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Processo n.º 332/2012
ATA
Aos dezanove dias do mês de dezembro de dois mil e doze, em sessão plenária, encontrando-se presentes o Excelentíssimo Juiz Conselheiro Presidente Joaquim de Sousa Ribeiro e os Exmos. Juízes Conselheiros Maria de Fátima Mata-Mouros, João Cura Mariano, Catarina Sarmento e Castro, Pedro Machete, Vítor Manuel Gonçalves Gomes, Fernando Vaz Ventura, Maria Lúcia Amaral, José da Cunha Barbosa, Maria João Antunes, Carlos Fernandes Cadilha e Maria José Rangel de Mesquita, foram trazidos à conferência os autos do processo em referência para apreciação.
Após debate e votação, foi ditado pelo Excelentíssimo Conselheiro Presidente o seguinte:
ACÓRDÃO N.º 616/2012
I. Relatório
1. Notificado que foi para, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 3.º e na alínea m) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 25/95, de 18 de agosto, apresentar neste Tribunal, no prazo de trinta dias consecutivos, a declaração de património, rendimentos e cargos sociais a que se referem os artigos 1.º e 2.º da referida Lei, ou fazer prova da respetiva entrega no caso de esta ter já ocorrido, A. veio suscitar dúvidas sobre a respetiva vinculação, enquanto vereador da Câmara Municipal de …, ao regime de controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos constante da Lei n.º 4/83, de 02 de abril, na versão aprovada pela Leis n.º 25/95, de 18 de agosto, solicitando a prestação do correspondente esclarecimento.
Fundamentou tal dúvida na circunstância de ter exercido tal cargo, em regime de substituição, entre o dia 30 de junho de 2009 – tomada de posse – e o dia 21 de outubro de 2009 – data da cessação de funções em consequência da tomada de posse da nova Vereação.
Fez acompanhar o pedido de cópia das “Declarações do Imposto sobre o Rendimentos das Pessoas Singulares (IRS), inerentes aos anos de 2009 e 2010, para os fins convenientes” (cf. fls. 4 a 14).
2. No âmbito da instrução dos autos, foi junta certidão da ata da reunião ordinária da Câmara Municipal …., de 30 de junho de 2009, que documenta a investidura do requerente, como “Vereador do Executivo Municipal”, em virtude de “duas renúncias sucessivas (…) efetivadas e dadas a conhecer em reuniões anteriores”, nos termos do n.º 1 do artigo 79.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, com a redação dada pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de janeiro (cf. fls. 20 e 21), bem como certidão da “ata avulsa da instalação da Câmara Municipal” …, para o quadriénio de 2009/2013, de 22 de outubro de 2009, não constando o requerente da relação dos investidos como membros daquele órgão autárquico (cf. fls. 32 a 34).
3. Tendo sido concedida vista ao Ministério Público, o Sr. Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido de que a dúvida suscitada pelo requerente deverá ser esclarecida através do reconhecimento, em face da letra, do sistema e do espírito da lei, de que o mesmo desempenhou o “cargo político” de “vereador municipal” da Câmara Municipal …, entre 30 de junho e 22 de outubro de 2009, encontrando-se por essa razão, independentemente da causa próxima e da duração do mandato, adstrito ao dever de apresentar a respetiva declaração de património, rendimentos e cargos sociais (inicial e final) nos termos e para os efeitos das disposições conjugadas dos artigos 1.º, 2.º, 3.º, n.º 1, 4º da Lei nº 4/83, na redação da Lei nº 25/95, (LOFPTC, artigo 109.º, n.ºs 2 e 3), declaração essa à qual não poderão ser feitas equivaler as declarações, para efeitos de liquidação do IRS, relativas aos anos de 2009 e 2010.
4. Afigurando-se pertinente a dúvida suscitada, importa resolvê-la ao abrigo do disposto no artigo 109º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional.
