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Processo n.º 327/05
1.ª Secção
Relatora: Conselheira Maria Helena Brito
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
I
1. Notificado do acórdão da conferência de fls. 81 e seguintes
(Acórdão n.º 402/2005, de 14 de Julho), que lhe indeferiu a reclamação de fls.
73 e seguintes, desatendendo a arguição de nulidade da decisão sumária de fls.
56 e seguintes e, bem assim, não considerando inconstitucional a norma do artigo
78º-A, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional, na interpretação explicitada na
aludida reclamação, vem agora A., através do requerimento de fls. 91 e
seguintes, arguir a “inexistência jurídica, nulidade ou ineficácia” do
mencionado acórdão da conferência, a “não preclusão do direito do recorrente à
reclamação prevista no artigo 78º-A, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional”
e, por fim, interpor recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional ao
abrigo dos artigos 224º, n.º 3, da Constituição, e 79º-D, da Lei do Tribunal
Constitucional.
Em síntese, o requerente alega o seguinte:
a) O acórdão da conferência é inexistente, nulo ou ineficaz, pois que o
requerimento do recorrente de fls. 73 e seguintes havia sido dirigido à
relatora;
b) O objecto do requerimento de fls. 73 e seguintes é uma nulidade
processual e não uma nulidade de sentença;
c) Ainda que o acórdão da conferência não deva ser considerado
inexistente pelos motivos apontados, padece o mesmo de nulidade por omissão de
pronúncia e, bem assim, de nulidade por excesso de pronúncia;
d) A nulidade por omissão de pronúncia decorre da não apreciação das
questões vertidas nos números 1, 2 e 4, na primeira parte do n.º 3, na segunda
parte do n.º 3, no n.º 5, no n.º 6 e no n.º 7 do requerimento de fls. 73 e
seguintes;
e) A nulidade por excesso de pronúncia decorre da apreciação da questão
da especialidade quanto à matéria, no domínio do processo constitucional, da
norma do artigo 78º-A, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional, bem como da
apreciação da questão da competência da conferência para o proferimento da
decisão definitiva acerca do conhecimento do objecto do recurso de
constitucionalidade;
f) O acórdão da conferência aplicou norma arguida de
inconstitucionalidade, em sentido contraditório/divergente com outras decisões
proferidas no domínio de aplicação da mesma norma;
g) O acórdão da conferência invoca jurisprudência impertinente e
desnecessária;
h) O direito do recorrente à reclamação do artigo 78º-A, n.º 3, da Lei
do Tribunal Constitucional não se encontra precludido;
i) A norma segundo a qual “se entender que não pode conhecer-se do
objecto do recurso, o relator, antes de proferir decisão, ouvirá cada uma das
partes” foi considerada vinculativa pelo Tribunal Constitucional, nos acórdãos
n.ºs 28/94, 11/99, 466/2000, 189/2003, 660/2004 e 79/2005;
j) A norma que permite o não conhecimento do objecto do recurso
admitido no tribunal a quo, sem audição prévia do recorrente no tribunal ad
quem, e sem alegações, viola ostensivamente as normas e os princípios dos
artigos 20º, n.ºs 1 e 4, 202º, n.º 2, e 280º, n.º 1, alínea b), da Constituição,
sendo sancionada nos termos dos seus artigos 3º, n.º 3, e 204º, e não podendo a
impugnação de uma decisão jurisdicional ser havida como audição prévia à mesma,
ou seu sucedâneo.
Termina o requerente dizendo que “[c]aso não se acolha a arguição de
inexistência jurídica, nulidade ou ineficácia do acórdão de 14.7.2005, dele se
recorre para o Plenário ao abrigo das normas dos artigos 224º, n.º 3, da CRP, e
79º-D da LTC, por se verificar contradição/divergência na aplicação da norma que
tem sede no artigo 20º, n.ºs 1 e 4, da CRP, directamente aplicável, e
concretização nos artigos 3º, n.º 3, e 704º, n.º 1, do CPC, aplicáveis ex vi
artigo 69º da LTC”.
2. O representante do Ministério Público junto do Tribunal
Constitucional respondeu nos seguintes termos (fls. 106 e seguinte):
“[…]
1 - O requerimento ora apresentado carece obviamente de fundamento, já que nada
obsta a que sejam logo dirimidas pela conferência questões que o reclamante haja
colocado à apreciação do relator, quando seja manifesto que – em termos
substanciais – o que se pretende é a impugnação da decisão sumária inicialmente
proferida.
