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Processo n.º 412/2005
2.ª Secção
Relatora: Conselheira Maria Fernanda Palma
Acordam, em Conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
1. Nos presentes autos foi proferida a seguinte Decisão Sumária:
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos
do Tribunal da Relação de Coimbra, em que figuram como recorrente A. e como
recorridos o Ministério Público e outros, o recorrente interpôs recurso de
constitucionalidade do acórdão de fls. 715 e ss. nos seguintes termos:
Eng. A., casado, Presidente da Câmara Municipal de -----------, recorrente nos
autos de RECURSO PENAL - Proc. 3228/04.4 -, pendentes na 4ª Secção do Venerando
Tribunal da Relação de Coimbra, vem, nos termos do art°. 75° da Lei do Tribunal
Constitucional, interpor o competente RECURSO para o Tribunal Constitucional do
acórdão proferido nos presentes autos, a subir imediatamente, nos próprios autos
e com efeito suspensivo.
Em cumprimento do disposto no art. 75°.-A da mesma lei, indicam-se sumariamente
os fundamentos do presente recurso.
A) Violação das garantias de defesa do arguido, previstas no art° 32º, n° 1 da
Constituição da República Portuguesa, na interpretação do art° 100° do Cód.
Proc. Penal na decisão que permitiu ao M.P. não responder integralmente às
provas requeridas pelo ora recorrente.
B) Violação do previsto nos nºs 1 e 2 do artigo 37° e do art° 48°, ambos da
Constituição da República Portuguesa, ao considerar incurso no crime de
difamação o exercício do direito à liberdade de expressão do pensamento, apesar
de susceptível de causar uma lesão da honra, se revele adequado, proporcional e
razoável em relação aos interesses que se pretendem acautelar, como se demonstra
no caso dos presentes autos, bem como o direito de informar e de ser informado,
direitos fundamentais, sem os quais não há Democracia e deles depende o
funcionamento ético e transparente das Instituições do Estado de Direito e a
possibilidade de os cidadãos avaliarem, livre e conscientemente a actuação
daqueles a quem, pelo sufrágio, confiam os destinos da comunidade.
Proferido despacho ao abrigo do artigo 75º‑A da Lei do Tribunal Constitucional,
o recorrente respondeu o seguinte:
Eng. A., casado, Presidente da Câmara Municipal de ----------, recorrente nos
autos de RECURSO - Proc. 412/05 -, pendentes na 2ª Secção do Tribunal
Constitucional, face ao doutamente ordenado por V. Exa. vem dizer o seguinte:
O presente recurso é interposto, ao abrigo do disposto no art°. 70°., n°. 1, al.
b) da Lei do Tribunal Constitucional, dado que:
a) No caso da violação das garantias de defesa do arguido, previstas no art.
32°, n° 1 da CRP, foi aplicado o art° 100° do CPP, para permitir ao M.P. não
prestar todas as informações que foram solicitadas pelo arguido.
b) No caso da al. b) foi o ora recorrente condenado por estar incurso na
previsão do art°. 180°. do CP e condenado pelo crime de difamação, com violação
do direito à liberdade de expressão e de informação, previsto nos nº.s 1 e 2 do
artigo 37°. e do art. 48°., ambos da Constituição da República Portuguesa.
Requer o prosseguimento dos autos.
Cumpre apreciar.
2. Sendo o presente recurso interposto ao abrigo do artigo 70º, nº 1, alínea
b), da Lei do Tribunal Constitucional, o respectivo requerimento de interposição
deve conter a indicação da peça processual onde a questão de constitucionalidade
foi suscitada (cfr. artigo 75º‑A, nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional).
Ora, o recorrente não indica, nem no requerimento de interposição de recurso,
nem na resposta ao Despacho proferido nos termos do artigo 75º‑A da Lei do
Tribunal Constitucional, a peça processual onde suscita a questão de
constitucionalidade.
Nessa medida, o requerimento de interposição de recurso deve ser indeferido, de
acordo com o nº 2 do artigo 76º da Lei do Tribunal Constitucional.
3. Acresce que, quanto à alegada recusa de resposta do Ministério Público ao
requerimento do recorrente relativo a determinadas informações, o tribunal a quo
considerou que tal recusa, quando muito, consubstanciaria uma nulidade
dependente de arguição, arguição que não ocorreu, pelo que a mesma se
encontraria sanada, nos termos do artigo 120º do Código de Processo Penal (fls.
