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Processo n.º 838/05
Plenário
Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional:
A - Relatório
1 – Miguel Elísio Capinha Alves, mandatário da candidatura do
Partido Socialista aos Órgãos Autárquicos do Concelho do Redondo, e Rui Calisto
Ramalho, candidato pelo Partido Socialista à eleição da Assembleia de Freguesia
de Montoito, Concelho do Redondo, nas eleições gerais realizadas no dia 9 de
Outubro de 2005, recorrem contenciosamente para o Tribunal Constitucional da
decisão do Governador Civil de Évora, de 20 de Outubro de 2005, que fixou o dia
30 de Outubro de 2005 para o acto eleitoral de repetição de eleições para a
Assembleia de Freguesia de Montoito.
2 – Como fundamento dos recursos, e após afirmarem terem “protestado
nesse sentido na reunião efectuada junto dessa instituição”, os recorrentes
dizem, nos mesmíssimos termos, o seguinte:
«[…]
1º
Na eleição para a Freguesia de Montoito, em que intervieram 892 dos 1254
eleitores inscritos foram apurados os seguintes resultados:
2º
Votos Brancos-13
Votos Nulos-13
Votos CDU-PCP/PEV-192
Votos MICRE-151
Votos PPD/PSD-151
Votos PS-373
3º
Tendo em conta os resultados apurados, mormente, o empate entre o PSD e o MICRE,
veio a Assembleia de Apuramento Geral deliberar no sentido, que passa a citar:
“dando cumprimento ao critério de eleição previsto no art. 13º da Lei 1/2001 de
14/08, verificou-se não ser possível a atribuição do último mandato, uma vez que
as listas empatadas por aplicação do referido método têm o mesmo número total de
votos, inviabilizando a aplicação da regra constante da alínea d) do citado art.
13º. Assim, não foi possível efectivar o aludido critério legal, tornando
impossível a conversão dos votos em mandatos, pelo que, os mesmos não serão
proclamados”.
4º
No mesmo sentido, se pronuncia agora o Governo Civil de Évora, deliberando, na
reunião atrás referenciada, pela repetição do acto eleitoral no próximo dia 30
de Outubro.
5º
Com o devido respeito, que é muito, o ora recorrente discorda totalmente desta
decisão, pelos motivos que passa a expor:
6º
Segundo o art.13º da Lei 1/2001, nomeadamente na sua alínea d): no caso de
restar um só mandato para distribuir e de os termos seguintes da série serem
iguais e de listas diferentes, o mandato cabe à lista que tiver obtido o menor
número de votos.
7º
Ora, no caso em apreço, e salvo melhor opinião em contrário, os requisitos deste
preceito estão preenchidos, através de uma interpretação extensiva da Lei.
8º
A qual nos permite subsumir esta situação de empate, sublinhe-se matemático e
não absoluto, à alínea d) do citado artigo.
9º
Pois que, existem duas listas diferentes, que obtiveram o mesmo número de votos
para atribuição do último mandato.
10º
A mesma tese é defendida pela doutrina
11º
Segundo, Maria de Fátima Abrantes Mendes, Assessora Jurista Principal da
Assembleia da República, destacada desde Junho de 1979, na Comissão Nacional de
Eleições, em caso de empate absoluto, isto é de empate logo na atribuição do 1º
mandato, a votação terá de ser repetida.
12º
Ora, na situação em análise, não se discute a atribuição do 1º mandato, pelo
que, não estamos perante um empate absoluto.
13º
Consequentemente e, a contrario, em caso de empate 'relativo' a votação não tem
de ser repetida.
14º
Pois que se outro fosse o sentido das suas palavras, a autora não teria tido a
necessidade de fazer a distinção.
15º
A isto acresce que, e parafraseando uma vez mais Maria de Fátima Abrantes
Mendes, as repetições de votação determinam, sempre, num índice baixíssimo de
participação, situação que desprestigia um acto cívico de participação política
por excelência que é uma eleição.
16º
Se estes argumentos em si não bastarem, cumpre ainda referir que a aplicação
deste método é pura e simplesmente, um meio de apuramento de mandatos, o que, e
salvo melhor opinião, não pode ser privilegiado em detrimento da melhor
manifestação democrática que é o sufrágio universal directo.
