Imprimir acórdão
Processo n.º 777/05
Plenário
Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional:
A – Relatório
1 – Aprígio dos Santos Venda, primeiro proponente da lista
denominada “ProRebordosa”, candidata à eleição da Assembleia de Freguesia de
Rebordosa, concelho de Paredes, realizada no dia 9 de Outubro de 2005, dirigiu
ao Tribunal Constitucional o requerimento que, de seguida, se transcreve:
«Aprígio Venda, primeiro proponente da lista denominada 'ProRebordosa',
candidata à Assembleia de Freguesia de Rebordosa, vem por este meio, fazer uma
exposição das seguintes irregularidades ocorridas no acto eleitoral realizado na
freguesia de Rebordosa:
I
Depois do encerramento de todas as secções de voto e do levantamento da
documentação por parte da GNR e estando já a caminho da Assembleia de Apuramento
Geral, esta foi chamada novamente à Assembleia de Apuramento Local, Escola EB
2/3 de Rebordosa, por um funcionário da Junta de Freguesia.
II
Após a chegada da GNR à referida escola, foram solicitados os documentos
respeitantes à secção de voto nº 6, pelo presidente da referida mesa, Dr. Manuel
Domingos, indicado pelo PPD/PSD e candidato à Assembleia Municipal.
III
Tomei conhecimento pela Junta de Freguesia, que na secção de voto nº 6, o
presidente da mesa, em presença dos restantes membros da mesa, procedia à
recontagem de votos.
IV
Dirigindo-me à secção de voto nº 6, apercebi-me da ausência dos delegados das
forças políticas.
V
Reclamei junto da Junta de Freguesia o facto da documentação ter regressado à
secção de voto, depois de já se encontrar a caminho da Assembleia de Apuramento
Geral de Paredes.
Reclamei também o facto de ter visto boletins de voto em cima de uma mesa, na
referida secção de voto, enquanto se procedia à referida recontagem, sem a
presença dos delegados das forças política.
VI
O agente da GNR no local identificou o funcionário que o chamou, bem como o
presidente da secção de voto nº 6, tomando nota da ocorrência.
VII
No dia 10 de Outubro, na Escola EB 2/3 de Rebordosa, pelas 9.30 h, no pavilhão B
onde estavam instaladas as secções de voto nº 5, 6, 7, 8 e 9, um funcionário da
Câmara Municipal de Paredes, que se encontrava a recolher todo o material
utilizado na realização do acto eleitoral, encontrou um pacote escondido por
detrás de uma estante de marcação de voto. Esse pacote foi entregue a duas
funcionárias da referida escola, que se encontravam de momento no local. O
referido pacote encontrava-se lacrado e estava direccionado ao presidente da
Câmara Municipal de Paredes. De seguida foi dado conhecimento à Presidente do
Conselho Executivo do Agrupamento Vertical de Escolas de Rebordosa, que procedeu
à entrega do referido pacote a um agente da GNR de Lordelo. A entrega foi
efectuada pelas 10h 30m, do mesmo dia.
Para dar consistência aquilo que acabei de relatar, junto em anexo declarações
das duas funcionárias já mencionadas, bem como da Presidente do Conselho
Executivo do Agrupamento Vertical das Escolas de Rebordosa.
Considerando que o destacamento da GNR de Lordelo não emite em tempo útil, para
apenso a este processo, a certidão comprovativa ou fotocópia dos autos da
ocorrência, é de requerer a nível oficia que estes autos sejam apensos ao
processo.
VIII
Tendo em conta o atrás descrito:
Tenho o direito de suspeitar da intenção ilegítima do presidente da mesa de
secção de voto nº 6, em fazer regressar á secção de voto, toda a documentação já
levantada e devidamente encaminhada.
Tenho o direito de suspeitar de todo e qualquer resultado que possa ser
proveniente de todo e qualquer acto praticado nessa secção de voto, sem a
presença dos delegados.
Tenho o direito de suspeitar da existência de uma nova acta não assinada pelos
delegados, ou da rasura da acta verdadeira, sem o consentimento, porque não
estavam presentes, dos referidos delegados.
Tenho o direito de suspeitar de má-fé e tentativa de viciação de resultados.
Tenho o direito de suspeitar da própria viciação de resultados.
Em virtude do que foi exposto anteriormente, venho requerer a impugnação do acto
eleitoral, e consequente realização de novo acto eleitoral, na freguesia de
Rebordosa».
À petição, o requerente juntou três declarações, subscritas pela
“Presidente do Conselho Executivo do Agrupamento Vertical de Escolas de
Rebordosa, concelho de Paredes” e por duas funcionárias da Escola Básica do 2º e
3º Ciclos de Rebordosa.
2 – O requerimento foi enviado pelo correio registado, tendo como
data de registo o dia 10 de Outubro de 2005 e deu entrada, no Tribunal
Constitucional, no dia 11 de Outubro de 2005.
3 – Por fax, recebido entre as 13,00 e 13, 01 horas, o requerente
repetiu a petição enviada, alegando fazê-lo por ter ficado na dúvida sobre se o
original enviado anteriormente continha ou não a sua assinatura.
B – Fundamentação
4 – Não obstante os termos verbais utilizados no início da sua
petição, onde diz “vem por este meio, fazer uma exposição das seguintes
irregularidades ocorridas no acto eleitoral realizado na freguesia da
Rebordosa”, pode concluir-se, quer pelas razões que aduz em fundamentação do
pedido, quer pelo jeito como o formula – “requerer a impugnação do acto
eleitoral, e consequente realização de novo acto eleitoral, na freguesia da
Rebordosa” – que o requerente pretende recorrer contenciosamente das
irregularidades do acto de apuramento local da secção de voto n.º 6 da freguesia
de Rebordosa, concelho de Paredes, na eleição realizada no dia 9 de Outubro de
2005.
