmo diploma sempre se supriria a eventual falta de efectivos.
Porém, como se referiu, a lista padece de outras irregularidades.
Desde logo, a declaração de candidatura, embora tenha sido assinada por todos os
candidatos (efectivos e suplentes), manifesta apenas a vontade dos denominados
candidatos efectivos em candidatarem-se à Assembleia de Freguesia, a declaração
dos mesmos da inexistência de causas de inelegibilidade, a declaração de que não
figuram em outra lista para o mesmo órgão, e a sua aceitação da pessoa do
mandatário.
Ora, a circunstância de os restantes candidatos terem assinado esta declaração
não tem a virtualidade de converter aquelas declarações em declarações dos
restantes.
A declaração de candidatura teria de conter a menção aos restantes candidatos,
não bastando a sua assinatura que nada mais constitui do que um acto supérfluo
no âmbito da declaração efectuada pelos candidatos efectivos.
As vicissitudes estendem-se ainda aos proponentes da lista.
Estes devem ser identificados pelo nome completo, devendo ainda apor a sua
assinatura (artigo 19.º, n.º 5, als. a) e d), da Lei Eleitoral dos Órgãos das
Autarquias Locais).
Os proponentes com os n.ºs 10, 12 e 17 surgem com uma letra total ou
parcialmente ilegível, típica de assinaturas.
Se o legislador pretendesse que os proponentes apenas subscrevessem a lista,
limitar-se-ia a determinar que a declaração de propositura fosse assinada,
eventualmente com os restantes elementos que são legalmente exigidos.
Porém, o legislador foi mais longe e com propósitos óbvios – poder controlar a
identidade do proponente – exigiu ainda que constasse da declaração o nome
completo do proponente que, necessariamente, deverá ser exarado de modo legível.
Por outro lado, ao determinar a indicação do nome completo, eliminou a
possibilidade de uso de formas abreviadas de expressão, como sucede quanto aos
proponentes n.ºs 20 e 35.
O número de proponentes é de 37.
Atento o número de eleitores da freguesia, seria um número suficiente à luz da
fórmula estatuída no n.º 1 do artigo 19.º da Lei Eleitoral dos Órgãos das
Autarquias Locais (29).
Contudo, olvidou-se o teor do n.º 2 deste artigo 19.º, segundo o qual:
“2 – Os resultados da aplicação da fórmula do número anterior, contudo, são
sempre corrigidos por forma a não resultar um número de cidadãos proponentes
inferior a 50 ou superior a 2000, no caso de candidaturas a órgão da freguesia,
ou inferior a 250 ou superior a 4000, no caso de candidaturas a órgão do
Município”.
Deste modo, em caso algum, o número de proponentes poderá ser inferior a 50.
Acresce ainda que, nos termos do artigo 19.º, n.º 1, da Lei Eleitoral dos Órgãos
das Autarquias Locais, “as listas de candidatos a cada órgão são propostas pelo
número de cidadãos eleitores”, constando do n.º 3 que os proponentes deverão
subscrever declaração da qual resulte inequivocamente a vontade de apresentar a
lista de candidatos dela constante.
Ou seja, os cidadãos não propõem uma lista de candidatos em abstracto, antes
propõem concretos candidatos.
No caso, apenas foram propostos os denominados candidatos efectivos, isto é,
neste momento, a lista é composta unicamente de 3 candidatos em condições
regulares.
Assim, notifique o mandatário para:
- Indicar os nomes completos dos proponentes identificados sob os n.ºs 10, 12,
17, 20 e 35;
- Juntar declaração adicional de propositura que permita alcançar o número
legalmente exigido de proponentes;
- Juntar declaração adicional de todos os proponentes, em número mínimo legal, a
propor os restantes candidatos denominados como suplentes;
- Juntar declaração de candidatura dos denominados suplentes.»
