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Processo n.º 529/05
1.ª Secção
Relator: Conselheiro Pamplona de Oliveira
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
A. reclama, ao abrigo do n.º 4 do artigo 76º da Lei 28/82 de 15 de Novembro
(LTC), contra o despacho do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça que lhe
não admitiu o recurso que pretendia interpor para este Tribunal. Fá-lo nos
seguintes termos:
1- O ora recorrente interpôs recurso para o Tribunal Constitucional da decisão
do Ex.mo Sr. Dr. Juiz Presidente do Supremo Tribunal de Justiça que indeferiu a
reclamação e não admitiu o recurso interposto para fixação de jurisprudência da
decisão proferida pelo Ex.mo Sr. Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra
que indeferiu a reclamação apresentada do despacho de 1ª instância, que não
admitira o recurso por extemporaneidade.
2 - Entende o ora reclamante que nesses autos suscitou a inconstitucionalidade
da norma constante no n.º 4 do artigo 405.º do Código de Processo Penal, bem
como da violação do Princípio Constitucional consagrado no artigo 13.º da
Constituição da República Portuguesa: 'Todos os cidadãos são iguais perante a
lei'.
3 - Por requerimento feito a fls. 68, notificado para o efeito, nos termos do
artigo 75-A n.º 2 e n.º 5, veio o arguido dizer que suscitou as questões da
inconstitucionalidade na reclamação dirigida ao Ex.mo Sr. Juiz Conselheiro
Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
4 - Nesse requerimento esclareceu que nessa peça processual havia suscitado a
inconstitucionalidade do n.º 4 do artigo 405.º do CPP, bem como, a violação do
principio da igualdade da lei para todos os cidadãos, consagrado no artigo 13.º
da nossa Constituição.
5 - O Ex.mo Sr. Dr. Juiz Conselheiro Presidente do Supremo Tribunal de Justiça,
entendeu, que a questão da inconstitucionalidade da norma do artigo 405.º n.º 4
do CPP, não foi suscitada naquela peça processual.
6 - Com todo o respeito por tal opinião, o ora reclamante não concorda que assim
seja.
7 - Antes, acredita ter suscitado essa questão da inconstitucionalidade, embora
de uma forma implícita nos parágrafos n.º 60 a 65 e 67 a 70.
8 - Contudo, já quanto à violação do principio da igualdade da lei para todos os
cidadãos, o Ex.mo Sr. Dr. Juiz Conselheiro Presidente do Supremo Tribunal de
Justiça, no seu, aliás douto, despacho que não admitiu o recurso interposto pelo
ora reclamante, não se pronunciou.
9 - Ora, naquela peça processual, foi expressamente invocada a máxima
constitucional - 'a lei é igual para todos' - e o princípio da igualdade perante
a lei, consagrado no artigo 13.º da nossa Constituição e que o ora reclamante
defende ter sido violada e violado nestes autos.
10 - A violação daquela máxima e princípio constitucional, foi expressamente
invocada nos parágrafos n.º 40 a 53 pelo que não vê o ora reclamante razão para
a mesma não ser apreciada pelo Tribunal Constitucional, apreciação que desde já
se requer.
11 - Uma vez que, muito embora o Ex.mo Sr. Dr. Juiz Conselheiro Presidente do
Supremo Tribunal de Justiça, não tenha admitido o recurso interposto pelo ora
reclamante para o Tribunal Constitucional, nada disse quanto à violação
constitucional invocada e cuja apreciação também se requereu na interposição
daquele recurso.
12 - Considera, contudo, o ora reclamante, que a questão da
inconstitucionalidade da norma do artigo 405º n.º 4 do CPP foi de facto
suscitada na reclamação dirigida ao Ex.mo Sr. Dr. Juiz Conselheiro Presidente do
Supremo Tribunal de Justiça, embora de forma implícita, nos parágrafos 60 a 65 e
67 a 70 desta peça.
13 - Nesses parágrafos o ora reclamante entende que, por força daquela norma, as
decisões dos Ex.mos Srs. Presidentes dos Tribunais Superiores, têm um carácter
mais decisivo e vinculativo que as decisões proferidas pelos Tribunais a que
presidem.
14 - Nesse sentido, o ora reclamante, entende que deveria ser precisamente ao
contrário.
15 - Ou seja, as decisões tomadas pelo colectivo daqueles Tribunais, serem mais
decisivas e vinculativas do que as decisões tomadas pelos seus Ex.mos
Presidentes.
16 - Pois, com todo o respeito pelos Ex.mos Srs. Presidentes daqueles Tribunais,
sempre terá de se entender que as decisões tomadas por um conjunto de Juízes
será, ou pelo menos deverá ser, mais 'perfeita' que as decisões dos Ex.mos Srs.