II. Fundamentação.
5. A prestação do esclarecimento que vem solicitado prende-se com a questão de saber se a circunstância de o requerente ter sido investido no cargo de vereador em regime de substituição, em virtude de duas renúncias sucessivas ao mandato de anteriores titulares, e de o haver exercido apenas no período compreendido entre 30 de junho de 2009 e 22 de outubro de 2009, data em que teve lugar o empossamento da nova formação camarária resultante do ato eleitoral de 11 de outubro de 2009, o exonera do dever de apresentação das declarações de rendimentos, património e cargos sociais” previstas nos artigos 1.º e 2.º da Lei n.º 4/83, de 02 de abril, na versão aprovada pela Lei n.º 25/95, de 18 de agosto.
6. O regime jurídico do controle público da riqueza dos titulares de cargos políticos instituído pela Lei n.º 4/83, de 02 de abril, e revisto pela Lei n.º 25/95, de 18 de agosto, foi entretanto alterado pela Lei n.º 38/2010, de 02 de setembro, que entrou em vigor no dia 2 de novembro de 2010 (cf. artigo 3.º).
Embora tal alteração nenhum efeito produza no caso presente na medida em que a previsão da alínea n) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 4/83, de 02 de abril, na redação conferida pela Lei n.º 25/95, de 18 de agosto, transitou sem alterações para a alínea m) do n.º 1 do artigo 4.º da mesma lei, na versão conferida pela Lei n.º 38/2010, de 02 de setembro, o certo é que a circunstância de tanto o início como a cessação das funções exercidas pelo requerente ter ocorrido antes da entrada em vigor da Lei n.º 38/2010, de 02 de setembro, determina que o esclarecimento da dúvida suscitada ocorra sob consideração do regime jurídico do controle público da riqueza dos titulares de cargos políticos instituído pela Lei n.º 4/83, de 02 de abril, e revisto pela Lei n.º 25/95, de 18 de agosto.
7. O universo dos sujeitos obrigados à apresentação da declaração de património, rendimentos e cargos sociais tipificado no artigo 4.º da Lei n.º 4/83, de 02 de abril, na redação introduzida pela Lei n.º 25/95, de 18 de agosto, inclui, de acordo com a alínea n) do respetivo n.º 1, os vereadores das câmaras municipais.
Por força de tal inclusão, o cargo de vereador é considerado, para efeitos de aplicação do regime jurídico do controlo público da riqueza instituído pela Lei n.º 4/83, de 02 de abril, um cargo político, encontrando-se por isso o respetivo titular sujeito ao dever de apresentar, no prazo de 60 dias contado da data do início das respetivas funções, a declaração de património, rendimentos e cargos sociais a que se refere o artigo 1.º, bem como nova declaração atualizada, no prazo de 60 dias a contar da cessação das funções que tiverem determinado a apresentação da precedente (cf. artigo 2.º, n.º 1).
8. A definição do âmbito subjetivo de aplicação do regime de controlo público da riqueza em razão do cargo instituído pela Lei n.º 4/83, de 02 de abril, e revisto pela Lei n.º 25/95, de 18 de agosto, realiza-se através da subsunção da titularidade de determinado cargo ao elenco daqueles que, de acordo com a tipificação constante do respetivo artigo 4.º, são qualificados como políticos para os efeitos aí previstos, sendo estranha à conformação do dever de apresentação das declarações de património, rendimentos e cargos sociais a que se referem os artigos 1.º e 2.º da referida lei, quer a natureza do mecanismo pelo qual o acesso ao cargo ocorreu, quer o período de tempo durante o qual este foi exercido.
Não estabelecendo a lei qualquer condição objetiva relativa aos termos do exercício do mandato de vereador da qual se retire que este deve observar uma dilação temporal mínima e/ou que direta ou indiretamente aponte para a exclusão do âmbito de aplicação do regime de controlo público da riqueza em razão do cargo das hipóteses em que a investidura no cargo haja ocorrido em regime de substituição, a circunstância de o requerente ter exercido o cargo de vereador da câmara municipal de … determina, em si mesma, a respetiva vinculação ao dever de apresentação das declarações de património, rendimentos e cargos sociais previstas nos artigos 1.º e 2.º da Lei n.º 4/83, de 02 de abril, na redação conferida pela Lei n.º 25/95, de 18 de agosto.