Em resposta a esta notificação, o mandatário da respectiva lista de cidadãos
veio juntar:
a) a indicação dos nomes completos dos proponentes n.ºs 10, 12, 17, 20 e 35 da
candidatura Moimenta Sempre Mais;
b) a declaração de candidatura dos sete candidatos efectivos à Assembleia de
Freguesia, com a declaração de elegibilidade, de não duplicação de candidaturas
ao mesmo órgão autárquico e de aceitação do mandatário, devidamente assinada por
todos;
c) a declaração de candidatura dos dez candidatos suplentes à Assembleia de
Freguesia, com a declaração de elegibilidade, de não duplicação de candidaturas
ao mesmo órgão autárquico e de aceitação do mandatário, devidamente assinada por
todos;
d) declaração adicional de propositura, constituída por um formulário em cujo
cabeçalho se dizia que os subscritores declaravam “apoiar a lista do grupo de
cidadãos eleitores à eleição da Assembleia de Freguesia, sob a denominação de
Moimenta Sempre Mais, constituída pelos seguintes candidatos efectivos: Rui
Manuel dos Reis Pais, Carlos Fernando Duarte Pais, Orlando Óscar Alves Ferreira,
José Henriques Marques, Januário Francisco Almeida Carvalho, José António
Esteves Soares Marujo e Maria Helena Marques Gonçalves” (nomes manuscritos dos 7
candidatos efectivos agora indicados), e assinada por 13 proponentes, numerados
de 38 a 50, com indicação do seu nome completo, número do bilhete de identidade,
número do cartão de eleitor e unidade geográfica de recenseamento e assinatura.
Em 25 de Agosto, o juiz do Tribunal Judicial da Comarca de Gouveia proferiu, no
que a esta candidatura diz respeito, o despacho já referido, em que se lê:
«(…)
5.
Moimenta da Serra
Grupo de cidadãos “Moimenta Sempre Mais”
Foram várias as irregularidades verificadas a propósito desta lista,
ordenando-se que o mandatário viesse:
- Indicar os nomes completos dos proponentes identificados sob os n.ºs 10, 12,
17, 20 e 35;
- Juntar declaração adicional de propositura que permitisse alcançar o número
legalmente exigido de proponentes;
- Juntar declaração adicional de todos os proponentes, em número mínimo legal, a
propor os restantes candidatos denominados como suplentes;
- Juntar declaração de candidatura dos denominados suplentes.
Cada um destes pontos respeitava a uma irregularidade susceptível de se traduzir
em consequências diversas.
Assim, se no primeiro caso, apenas poderia verificar-se a exclusão dos
proponentes cuja identificação não se revelava viável, já as restantes
irregularidades são susceptíveis de conduzir à rejeição da lista.
O mandatário cumpriu o determinado em primeiro lugar, procedendo à indicação do
nome completo dos proponentes.
Por outro lado, apresentou uma primeira declaração de candidatura que, além de
incluir os denominados candidatos efectivos, integra ainda os candidatos
identificados na lista como suplentes sob os n.ºs 1.º a 4.º.
Numa segunda declaração constam os restantes candidatos.
Finalmente, foi apresentada uma lista adicional de proponentes, perfazendo o
total de 50 proponentes.
Sucede, porém, que, apesar destas iniciativas, se mantém uma irregularidade que
afecta a lista.
Assim, se 13 proponentes indicaram os 7 primeiros candidatos, por outro lado, os
restantes 37 proponentes indicaram apenas 3 candidatos.
Desde logo resulta que os denominados candidatos suplentes, identificados sob os
n.ºs 5 a 14, não foram propostos por nenhum cidadão, o que implica que os seus
processos de candidatura são inválidos, não constituindo, na verdade, candidatos
ao órgão autárquico.
Restariam os restantes 7 candidatos, o que seria suficiente para a admissão da
lista, atento o disposto no artigo 27.º, n.º 3, da Lei Eleitoral dos Órgãos das
Autarquias Locais.
Todavia, destes 7 candidatos, como se referiu, aqueles que surgem identificados
como suplentes sob os n.ºs 1 a 4 foram indicados unicamente pelos últimos 13
proponentes, sendo que apenas os 3 primeiros candidatos (denominados efectivos)
foram indicados pelo número mínimo de proponentes (50).
Deste modo, a candidatura daqueles outros é inválida, pois teriam os mesmos de
ser propostos pelos 50 proponentes.
Restam assim em condições legais apenas os 3 primeiros candidatos.