17º
Pelo que, fazer tábua rasa de um acto que não padece de qualquer vício, quando
através de uma simples interpretação para lá da letra da lei, se mantém a vida
de um acto que não é nulo e que espelha de forma expressiva a vontade do
eleitorado, é inquinar e desprestigiar o acto cívico que melhor reflecte a
palavra Democracia!
Nestes termos e nos melhores de direito aplicáveis, e com o mui douto suprimento
de V. Exas. deve ser concedido total provimento ao presente recurso e,
consequentemente, revogar-se deliberação proferida pelo Governo Civil de Évora,
assim se fazendo a costumada
JUSTIÇA».
B – Fundamentação
3 – Dos autos resulta o seguinte quadro de facto:
a) As petições dos recursos foram apresentadas, por via fax, no Governo Civil
de Évora, no dia 21 de Outubro de 2005;
b) O Governador Civil de Évora convocou, no dia 19 de Outubro de 2005, uma
reunião com os representantes das candidaturas à eleição para a Assembleia de
Freguesia de Montoito, concelho do Redondo nas eleições gerais autárquicas
realizadas no passado dia 9 do mesmo mês de Outubro;
c) Dessa reunião foi lavrada acta, relatando esta o seguinte:
«Aos dezanove dias do mês de Outubro de dois mil e cinco, pelas quinze horas e
trinta minutos, nas instalações do Governo Civil do Distrito de Évora, estiveram
presentes o Governador Civil, Dr. Henrique Ant6nio de Oliveira Troncho e
representantes das forças políticas concorrentes à eleição para a Assembleia de
Freguesia de Montoito, concelho de Redondo, Inácio dos Santos Casimiro, pela
Coligação Democrática Unitária; António Joaquim Siquenique Carriço, pelo
MICRE-I; João Gonçalo Morais Tristão pelo PPD/PSD e Miguel Elísio Capinha Alves
pelo Partido Socialista.
O Senhor Governador Civil começou por informar que a reunião para que foram
convocados tem por objecto ouvir a sua opinião relativamente à data para a
repetição do acto eleitoral da Assembleia de Freguesia de Montoito, tendo em
conta a impossibilidade legal da atribuição completa de mandatos.
Continuou no uso da palavra e disse que havia duas datas que considera
aceitáveis os dias vinte e três ou trinta do corrente. Mas atendendo a que não
há garantias de haver boletins de voto, até ao dia vinte e três, de acordo com
informação prestada pelo Presidente da Câmara Municipal de Redondo afirmou
parecer-lhe mais seguro serem marcadas no próximo dia trinta de Outubro.
De seguida foi pedida informação pelo representante do PS sobre se podia
consultar o ofício da Comissão Nacional de Eleições, tendo, em resposta, o
Governador Civil lido em voz alta a correspondência trocada entre o Governo
Civil de Évora e a dita Comissão e que a seguir se transcreve:
Ofício nº 860 de 12-10-05 do Governo Civil para a Comissão Nacional de Eleições:
Assunto: Eleições Autárquicas 2005 – Distribuição de mandatos para a Assembleia
de Freguesia de Montoito, concelho de Redondo.
Foi recebido neste Governo Civil a Acta da Assembleia de Apuramento Geral do
Município do Redondo relativa às Eleições Autárquicas de 9 de Outubro de 2005.
No que respeita à Assembleia de Freguesia de Montoito, refere essa acta o
seguinte: “Dando cumprimento ao critério de eleição previsto no Artigo 13º da
Lei 1/2001, de 14 de Agosto, verificou-se não ser possível a atribuição do
último mandato, uma vez que as listas empatadas por aplicação do referido método
tem o mesmo número total de votos, inviabilizando a aplicação da regra constante
da alínea d) do citado art. 13º.