9. Não resultando da aplicação literal dos preceitos legais mobilizados a convocação de um elemento diferencial baseado na duração do exercício do cargo e/ou na natureza do mecanismo através do qual o acesso ao mesmo se processou, tal elemento não é igualmente alcançável a partir da teleologia implícita à inclusão do cargo de vereador no elenco dos sujeitos vinculados à apresentação da declaração de património, rendimentos e cargos sociais por força da alínea n) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 4/83, de 02 de abril, na versão resultante da Lei n.º 25/95, de 18 de agosto.
A Lei n.º 169/99, de 18 de setembro – que estabeleceu o regime jurídico do funcionamento dos órgãos dos municípios e das freguesias, assim como as respetivas competências (cf. artigo 1.º) –, para além de prescrever, no n.º 1 do respetivo artigo 79.º, que “as vagas ocorridas nos órgãos autárquicos são preenchidas pelo cidadão imediatamente a seguir na ordem da respetiva lista ou, tratando-se de coligação, pelo cidadão imediatamente a seguir do partido pelo qual havia sido proposto o membro que deu origem à vaga”, não associa à circunstância de a investidura no cargo ter ocorrido por substituição qualquer especificidade, designadamente quanto ao conjunto de direitos e deveres que, em especial por via da delegação de competências prevista no n.º 2 do artigo 65.º, integram o estatuto dos vereadores municipais.
Por assim ser, o mandato de vereador municipal exercido pelo requerente, apesar de resultante de uma investidura por substituição, procede do mesmo ato legitimador – o sufrágio popular, direto e secreto – e apresenta o mesmo tipo de conteúdo funcional que são próprios dos mandatos exercidos pelos vereadores municipais diretamente investidos no cargo, não sendo tal paridade além do mais afetada pela diferente duração que o exercício do cargo pode assumir em uma e outra das duas situações.
10. Tal conclusão em nada se altera perante as finalidades subjacentes ao regime jurídico do controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos.
Conforme se afirmou no Acórdão n.º 171/2011, do ponto de vista da valoração ou ponderação dos interesses que a norma regula, a ratio legis do regime jurídico sob aplicação revela que ““a legislação institucionalizando a obrigação de declarar o património, as atividades e funções privadas e os interesses particulares dos titulares de cargos públicos deriva da vontade de moralizar e melhorar a transparência da vida pública” através do “levantamento dos casos em que os interesses privados podem afetar a atuação dos homens públicos” (projeto-lei 569/VI, que esteve na génese da Lei n.º 25/95, de 18 de agosto)”, o que confere inteiro cabimento teleológico à irrelevância da natureza do mecanismo através do qual se processa o acesso ao cargo de vereador municipal, bem como do lapso temporal durante o qual este foi exercido, no âmbito da subordinação dos respetivos titulares ao dever de apresentação de declaração de património, rendimentos e cargos sociais.
11. Por tudo o que fica exposto, deverá concluir-se no sentido de que, por ter exercido o cargo de vereador da Câmara Municipal … no período compreendido entre 30 de junho de 2009 e 21 de outubro de 2009, o requerente se encontra vinculado ao dever de entrega das declarações de património, rendimentos e cargos sociais previstas nos artigos. 1.º e 2.º Lei n.º 4/83, de 02 de abril, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 25/95, de 18 de agosto, dever esse a cujo cumprimento não poderá ser feita, além do mais, equivaler a apresentação da cópia das declarações do Imposto sobre o Rendimentos das Pessoas Singulares relativas aos anos de 2009 e 2010, com que o requerente instruiu o respetivo pedido de esclarecimento.
