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Processo n.º 266/05
3.ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional
1. A. e B., reclamam, ao abrigo do n.º 4 do artigo 76.º da Lei n.º
28/82, de 15 de Novembro (LTC), do despacho de 19 de Outubro de 2004 (fls. 463)
que não admitiu recurso que interpôs para o Tribunal Constitucional (fls. 461),
no âmbito de um processo de recurso de revista em que os agora reclamantes foram
recorridos e em que foram recorrentes C. e D..
Na parte desse requerimento que pode ter algum aproveitamento como
reclamação para o Tribunal Constitucional do despacho que não admitiu o recurso
de constitucionalidade – no mais, os requerentes produzem considerações sobre a
razão que entendem assistir-lhes quanto ao fundo da causa e quanto à pretensão
de ser proferida decisão de harmonização de jurisprudência, matérias que não
cabem nos poderes de cognição deste Tribunal –, os reclamantes dizem o
seguinte:
“(...)notificados do douto Indeferimento do recurso tempestivamente apresentado
para o Tribunal Constitucional,
Com o mesmo não se conformando, vem
Nos termos do art.º 76.º n.º 4 da Lei do Tribunal Constitucional e art.º 20.º
n.º 1 da C.R.P., apresentar a sua reclamação.
Com base no seguinte somatório de factos e fundamentos:
1º
Salvo melhor opinião, a fundamentação aduzida pelo Sr. Dr. Juiz Conselheiro,
aquando do indeferimento do requerimento de recurso, apenas e tão só tem
aplicabilidade directa nos casos em concreto do “julgamento ampliado de revista”
– conf. Art.º 732º-A do C.P.C.
2º
O facto de os aqui recorrentes, no decorrer do processo e no acórdão em questão,
não terem alegado qualquer Constitucionalidade/inconstitucionalidade de qualquer
norma legal, o que não é verdade como adiante se verá, não se lhes afigura razão
bastante para o indeferimento ora em crise.
3º
Com efeito, para além de não corresponder à verdade tal conclusão, porquanto,
decorre dos próprios autos, que os princípios constitucionais da igualdade e do
direito à habitação sempre estiveram presentes e que se podem assim objectivar:
- da mesma forma que os recorrentes executaram as suas obras com autorização do
outro condómino e com autorização Municipal, também este executou as suas obras
– ampliação – embora sem autorização municipal, com autorização particular dos
aqui recorrentes – Do direito à habitação – art. 65º n.º 1 da CRP – (as obras
dos recorrentes, legalmente autorizadas sempre visaram dotar a sua habitação de
dimensão adequada ao seu agregado familiar, de forma a que as condições mínimas
de higiene e de conforto ficassem asseguradas).
4º
É certo que tal fundamentação apenas e tão só pode merecer aplicabilidade no que
concerne ao “Julgamento ampliado de revista – vide art.º 732º-A do C.P.C.;
5º
Acresce que, causa profunda estranheza aos quais recorrentes a teor do despacho
em crise, por duas ordens de razões:
Em primeiro lugar, porque o mesmo não aponta, para o indeferimento ora
contestado, qualquer fundamentação legal – não é referido qualquer preceito
legal e, em segundo lugar, porque se pretende coarctar os recorrentes do acesso
ao direito de defesa dos seus legítimos direitos e interesses, maxime, quando
por mero “esquecimento”, acredita-se..., nada se diz quanto à ilegalidade das
normas violadas no douto acórdão que julgou procedente a acção julgada
parcialmente improcedente em primeira instância.
6º
Ora, assiste também direito de recurso para o Tribunal Constitucional quando uma
das partes: “haja suscitado a questão de constitucionalidade ou da legalidade” –
art.º 72º n.º 2 da Lei do T.C.;
(...).”
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer nos termos
seguintes:
“A presente reclamação carece ostensivamente de fundamento sério, já que os
reclamantes não individualizaram qualquer questão de inconstitucionalidade
normativa, susceptível de integrar objecto idóneo de um recurso de
constitucionalidade. Aliás, fundado tal recurso na alínea a) do n.º 1 do art.º
70.º da Lei n.º 28/82, sempre seria evidente a inverificação dos pressupostos,
por a decisão recorrida não ter obviamente versado a aplicação de qualquer
norma, com fundamento em inconstitucionalidade.”
2. Para decisão da reclamação interessam as ocorrências processuais
seguintes:
a) Por acórdão de 6/7/04, no processo n.º 4475/03 em que são partes como
Recorrentes: C. e mulher e Recorridos: A. e mulher, concedendo a revista, o
Supremo Tribunal de Justiça, revogou o acórdão do Tribunal da Relação e julgou
procedente o pedido formulado pelos autores;
b) Notificados desse acórdão, os ora reclamantes (réus na acção e aí
recorridos) apresentaram um requerimento, em 17 de Setembro de 2004 ( fls 451),
pedindo o julgamento ampliado da revista, nos termos do nº 2 do artigo 732.º-A
do CPC.
c) Sobre esse requerimento foi proferido, em 30/9/04, o seguinte despacho
(fls. 458):
“Indefere-se o requerido a fls. 451 e segs. pela parte A. e mulher.
