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Processo n.º 573/05
3ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. O relator proferiu a seguinte decisão sumária:
“1. A., melhor identificado nos autos, interpôs recurso para o Tribunal
Constitucional do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 11 de Maio de
2005, que negou provimento ao recurso por si interposto do despacho do Juiz de
Instrução Criminal, de 10 de Janeiro de 2005, que, no âmbito do reexame dos
pressupostos da prisão preventiva nos termos do disposto no artigo 213.º do
Código de Processo Penal, manteve aquela medida de coacção aplicada aquando do
1º interrogatório judicial, por despacho de 12 de Outubro de 2004, e confirmada
pelo acórdão da Relação de 16 de Dezembro do mesmo ano.
O recurso é interposto com fundamento na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da
Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, pretendendo o recorrente a apreciação da
inconstitucionalidade das seguintes normas:
«1. - a norma do n.º 1 do art.º 213.º do Código de Processo Penal, interpretada
como o foi no despacho judicial e no acórdão recorridos, ou seja, no sentido de
que, para o reexame da subsistência dos pressupostos da prisão preventiva e para
decidir da sua manutenção, bastará a transcrição do despacho que determinou a
aplicação da medida coactiva e uma indicação genérica ao arguido de que “todos
os fundamentos mantêm actualidade e, neste momento se encontra ainda mais
fortalecida a prova entretanto carreada aos autos”, e de que “dos autos resultam
inalterados os pressupostos de facto e de direito que determinaram a sujeição do
arguido à medida de coacção de prisão preventiva, sem enunciar em concreto quais
os novos meios de prova entretanto carreados para os autos nem os motivos por
que resultariam inalterados os pressupostos;
2. - a norma do n.º 3 do art.º194.º do Código de Processo Penal, interpretada
como o foi no despacho judicial e no acórdão recorridos, ou seja, no sentido
segundo o qual a enunciação dos motivos de facto da decisão de aplicação da
medida de prisão preventiva pode consistir apenas em formulações gerais e
abstractas, sem concretização das circunstâncias de tempo, modo e lugar em que
ocorreram os factos que integram a prática dos crimes imputados;
3. - a norma extraída da conjugação dos artºs. 193.º, n.ºs 1 e 2, e 213.º, n.º
1, do Código de Processo Penal, interpretada e aplicada como o foi no despacho
judicial e no acórdão recorridos, no sentido de que, ao reexaminar a
subsistência dos pressupostos da prisão preventiva, não terá o juiz de analisar
em concreto a adequação e proporcionalidade dessa medida coactiva às exigências
cautelares que o caso em concreto requer e que nem terá também, em sede de
reexame, de averiguar se todas as medidas, com excepção da prisão preventiva, se
revelam concretamente inadequadas ou insuficientes;
4. - a norma extraída da conjugação dos artºs. 202.º, n.º 1, alínea a), e 213.º,
n.º 1, do Código de Processo Penal, interpretada como o foi no despacho judicial
e no acórdão recorridos, no sentido de que, no despacho que decide manter a
prisão preventiva, não têm que ser reexaminados em concreto os factos que
porventura indiciam fortemente a prática de crime doloso punível com pena de
prisão máxima superior a três anos, com suas circunstâncias de tempo, modo e
lugar;
5. - a norma extraída das disposições conjugadas do art.ºs 204.º e 213.º, n.º 1,
do Código de Processo Penal, interpretada como o foi no despacho judicial e no
acórdão recorridos, no sentido segundo o qual o reexame da subsistência dos
pressupostos gerais de perigo, que permite decidir da manutenção da prisão
preventiva, se bastaria com a mera transcrição dos requisitos legais tal como
constam do art.º 204.º do CPP, sem curar de enunciar os factos ou indícios que
preencheriam esses pressupostos.»
Acrescenta o recorrente que tais interpretações violam o disposto nos artigos
28.º, n.ºs 1 e 2, e 32.º, da Constituição da República Portuguesa e que arguiu
as questões de inconstitucionalidades na motivação e conclusões do recurso
ordinário para o Tribunal da Relação de Lisboa, do despacho do juiz de instrução
no Círculo Judicial do Funchal, proferido nos termos e para os efeitos do
disposto no n.º 1 do artigo 213.º do Código de Processo Penal.
2. Não obstante o recurso ter sido admitido, o que não vincula este Tribunal
(cfr. artigo 76.º, n.º 3, da LTC), entende-se não poder conhecer-se do objecto
do recurso, sendo de proferir decisão sumária, ao abrigo do n.º 1 do artigo
78.º-A, por não se verificarem os respectivos pressupostos de admissibilidade.
3. Com efeito, a admissibilidade do recurso de fiscalização concreta de
constitucionalidade, interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º
da Lei nº 28/82, exige a congregação de vários pressupostos, consistindo um
deles na aplicação, pela decisão impugnada, como sua ratio decidendi, da norma
cuja conformação constitucional se pretende apreciar, tomada seja no seu todo ou
em determinado segmento, seja em dada interpretação.
No concreto caso é desta última vertente que se trata.
As “questões interpretativas” colocadas pelo recorrente radicam na ideia de
falta ou insuficiência da fundamentação da decisão quando concluiu pela
verificação dos pressupostos de facto e de direito que justificaram a manutenção
da medida de coacção de prisão preventiva. A este respeito, questiona, em
síntese, o recorrente o facto de a fundamentação ser feita por remissão para a
decisão que inicialmente decretou a medida e para o despacho judicial que a
manteve (sobre o qual incide o recurso), que são transcritos, sem que se proceda
a um reexame em concreto da subsistência daqueles pressupostos, com o acréscimo
de que os fundamentos então invocados mantém a actualidade e se encontra ainda
mais fortalecida a prova entretanto carreada para os autos, sem se enunciar em
concreto quais os novos meios de prova.
A questão da falta ou insuficiência da fundamentação é desdobrada pelo
recorrente pelas cinco “questões interpretativas” que coloca com referência às
normas dos artigos 213.º, n.º 1, 194.º, n.º 3, 193.º, n.ºs 1 e 2, 202.º, n.º 1,
alínea a), e 204.º do Código de Processo Penal. Mas, na prática, tudo gira à
roda da falta de fundamentação do despacho que procedeu ao reexame dos
pressupostos da prisão preventiva, que o recorrente entende ter violado as
normas dos artigos 97.º, n.ºs 1 e 4, 374.º, n.º 2, 379.º, n.º 1, alínea a) e
213.º, estes do Código de Processo Penal, e ainda dos artigos 28.º, n.ºs 1 e 2,
32.º, n.º 1, e 205.º, n.º 1, da Constituição, e que o acórdão recorrido resolveu
nos pontos III-A e B. E tanto assim é que o recorrente afirmou expressamente nas
conclusões de recurso para a Relação que “o despacho aqui sob recurso, emitido
ao abrigo do n.º 1 do artigo 213.º do CPP, carece em absoluto de fundamentação”
(conclusão 8ª) e, antes de invocar algumas das “questões interpretativas”, que
pretende agora ver apreciadas em sede de recurso de constitucionalidade, invoca
a violação de preceitos da lei adjectiva penal [artigos 97.º, n.ºs 1 e 4, 374.º,
n.º 2, e 379.º, n.º1, alínea a)], como sucede nas conclusões 11ª, 16ª e 27ª, não
invocando, porém a inconstitucionalidade da interpretação e aplicação destes
preceitos.