III. Decisão.
12. Nos termos e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide que, por ter exercido o cargo de vereador da Câmara Municipal … no período compreendido entre 30 de junho de 2009 e 21 de outubro de 2009, o requerente encontra-se abrangido pela previsão da alínea n) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 4/83, de 02 de abril, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 25/95, de 18 de agosto, e, consequentemente, sujeito ao dever de apresentação das declarações de património, rendimentos e cargos sociais previstas nos artigos 1.º e 2.º do referido diploma legal.
Lisboa, 19 de dezembro de 2012 - Maria de Fátima Mata-Mouros – João Cura Mariano – Catarina Sarmento e Castro – Pedro Machete – Vítor Gomes – Fernando Vaz Ventura – Maria Lúcia Amaral – José da Cunha Barbosa – Maria João Antunes – Carlos Fernandes Cadilha –Maria José Rangel de Mesquita – Joaquim de Sousa Ribeiro
[ documento impresso do Tribunal Constitucional no endereço URL: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc//tc/acordaos/20120616.html ]ACÓRDÃO N.º 619/2012
Processo n.º 805/12
1.ª Secção
Relator: Conselheiro José da Cunha Barbosa
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. A., melhor identificado nos autos, reclama para a conferência ao abrigo do disposto no n.º 3, do artigo 78.º-A, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual redação (LTC), da decisão sumária proferida pelo Relator que decidiu não conhecer do objeto do recurso de constitucionalidade interposto.
2. A reclamação apresentada tem o seguinte teor:
‹(…)
A., supra identificado, notificado da decisão sumária proferida, não se conformando com a mesma, vem ao abrigo do disposto no artigo 77 da L.T.C. (redação da Lei nº 13-A/98 de 26 de fevereiro, reclamar para a conferência, nos termos e com os seguintes fundamentos:
Do despacho de indeferimento do recurso ora interposto, decorre que o recorrente não indicou de forma clara e percetível, o exato sentido normativo do preceito que considera inconstitucional, designadamente, os arts 97 n.º 4, 379 al c) do C.P.P. e 668 do C.P.C.
Ou seja, não explica de que forma é que a interpretação dada destes artigos colide com os arts 32 e205 do C.R.R. Ora.
No fundo existiu una falta de conciso da motivação do recurso interposto. Assim sendo, e ao contrário do referido na decisão sumária, deveria ao abrigo do disposto no número 6 do artigo 75-A da LTC a recorrente ser convidada a corrigir ou a aperfeiçoar a motivação apresentada.
Na verdade, dispõe o nº 5 da referida norma “Se o requerimento de interposição do recurso não indicar algum dos elementos previstos no presente artigo, o juiz convidará o requerente a prestar essa indicação no prazo de 10 dias.”
Peio que, atento o disposto no artigo 32 da C.R.P, onde se refere expressamente que “São asseguradas todas as garantias de defesa dos arguidos”, o facto de não se dar á recorrente a possibilidade de corrigir as deficiências na motivação apresentada, implica uma clara diminuição das suas garantias de defesa. Tanto mais que,
O Tribunal Constitucional decidiu, que são inconstitucionais as normas do nº 1 do artigo 420 do C.P.P., quando interpretadas no sentido de a falta de concisão das conclusões da motivação levar à rejeição do recurso interposto pelo arguido (Acs 193/97, 43/99 e 417/99), e sem que previamente seja feito o convite ao recorrente para aperfeiçoar as deficiências (Ac de 99.01-19, proc º 46/98, 1ª Secção. Isto por se entender que o direito ao recurso assume expressamente a natureza de garantia constitucional de defesa (art 32, nº 1 da C.R.P)
Termos em que, requer seja revogada a decisão supra referida sendo o requerente convidado no prazo legal a proceder ao aperfeiçoamento da motivação apresentada, explicando de forma clara e percetível, o exato sentido normativo do preceito que considera inconstitucional.