Em primeiro lugar, os requerentes não indicam um único acórdão deste S.T.J. que
esteja em contradição com o acórdão agora proferido, condição essencial para que
possa haver uniformização da jurisprudência.
Em segundo lugar, o art. 732º-A do C.P.C. só permite o recurso de uniformização
de jurisprudência (revista ampliada) a partir de acórdãos da 2ª instância e não
a partir de acórdão do S.T.J.
Daí que os requerentes a pretender a revista ampliada, deviam tê-la requerido
logo que recorreram para o S.T.J. e não agora com a questão decidida.”
d) Os recorrentes interpuseram recurso para o Tribunal Constitucional com
requerimento do seguinte teor:
“A. e outro, melhor identificados nos autos, notificados do despacho a fls. 458
dos autos, com o mesmo não se conformando, vêm:
Nos termos do art.ºs 70º al. A), 72º nº 1 b) da Lei do Tribunal Constitucional e
artº.s 280º da Constituição da República Portuguesa, apresentar recurso para o
Tribunal Constitucional, indicando desde já que, no seu modesto entendimento,
foram ofendidos os artºs. 65º, 66º e 67º da C.R.P..”
e) Sobre este requerimento recaiu o seguinte despacho, de 19/10/04 (fls.
463) :
“Não admito o recurso para o T.C. porque não foi invocada pelas partes ao longo
do processo, nem foi apreciada no acórdão em questão a
constitucionalidade/inconstitucionalidade de qualquer norma legal.
Notifique.”
f) Os recorrentes apresentaram o requerimento de fls. 466 ss, acima
parcialmente transcrito, sobre o qual recaiu o seguinte despacho do Presidente
do Supremo Tribunal de Justiça :
“Embora no cabeçalho se refira Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, o
requerimento de fls. 114 a 121 constitui uma reclamação para o Tribunal
Constitucional do despacho do Exmo. Conselheiro relator de fls. 113 que não
admitiu o recurso para aquele Alto Tribunal.
Assim sendo, remeto os presentes autos ao Tribunal Constitucional.”
3. Resulta inequivocamente da sequência de actos processuais que se
pôs em destaque que a decisão judicial de que os recorrentes pretenderam
recorrer para este Tribunal é o despacho de 30 de Setembro de 2004 [supra n. 2.
c )], que não admitiu o julgamento ampliado da revista e não o acórdão de 6 de
Julho de 2004 que julgou o recurso interposto do acórdão da Relação [supra n.º
2. a)]. O requerimento de interposição de recurso de fls. 461 [supra n.º 2. d)]
é inequívoco. Portanto, apesar de o despacho reclamado [supra 2. e)] fazer
referência ao “acórdão em questão”, é o recurso daquele outro despacho, o único
interposto para o Tribunal Constitucional, que se considera não admitido.
4. Visto o disposto nos artigos 70.º, n.º 1, 72.º, n.º 2 e 75.º-A, n.ºs 1 e 2,
da LTC, a reclamação é manifestamente improcedente, pelas seguintes razões, cada
uma de per si bastando para conduzir a esse resultado:
- No despacho de fls. 458 não se recusou a aplicação de qualquer norma
com fundamento em inconstitucionalidade. Portanto, o recurso não pode ser
admitido ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, que é a previsão
de recurso de constitucionalidade que a recorrente invocou no requerimento de
interposição.
- Mesmo que, como parece pressuposto no despacho sob reclamação, se
considerasse ter existido lapso na indicação da alínea a) e se considerasse que
a recorrente pretendeu recorrer ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º
da LTC – a recorrente não faz nenhum esforço para convencer disso, corrigindo,
na reclamação, essa indicação – não foi suscitada no requerimento sobre que tal
despacho recaiu a inconstitucionalidade de qualquer norma, designadamente do
artigo 732.º-A do CPC, que foi o regime aplicado pelo despacho de que se
recorreu para o Tribunal Constitucional.
- A reclamante não procedeu, no requerimento de interposição, à
indicação da norma cuja (in)constitucionalidade quer ver apreciada. E também não
aproveitou a reclamação para suprir essa falta, como teria de fazer, uma vez
que, fazendo a decisão caso julgado quanto à admissibilidade do recurso, nos
termos do n.º 4 do artigo 77.º da Lei n.º 28/82, é pressuposto do provimento da
reclamação que estejam reunidas todas as condições para que o Tribunal
Constitucional possa resolver definitivamente, no momento em que a aprecia,
sobre a admissibilidade do recurso (Acórdão n.º 18/04, Diário da República, II
série, de 21 de Fevereiro de 2004). Ainda hoje não é possível determinar qual o
objecto (mediato) do recurso interposto, qual a norma cuja conformidade a
preceitos ou a princípios constitucionais os requerentes pretendem que o
Tribunal aprecie.
Assim, é ostensiva a inviabilidade da reclamação.
5. Decisão
Pelo exposto, indefere-se a reclamação do despacho de não admissão do recurso e
condena-se os recorrentes nas custas, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte)
unidades de conta.
Lisboa, 20 de Abril de 2005
Vítor Gomes
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Artur Maurício