2 - E sendo também evidente que dessa qualificação da pretensão deduzida como
«reclamação para a conferência» não decorre qualquer diminuição das garantias
do reclamante, que vê apreciadas as suas razões pelo órgão jurisdicional
(colegial) competente para sobre elas proferir decisão final.
3 - Verificando-se, por outro lado, perante a conduta processual do recorrente,
os pressupostos tipificados no artigo 84°, n.º 8, da Lei do Tribunal
Constitucional, urge proceder à extracção de traslado, devolvendo-se de pronto
os presentes autos ao Tribunal «a quo».”
Cumpre apreciar.
II
3. Não obstante o requerimento de fls. 73 e seguintes não ter sido
formalmente designado pelo requerente como “reclamação para a conferência”, a
verdade é que, atento o seu conteúdo, era esse o meio processual a que
correspondia, e como tal foi processado neste Tribunal. Explicou-se, aliás, no
acórdão da conferência ora impugnado (cfr. o n.º 4) o motivo pelo qual era
aplicável o disposto no artigo 78º-A, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional.
Não procede, assim, o alegado supra, 1., a) e h).
A circunstância de, no requerimento de fls. 73 e seguintes, ter sido
arguida uma nulidade processual e não uma nulidade de sentença propriamente dita
(ou seja, uma nulidade prevista no artigo 668º do Código de Processo Civil), não
foi ignorada no acórdão da conferência ora impugnado, onde aliás se refere
expressamente o artigo 201º deste Código (cfr. nomeadamente os n.ºs 4 e 5 do
texto desse acórdão). Improcede, assim, o alegado supra, 1., b).
Relativamente à alegada omissão de pronúncia (supra, 1., c) e d)),
não tem o requerente manifestamente razão. As questões de que cumpria tratar no
acórdão ora impugnado encontram-se elencadas no respectivo texto (cfr. o n.º 5),
tendo sido as mesmas decididas. Aquelas que o requerente agora identifica e que,
na sua perspectiva, não foram tratadas, ou se encontram consumidas pelas
questões identificadas e tratadas no acórdão – tendo sido, portanto,
implicitamente decididas – ou não constituem verdadeiras questões, mas meros
argumentos cuja não ponderação não constitui omissão de pronúncia (cfr. os
vários fundamentos de nulidade da sentença previstos no n.º 1 do artigo 668º do
Código de Processo Civil).
Quanto ao invocado excesso de pronúncia (supra, 1., c) e e)), é
também evidente que o requerente não tem razão. Para decidir as questões que lhe
são colocadas, pode o Tribunal Constitucional valer-se de argumentos jurídicos
não aduzidos ou não aceites pelo recorrente. Dito de outro modo, o invocado
excesso de pronúncia redunda na não aceitação, pelo requerente, dos argumentos
jurídicos utilizados no acórdão da conferência, sendo que tal utilização não
envolve obviamente qualquer nulidade.
Os acórdãos do Tribunal Constitucional assinalados no n.º 7 do
acórdão da conferência ora impugnado traduzem, segundo o requerente, a invocação
de jurisprudência impertinente e desnecessária (supra, 1., g)). Tal alegação,
contudo, nenhuma repercussão tem na manutenção ou alteração da decisão ora
impugnada, pelo que não será considerada.
Em relação à alegada contradição entre o acórdão ora impugnado e os
acórdãos citados pelo requerente (supra, 1., f) e i)), refira-se que, mesmo que
tal contradição existisse, nunca a mesma poderia justificar recurso para o
Plenário, pois que nesses acórdãos nenhum julgamento ocorreu no sentido da
inconstitucionalidade da norma que, no acórdão da conferência ora impugnado, foi
julgada não inconstitucional (cfr. artigo 79º-D, n.º 1, da Lei do Tribunal
Constitucional).
Por fim, e quanto ao alegado supra, 1., j), já se explicou no
acórdão ora impugnado (cfr. o respectivo n.º 7) por que motivo a norma do artigo
78º-A, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional, na interpretação identificada
no requerimento de fls. 73 e seguintes, não era inconstitucional. Nenhuma razão
havendo para rejeitar agora tal motivo, reitera-se tal julgamento de não
inconstitucionalidade.
III
4. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos:
a) Indefere-se a arguição de inexistência jurídica, nulidade ou
ineficácia do acórdão da conferência de fls. 81 e seguintes;
b) Reitera-se o julgamento de não inconstitucionalidade constante do
acórdão da conferência de fls. 81 e seguintes;
c) Não se admite o recurso para o Plenário interposto pelo
requerente a fls. 104.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em vinte
unidades de conta.
Lisboa, 14 de Outubro de 2005
Maria Helena Brito
Carlos Pamplona Oliveira
Rui Manuel Moura Ramos