Presidentes.
17 - Contudo, se caírem no âmbito da norma constante do n.º 4 do artigo 405.º do
CPP, aquelas decisões dos Ex.mos Srs. Juízes Presidentes daqueles Tribunais
adquirem um poder imperial que os próprios acórdãos não têm.
18 - Nos parágrafos referidos da reclamação dirigida ao Ex.mo Sr. Dr. Juiz
Presidente Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, defende-se precisamente
isso.
19 - Assim, muito embora não tenha o ora reclamante suscitado expressamente a
inconstitucionalidade daquela norma, entende que a mesma se poderá depreender
ter sido suscitada, pelas ideias expostas e defendidas naqueles parágrafos.
20 - Ideias essas que vão de encontro à inconstitucionalidade daquela norma.
21 - Entende o ora reclamante ter suscitado essa questão da
inconstitucionalidade, embora de forma implícita, pelo que requer desde já a sua
apreciação.
NESTES TERMOS,
e nos demais de direito aplicáveis, deve o, aliás douto, despacho do Ex.mo Sr.
Dr. Juiz Presidente Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça ser revogado e em
consequência ser admitido o recurso interposto para o Tribunal Constitucional
nos termos atrás alegados.
O despacho reclamado é do seguinte teor:
O disposto no art. 75°-A, n.º 2 da LTC exige que no requerimento de interposição
de recurso seja indicada a peça processual onde a questão da
inconstitucionalidade foi suscitada, e como tal não aconteceu foi a parte
convidada a fazê-lo, nos termos do n.º 5 do referido artigo.
Vem agora o recorrente, no seu requerimento de fls. 68, dizer que, no
respeitante à inconstitucionalidade do art. 405.º, n.°4 do CPP, ela foi arguida
na reclamação que nos foi dirigida, ainda que não expressamente.
Ora, após uma leitura dos parágrafos 60 a 65 e 67 a 70 da reclamação indicados
pela recorrente, verifica-se que a inconstitucionalidade da referida norma não
foi suscitada nem implícita nem explicitamente.
E, manifestamente, como a doutrina tem assinalado, é momento inidóneo para
suscitar a questão da inconstitucionalidade o requerimento de interposição de
recurso para o Tribunal Constitucional, por, após a sua apresentação, o tribunal
a quo já não poder emitir juízos de inconstitucionalidade.
Assim, não se admite o recurso interposto a fls. 60, para o Tribunal
Constitucional.
Sobre o pedido diz o representante do Ministério Público:
A presente reclamação é manifestamente improcedente. Na verdade, o reclamante
não suscitou durante o processo e em termos processualmente adequados, qualquer
questão de inconstitucionalidade normativa, susceptível de servir de base ao
recurso interposto para este Tribunal Constitucional.
Cumpre decidir.
A presente reclamação assenta num equívoco manifesto do reclamante: o recurso de
constitucionalidade previsto na alínea b) do n. 1 do artigo 70º da LTC tem uma
característica peculiar; é que, ao contrário dos recursos jurisdicionais comuns,
o seu objecto não consiste na decisão recorrida em si mesmo considerada, mas em
norma aplicada nessa decisão apesar de acusada de inconstitucional. Além disso,
exige-se que o objecto do recurso concretize uma questão de
inconstitucionalidade normativa, suscitada em termos de o tribunal recorrido
estar obrigado a conhecê-la. Isto é: se em regra o tribunal comum não pode
ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, é bem certo que as
questões de inconstitucionalidade normativa não podem ser implicitamente
levantadas, conforme sustenta o reclamante, antes se requer que o interessado as
coloque de acordo com o princípio do pedido, ou seja, mediante expressa
solicitação de resolução da controvérsia. Ora, a verdade é que, tal como se
julgou no despacho reclamado, o reclamante nunca enunciou qualquer questão de
inconstitucionalidade normativa, requerendo no processo que sobre ela recaísse a
pronúncia do Tribunal recorrido. As referências feitas pelo reclamante a
princípios ou normas constitucionais surgem a título argumentativo, como razões
lógicas de apoio a uma determinada solução, mas sem constituírem pedido de
solução de uma controvérsia autónoma, nascida da desconformidade constitucional
da norma aplicada como ratio decidendi.
Decide-se, por isso, indeferir a reclamação, com custas pelo reclamante, sem
prejuízo do apoio judiciário eventualmente concedido. Taxa de justiça: 20 UC.
Lisboa, 14 de Julho de 2005
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria Helena Brito
Rui Manuel Moura Ramos