É certo que o recorrente, além das normas dos artigos 213., n.º 1, 193.º, n.ºs 1
e 2, 202.º, n.º1, alínea a), e 204.º, do Código de Processo Penal, questiona
também a constitucionalidade da norma do artigo 194.º, n.º 3, que acolhe a regra
de fundamentação dos despachos que decretam medidas de coação e de garantia
patrimonial, mas, em qualquer dos casos o acórdão não aplicou qualquer das
normas impugnadas com o sentido que lhes é atribuído.
Vejamos:
4. O acórdão recorrido, na sua parte decisória que interessa considerar, é do
seguinte teor:
«III - Colhidos os vistos, cumpre decidir.
A) O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (como é
jurisprudência pacífica dos nossos tribunais superiores), sendo, porém, certo
que a questão fulcral no presente recurso é a do reexame dos pressupostos da
prisão preventiva, nos termos e para efeitos do art.º 213° do CPP.
Acresce que o recorrente argui a nulidade do despacho ora recorrido, por alegada
falta de fundamentação, com o que, no seu entender, teriam sido violadas as
normas constantes dos art.ºs 97°, n.ºs 1 e 4, 374° n° 2, 379° n° 1 al. a), e
213°, estes do CPP, e ainda os art.ºs 28°, n.ºs 1 e 2, 32°, n° 1, e 205° n° 1,
da CRP.
Finalmente, observa-se que, face ao já relatado, não cabe, aqui e agora,
debruçarmo-nos sobre questões já anteriormente suscitadas e que já se mostram
decididas, nestes autos, mormente pelos supracitados Acórdãos da Rel. de Lisboa,
de 16/12/04 (Proc. n° 9715/04-9ª) e de 3/02/05 (Proc. n° 1057/05-9ª).
Serve isto para afastar, expressamente, as questões subjacentes às conclusões 5ª
a 7ª do recorrente, sobre as quais esta Relação de Lisboa já se debruçou e
decidiu: nomeadamente, no que respeita à alegada falta de notificação, com
cópia, do despacho de 12/10/04 (que determinou a prisão preventiva do
recorrente); e quanto à alegada nulidade desse despacho de 12/10/04.
B) Da arguida nulidade do despacho recorrido.
1. O teor do despacho do Mmo JIC de 10/01/05 é o seguinte:
«Dado que ao arguido A. lhe foi aplicada a medida de coacção prisão preventiva
em 1° interrogatório judicial de fls. 280 e seguintes, iniciado em 11 de Outubro
de 2004 e terminado com a notificação do despacho proferido, pelas 24.15 horas
de 12 de Outubro de 2004, há que proceder oficiosamente ao reexame de
subsistência dos pressupostos daquela medida, decidindo se é de manter ou se
deve ser substituída ou revogada, nos termos do n.º 1, do artigo 213°, do Código
de Processo Penal.
*
O Ministério Público a fls. 1120 a 1121 (cujos termos dou aqui por integralmente
reproduzidos) promove se mantenha tal medida de coacção.
*
O arguido A. veio a fls. 1077 requerer a sua audição por entender que a decisão
ora a proferir pessoalmente o afecta, foi notificado para se pronunciar por
escrito quanto à subsistência dos pressupostos de tal medida de coacção.
Pronuncia-se nos termos constantes de fls. 1108 a 1119 - original a fls. 1176 a
1185 (cujo teor dou por integralmente reproduzido ), onde requer a final a
substituição da medida de coacção prisão preventiva pela medida de coacção
obrigação de permanência na habitação (frisa-se que o arguido conhece o teor de
alegado acórdão que terá sido proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa que
terá mantido o despacho a aplicar a medida de coacção em causa - cfr. ponto XVI
do requerimento - acórdão esse ainda não conhecido por este tribunal).
E a fls. 1218 a 1227 vem, notificado do despacho a conceder-lhe a faculdade de
se pronunciar por escrito a “dizer que, no seu entendimento, não subsiste nenhum
dos pressupostos da medida de coacção de prisão preventiva que lhe foi aplicada
(...)” e requer a final se conclua pela insubsistência actual dos pressupostos e
se revogue a medida aplicada ou se substitua a mesma por outra menos gravosa,
mais adequada e proporcional, sugerindo a substituição pela medida de obrigação
de permanência na habitação.
Requerimento esse que tenho aqui por integralmente reproduzido.
*
Decidindo:
O artigo 204° do Código de Processo Penal enuncia os requisitos que têm de se
mostrar, em concreto, verificados para que possa ser aplicada qualquer medida da
coacção, à excepção da prevista no artigo 196°, do mesmo diploma legal:
a) Fuga ou perigo de fuga;
b) Perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e,
nomeadamente, perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova; ou
c)Perigo, em razão da natureza ou das circunstâncias do crime ou da
personalidade do arguido, de perturbação da ordem e da tranquilidade públicas ou
de continuação da actividade criminosa.
Dos autos resultam inalterados os pressupostos de facto e de direito que
determinaram a sujeição do arguido à medida de coacção prisão preventiva.
Na verdade, a gravidade dos factos imputados ao arguido, a ressonância social da
sua comissão, o modo de execução dos mesmos, inculcam, ipso facto, a convicção
da existência de perigo de fuga, perigo perturbação da ordem e tranquilidades
públicas e perigo de continuação da actividade criminosa e grande perigo para a
perturbação do decurso do inquérito, principalmente para a aquisição,
conservação ou veracidade da prova.
Na verdade basta reler os fundamentos e normas invocadas no despacho proferido
em 1° interrogatório:
'Apesar de o arguido “mostrar” ignorar os factos fortemente indiciados terem
sido praticados por si e que lhe foram exaustivamente comunicados, o que é certo
é que os elementos de prova até este momento colhidos indiciam fortemente que o
mesmo conjuntamente com outros dois arguidos já ouvidos em sede de 1ª
interrogatório judicial, pelo menos por duas vezes procuraram que promotores de
projectos devidamente identificados nos autos entregassem quantias elevadas em
dinheiro “vivo” em “troca” de uma futura aprovação de projectos contra o Plano
Director Municipal da Câmara Municipal de Ponta do Sol.
Indiciado está fortemente e igualmente que o dinheiro a receber seria para ser
entregue ao ora arguido, que depois o repartiria com pelo menos o co-arguido B.,
funcionário da referida Câmara.
Igualmente está fortemente indiciado que usando da sua qualidade de Presidente
da Câmara terá “forçado” um dos aludidos promotores de projectos a entregar a
elaboração do mesmo á co-arguida C., a quem teria que pagar o preço da sua
execução para que se “facilitasse” a aprovação do projecto em causa.
Dos autos resulta por parte do mesmo, a prática já fortemente indiciada de
vários ilícitos cometidos no âmbito da al. i) do art. ° 3° da Lei 34/87 de
16/07, a saber:
- Dois crimes de prevaricação, p. e p. nos termos do art. ° 11° do Dec-Lei supra
citado, e punido com pena de prisão de 2 a 8 anos;
- Dois crimes de corrupção passiva para acto ilícito, p. e p. nos termos do art.
° 16° n° 1 do citado diploma com a redacção que lhe foi dada pela Lei 108/01 de
28/11, punido com pena de prisão de 2 a 8 anos;
- Dois crimes de corrupção activa, p. e p. nos termos do n° 3 do art. ° 18° da
Lei 34/87 de 16/07, com a redacção que lhe foi dada pela Lei 108/01 de 28/11,
punido com pena de prisão de 2 a 8 anos.