De acordo com o já aludido n.º 3 do artigo 27.º da Lei Eleitoral dos Órgãos das
Autarquias Locais, a lista é definitivamente rejeitada por falta do número
mínimo de candidatos efectivos.
Pelo exposto, rejeito a lista de candidatos do Grupo de cidadãos “Moimenta
Sempre Mais”.»
O mandatário apresentou reclamação desta candidatura, que veio a ser decidida
pelo Tribunal Judicial da Comarca de Gouveia nos seguintes termos, em 2 de
Setembro de 2005:
«1.
O grupo de cidadãos “Moimenta Sempre Mais” veio reclamar do despacho que
rejeitou a lista apresentada, alegando, em síntese, que o mandatário se
convenceu de que o Tribunal havia ordenado apenas a junção de uma lista
adicional de proponentes de modo a completar o mínimo legal. Subsistindo assim
uma irregularidade, a verdade é que a lista revelou uma vontade inequívoca de
apresentação de uma candidatura, além da vontade de suprir as irregularidades
verificadas, só não atingindo tal desiderato porque não foi compreendido o
alcance do despacho. Esse pormenor não deveria ser capaz de excluir uma lista de
candidatos, colocando em causa o princípio democrático, por afectar o pluralismo
e a participação política, o bem-estar do povo e a igualdade real entre os
cidadãos, pois todos os proponentes da lista conhecem e sabem quem são os
candidatos e convenceram-se de que estes seriam capazes de ser eleitos, por
isso, os tendo apoiado.
Concluiu requerendo a aceitação da lista.
Notificadas as listas concorrentes, o Partido Socialista – PS veio responder
sustentando o indeferimento da reclamação.
2.
É o próprio grupo de cidadãos ora reclamante que admite que subsiste a
irregularidade notada no antecedente despacho, admitindo ainda que no despacho
em que se determinou a necessidade de suprimento das irregularidades constavam
todas as diligências a empreender.
Efectivamente, além do mais que foi ordenado – e cumprido –, aí se consignou que
o mandatário deveria “juntar declaração adicional de todos os proponentes, em
número mínimo legal, a propor os restantes candidatos denominados como
suplentes”.
Independentemente do modo como o mandatário percepcionou esta determinação,
afigura-se-nos que objectivamente ela não deixava margem para dúvidas.
Daí que o grupo de cidadãos, representado pelo seu mandatário, não possa
usufruir da atenuante que resultaria da imputação ao Tribunal de uma conduta a
induzir ou a concorrer para o erro em que lavrou o mandatário da lista, isto é,
independentemente das causas “internas” desse erro, o mesmo é-lhe integralmente
imputável.
Ora, inexistindo atenuantes para a manutenção da notada irregularidade, não
vislumbramos a possibilidade jurídica de admissão da lista de candidatos.
Efectivamente, a regularidade do processo eleitoral deriva exclusivamente da
regularidade dos elementos documentais em que assenta. Vigora um princípio de
literalidade que afasta a relevância de quaisquer outros elementos, mormente a
interpretação da vontade dos proponentes ou dos candidatos que não se tenha
manifestado nos elementos documentais respeitantes à lista.
Os elementos documentais concernentes à lista ora reclamante revelam que o
número mínimo legal de proponentes apoia um número de candidatos inferior ao
mínimo legal.
Por tal motivo, impõe-se a manutenção da anterior decisão.
3.
Pelo exposto, decide o Tribunal indeferir a reclamação apresentada pelo grupo de
cidadãos “Moimenta Sempre Mais”, mantendo, em consequência, a decisão de
rejeição da lista.
Notifique.
Cumpra o disposto no artigo 29.º, n.ºs 5, e 6, da Lei Eleitoral dos Órgãos das
Autarquias Locais.
Decorrido o prazo para recurso para o Tribunal Constitucional, e caso não o
haja, cumpra, de seguida, o disposto no artigo 35.º, n.º 1, da Lei Eleitoral dos
Órgãos das Autarquias Locais. Havendo recurso, cumpra essa norma, após
conhecimento da decisão daquele Tribunal.»
Nessa mesma data (2 de Setembro de 2005, sexta-feira), pelas 12h10m, procedeu-se
à afixação da lista definitiva à porta do referido Tribunal, segundo certidão
constante dos autos (fl. 3035).