Estabelecendo o Artigo 160º nº 1, da referida lei que “a votação em qualquer
assembleia de voto e a votação em toda a área do município só são julgadas nulas
quando se hajam verificado ilegalidades que possam influir no resultado geral da
eleição do respectivo órgão autárquico”, o que não é o caso, solicito a V. Exa.
esclarecimento sobre a validade ou não do referido acto eleitoral visto que
compete ao Governador Civil marcar a data de futuras eleições, se for essa a
situação.
Permito-me chamar a atenção de V. Exa. para o facto de na referida Acta de
Apuramento Geral, na parte dos totais da Assembleia Freguesia de Montoito, o
somatório dos votos brancos, nulos e os expressos nas forças políticas
concorrentes ser de 893 e o número de votantes ser de 892.
Teor da resposta da CNE ao Governo Civil a coberto do ofício nº 2394, de
13-10-05 daquele serviço:
“Assunto: Não distribuição de mandatos na eleição para a Assembleia de Freguesia
de Montoito.
Nos termos do preceituado no artigo 146º da LEOAL, compete a Assembleia de
Apuramento Geral, distribuir os mandatos pelas diversas listas e em consequência
determinar os candidatos que cada uma das listas elege.
Conforme se retira da acta de apuramento geral do concelho de Redondo, tal
operação não é possível levar a efeito no que respeita a eleição para a
Assembleia de Freguesia de Montoito, por impossibilidade na atribuição do último
mandato, visto que os quocientes das listas MICRE e PPD/PSD serem
matematicamente iguais.
Muito embora a lei eleitoral seja omissa na matéria, não se alcança outra
solução que não seja a de mandar repetir o acto eleitoral cuja atribuição de
mandatos esteja em causa, no primeiro ou segundo Domingo posterior à proclamação
e publicação dos resultados do apuramento geral, consoante haja ou não condições
logísticas para o fazer, nomeadamente, se existe número suficiente de boletins
de voto.
Tal como decorre da Lei Eleitoral para os Órgãos das Autarquias Locais como da
lei nº 169/99, de 18 de Agosto, parece competir ao Senhor Governador Civil
proceder a tal marcação.
Ofício nº 863 de 13-05-2005 do Governo Civil para a CNE:
“Assunto: Não distribuição de mandatos na eleição para a Assembleia de Freguesia
de Montoito
Acuso a recepção do ofício nº 2394 relativo ao assunto em epígrafe cujo conteúdo
me suscita algumas dúvidas.
Assim:
· Sendo a Lei eleitoral omissa na matéria, qual a entidade a quem compete
decidir sobre a repetição do acto eleitoral?
· No caso dessa competência ser da Comissão Nacional de Eleições, qual a
decisão tomada?
· No caso de não ser da competência da C.N.E., pode o Governador Civil
marcar a data da eleição sem que a entidade competente tenha decidido pela sua
repetição?
· A Impossibilidade de atribuição do último mandato ocasiona a não
atribuição dos outros 8 obtidos pelas forças políticas concorrentes?
· Qual o efeito do recurso contencioso e da exposição, de que anexo
cópias, recebidos no Governo Civil, no que diz respeito à marcação da data de
novas eleições.
Teor da resposta da CNE ao Governo Civil a Coberto do oficio nº 2455, de
18-10-05 daquele serviço:
“Assunto: Repetição da eleição para a Assembleia de Freguesia de Montoito.
Em resposta às questões colocadas por V. Exas. vem esta Comissão informar: - Tal
como se referiu no ofício da CNE nº 2394 de 13.10.2005, é entendimento deste
órgão que competirá ao Governador Civil proceder a marcação da repetição da
eleição;
- A repetição diz respeito ao acto eleitoral de cujo apuramento decorreu não ter
sido possível distribuir a totalidade dos mandatos, devido a uma situação de
empate, independentemente de tal empate ocorrer na atribuição do primeiro ou
último mandato.
- A interposição de recursos de eventuais irregularidades ocorridas no decurso
do apuramento geral é feita junto do Tribunal Constitucional, conforme se infere
dos artigos 158º e seguintes da LEOAL.
O representante do PS tomou de novo a palavra e disse não concordar com o novo
acto eleitoral mas no caso de tal vir a ocorrer concordava com o dia trinta.