A prova já carreada aos autos quer documental quer testemunhal entre outras
conseguida em tão pouco tempo de investigação e com bases já tão sólidas é
fortemente elucidativa da actividade ilícita do arguido na sua qualidade de
Presidente da Câmara de Ponta do Sol.
Face às funções que o mesmo arguido exerce à frente da Câmara Municipal de Ponta
do Sol e tendo em atenção que está compreendido no âmbito das suas funções
proferir despachos sobre projectos de licenciamento de obras, bem como tem o
mesmo acesso a todos os documentos existentes em tal Câmara, bem como a
influência que exercerá sobre alguns dos seus colaboradores mais próximos leva a
concluir pela existência de perigo de continuação da actividade criminosa e de
perigo de perturbação do decurso do inquérito bem como grande perigo para a
aquisição, conservação ou veracidade da prova.
Perigo esse de perturbação do Inquérito e aquisição, conservação ou veracidade
da prova que maior é ainda sabendo-se que o mesmo reside na área da Câmara de
que é Presidente, podendo “destruir” ou “calar” a prova.
É pois por demais evidente que existe perigo de continuação da actividade
criminosa.
Perigo igualmente existe e grande quer por um lado, face ao extracto
socio-económico em que o arguido está inserido, de o mesmo se ausentar da RAM
Por outro lado, a natureza dos ilícitos que já se encontram fortemente
indiciados e imputáveis ao arguido, de estrema gravidade dada a confiança que
lhe foi depositada ao ser eleito para um cargo de Presidência de Câmara pelos
seus conterrâneos são veemente repudiados e fortemente condenados pela opinião
pública a que acresce, no caso concreto, a já referida posição do arguido no
seio da autarquia de Ponta do Sol.
Ilícitos esses a condenar ainda mais sabendo-se que para se obterem ganhos
ilícitos através da prática de actos ilícitos contrariando a mais elementar das
regras: não violação do PDM
Assim sem sobra de dúvidas estão reunidos todas as condições para se aplicar
qualquer das medidas de coacção previstas na Lei Processual Penal para além da
medida de coacção termo de Identidade e Residência.
É certo que a medida de coacção prisão Preventiva apenas é de aplicar face aos
princípios da adequação e proporcionalidade em ultimo caso, quando se revelarem
inadequadas ou insuficientes qualquer outra das mediadas de coacção.
Do que até agora se disse resulta ser a única medida capaz e adequada às
exigências cautelares que este caso requer, bem como é proporcional à gravidade
do crime e ás sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas.
Assim, e tendo em atenção essencialmente a natureza dos ilícitos, a
personalidade e funções do arguido, a existência de perigo de continuação da
actividade criminosa, o perigo de fuga e a necessidade de assegurar a
tranquilidade e a paz publica determino que e ao abrigo do disposto nos art.ºs
191.º, 192.º, 193.º, 195°, 202°, n° 1, al. a), 204°, nas suas diversas alíneas
(a), b) e c)), todos do Código de Processo Penal, que o arguido aguarde os
ulteriores termos do processo sujeito ás seguintes medidas de coacção:
a)TIR já prestado a fls. 275 e
b)Prisão Preventiva.”
Todos os fundamentos mantém actualidade e, neste momento, se encontram ainda
mais fortalecidos com a prova entretanto carreada aos autos.
Sopesado o acervo factual carreado para os presentes autos, e, agora, ainda mais
fortalecido apenas e tão só a privação da liberdade do arguido satisfaz as
exigências cautelares pressupostas in casu.
Assim sendo, mostram-se preenchidos os requisitos previstos no artigo 202°, n.º
1, alínea a), do Código de Processo Penal e 204° alíneas a) a c), do mesmo
diploma legal, atentos os critérios de necessidade, adequação e
proporcionalidade, conservando-se inalterados os pressupostos que determinaram a
sujeição do arguido a prisão preventiva.
Por outro lado, ainda não decorreu o prazo de duração da medida nos termos do
artigo 215°, do Código de Processo penal.
Assim sendo mantenho a medida de coacção prisão preventiva imposta ao arguido A.
por subsistirem os pressupostos da mesma, nos termos do n.º 1, do artigo 213° do
Código de Processo Penal.
Notifique-se sendo via fax ao seu Digno Defensor constituído.» - nossos realces.
2. Relembramos que, nesta matéria, no processo penal, vigora o princípio da
legalidade - cfr. art.º 118° do CPP - pelo que: «2. Nos casos em que a lei não
cominar a nulidade, o acto ilegal é irregular.»
Por outro lado, não olvidamos que os actos decisórios são sempre fundamentados,
como o impõe a Lei Fundamental (citado art.º 205°, n° 1 da CRP), o que, aliás, é
consentâneo com um Estado democrático de Direito aí consagrado.
Por isso, se concretiza tal princípio na lei processual penal, mormente no art.º
97°, n° 4 do CPP (como o recorrente bem sabe - cfr. sua conclusão 11ª).
Contudo, e ao invés do que alega o recorrente (cfr . sua conclusão 16ª), a
fundamentação de um despacho, como o ora questionado, não tem de ser tão
exaustiva e completa como a que a lei exige para as sentenças finais - cfr.
artº.s 374°, n° 2 e 379°, do CPP.
De outro modo (como costumamos dizer em situações idênticas ), uma tal exigência
poria em causa a almejada celeridade processual, que é, como se sabe, uma das
traves mestras do nosso direito penal adjectivo, visando atingir o que se
designa por due process; cfr. art.º 6°, n° 1 da CEDH: - «1.Qualquer pessoa tem
direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo
razoável por um tribunal independente e imparcial, . . . »
Afastada, assim, a tese da fundamentação que é própria das sentenças - que, como
se sabe, conhecem a final do objecto do processo (vide n° 2 do art.º 374° do
CPP) -, reafirmamos que, no presente caso, estamos perante um mero despacho,
isto é, perante uma decisão que se limita a conhecer de questão interlocutória -
cfr. citado art.º 97°, n° 1 e suas alíneas, do CPP .
Dito isto, logo se compreende que o despacho que procede ao reexame dos
pressupostos da prisão preventiva, para os efeitos do art.º 213° do CPP, como é
o caso, tem de estar fundamentado, de facto e de direito (cfr. art.º 97° do
CPP), mas, repete-se, não se exige que o seja com os requisitos de uma sentença
(cfr. art.º 374°, n° 2 do CPP), nem sequer como se exige para a acusação (cfr.
art.º 283° do CPP), ou para a decisão instrutória (cfr. art.º 308° do CPP).
Em suma, estando como se está no âmbito do reexame dos pressupostos da prisão
preventiva (citado art.º 213° do CPP), em que, como se sabe, vigora o princípio
rebus sic stantibus (vd. Maia Gonçalves, no seu CPP Anotado, ed. 13ª, p. 466),
aliás em conformidade com jurisprudência fixada pelo Ac. PL. Sec. Crim. do STJ,
n° 3/96, de 24/01/96, o que é fulcral é constatar se houve (ou não) alteração,
de facto e de direito, face a imediatamente anterior despacho judicial, que
determinou ou que reexaminou a situação processual do arguido.