Em 5 de Setembro de 2005, a segunda-feira imediatamente seguinte, deu entrada na
Secretaria Judicial do Tribunal de Gouveia o recurso dirigido ao Tribunal
Constitucional, que foi admitido, tendo sido dado cumprimento ao disposto no n.º
3 do artigo 33.º da LEOAL. Não foi apresentada qualquer resposta por parte dos
mandatários das restantes candidaturas.
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentos
3.A lei (artigo 31.º, n.º 2, da LEOAL) fixa um prazo de “quarenta e oito horas a
contar da afixação das listas a que se refere o n.º 5 do artigo 29.º” para a
interposição do recurso de constitucionalidade, e o presente recurso deu entrada
no Tribunal Judicial da Comarca de Gouveia no dia 5 de Setembro, quando a
afixação das listas ocorreu pelas 12h10m do dia 2 de Setembro, pelo que a
primeira questão a resolver é a da tempestividade do recurso.
Sendo o dia 2 de Setembro uma sexta-feira, o prazo de 48 horas transfere-se
inevitavelmente para a segunda-feira seguinte. Solicitada informação ao Tribunal
de Gouveia sobre a hora de entrega do recurso naquele Tribunal, verificou-se que
deu entrada às 9 horas do dia 5 de Setembro, segunda-feira, isto é, à hora de
abertura da Secretaria Judicial (cf. a informação de fls. 3054). Pelo que se
conclui que o recurso deu entrada dentro do referido prazo de quarenta e oito
horas, sendo tempestivo.
4.Como resulta da decisão da reclamação, ora recorrida, a rejeição da
candidatura teve como fundamento apenas a circunstância de que “o número mínimo
de proponentes apoia um número de candidatos inferior ao mínimo legal”.
Tal conclusão é assim fundamentada no despacho de 25 de Agosto já referido:
«Sucede, porém, que, apesar destas iniciativas, se mantém uma irregularidade que
afecta a lista.
Assim, se 13 proponentes indicaram os 7 primeiros candidatos, por outro lado, os
restantes 37 proponentes indicaram apenas 3 candidatos.
Desde logo resulta que os denominados candidatos suplentes, identificados sob os
n.ºs 5 a 14, não foram propostos por nenhum cidadão, o que implica que os seus
processos de candidatura são inválidos, não constituindo, na verdade, candidatos
ao órgão autárquico.
Restariam os restantes 7 candidatos, o que seria suficiente para a admissão da
lista, atento o disposto no artigo 27.º, n.º 3, da Lei Eleitoral dos Órgãos das
Autarquias Locais.
Todavia, destes 7 candidatos, como se referiu, aqueles que surgem identificados
como suplentes sob os n.ºs 1 a 4 foram indicados unicamente pelos últimos 13
proponentes, sendo que apenas os 3 primeiros candidatos (denominados efectivos)
foram indicados pelo número mínimo de proponentes (50).
Deste modo, a candidatura daqueles outros é inválida, pois teriam os mesmos de
ser propostos pelos 50 proponentes.
Restam assim em condições legais apenas os 3 primeiros candidatos.
De acordo com o já aludido n.º 3 do artigo 27.º da Lei Eleitoral dos Órgãos das
Autarquias Locais, a lista é definitivamente rejeitada por falta do número
mínimo de candidatos efectivos.»
5.A irregularidade que determinou a rejeição da lista em causa não consistiu,
como se vê, na falta do número mínimo de candidatos efectivos (sete), que estão
indicados (e, aliás, segundo o despacho de 22 de Agosto e o artigo 27.º, n.ºs 2
e 3, da LEOAL, nem precisariam de o ser, podendo os quatro candidatos efectivos
então em falta ser preenchidos com os suplentes indicados).
É certo que a primeira das declarações de candidatura apresentadas, apesar de se
encontrar subscrita por todos os candidatos, efectivos e suplentes, e pelo
mandatário, apenas identificava como declarantes, no início do respectivo texto,
os candidatos efectivos. Mas as segundas declarações de candidatura,
apresentadas em resposta à notificação do Tribunal, estão devidamente subscritas
por todos os candidatos, efectivos e suplentes.