Em situação idêntica à dos presentes autos, o Tribunal
Constitucional (Ac. nº 585/01, D.R. II Série, de 28 de Janeiro de 2002) decidiu
não tomar conhecimento do recurso, fundando-se nas seguintes razões:
«O artigo 158º da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais (aprovada pelo
nº 1 do artigo 1º da Lei Orgânica nº 1/2001 de 14 de Agosto) dispõe que “o
recurso contencioso é interposto perante o Tribunal Constitucional no dia
seguinte ao da afixação do edital contendo os resultados do apuramento”. Há que
entender que o artigo 158º se refere a “resultados do apuramento” geral. A mesma
expressão é usada no artigo 150º, segundo o qual “os resultados do apuramento
geral são proclamados pelo presidente da assembleia até ao 4º dia posterior ao
da votação e, em seguida, publicados por meio de edital afixado à porta do
edifício onde funciona a assembleia”.
Esta solução só pode ser duvidosa quanto às irregularidades ocorridas no decurso
da votação ou do apuramento local, de que são exemplo as invocadas no presente
recurso. A letra do artigo 158º é compatível com a fixação de um prazo
peremptório de um dia depois do apuramento local para esses recursos. Só que não
haveria justificação racional para tal fixação. A ser assim, a parte recorrente
seria obrigada a recorrer antes de saber se teria interesse em recorrer, visto
que poderia ainda sair vencedora do apuramento geral, seja quanto ao resultado
das eleições, seja quanto à correcção das irregularidades que invocou, nos casos
em que essa correcção pode ser feita pelo apuramento geral. Ora o nº 2 do artigo
156º, que é uma inovação da LEOAL, faculta à parte “a interposição de recurso
gracioso perante a assembleia de apuramento geral no 2º dia posterior ao da
eleição”. A parte seria assim obrigada a recorrer antes de conhecer a decisão de
recurso gracioso que poderia ainda interpor depois da interposição do recurso
contencioso, mesmo quando tal decisão a satisfizesse em face do resultado ou a
convencesse pelos fundamentos. Assim, no caso presente, a assembleia de
apuramento geral poderia ainda, por hipótese, concluir que a eleitora que,
segundo a recorrente, não estaria inscrita nos cadernos eleitorais, afinal se
encontrava neles. Mas, o que é mais grave, a parte seria obrigada a recorrer
antes de saber se o recurso poderia ter provimento, a serem provados os factos
que alega. Na verdade, o artigo 160º, nº 1, estabelece que a votação só será
julgada nula quando se hajam verificado ilegalidades que possam influir no
resultado geral da eleição do respectivo órgão autárquico. Ora, só depois do
apuramento geral se pode saber desta condição do provimento do recurso. Assim
sendo, tal interpretação encurtaria ainda desnecessariamente o prazo de
interposição, pois que o Tribunal sempre teria que esperar pela comunicação dos
resultados do apuramento geral para julgar das condições de procedibilidade. Até
porque pode estar em causa a eleição de três órgãos autárquicos distintos.
Por sua vez , o Tribunal, para cumprir os prazos que o artigo 159º de LEOAL lhe
impõe, seria obrigado a notificar imediatamente os representantes dos partidos
políticos, coligações e grupos de cidadãos intervenientes na eleição para
responderem, querendo, no prazo de um dia, bem como a requisitar todos os
elementos de prova solicitados na petição de recurso, incluindo a futura acta de
apuramento geral e respectivos anexos – e, neste caso, antes da realização desta
e quando tais elementos, por isso mesmo, não podem ser fornecidos sem impedir o
apuramento geral -, tudo isto sem saber se a parte manteria interesse em
recorrer, continuaria a sustentar todos os fundamentos ou se poderia tomar
conhecimento do recurso. Estaria o Tribunal a notificar para ou a requisitar
actos eventualmente inúteis dos representantes dos outros concorrentes às
eleições, do juiz da comarca e do governador civil e estes solicitados ou
obrigados a praticá-los.
Há, pois, que entender que se mantêm (e na hipótese do nº 2 do artigo 156º se
reforçaram) as razões sistemáticas que faziam que a anterior lei eleitoral, o
Decreto-Lei nº 701-B/76 de 29 de Setembro, explicitasse que o prazo para a
interposição de recurso para o Tribunal Constitucional se contava “a contar da
afixação do edital a que se refere o artigo 99º”, que era o edital com os
resultados do apuramento geral.
Mantém-se, assim, a doutrina do Acórdão nº 717/97 (Acórdãos do Tribunal
Constitucional, 38, 443, 450, 451), que, numa hipótese semelhante, julgou que o
recurso foi prematuramente apresentado e que não ficam os recorrentes impedidos
da apreciação contenciosa das irregularidades invocadas uma vez que o poderão
fazer após a afixação do edital do apuramento geral».
Por não haver razões para dela dissentir, reitera-se a doutrina que
se extrai desta decisão.
C – Decisão
5 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional
decide não conhecer do recurso.
Lisboa, 12 de Outubro de 2005~
Benjamim Rodrigues
Rui Manuel Moura Ramos
Gil Galvão
Bravo Serra
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Maria Helena Brito
Paulo Mota Pinto
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria João Antunes
Maria Fernanda Palma
Mário José de Araújo Torres
Vítor Gomes
Artur Maurício