Assim sendo, como vimos entendendo, concluímos que, no presente caso, se
ponderou e se explicitou quais os fundamentos, de facto e de direito, que
determinaram a prisão preventiva do arguido (ora recorrente), chegando a
transcrever-se o despacho que aplicou tal medida de coacção ao arguido para, de
seguida, se ponderar e decidir que não foram alegados nem ocorreram factos novos
- no sentido de terem relevo para infirmar ou comprometer aqueles pressupostos.
É claro que se pode considerar excessiva a transcrição do despacho de 12/10/04,
que determinou a prisão preventiva do arguido, tal como seria de considerar
insuficiente a prolação de despacho meramente tabelar .
No entanto, aquela transcrição integrada como está no despacho recorrido, serviu
exactamente para, mais facilmente, se ponderar e decidir do aludido reexame dos
pressupostos da prisão preventiva aplicada ao arguido.
Daí que, no caso concreto, se procedeu ao reexame exigido daqueles pressupostos
e, como não ocorreram factos novos, concluiu-se pela manutenção da medida de
prisão preventiva do arguido, reafirmando a sua necessidade, adequação e
proporcionalidade.
Concluindo, o douto despacho recorrido não está ferido de nenhum vício, estando
antes devidamente fundamentado, percebendo-se quais os ilícitos ali considerados
fortemente indiciados nos autos, a sua gravidade e não se deixou de acentuar as
exigências cautelares do caso concreto, concretizando-se os perigos a que se
referem as alíneas a), b) e c) do citado art.º 204° do CPP.
Em suma, pode-se discordar de tais fundamentos, mas uma coisa nos parece
evidente concluir:
Improcede a arguida nulidade do despacho recorrido (cfr. art.ºs 97°, n° 4 do CPP
e 205°, n° 1 da CRP).
C) Da manutenção da medida de prisão preventiva.
Chegámos ao cerne da questão, no presente recurso.
Há, assim, que ponderar se houve alteração dos pressupostos que determinaram a
aplicação da medida de prisão preventiva ao arguido, ora recorrente, mormente,
se diminuíram as exigências cautelares desta.
Na verdade, como já afirmamos, estando perante o afloramento do princípio rebus
sic stantibus, deve atender-se à manutenção (ou não) do circunstancialismo, de
facto e de direito, que determinou a aplicação da medida de coacção em causa.
1. Não deixamos, assim, de reafirmar os princípios que regem as medidas de
coacção e que, como se sabe, são meios processuais de limitação da liberdade
pessoal dos arguidos, tendo por “fim acautelar a eficácia do procedimento, quer
quanto ao seu desenvolvimento, quer quanto à execução das decisões
condenatórias” (vd. “Curso de Processo Penal” - II, do Prof. Germano Marques da
Silva, pág. 20l, Verbo, ed. 1993).
E que, 'a sua finalidade é referida pelo art.º 204° (do C.P.P.), quando dispõe
que nenhuma medida de coacção, à excepção do termo de identidade, pode ser
aplicada se em concreto se não verificar:
a) Fuga ou perigo de fuga;
b) Perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e,
nomeadamente, perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova;
c) Perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da
personalidade do arguido, de perturbação da ordem e da tranquilidades públicas
ou de continuação da actividade criminosa.' (idem, ibidem - sublinhados nossos).
Tudo isto tendo em atenção os princípios constitucionais - mormente dos art.ºs
27°, n° 3, 28°, n° 2 («A prisão preventiva não se mantém sempre que possa ser
substituída por caução ou por qualquer outra medida mais favorável prevista na
lei.») e 32°, n° 2, nomeadamente – “A lei admite a aplicação ao arguido de
certas medidas restritivas dos seus direitos fundamentais, medidas que formula
em abstracto, ponderando também em abstracto da sua adequação, necessidade e
proporcionalidade, mas prescreve também que nenhuma dessas medidas, excepção
feita ao termo de identidade, pode ser aplicada se em concreto não se verificar
a sua necessidade para acautelar os fins que importa prosseguir e que indica nos
art.ºs 204º, 227° e 228°” ( ob. cit., pág. 205).
Trata-se, de medida excepcional, cuja adequação, necessidade e proporcionalidade
tem de ser aferida, em concreto, aliás como flui, também do art.º 193° do CPP.
2. Como foi afirmado por esta Relação de Lisboa, no Ac. de 16/12/04 e que
manteve aquele primeiro despacho judicial, de 12/10/04, existem nos autos
'fortes indícios' da prática pelo arguido, em co-autoria, de dois crimes de
prevaricação, dois crimes de corrupção passiva para acto ilícito e dois crimes
de corrupção activa, p. e p. respectivamente pelos citados art.ºs 11º, 16° n° 1,
e 18° n° 3, da referida Lei n° 34/87, de 16 de Julho (red. Lei 108/01). Sendo
que cada um destes delitos é punível com pena de prisão de 2 a 8 anos, o que
revela bem a gravidade concreta dos ilícitos.
Como o recorrente sabe, tais indícios foram considerados fortes face aos
«elementos probatórios já carreados para os autos, designadamente os depoimentos
dos também arguidos C. e B., reproduzidos de fls. ..., e que prestam,
igualmente, serviço na Câmara Municipal de Ponta do Sol...»
Porquanto: «Aqueles são peremptórios na imputação factual que fazem ao
recorrente, imputação essa que se reforça com o depoimento prestado pelo
denunciante D., e com a apreensão dos 15.000 € feita pelo mesmo à referida C.,
logo após os ter recebido daquele, como forma de ver aprovado um projecto de
construção, há muito apresentado na Câmara de Ponta do Sol, mas que também não
respeitava as imposições do PDM e do RGEU. Assim sendo, e na suficiência dos
indícios nesta fase processual, as imputações criminosas feitas ao recorrente
mostram-se claramente sustentadas, sendo também as respectivas molduras penais
aquelas que foram indicadas no despacho recorrido.» - com o que se verifica um
dos pressupostos para aplicação da prisão preventiva, concretamente, o previsto
no art.º 202°, n° 1, al. a) do CPP (cfr. certidão a fls. 110, 111).
Por outro lado, no que respeita às exigências cautelares do caso concreto,
realça aquele acórdão da Relação de Lisboa, de 16/l2/04, cuja actualidade se
mantém intacta, o perigo de perturbação do decurso do inquérito - cfr. art.º
204°, al. b), do CPP - mormente:
«Não tanto pela possibilidade de fuga, que sempre poderia acontecer ..., nem
pelo perigo de continuação da actividade criminosa por que está indiciado ...»;
Mas antes por considerar existir, no caso concreto, perigo de perturbação do
inquérito: «...tentando dissipar, atenuar ou inviabilizar a recolha das provas,
conhecendo bem, como conhece, os meandros por onde, nesse sentido, se haveria de
movimentar, eventualmente influenciando pessoas, manipulando documentos,
simulando situações de facto, etc., ... não se pode esquecer que o mesmo vinha
exercendo as funções de Presidente de Câmara, com todos os “poderes”,
designadamente de influência, daí advindos...»
Finalmente, ali se afastam por insuficientes e desadequadas as demais medidas de
coacção, mormente a sugerida obrigação de permanência na habitação, do art.º
201º o do CPP (ainda que acompanhada de outras restrições, v.g., pulseira
electrónica).
Em suma, de acordo com o princípio rebus sic stantibus, como não foram alegados,
nem ocorreram factos novos, mormente posteriores à decisão confirmada pelo
mencionado Acórdão de 16/12/04 desta Relação de Lisboa, concordamos com a
decisão recorrida; excepto no que respeita aos perigos de fuga e de continuação
da actividade criminosa.