6.O que está em causa é, pois, apenas a falta do número de proponentes – ou,
noutros termos, de declarações de propositura – mínimo que é de 50, por
aplicação do artigo 19.º, n.º 2, da LEOAL. Tal falta resultaria, segundo o
Tribunal recorrido, da circunstância de na “Lista de proponentes” apresentada,
quer originariamente, quer tentando cumprir o convite do Tribunal, se ter
efectuado, além da identificação da “lista do grupo de cidadãos eleitores à
eleição da Assembleia de Freguesia, sob a denominação Moimenta Sempre Mais”, a
indicação da constituição da lista, com referência apenas aos candidatos
efectivos (que eram apenas três, na “Lista de proponentes” primeiramente
apresentada, subscrita por 37 cidadãos, e sete, na declaração adicional de
propositura, subscrita por mais 13 cidadãos).
Ora, os artigos 19.º e 23.º da LEOAL não exigem que a declaração de propositura
das listas discrimine e identifique, um a um, todos os candidatos, efectivos e
suplentes, que integram a lista. Nos termos do artigo 19.º, n.º 4, da LEOAL, os
proponentes devem “subscrever declaração de propositura da qual resulte
inequivocamente a vontade de apresentar a lista de candidatos dela constante”.
Tal vontade pode, porém, resultar inequivocamente da identificação, pela
respectiva denominação, da lista que se encontra anexa, e na qual – aí sim – os
candidatos são elencados, devidamente identificados e ordenados.
No presente caso, a declaração de propositura, além da identificação da
denominação da lista, continha, manuscrita no espaço em branco para o efeito,
apenas indicação do nome dos candidatos efectivos. O problema decisivo reside,
pois, em saber se, tendo sido num primeiro momento entregues uma lista de
candidatos sob o nome “Moimenta Sempre Mais”, com três efectivos e catorze
suplentes (sendo os quatro primeiros suplentes correspondentes, pela mesma
ordem, aos efectivos 4.º a 7.º, indicados na lista adicional, posteriormente
entregue), e declarações de propositura subscritas por 37 cidadãos, que
declaravam apoiar a lista do grupo de cidadãos eleitores à eleição da Assembleia
de Freguesia, sob a denominação de Moimenta Sempre Mais, “constituída pelos
seguintes candidatos efectivos: Rui Manuel dos Reis Pais, Carlos Fernando Duarte
Pais, Orlando Óscar Alves Ferreira”, a identificação destes candidatos efectivos
em tais declarações faz com que devessem considerar-se excluídos da declaração
de propositura primeiramente apresentada os restantes candidatos integrantes da
lista apresentada – designadamente, os suplentes.
Na verdade, a entender-se que os candidatos suplentes tinham igualmente sido
objecto da declaração inicial de propositura – a qual se referia a uma lista,
identificada como a lista “Moimenta Sempre Mais”, e não apenas aos três
candidatos efectivos, isoladamente –, torna-se patente que tem de considerar-se
existir um número suficiente de declarações de propositura, devendo adicionar-se
os 37 proponentes constantes da declaração inicial aos 13 subscritores da
declaração adicional de propositura.
É que aqueles primeiros 37 proponentes propuseram uma lista então constituída
por três candidatos efectivos, e em que os restantes candidatos efectivos seriam
obtidos pelo reajustamento da lista resultante do preenchimento desses lugares
pelos suplentes propostos, nos termos do artigo 27.º, n.º 2, da LEOAL. Tal
reajustamento em caso de irregularidades da lista foi admitido, aliás, pelo juiz
do Tribunal Judicial de Gouveia no despacho de 22 de Agosto, corresponde à razão
de ser dos n.ºs 2 e 3 do artigo 27.º da LEOAL, e é admitido pela jurisprudência
do Tribunal Constitucional, que já afirmou, no acórdão n.º 492/2001 (in Diário
da República, II série, n.º 290, de 17 de Dezembro de 2001), que “embora no n.º
1 do mesmo artigo se diga que «são rejeitados os candidatos inelegíveis e as
listas cujas irregularidades não tenham sido supridas», tem de se entender, numa
lógica de aproveitamento dos actos jurídicos, que as irregularidades que
conduzem à rejeição da lista são apenas aquelas que a afectam no seu conjunto, e
não aquelas que afectam tão-só algum ou alguns dos candidatos – neste último
caso, tudo se deve passar como se esses candidatos fossem inelegíveis”. Por
outro lado, os restantes 13 proponentes referiram-se também à lista “Moimenta
Sempre Mais” constituída por sete candidatos efectivos, dos quais os efectivos
4.º a 7.º eram, pela mesma ordem, os anteriores suplentes 1.º a 4.º. Ou seja,
referiram-se a uma lista constituída pelos mesmos candidatos que resultavam,
directa ou indirectamente, da lista anterior.