(…)›
3. Notificado, o Ministério Público pugnou pelo indeferimento da reclamação apresentada.
II. Fundamentação
4. A decisão sumária reclamada tem o seguinte teor:
«(…)
1. A., melhor identificado nos autos, recorre para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual redação (LTC), dos acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação em 11 de julho e 24 de setembro de 2012, pretendendo ver apreciada “a inconstitucionalidade da norma incita no artigo 379 al c) do CPP, na interpretação acolhida na decisão recorrida, isto é, se o tribunal ao fundamentar a manutenção da pena aplicada, nos antecedentes criminais do arguido deveria ter feito menção ao bom enquadramento familiar e profissional, designadamente o facto do arguido dispor de colocação profissional, estar integrado a nível familiar e manter-se abstinente do consumo de drogas, factos referidos no teor do relatório social junto aos autos e que serviu de base para formar a convicção do tribunal. Tal norma, com a interpretação com que foi aplicada, viola os arts 32 e 205 da CRP.”
2. Com efeito, no primeiro dos acórdãos mencionado, considerou o Tribunal da Relação de Lisboa que a pena aplicada ao arguido em primeira instância seria “justa, adequada, proporcionada e fixada em obediência aos critérios previstos nos art.ºs 40º e 71º do CP, impondo-se a sua manutenção, com a consequente improcedência do recurso por si interposto.” Arguiu o recorrente, em requerimento com data de 24 de julho de 2012, a nulidade de tal decisão, veiculando, para o efeito, os seguintes argumentos:
«(...)
1 – O arguido no recurso por si interposto recorreu da medida da pena que lhe foi aplicada.
Invocou entre outros fundamentos, o seu comportamento processual, destacando a confissão dos factos, o facto da condenação anteriormente sofrida, ainda que por factos de idêntica natureza, terem sido praticados em 1-07-2003, com condenação transitada em julgado em 19-01-06, pena já declarada extinta.
E, no caso em apreço, para além do bom comportamento posterior aos factos e o facto de se manter abstinente do consumo de substâncias estupefacientes, o mesmo dispor de colocação laboral, concretizada no Documento intitulado “Contrato Promessa”, datado de 20.12.2011, de onde consta que a sociedade que nele surge identificada “declara, para os devidos e legais efeitos que A. (...) fará parte dos quadros desta empresa, com a categoria de Motorista, recolhendo e entregando cargas diversas.
2 – No acórdão ora proferido, o tribunal da Relação não se pronunciou quanto a tais factos, nomeadamente a sua influência quanto à medida da pena aplicada, pronunciando-se única e exclusivamente quanto à gravidade do crime praticado, e às consequências nefastas que o mesmo determina para a sociedade, aflorando, o período, e forma de execução do crime praticado.
Quanto à confissão dos factos e ao reconhecimento por parte da arguida do caráter ilícito da sua conduta, associado ao bom enquadramento social, familiar e profissional, nada é referido.
3 – O acórdão é, assim, nulo uma vez que não se pronunciou sobre questão que foi suscitada e que, salvo o devido respeito, devia apreciar (artigo 379 n.º 1 al c) do C.P.P e art. 668 al d) do C.P.C.
4 – A entender-se de forma diferente há omissão se pronúncia, o Tribunal faz uma errada interpretação das referidas normas, interpretação que contende com a possibilidade de defesa da arguida violando desta forma os artigos 32 nº 1 e 205 da CRC.
5 – Violação, que expressamente se invoca e só agora, uma vez que, não poderia anteriormente ter conhecimento da mesma.
(...)»
Simultaneamente, o recorrente interpôs recurso da decisão proferida para o Supremo Tribunal de Justiça. Seguiu-se o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação em 24 de setembro de 2012, que indeferiu a arguição de nulidade e não admitiu o recurso interposto pelo arguido para o tribunal superior, com fundamento na alínea f), do n.º 1, do artigo 400.º, do Código de Processo Penal. Finalmente, interpôs o recorrente o recurso de constitucionalidade que agora se aprecia.