Tomou, de seguida a palavra o mandatário do PPD/PSD e disse também não concordar
com novas eleições mas em caso de não haver outra alternativa a eleição deveria
ter lugar no próximo dia trinta.
Sugeriu, com a concordância de todos, que a Comissão Nacional de Eleições
deveria vir explicar a situação criada a Montoito.
O representante do MICRE tomou a palavra e questionou os presentes no sentido de
saber se não se podia marcar a eleição depois do dia trinta ao que o Senhor
Governador esclareceu que não se devia ir muito para além do domingo seguinte ao
das eleições.
A mesma Entidade disse novamente que dada a incerteza da feitura dos boletins de
voto que permita a marcação para o dia vinte e três achava que o dia mais
conveniente era de facto o dia trinta.
O mandatário da CDU deu a sua opinião referindo que o dia mais aconselhável era
o dia trinta.
Continuou a sua intervenção dizendo que a CDU vê este acto eleitoral com
apreensão porque existe algum sentimento de revolta na população.
O Governador Civil apelou aos presentes no sentido de estes assumirem uma
atitude pedagógica junto dos eleitores para que o acto decorra com toda a
normalidade.
Do que ficou dito por todas as forças políticas perante o Senhor Governador
Civil pode concluir-se:
1. Que o PSD; o PS e CDU discordam da repetição do acto eleitoral.
2. Que todos concordam que o dia trinta de Outubro de dois mil e cinco é o mais
indicado para a repetição do acto eleitoral.
3. Atendendo à situação invulgar ocorrida em Montoito de não ter sido possível
distribuir a totalidade de mandatos devido a uma situação de empate, foi
proposto pelo mandatário do PPD/PSD que se convidasse a Comissão Nacional de
Eleições a visitar a freguesia em causa para elucidar a população sobre a
necessidade da repetição do acto eleitoral.
Nada mais havendo a tratar, foi encerrada a reunião, da qual foi elaborada a
presente acta que vai ser assinada por todos»;
d) Na sequência dessa reunião, o Governador Civil de Évora proferiu,
no dia 20 de Outubro de 2005, o despacho do seguinte teor:
«DESPACHO
1. Ao ser recebida a Acta da Assembleia de Apuramento Geral do Concelho de
Montoito verificou-se, pelo seu conteúdo e relativamente à Assembleia de
Freguesia de Montoito, não ser possível a atribuição do último mandato, uma vez
que as listas empatadas MICRE e PPD/PSD, por aplicação do método de Hondt têm o
mesmo número total de votos, inviabilizando a aplicação da regra constante da
alínea d) do art. 13º da Lei 1/2001, de 14 de Agosto.
2. Sendo a Lei Eleitoral omissa nesta matéria foi pedido parecer à
Comissão Nacional de Eleições a qual se pronunciou no sentido do acto eleitoral
ser repetido e a ter lugar no primeiro ou segundo Domingo posterior à
proclamação e publicação dos resultados do apuramento geral, consoante haja ou
não condições logísticas para o fazer, nomeadamente, se existe número suficiente
de boletins de voto.
3. Em reunião com os representantes das forças políticas concorrentes à
dita Assembleia de Freguesia foi reconhecido o dia trinta de Outubro de dois mil
e cinco como o mais conveniente para a repetição do acto eleitoral, dado não
existirem condições logísticas para o realizar antes, conforme informação do
Senhor Presidente da Câmara Municipal de Redondo.
4. Assim:
4.1- Fixo o dia trinta de Outubro de dois mil e cinco para o acto eleitoral de
repetição de eleições para a Assembleia de Freguesia de Montoito.