Concluindo:
No caso concreto, a prisão preventiva continua a ser a única medida coactiva,
adequada e proporcional, mormente atento o aludido perigo de perturbação do
decurso do inquérito (citados art.ºs 191°,193°,202°, n° 1, al. a), 204°, al. b),
do CPP e ainda os citados art.ºs 28°, n.ºs 1 e 2, e 32°, n° 1, estes da CRP).»
5. Começa o recorrente por invocar a aplicação da norma do n.º 1 do artigo 213.º
no sentido de que, para o reexame da subsistência dos pressupostos da prisão
preventiva e para decidir da sua manutenção, bastará a transcrição do despacho
que determinou a aplicação da medida coactiva e uma indicação genérica ao
arguido de que “todos os fundamentos mantêm actualidade e, neste momento se
encontra ainda mais fortalecida a prova entretanto carreada aos autos”, e de que
“dos autos resultam inalterados os pressupostos de facto e de direito que
determinaram a sujeição do arguido à medida de coacção de prisão preventiva, sem
enunciar em concreto quais os novos meios de prova entretanto carreados para os
autos nem os motivos por que resultariam inalterados os pressupostos.
Ora, o acórdão recorrido não aplicou a norma com esta interpretação. Na verdade,
embora nele se surpreenda a transcrição do despacho recorrido, certo é que ao
fazê-lo o acórdão fez sua aquela mesma fundamentação, reafirmando, primeiro, que
aqueles fundamentos que presidiram ao decretamento da medida de coação se mantém
no momento da reapreciação e, por acréscimo, que resultam reforçados face à
prova entretanto carreada para os autos.
Acolheu-se no aresto recorrido o entendimento de que no âmbito do reexame dos
pressupostos da prisão preventiva, nos termos do artigo 213.º, vigora o
princípio rebus sic stantibus, pelo que o que é fulcral é constatar se houve (ou
não) alteração, de facto e de direito, face a imediatamente anterior despacho
judicial, que determinou ou que reexaminou a situação processual do arguido.
Assim sendo, entendeu-se que no despacho recorrido se ponderou e se explicitou
quais os fundamentos, de facto e de direito, que determinaram a prisão
preventiva do recorrente, chegando a transcrever-se o despacho que aplicou tal
medida de coacção para, de seguida, se ponderar e decidir que não foram alegados
nem ocorreram factos novos – no sentido de terem relevo para infirmar ou
comprometer aqueles pressupostos –, considerando-se que aquela transcrição
integrada como está no despacho recorrido, serviu exactamente para, mais
facilmente, se ponderar e decidir do aludido reexame dos pressupostos da prisão
preventiva aplicada ao arguido.
Há, por conseguinte, por parte da decisão recorrida, uma análise da situação de
facto que consubstancia a manutenção da medida de coação em causa que vai para
além da simples remissão para a decisão que primariamente a impôs e que consiste
em se terem verificado (nem o recorrente ter alegado) factos novos. [ Há
manifesto lapso, que se corrige; queria dizer-se “em não se terem verificado (
nem o recorrente ter alegado) factos novos].
Deste modo, a questão identificada pelo recorrente não se reporta à globalidade
do fundamento normativo da decisão impugnada, ou seja, a norma não foi aplicada
com o sentido que o recorrente quer submeter a apreciação de
constitucionalidade.
6. No que toca à norma do artigo 194.º, n.º 3, do Código de Processo Penal,
entende o recorrente que foi interpretada no sentido segundo o qual a
enunciação dos motivos de facto da decisão de aplicação da medida de prisão
preventiva pode consistir apenas em formulações gerais e abstractas, sem
concretização das circunstâncias de tempo, modo e lugar em que ocorreram os
factos que integram a prática dos crimes imputados.
Sucede que o acórdão recorrido não fez aplicação, expressa ou implícita, deste
preceito legal, como seria necessário para que o recurso de constitucionalidade
pudesse incidir sobre a norma enunciada pelo recorrente.
Efectivamente, no que se refere à fundamentação do despacho impugnado, o acórdão
recorrido apenas analisou a questão à luz da norma do n.º 4 do artigo 97.º do
Código de Processo Penal, sem qualquer referência ao n.º 3 do artigo 194.º. A
invocação deste preceito e da respectiva inconstitucionalidade fizera-a o
recorrente por referência ao despacho de 12 de Outubro de 2004, argumentando
que, na parte em que reproduz esse despacho (que impôs a prisão preventiva) o
despacho recorrido (que a reapreciou) é nulo. Só por essa via se compreende a
invocação do n.º 3 artigo 194.º nas alegações de recurso. Ora, o acórdão
recorrido, além de não fazer referência ao n.º 3 do artigo 194.º, afastou
expressamente, por considerá-las resolvidas pelo anterior acórdão de 16 de
Dezembro de 2004, as questões de nulidade que se prendam com o teor do despacho
de 12 de Outubro de 2004. Portanto, nem implicitamente pode considerar-se que
fez aplicação da norma do n.º 3 do artigo 194.º do Código de Processo Penal.
7. Quanto à terceira questão submetida pelo recorrente, não é exacto que o
acórdão recorrido tenha interpretado e aplicado a norma extraída da conjugação
dos artºs. 193.º, n.ºs 1 e 2, e 213.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, no
sentido de que, ao reexaminar a subsistência dos pressupostos da prisão
preventiva, não terá o juiz de analisar em concreto a adequação e
proporcionalidade dessa medida coactiva às exigências cautelares que o caso em
concreto requer e que nem terá também, em sede de reexame, de averiguar se todas
as medidas, com excepção da prisão preventiva, se revelam concretamente
inadequadas ou insuficientes.
Com efeito, o acórdão recorrido reexaminou os pressupostos da aplicação da
prisão preventiva e ponderou a possibilidade de aplicação das restantes medidas
de coacção. Tanto assim que não acompanhou o despacho impugnado quanto ao perigo
de fuga ou de continuação da actividade criminosa. Mas considerou, acompanhando
o despacho impugnado nessa parte, que as restantes medidas de coacção, mormente
a sugerida obrigação de permanência na habitação, ainda que desacompanhada de
outras restrições, eram insuficientes e desadequadas por existir perigo de
perturbação do inquérito.
Assim, não vindo questionados os critérios normativos segundo os quais o
tribunal chegou a esse juízo, sobrevive apenas uma divergência relativamente à
decisão, que não compete ao Tribunal Constitucional sindicar.
8. Quanto à questão apresentada pelo recorrente em quarto lugar, é manifesto que
o tribunal ponderou a suficiência de indícios, considerando as imputações
concretamente feitas ao recorrente claramente sustentadas, designadamente nos
depoimentos dos co-arguidos e do denunciante. Consequentemente, também esta
norma não foi aplicada com o sentido que o recorrente indica. A divergência só
pode situar-se no plano da valoração desses indícios, questão que escapa ao
poder cognitivo do Tribunal Constitucional.
9. O mesmo sucede quanto à questão identificada em quinto lugar pelo recorrente.
O acórdão recorrido não se limitou a transcrever os requisitos legais do artigo
204.º do Código de Processo Penal. O acórdão ponderou, reassumindo o que fora
dito no acórdão de 16 de Dezembro de 2004, o risco de perturbação do inquérito,
motivando esse julgamento na posição institucional e nos relacionamentos
pessoais do arguido, que lhe possibilitam dissipar, atenuar ou inviabilizar a
recolha das provas. E entendeu que não existam factos novos que motivassem
diferente julgamento. Pode divergir-se desse entendimento, mas não pode dizer-se
que a decisão recorrida interpretou e aplicou a norma extraída dos artigos 204.º
e 213.º do Código de Processo Penal com o sentido que o recorrente indica.