742 e 743).
Todavia, o recorrente não impugnou esta dimensão normativa do artigo 120º do
Código de Processo Penal.
4. Por outro lado, quanto à alegada violação do direito à liberdade de
expressão, cabe realçar que o recorrente não suscita qualquer questão de
inconstitucionalidade normativa, impugnando só a condenação proferida nos autos,
o que não constitui objecto idóneo do recurso interposto.
Assim, para além de o requerimento de interposição de recurso de
constitucionalidade não conter todos os elementos que a lei exige (o que, por
si, fundamenta o indeferimento desse requerimento, como se referiu), não se
verificam os demais pressupostos do recurso interposto, pelo que também por essa
razão o Tribunal Constitucional não poderia tomar conhecimento do seu objecto.
5. Ante o exposto, decide‑se indeferir o requerimento de interposição do
recurso de constitucionalidade.
O recorrente vem agora reclamar, ao abrigo do artigo 78º‑A, nº 3, da Lei do
Tribunal Constitucional, nos seguintes termos:
ENG. A., casado, Presidente da Câmara Municipal de ---------, recorrente nos
autos de RECURSO - Proc. 412/05 -, pendentes na 2ª. Secção do Tribunal
Constitucional, vem, nos termos do art. 78°.-A, nº.3 da Lei do Tribunal
Constitucional, reclamar para a conferência da decisão sumária, proferida por
V.Exa. ao abrigo do disposto no art°. 78°.-A, n°. 3 do mesmo diploma, nos termos
e com os fundamentos seguintes:
1.- A presente decisão sumária foi proferida com 2 fundamentos:
a) O recorrente não indica, nem no requerimento de interposição de recurso, nem
na resposta ao despacho proferido nos termos do artigo 75°-A da Lei do Tribunal
Constitucional, a peça processual onde suscita a questão de constitucionalidade.
b) Quanto à alegada recusa de resposta do Ministério Público ao requerimento do
recorrente relativo a determinadas informações, o tribunal a quo considerou que
tal recusa, quando muito, consubstanciaria uma nulidade dependente de arguição,
arguição que não ocorreu, pelo que a mesma se encontraria sanada, nos termos do
artigo 120° do Código de Processo Penal (fls. 742 e 743). Todavia, o recorrente
não impugnou esta dimensão normativa do artigo l20°.do Código de Processo Penal.
Salvo o devido respeito, não procede nenhum dos argumentos, sendo o primeiro,
uma expressão excessiva de formalismo que não deve nortear um qualquer processo
judicial.
2.- Quanto à falta de indicação da peça processual onde foi suscitada a questão
da inconstitucionalidade, apesar de expressamente ela não ter sido referida,
está implícito no requerimento de interposição de recurso que as mesmas foram
suscitadas na motivação do recurso interposto da decisão da 1ª. Instância para o
Tribunal da Relação de Coimbra.
Com efeito,
Só face à decisão da 1ª Instância é que foram suscitadas as
inconstitucionalidades que foram invocadas, pois até ai não havia qualquer
decisão que permitisse essa invocação.
Deste modo,
A única peça processual onde poderiam ser – e foram-no efectivamente -
suscitadas as diferentes questões de inconstitucionalidade foi na motivação do
recurso da sentença final, até porque, dada a natureza do crime em causa - crime
de difamação -, não é admissível recurso ordinário para o Supremo Tribunal de
Justiça - Cfr. art°. 400°., nº.1, al. e) do Cód. Proc. Penal.
Deste modo,
Porque a indicação dos fundamentos do recurso para o Tribunal Constitucional em
rigorosa coincidência com o que consta dessa motivação, para que se não
levantasse a questão prévia da falta de invocação anterior das
inconstitucionalidades suscitadas, também não deixa qualquer dúvida sobre a peça
processual em que foram suscitadas as questões de inconstitucionalidade ora em
causa.
Acresce que existe em matéria de processo civil o princípio da adequação formal,
hoje com consagração no art. 265°-A do Cód. Proc. Civil, segundo o qual quando a
tramitação processual não se adequar às especificidades da causa, deve o juiz
determinar a prática dos actos que melhor se ajustem ao fim do processo.