4.2- Comunique-se o presente despacho às forças políticas concorrentes àquela
Assembleia e à Câmara Municipal de Redondo»;
e) O primeiro recorrente foi notificado desse despacho no dia 21 de
Outubro de 2005, através do ofício n.º 879, P-3/5, datado do dia anterior;
4 – Do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 540/2005 (art.º 514º,
n.º 2, do Código de Processo Civil) resulta ainda:
f) Na eleição realizada no dia 9 de Outubro de 2005 para a
Assembleia de Freguesia de Montoito, Concelho do Redondo, intervieram 892 dos
1254 eleitores inscritos e foram apurados os seguintes resultados: Votos Brancos
– 13; Votos Nulos – 13; Votos CDU-PCP/PEV – 192; Votos MICRE – 151; Votos PSD –
151; Votos PS – 373;
g) Em função destes resultados, a Assembleia de Apuramento Geral do
Concelho do Redondo, reunida no dia 11 de Outubro de 2005, deliberou não
atribuir quaisquer mandatos na eleição para a referida Assembleia de Freguesia,
decisão esta que fundamentou nos seguintes termos: “Dando cumprimento ao
critério de eleição previsto no art.º 13º da Lei n.º 1/2001, de 14 de Agosto,
verificou-se não ser possível a atribuição do último mandato, uma vez que as
listas empatadas por aplicação do referido método têm o mesmo número total de
votos, inviabilizando a aplicação da regra constante da alínea d) do citado
art.º 13º. Assim, não foi possível efectivar o aludido critério geral, tornando
impossível a conversão dos votos em mandatos, pelo que, os mesmos não serão
proclamados”;
g) Os resultados do apuramento geral, referidos nas alíneas
anteriores, foram publicados por edital afixado no dia 11 de Outubro de 2005;
h) Da deliberação da assembleia de apuramento geral, referida na
alínea g) supra, Francisco Ramalho Batista Claré e o acima identificado Rui
Calisto Ramalho recorreram contenciosamente para o Tribunal Constitucional,
pedindo que fossem proclamados os resultados da atribuição dos primeiros oito
mandatos, apurados segundo as regras do art.º 13º da LEOAL;
i) Pelo Acórdão n.º 540/2005, o Tribunal Constitucional decidiu não
tomar conhecimento do recurso contencioso com base na extemporaneidade da sua
interposição e na irrecorribilidade do acto impugnado, por não ter sido
apresentada nesse acto reclamação ou protesto.
5 – Antes de mais, cumpre recordar que os recorrentes apenas
controvertem contenciosamente o despacho do Governador Civil de Évora que marcou
a repetição da eleição para a Assembleia de Freguesia de Montoito, concelho do
Redondo, com o fundamento de que não ocorre hipótese legal que postule a
repetição do acto eleitoral ou a realização de eleições intercalares, dado não
se estar perante qualquer impossibilidade de atribuição dos mandatos políticos
para aquela assembleia, nas eleições gerais realizadas no dia 9 de Outubro de
2005, pois tal apenas poderia acontecer se houvesse um empate absoluto do número
de votos para a atribuição do 1º lugar, o que não se verifica no caso, em
virtude de esse empate apenas ocorrer em relação à atribuição do 9º lugar, mas
que deve ser resolvido pela aplicação da regra da alínea d) do art.º 13º da Lei
Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto (LEOAL).
O recurso é tempestivo (art.º 102º-B, nºs 2 e 7, da Lei n.º 28/82,
de 15 de Novembro, na sua actual versão) e os recorrentes têm legitimidade
activa por terem interesse directo no recurso (art.º 32º da LEOAL).
Pelo Decreto-Lei n.º 13-A/2005, de 20 de Julho, o Governo marcou as eleições
gerais, para os órgãos representativos das autarquias locais, para o dia 9 de
Outubro de 2005.
O processo eleitoral autárquico consubstancia-se, de acordo com o
regime constante da LEOAL, num encadeado de actos que tem por escopo final a
atribuição do número de mandatos políticos previstos na lei para cada um dos
órgãos representativos das autarquias locais aos partidos ou forças políticas
que a eles se candidatam e a identificação dos candidatos a quem tais mandatos
são conferidos, iniciando-se, em caso de eleições gerais, com publicação do
diploma do Governo que procede à marcação das eleições.
E o processo esgota-se apenas com a consolidação na Ordem Jurídica
da determinação dos mandatos políticos que são atribuídos às listas de
candidatura que se apresentam ao acto eleitoral e dos candidatos a quem tais
mandatos são conferidos.
Ora, no caso da Assembleia de Freguesia de Montoito, não poderá
considerar-se, ainda, realizado esse escopo ou resultado jurídico-prático.