10. Consigna-se por último, sem que importe, nesta fase e face ao que antecede,
retirar dessa circunstância qualquer consequência imediata, que a situação do
recorrente se encontra actualmente definida por decisão posterior, também ela
objecto de recurso de constitucionalidade que corre seus termos sob o n.º
571/2005.
11. Decisão
Nestes termos, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, decide-se
não tomar conhecimento do objecto do recurso e condenar o recorrente nas custas,
fixando a taxa de justiça em 7 (sete) unidades de conta.”
2. O recorrente reclamou para a conferência, ao abrigo do n.º 3 do
artigo 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, pedindo a revogação da
decisão do relator e o prosseguimento do recurso, com os seguintes fundamentos:
I – ( Inconstitucionalidade da norma do n.º 1 do artigo 78.º da Lei
n.º 28/82)
O n.º 1 do a artigo 78.º-A da LTC, ao permitir que os recursos de
fiscalização concreta sejam decididos por simples despacho do relator, mormente
quando não estão em causa questões de mero expediente ou de ordenação do
processo, é inconstitucional, por contrariar directa e frontalmente o disposto
no n.º 2 do artigo 224.º da Constituição.
II – ( Erro na interpretação e aplicação da mesma norma)
Se for entendido que a norma do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC não é
inconstitucional, a decisão sumária deve ser revogada por errónea interpretação
e aplicação dessa norma, visto que a faculdade concedida ao relator de proferir
decisão sumária está em paralelo com a norma do n.º 3 do artigo 76.º. Ou seja, o
relator só poderá entender que não pode conhecer do objecto do recurso quando
este não for admissível, nomeadamente porque o requerimento de admissão não
satisfaz os requisitos do artigo 75.º-A da LTC, não podendo chegar a essa
conclusão depois de decidir sobre todo o objecto do recurso.
III – ( Nulidade da decisão sumária. Outra inconstitucionalidade)
A decisão sumária – que de sumária só tem o nome – conheceu e
decidiu de questões de direito suscitadas pelo recorrente sem que lhe tivesse
sido dada oportunidade de, em conformidade com o princípio do contraditório,
sobre elas se pronunciar através da apresentação das respectivas alegações, com
o que violou o disposto no n.º 3 do artigo 3.º do Código de Processo Civil, o
que constitui nulidade nos termos do n.º 1 do artigo 201.ºdo mesmo Código,
aplicável por força do artigo 60.º da LTC.
IV – ( Do reexame dos pressupostos da prisão preventiva)
A norma do n.º 1 do art.º 213.º do Código de Processo Penal,
interpretada como o foi no despacho judicial e no acórdão recorridos, ou seja,
no sentido de que, para o reexame da subsistência dos pressupostos da prisão
preventiva e para decidir da sua manutenção, bastará a transcrição do despacho
que determinou a aplicação da medida coactiva e uma indicação genérica ao
arguido de que “todos os fundamentos mantêm actualidade, e neste momento se
encontra ainda mais fortalecida a prova entretanto carreada aos autos”, e de
que, “dos autos resultam inalterados os pressupostos de facto e de direito que
determinaram a sujeição do arguido à medida de coacção de prisão preventiva”,
sem enunciar em concreto quais os novos meios de prova entretanto carreados para
os autos nem os motivos por que resultariam inalterados os pressupostos, então
tal interpretação é materialmente inconstitucional por violação do disposto nos
artº.s 28.º, n.ºs 1 e 2, e 32.º, n.º 1, da CRP.
E por isso não tem razão a decisão reclamada quando pretende que a norma do n.º
1 do art.º 213.º do CPP não foi interpretada e aplicada com o sentido que o
recorrente pretendeu submeter à apreciação do Tribunal Constitucional.
V – ( A norma do n.º 3 do artigo 194.º do CPP)
A decisão sumária em apreço parece não ter compreendido o ponto de
vista do recorrente quando, no que toca a norma do n.º 3 do art.º 194.º do CPP,
alegou que tal norma foi interpretada tanto no despacho como no acórdão
recorridos no sentido segundo o qual a enunciação dos motivos de facto da
decisão de aplicação da medida de prisão preventiva pode consistir em
formulações gerais e abstractas, sem concretização das circunstâncias de tempo,
modo e lugar em que ocorreram os factos que integram a prática dos crimes
imputados.
Salvo o devido respeito, não tem razão a decisão sumária quando
alega que o acórdão recorrido não fez aplicação do preceito legal do n.º 3 do
art.º 194.º do CPP.
Não o fez expressamente, naturalmente porque já sabia que o caso
iria ser levantado perante o Tribunal Constitucional. Mas a verdade é que o
acórdão recorrido, embora não explicitamente, aplicou a norma do n.º 3 do art.º
194.º do CPP com o sentido materialmente inconstitucional invocada pelo
recorrente. Com efeito, ao reproduzir o despacho que aplicou em 12.10.2004 a
medida de prisão preventiva ao arguido, tanto o despacho que manteve a medida
coactiva como o acórdão recorrido estão ambos a assentar a sua decisão num
despacho que é nulo, por não enunciar as circunstâncias de tempo, modo e lugar
dos factos delituosos que imputa ao arguido.
Mas esse despacho inicial não é apenas nulo; ele interpreta e aplica
uma norma (n.º 3 do art.º 194.º) num sentido que é materialmente
inconstitucional, por violar o disposto nos nº.s 1 e 2 do art.º 28.º e no n.º 1
do art.º 32.º da CRP.
Assim, todas as vezes que um acórdão da Relação se fundamenta
naquele despacho inicial nulo e que aplica a lei num sentido inconstitucional, é
lícito ao recorrente invocar sempre essa nulidade e essa inconstitucionalidade.
E, por isso, e ao invés do que pretende a decisão sumária impugnada,
o acórdão recorrido, muito embora não explicitamente, aplicou de facto, num
sentido inconstitucional, a norma supracitada.
VI – ( A norma extraída da conjugação dos artigos 193.º, n.ºs 1 e 2
e 213.º do CPP)
A questão aqui é esta (a que a decisão sumária foge): o despacho do
juiz de instrução que decidiu manter a medida coactiva nenhum reexame contém
quanto á adequação da prisão preventiva às exigências cautelares do caso,
reexame que naturalmente deveria basear-se em critérios rigorosos e ponderando
factos concretos e não hipóteses teóricas.
Não agindo daquele maneira, o despacho do juiz de instrução
interpretou e aplicou a norma extraída dos artº.s 193.º, n.ºs 1 e 2, e 213.º,
n.º 1, do CPP, no sentido de que ao reexaminar a subsistência dos pressupostos
da prisão preventiva, não terá o juiz de analisar em concreto a adequação e
proporcionalidade na medida das exigências cautelares do caso, e que não teria
também, em sede de reeexame, de averiguar se todas as medidas, com excepção da
prisão preventiva, se revelavam concretamente inadequadas ou insuficientes.
O acórdão recorrido não examinou a questão suscitada pelo
recorrente, mas, ao omitir pronunciar-se sobre a matéria, co-honestou com o seu
critério a inconstitucionalidade do despacho da manutenção da prisão preventiva.