1. O recurso foi admitido pelo Tribunal recorrido. Contudo, em face do disposto no artigo 76.º, n.º 3, da LTC, e porque o presente caso se enquadra na hipótese normativa delimitada pelo artigo 78.º-A, n.º 1, do mesmo diploma, passa a decidir-se nos seguintes termos.
2. O presente recurso de constitucionalidade é interposto ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da LTC, preceito que faz depender o conhecimento do objeto do recurso de uma série de pressupostos processuais. Necessário se revela, portanto, que para além de esgotados os recursos ordinários tolerados pela decisão, o recorrente haja, durante o processo, suscitado de forma adequada o incidente de inconstitucionalidade, incidente que – sublinhe-se – deve respeitar a normas jurídicas que hajam constituído ratio decidendi da decisão recorrida (cfr., entre muitos outros, o Acórdão n.º 355/2005, disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
3. Ora no caso vertente, o recorrente arguiu a nulidade do acórdão do Tribunal da Relação por omissão de pronúncia, resultante do facto de tal tribunal não se ter pronunciado sobre a influência de uma série de fatores (v.g., comportamento processual, colocação laboral, abstinência no consumo de drogas) na medida da pena. Tal circunstância, no entender do recorrente, corresponde a uma “errada interpretação” do artigo 379.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal, violadora dos artigos 32.º, n.º 1, e 205.º, da CRP.
Sucede, porém, que a questão assim enunciada pelo recorrente não é uma questão de constitucionalidade normativa de que este Tribunal deva conhecer. Talqualmente referimos supra, o controlo realizado pelo Tribunal Constitucional é um controlo normativo, que pressupõe, portanto, a invocação de uma relação de desconformidade entre uma norma jurídica para efeitos de controlo (objeto do controlo) e o conjunto das normas e princípios constitucionais (parâmetro de controlo). Isto implica a recusa do modelo de recurso de amparo ou de queixa constitucional, o que significa que a competência do Tribunal Constitucional deve abranger “a fiscalização da constitucionalidade de uma regra abstratamente enunciada para uma aplicação genérica e não simplesmente o controlo da concreta decisão de um caso jurídico” (Rui Medeiros, A decisão de inconstitucionalidade, Lisboa, 1999, p. 339).
Talqualmente se percebe a partir dos autos, a divergência subjacente ao caso vertente não tem por objeto uma norma jurídica ou mesmo uma interpretação normativa dela extraída – a saber, o artigo 379.º, n.º 1, do Código de Processo Penal – mas antes o conteúdo da fundamentação constante do Acórdão do Tribunal da Relação de 11 de julho de 2012. Com efeito, enquanto o recorrente alega que, em tal acórdão, aquele Tribunal não se pronunciou quanto a uma série de factos e respetiva influência na medida da pena aplicada, o Tribunal da Relação esclarece inequivocamente que algumas dessas considerações – mormente as relativas à confissão e colocação profissional do arguido - nunca poderiam ter sido apreciadas, por não constarem da matéria de facto da decisão recorrida, enquanto as outras, não obstante objeto de apreciação, não foram suficientes para considerar a culpa do arguido diminuída. Veja-se, neste sentido, a seguinte passagem do acórdão de 24 de setembro de 2012:
«(...)
O recorrente vem agora apontar ao acórdão por nós proferido a nulidade da omissão de pronúncia por entender não terem sido expressa e devidamente valorados nele a sua confissão e os factos supra referidos.
Ora, não lhe assiste qualquer razão, quer porque as alegadas confissão e colocação profissional nem sequer constam da matéria de facto da douta decisão em recurso, que não foi impugnada, pelo que, nem poderiam ter sido apreciadas, quer porque nos pronunciamos quanto aos restantes aspetos, apenas lhes dando um valor “atenuativo” da ilicitude e da culpa diferente daquele que o recorrente pretendia que lhes fosse atribuído.