Por outro lado, há que entender que se consolidou, de vez, na Ordem
Jurídica a deliberação da Assembleia de Apuramento Geral do Concelho do Redondo
que decidiu – não importa, agora, saber se bem ou se mal – não proclamar os
resultados e, consequentemente, não atribuir os mandatos políticos, em número de
9, previstos na lei para o órgão autárquico em causa, aos partidos e forças
políticas que se candidataram ao acto eleitoral – CDU-PCP/PEV, MICRE, PSD e PS –
e não conferir os mandatos aos respectivos candidatos destas listas.
Na verdade, a assembleia de apuramento geral, prevista nos artigos
141º e 142º da LEOAL, tem a natureza de um órgão de administração eleitoral
autónoma e independente, de existência não permanente (cf. Manuel Freire Barros,
Conceito e Natureza Jurídica do Recurso Contencioso Eleitoral, 1998, pp. 46 a
48), cujas constituição e atribuições estão exaustivamente enunciadas na lei
(cf. art. 141º a 151º da mesma LEOAL).
No exercício das suas funções, a assembleia de apuramento geral está
sujeita apenas à lei, gozando de completa independência funcional na sua
aplicação. Não existe qualquer relação de hierarquia entre a assembleia de
apuramento geral e qualquer outro órgão do Estado, nomeadamente o Governo ou o
Governador Civil, pelo que não está subordinada a qualquer dos poderes que
consubstanciam a relação hierárquica – poderes de direcção, de obediência, de
sujeição a inspecção e a supervisão, poder disciplinar e poder dispositivo da
competência legalmente atribuída (sobre a matéria, cf. Paulo Otero, Conceito e
Fundamento da Hierarquia Administrativa, 1992, pp. 107 e ss.).
As suas deliberações apenas são susceptíveis de censura em via de
recurso contencioso para o Tribunal Constitucional, nos termos previstos nos
art. 156º e ss. da LEOAL.
Assim sendo, tem de se concluir que: i) uma vez consolidada na Ordem
Jurídica, por insusceptibilidade de recurso para o Tribunal Constitucional, seja
por caducidade do direito de impugnação contenciosa, por o seu prazo se
encontrar esgotado (art. 158º da LEOAL), seja por falta dos pressupostos de
recorribilidade previstos na lei eleitoral (art.ºs 156º e 157º da mesma lei),
como no referido Acórdão n.º 540/05 se reconheceu relativamente a recurso
interposto, também, pelo aqui primeiro recorrente, a deliberação da Assembleia
de Apuramento Geral do Concelho do Redondo, que decidiu não converter em
mandatos os votos obtidos por cada um dos partidos, coligações de partidos ou
movimentos políticos independentes, que concorreram à eleição para a Assembleia
de Freguesia de Montoito, nas eleições gerais realizadas no dia 9 de Outubro de
2005, e não os conferir aos respectivos candidatos de cada lista; ii) tendo-se
esgotado os poderes dessa assembleia de iniciativa de exercício das suas
funções, com a deliberação tomada; iii) não podendo ela, actualmente, revogar ou
alterar a deliberação tomada em cumprimento de qualquer ordem de outro órgão do
Estado e iiii) não podendo também qualquer outro órgão do Estado, nomeadamente a
autoridade recorrida, substituir-se-lhe no exercício das suas funções, não resta
outro caminho que não seja o de repetir o acto eleitoral, de modo a ser
alcançado o escopo ou resultado jurídico-prático do processo eleitoral, aberto
com a convocação das eleições gerais autárquicas.
Pode, pois, concluir-se que o pedido dos recorrentes de anulação do
acto contenciosamente recorrido e de não repetição do acto eleitoral não pode
proceder.
C – Decisão
6 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional
decide negar provimento ao recurso contencioso.
Lisboa, 24 de Outubro de 2005
Benjamim Rodrigues
Rui Manuel Moura Ramos
Gil Galvão
Bravo Serra
Maria Helena Brito
Paulo Mota Pinto
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria João Antunes
Maria Fernanda Palma
Mário José de Araújo Torres
Vítor Gomes
Artur Maurício