E, por isso, é de toda a justiça que o Tribunal Constitucional
aprecie e resolva a questão suscitada.
VII – ( A norma extraída dos artigos 202.º, n.º 1, alínea a) e
213.º, n.º 1, do CPP)
O despacho do juiz de instrução, muito embora por omissão,
interpretou e aplicou a norma extraída da conjugação dos art.ºs 202.º, n.º 1,
alínea a) e 213.º, n.º 1 do CPP num sentido que viola o disposto nos art.ºs
28.º, n.ºs 1 e 2, e 32.º, n.º 1, ambos da CRP.
Ou seja: interpreta-a e aplica-a no sentido de que, no despacho que
decide manter a prisão preventiva, não têm que ser reexaminados em concreto os
factos que porventura indiciem fortemente a prática de crime doloso punível com
pena de prisão de máximo superior a três anos, com suas circunstâncias de tempo,
modo e lugar.
Nesta matéria nada foi reexaminado.
E assim, se o arguido pretender impugnar a despacho de manutenção da
medida, como efectivamente pretendeu, não tem nenhum facto contra o qual possa
conduzir a sua defesa, porque os factos lhe foram astuciosamente ocultados.
O despacho é totalmente opaco e, com essa opacidade, viola
gravemente os direitos de defesa do arguido.
Ora, desta opacidade e contra ele recorreu o arguido, e o acórdão
recorrido, precisamente por que tem uma opinião igual à do despacho recorrido,
aplicou num sentido que é materialmente inconstitucional a norma conjugada dos
artºs. 202.º, n.º 1, alínea a), e 213.º, n.º 1, do CPP.
VIII – ( A norma extraída dos artigos 204.º e 213.º, n.º 1, do CPP)
A quinta questão identificada pelo recorrente resulta do facto de
que o despacho recorrido, primeiro, e o acórdão recorrido, depois, interpretaram
a norma extraída dos art.ºs 204.º e 213.º, n.º 1, do CPP no sentido segundo o
qual o reexame da subsistência dos pressupostos gerais e perigo, que permite
decidir da prisão preventiva, se bastaria com a mera transcrição dos requisitos
legais tal como constam do art.º 204.º do CPP, sem curar de enunciar os factos
ou indícios que preencheriam esses pressupostos.
E não se diga, como o diz a decisão sumária aqui reclamada, que o
acórdão recorrido ponderou o risco de perturbação do inquérito. A realidade é
que o arguido recorreu de um despacho do juiz de instrução que não examinou, com
factos concretos em apoio, os requisitos gerais do art.º 204.º. E não os
examinou nem na decisão inicial de aplicação da medida de prisão preventiva, nem
na decisão posterior que levou à sua manutenção. E o acórdão recorrido também
não ponderou, com factos em apoio, o preenchimento desses requisitos.
3. O Ministério Público sustenta a confirmação da decisão reclamada, pelo
seguinte:
“1- Relativamente àquela inconstitucionalidade da norma do n.º 1 do artigo
78.º-A, da Lei n.º 28/82, ao abrigo da qual foi tomada a decisão sumária, tem
vindo o Tribunal Constitucional reiteradamente a concluir pela sua conformidade
à Lei Fundamental – cfr., entre outros, os Acórdãos n.ºs 19/99, 123/01 e 456/02,
inexistindo qualquer razão para alterar o que vem sendo decidido.
2- A decisão de não conhecimento do recurso não aborda o mérito da questão, mas
tão só a matéria específica e inerente à não verificação dos respectivos
pressupostos processuais.
3- Não se verifica qualquer nulidade da decisão sumária, consistente na violação
do princípio do contraditório e geradora de qualquer inconstitucionalidade.
Semelhante questão foi apreciada já no Acórdão n.º 714/98, deste Tribunal, onde
se concluiu que o regime que passou a vigorar com a Lei n.º 13-A/98 visou uma
maior celeridade na decisão dos recursos, sem perda dos direitos de audiência
das partes, sendo que o carácter provisório da decisão sumária afasta a
aplicação do artigo 3.º, n.º 3 do Código de Processo Civil.
Tal jurisprudência tem aplicação no caso em apreço.
4- Face ao exposto, e na consideração de que no que demais vem alegado na
reclamação não é abalada a fundamentação e o sentido da decisão sumária, deve
aquela ser indeferida.”
4. A presente reclamação coloca questões de dois tipos:
A) As que incidem sobre a norma do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC ou sobre a
interpretação que dela está subjacente à decisão sumária (n.ºs I a III do
antecedente relato);
B) As que respeitam ao mérito da decisão reclamada, isto é, à decisão de não
conhecer de cada uma das questões de constitucionalidade que o recorrente quer
submeter ao Tribunal Constitucional (n.ºs IV a VIII do mesmo relato).
5. Sobre o primeiro grupo de questões:
I – O Tribunal já se pronunciou diversas vezes no sentido da não
inconstitucionalidade da norma contida no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC (cfr.,
por exemplo, os acórdãos n.ºs 19/99, 80/99, 550/99, 567/99, 223/01, 456/02).
Como se disse no acórdão n.º 19/99, publicado no Diário da República, II Série,
de 11 de Março de 1999:
“5. Não deixa, todavia, de dizer-se que não assiste razão ao reclamante quando
impugna a possibilidade de decisões individuais, nos casos previstos no artigo
78º-A, n.º 1, com fundamento nos artigos 222º, 224º, n.º 2 e 280º da
Constituição da República.
Quanto ao artigo 280º da Constituição, trata-se de norma atributiva de
competência ao Tribunal Constitucional no âmbito da fiscalização concreta da
constitucionalidade, não contendo regras relativas ao funcionamento do Tribunal.
E o mesmo se pode dizer do artigo 222º da Constituição, que rege sobre a
composição do Tribunal Constitucional, mas não indica qualquer regra relativa ao
processo de formação das decisões.
No que toca ao artigo 224º da Constituição, há que atentar antes de mais no seu
n.º 1, que permite à lei estabelecer as regras relativas ao funcionamento do
Tribunal Constitucional. A Lei Constitucional n.º 1/97 veio, aliás alterar o n.º
2 do artigo 224º da Constituição, eliminando a referência à fiscalização
concreta da constitucionalidade e da legalidade: onde se previa anteriormente a
possibilidade de funcionamento do Tribunal Constitucional por secções também
para o efeito da fiscalização concreta e outras competências previstas na lei,
passou agora a permitir-se simplesmente o funcionamento por secções, sem referir
já a fiscalização concreta e ressalvando-se apenas a fiscalização abstracta da
constitucionalidade e da legalidade.
Ora, esta norma constitucional não veda ao legislador a possibilidade de criar,
atenta a necessidade de flexibilização do funcionamento do Tribunal, um processo
de tomada de decisão que assente, em primeira mão, e para o tipo de questões
previstas no artigo 78º-A, n.º 1, numa decisão individual - decisões essas,
aliás, que não se tornam definitivas, quando o recorrente reclame, devendo então
ser decididas pela conferência (por unanimidade)ou pelo pleno da secção.