Com efeito, não faria sentido que, se nenhum dos proponentes se tivesse referido
a uma lista com o número mínimo de candidatos efectivos (no caso, sete)
legalmente exigido, tal falta fosse suprível pelo reajustamento da lista, nos
termos do artigo 27.º, n.º 2, da LEOAL, passando os primeiros suplentes a
efectivos, não sendo tal suprimento, porém, possível quando apenas uma parte dos
proponentes (os que subscreveram a declaração inicial de propositura) se não
referiu directamente a uma lista com tal número de candidatos efectivos. Se,
pois, for de entender que a declaração inicial de propositura se referia à lista
tal como então fora apresentada, e não apenas aos três candidatos efectivos cujo
nome nela foi manuscrito, tem de tomar-se em conta o reajustamento da lista
então proposta (por parte dos proponentes), com preenchimento pelos primeiros
suplentes dos lugares seguintes de candidato efectivo em falta, somando-se as
declarações de propositura dessa lista às constantes da declaração adicional.
7.Ora, como se disse, entende-se que da lei não resulta, em relação à declaração
de propositura, qualquer exigência de especificação e identificação, nesta mesma
declaração, dos candidatos que integram a lista proposta. O conteúdo dessa
declaração, a expressão inequívoca da “vontade de apresentar a lista de
candidatos dela constante”, basta-se com a identificação dos candidatos por
remissão para a lista devidamente identificada.
Pelo que não pode concluir-se que a indicação suplementar, no cabeçalho da
declaração de propositura, e a par da denominação da lista, dos três candidatos
efectivos que a integravam, excluísse de tal declaração de propositura os
restantes candidatos (suplentes) que então integravam a lista, identificada pela
respectiva denominação.
Pelo modo como se fez o acrescento dos candidatos efectivos em falta – passando,
pela mesma ordem, os primeiros quatro suplentes a efectivos –, e pelo modo como
se manteve inalterado o número total de candidatos, não tendo sido introduzidos
novos candidatos suplentes, pode dizer-se que a lista de candidatura
apresentada, tal como proposta pelos primeiros proponentes e tal como objecto da
declaração adicional de propositura, permaneceu a mesma. Tal estabilidade, com
os mesmos candidatos e sob a mesma denominação, transforma numa exigência formal
sem justificação a de que as declarações dos proponentes fossem todas expressas
no mesmo momento, ou de que identificassem nominalmente, elencando-os em cada
declaração de propositura, todos os candidatos que integram a lista (sendo,
aliás, que a exigência de declaração adicional de proponentes resultou
manifestamente da não consideração de uma excepção legal ao princípio base de
determinação do número de proponentes para as listas de cidadãos, que faz com
que o número mínimo de proponentes tenha de ser de 50).
E conclui-se, assim, que deve ser revogada a decisão recorrida, admitindo-se às
eleições para a Assembleia de Freguesia de Moimenta da Serra a lista de
candidatos apresentada pelo grupo de cidadãos “Moimenta Sempre Mais”.
III. Decisão
Pelos fundamentos expostos, decide-se conceder provimento ao recurso e admitir a
candidatura à eleição da Assembleia de Freguesia de Moimenta da Serra da lista
apresentada pelo grupo de cidadãos “Moimenta Sempre Mais”.
Lisboa, 16 de Setembro de 2005
Paulo Mota Pinto
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria João Antunes
Maria Fernanda Palma
Mário José de Araújo Torres
Vítor Gomes
Benjamim Rodrigues
Rui Manuel Moura Ramos
Bravo Serra
Gil Galvão
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Maria Helena Brito
Artur Maurício