Ora,
No caso dos autos, não existindo mais que um grau de recurso e,
consequentemente, não podendo ter sido suscitada em mais qualquer peça
processual a questão da inconstitucionalidade que não fosse na motivação desse
recurso, constitui um excesso de formalismo, incompatível com o referido
princípio da adequação formal, a omissão da indicação expressa da peça
processual, onde foi suscitada a questão da inconstitucionalidade.
Por isso, com fundamento no facto de implicitamente ter sido invocada a
motivação do recurso para o Tribunal da Relação - e por isso se apontam as
inconstitucionalidades ao acórdão por aquele proferido -, deve ordenar-se o
prosseguimento dos presentes autos, pois não pode haver escolha sobre a peça
processual onde as questões de inconstitucionalidade teriam de ser suscitadas,
porque ou eram suscitadas na motivação do recurso ou não o podiam ser em outro
local.
3.- Quanto ao segundo fundamento, não nos parece que o despacho ora reclamado
tenha analisado correctamente a questão.
Na verdade,
O acórdão declara com pouca convicção - a expressão quando muito assim o indicia
que se trata de uma questão de nulidade.
Porém,
Atento o disposto no art°. 400°, nº 1, al. e) do Cód. Proc. Penal, e dada a
natureza do crime em causa - crime de difamação -, impediam o ora recorrente de
interpor recurso ordinário para o Supremo Tribunal de Justiça.
Por isso,
Não havia qualquer outra forma de impugnação dessa decisão, razão pela qual era
admissível desde logo o recurso para o Tribunal Constitucional.
4.- Face ao exposto e cumprindo-se os melhores princípios de direito processual
e interpretando-se devidamente as normas legais, no sentido que permitam ao
tribunal uma decisão de mérito sobre os litígios que lhe são colocados, deve o
presente recurso ser admitido e ordenada a apresentação de alegações, tudo nos
termos do art°. 78°.-A, n°. 5 da Lei do Tribunal Constitucional.
Termos em que deve ser dado provimento à presente reclamação e revogando-se o
despacho ora reclamado, deve ser ordenado o cumprimento do disposto no artº.
78°.-A, n°. 5 da Lei do Tribunal Constitucional.
O Ministério Público pronunciou‑se do seguinte modo:
1 - A presente reclamação é manifestamente improcedente - desde logo - e em
termos decisivos - por o requerimento de interposição do recurso não conter as
exigências formais exigidas pelo artigo 75°-A da Lei do Tribunal Constitucional.
2 - Dado que o reclamante não aproveitou a oportunidade que lhe foi concedida
para proceder ao respectivo aperfeiçoamento.
Cumpre apreciar.
2. A Decisão Sumária reclamada demonstrou que o recorrente não deu cumprimento
ao disposto no artigo 75º‑A da Lei do Tribunal Constitucional.
O recorrente afirma, no entanto, que o único momento em que a questão de
constitucionalidade podia ser suscitada nos autos era o recurso para o Tribunal
da Relação de Coimbra.
Ora, todas as considerações que o reclamante desenvolve a este respeito apenas
demonstram a possibilidade que ele tinha de dar cumprimento ao ónus que sobre
ele impendia, nomeadamente quanto aos requisitos formais do requerimento de
recurso interposto.
Refira‑se que o princípio da adequação formal invocado pelo reclamante não tem
por finalidade isentar os recorrentes do cumprimento dos ónus e deveres
processuais que sobre si impendem.
3. A Decisão Sumária demonstrou ainda que não se verificam nos presentes autos
os demais pressupostos processuais do recurso interposto.
O reclamante afirma que não teve oportunidade de interpor recurso para o Supremo
Tribunal de Justiça, pelo que foi interposto recurso para o Tribunal
Constitucional.
Ora, o que entendeu a Decisão Sumária quanto à eventual nulidade da decisão
então recorrida foi que o agora reclamante não impugnou a norma do artigo 120º
do Código de Processo Penal no recurso de constitucionalidade que interpôs. Com
efeito, não decorre de nenhuma passagem da Decisão Sumária a sugestão de
interposição de um qualquer recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
4. Improcedem, portanto, os fundamentos do reclamante, pelo que a presente
reclamação será indeferida.
5. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente
reclamação, confirmando consequentemente a Decisão Sumária reclamada.
Custas pelo reclamante, fixando‑se a taxa de justiça em 20 UCs.
Lisboa, 12 de Outubro de 2005
Maria Fernanda Palma
Benjamim Rodrigues
Rui Manuel Moura Ramos