(...)»
Não assumindo a questão levantada pelo recorrente teor normativo, devem dar-se por não preenchidos os requisitos processuais de que está dependente a admissibilidade do recurso de constitucionalidade interposto nos termos da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da LTC.
4. Destarte, atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide não tomar conhecimento do objeto do recurso.
(…)».
5. Ora, a reclamação que agora se aprecia em nada machuca o acerto da decisão sumária proferida. Vejamos.
Argumenta o reclamante que “do despacho de indeferimento do recurso ora interposto, decorre que o recorrente não indicou de forma clara e percetível, o exato sentido normativo do preceito que considera inconstitucional, designadamente, os arts 97 n.º 4, 379 al c) do C.P.P. e 668 do C.P.C.” Esta leitura, porém, não se afigura legítima à luz da decisão sumária proferida, visto que em momento algum aí se contesta o rigor, rectius, a adequação da arguição da questão de constitucionalidade veiculada pelo recorrente nos autos. Com efeito, o obstáculo ao não conhecimento do objeto do recurso em que se estriba a decisão sumária reclamada é anterior ao problema da adequação – leia-se, da clareza e percetibilidade – do levantamento da questão de constitucionalidade em causa.
Na verdade, a decisão sumária proferida considerou que a questão de constitucionalidade levantada pelo recorrente não tinha objeto normativo, isto é, não se vertia numa questão de constitucionalidade normativa. Significa isto que a divergência que resulta dos autos e que o (ora) reclamante pretende ver sindicada não tem por objeto uma norma jurídica, ou um qualquer entendimento normativo dela extraído, antes a concreta e casuística valoração, pelo tribunal a quo, das específicas circunstâncias do caso. Porém, o nosso modelo de justiça constitucional, não admitindo as figuras da queixa constitucional ou do recurso de amparo, afasta-se do controlo da constitucionalidade das próprias decisões jurisdicionais, insistindo que o objeto de controlo são, em termos exclusivos, “os critérios jurídicos autonomizados, genérica e abstratamente referidos pelo julgador”, almejando “decidir quanto ao acerto constitucional de uma certa norma ou dimensão normativa do direito infraconstitucional, face ao texto constitucional” (cfr. o Acórdão n.º 551/01, disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
Feito este esclarecimento sobre o teor da decisão sumária reclamada e respetivos fundamentos, carece naturalmente de fundamento a outra pretensão veiculada na reclamação apresentada, nos termos da qual, tendo existido uma “falta de conciso da motivação do recurso interposto”, “deveria ao abrigo do número 6 do artigo 75-A da LTC o recorrente ser convidado a corrigir ou aperfeiçoar a motivação apresentada.”
Na verdade, o convite ao aperfeiçoamento constante dos n.º 5 e 6, do artigo 75.º-A, da LTC, visa, como se antecipa, a correção das insuficiências formais de que padeça o requerimento de interposição do recurso, não podendo ser mobilizado para o suprimento de erros sobre os pressupostos do recurso, ou mesmo para a realização de alterações substanciais quanto ao seu objeto. In casu, como se depreende, não está em causa a mera correção de uma insuficiência formal, faltando, na verdade, um dos requisitos essenciais à admissibilidade do recurso – o objeto normativo da questão de constitucionalidade enunciada - requisito esse, aliás, comum a todos os recursos de constitucionalidade tolerados no âmbito do processo de fiscalização concreta da constitucionalidade.
III. Decisão
6. Destarte, atento o exposto, o Tribunal Constitucional indeferir a reclamação apresentada e, por conseguinte, confirmar a decisão sumária reclamada.
Custas pelo reclamante, com taxa de justiça que se fixa em 20 (vinte) UCs., sem prejuízo da existência de apoio judiciário concedido nos autos.
Lisboa, 19 de dezembro de 2012. – J. Cunha Barbosa – Maria Lúcia Amaral – Joaquim de Sousa Ribeiro.