Na verdade, a decisão sumária, prevista no artigo 78º-A, n.º 1, da Lei do
Tribunal Constitucional, refere-se apenas a questões relativas à possibilidade
de conhecimento do recurso ou a questões simples, por terem sido objecto de
decisão anterior do Tribunal ou por serem manifestamente infundadas,
justificando-se por uma evidente razão de economia processual, sem qualquer
diminuição do conteúdo garantístico do processo constitucional (uma vez que
sempre fica aberta ao recorrente a possibilidade de reclamar para a conferência,
nos termos do n.º 3 - apresentando as razões da discordância com a decisão
sumária -, e que a decisão na conferência deve ser tomada por unanimidade dos
juízes intervenientes, sob pena de a decisão caber ao pleno da secção).
O artigo 78º-A, n.º 1 prossegue, assim, um objectivo de celeridade na
administração da justiça - relativamente à impossibilidade de conhecimento do
recurso ou a questões simples -, sem diminuição das garantias de defesa das
partes, facultando-se, sempre, ao recorrente a possibilidade de reclamar para a
conferência – oportunidade, essa, de resto, utilizada no presente caso pelo
reclamante.
Nestas condições, não pode considerar-se o regime desse artigo 78º-A, n.º 1,
como violador das normas constitucionais que regulam a organização e
funcionamento do Tribunal.”
Reitera-se este entendimento, pelo que subsiste a base legal habilitante da
decisão reclamada.
II – Não é exacto que a decisão reclamada tenha chegado à conclusão
de não conhecer do objecto do recurso “depois de examinar e decidir sobre todo o
objecto do recurso”, como afirma o reclamante. Decidindo com fundamento na não
verificação de um dos pressupostos de admissibilidade do recurso interposto ao
abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC – (não) versar o recurso
sobre a inconstitucionalidade de norma aplicada pela decisão recorrida – a
decisão reclamada teve, necessariamente, de proceder ao confronto entre a
identificação do sentido normativo que o recorrente indica no requerimento de
interposição do recurso relativamente a cada uma das questões de
constitucionalidade que quer ver apreciadas e a ratio decidendi do acórdão
recorrido. Análise a que procedeu para verificar se o objecto do recurso cabe na
previsão da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º e não para apreciar o seu mérito,
pelo que improcede o argumento de que a decisão recorrida assenta em errada
interpretação e aplicação do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC (1º segmento).
III – A decisão reclamada não incorreu em nulidade por violação do
n.º 3 do artigo 3.º do Código de Processo Civil pelo facto de o relator não ter
ouvido o recorrente antes de proferi-la.
Como se disse, apreciando arguição idêntica, logo no acórdão n.º
714/98, disponível em www.tribunalconstitucional.pt :
“2 - A decisão sumária reclamada foi proferida no uso dos poderes que o artigo
78-A nº. 1 da Lei nº. 28/82, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº. 13-A/98,
de 26 de Fevereiro, confere ao relator.
Este regime substituiu um outro em que o relator, verificando que se não podia
conhecer do objecto do recurso ou que a questão a decidir era simples, elaborava
uma sucinta exposição escrita do seu parecer e mandava ouvir cada uma das partes
por cinco dias- seguidamente, o processo ou era logo julgado (pelo colégio dos
juízes) ou continuado para alegações.
O regime que passou a vigorar com a Lei nº. 13-A/98 visou uma maior celeridade
na decisão dos recursos, sem perda dos direitos de audiência das partes.
Estes direitos estão convenientemente assegurados com a faculdade que é dada às
partes de reclamar para a conferência nos termos do artigo 78º-A nº. 3 da LTC,
podendo, designadamente, o recorrente defender, nessa reclamação, que não
deveria ter havido lugar a decisão sumária, caso em que, a obter vencimento, se
seguirão os termos previstos no nº. 5 do mesmo artigo 78º-A.
A própria razão de ser da norma contida no artigo 78º-A nº. 1 da Lei nº. 28/82 e
o carácter provisório, ou precário, da decisão sumária (ela só se converte em
definitiva se não for reclamada), afastam, pois, a aplicação do artigo 3º nº. 3
do CPC, no sentido pretendido pelo reclamante - a decisão do Tribunal, com a sua
formação colegial, nunca constituirá, para o recorrente, uma decisão-surpresa.”
Por outro lado, é manifesta a improcedência da argumentação do recorrente de
que, na interpretação que lhe foi dada pela decisão sumária, a norma do n.º 1 do
artigo 78.º-A da LTC viola as garantias constitucionais do arguido em processo
criminal, designadamente os n.ºs 1 e 5 do artigo 32.ºda Constituição.
Em primeiro lugar, a norma não foi aplicada com o sentido que o recorrente
supõe, como se referiu no antecedente n.º II. De todo o modo, não há qualquer
garantia de defesa que o processo criminal deixe de assegurar pelo facto de o
recurso de constitucionalidade poder ser objecto de uma decisão singular que,
nos termos sobreditos, pode sempre ser objecto de reclamação para uma formação
colegial do Tribunal.”
Improcedem, portanto, as questões de inconstitucionalidade do n.º 1
do artigo 78.º da LTC e de nulidade da decisão reclamada.
6. Relativamente ao segundo grupo de questões versadas na
reclamação, o Tribunal confirma a decisão sumária, cujos fundamentos a
reclamação não logra infirmar e que se reiteram relativamente a todas e cada uma
dessas questões, acrescentando, apenas, o seguinte:
A decisão sumária não pretende impor qualquer interpretação da
norma do n.º 1 do artigo 213.ºdo Código de Processo Penal, designadamente a de
que vigoraria neste domínio o princípio “rebus sic stantibus”, pelo que “o que é
fulcral é constatar se houve (ou não) alteração de facto e de direito, face a
anterior despacho judicial que determinou ou reexaminou a situação processual do
arguido” nem se pronunciou sobre a conformidade dessa norma (nessa
interpretação) com a Constituição. Limitou-se a verificar que esse foi o sentido
com que o n.º 1 do artigo 213.º do Código Penal foi aplicado pelo acórdão
recorrido e que não existe coincidência substancial entre tal sentido normativo
e aquele que o recorrente indica no ponto correspondente do requerimento de
interposição do recurso (n.º 1 do requerimento) e em que agora insiste.
Por outro lado, como se afirmou na decisão sumária e o reclamante
acaba por reconhecer, o acórdão recorrido entendeu que o que lhe cabia apreciar
era a fundamentação do despacho que reexaminou os pressupostos da medida de
coacção e, para tanto, considerou a norma do n.º 3 do artigo 97.º do Código de
Processo Penal, que não é objecto do recurso. Não apreciou a questão da
fundamentação do (primeiro) despacho de aplicação da prisão preventiva, por
considerá-la resolvida pelo acórdão de 16 de Dezembro de 2004, proferido em
recurso dele interposto. Não cumpre ao Tribunal Constitucional sindicar a
congruência desta decisão ou o acerto desse entendimento, que seguramente se não
socorre da norma do n.º 3 do artigo 194.º do Código de Processo Penal.
Por último, saber se a decisão judicial recorrida deixou de apreciar
questões que o recorrente colocou e de que deveria conhecer ou deixou de aplicar
normas que deveria tomar em consideração, é questão que respeita à conformação
do processo e à aplicação do direito ordinário. O recurso de constitucionalidade
tem função instrumental e natureza de fiscalização normativa, só podendo versar
sobre a conformidade à Constituição de normas efectivamente aplicadas (ou, no
seu caso, a que tenha sido recusada aplicação) pela decisão recorrida.
7. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e condenar o
recorrente nas custas, fixando a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 4 de Agosto de 2005
Vítor Gomes
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Artur Maurício