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Processo n.º 350/07
3ª Secção
Relator: Conselheiro Gil Galvão
(Conselheiro Bravo Serra)
Acordam, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório
1. Inconformado com o acórdão proferido em 14 de Outubro de 2004 pelo Tribunal
da Relação de Lisboa – acórdão esse que negou provimento ao recurso interposto
pelo arguido A. do aresto lavrado em 4 de Março de 2004 pelo tribunal colectivo
do Tribunal de comarca de Vila Praia da Vitória, o qual, pelo cometimento de
factos que foram subsumidos à autoria material de dois crimes de homicídio
qualificado, previstos e puníveis pelos artigos 131º e 132º, números 1, alíneas
d), g) e i), e 2, ambos do Código Penal, o condenou na pena de única de 25 anos
de prisão – recorreu o mesmo arguido para o Supremo Tribunal de Justiça que, por
acórdão de 30 de Novembro de 2006, negou provimento ao recurso, alterando,
porém, a qualificação jurídica dos factos, que subsumiu como integrando o
cometimento de dois crimes de homicídio qualificado, previstos e puníveis pelo
artº 132º, nº 2, alínea d), do Código Penal, impondo ao arguido a pena única de
vinte anos de prisão.
2. Deste acórdão recorreu o arguido para o Tribunal Constitucional ao abrigo da
alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, pretendendo a
apreciação da norma do “artº 123º do Código de Processo Penal na interpretação
perfilhada pelo acórdão recorrido, ou seja interpretada no sentido de ser mera
irregularidade a deficiência da gravação da prova oral produzida em audiência”.
O Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça, porém, por despacho
prolatado em 11 de Janeiro de 2007, não admitiu o recurso.
3. Desse despacho foi deduzida pelo arguido reclamação para o Tribunal
Constitucional. Pronunciando-se sobre a reclamação, o Representante do
Ministério Público junto deste Tribunal veio sustentar que a mesma era
manifestamente infundada.
4. Pelo Acórdão nº 205/2007, foi aquela reclamação julgada improcedente. Este
Tribunal fundamentou assim a decisão:
“[…] Na verdade, como deflui da transcrição supra efectuada do aresto querido
impugnar perante este órgão de administração de justiça, a razão de decidir
carreada àquele acórdão no tocante à questão da invocada irregularidade ou
nulidade relativa que, na óptica do então impugnante, teria sido cometida pela
circunstância de determinadas passagens da gravação da prova oral produzida em
audiência se mostrarem imperceptíveis, fundou-se em que, não tendo esse problema
sido impostado perante o Tribunal da Relação de Lisboa – e, por isso, não se
tendo esse Tribunal de 2ª instância debruçado ou emitido pronúncia sobre a
matéria – não podia tal problema ser reequacionado perante o Supremo Tribunal de
Justiça, justamente porque os recursos se destinam a reapreciar as decisões
judiciais impugnadas e não a curarem de questões novas que não foram objecto de
decisão pelo tribunal recorrido.
Por isso, a real razão jurídica do decidido no atinente à falada questão
esteou-se, e tão só, nas regras reguladoras dos poderes cognitivos do tribunal
de recurso e, em concreto, do Supremo Tribunal de Justiça.
Aliás, mesmo que porventura viesse o Tribunal Constitucional a pronunciar-se
sobre a desarmonia constitucional do artº 123º do diploma adjectivo criminal –
no recorte interpretativo que se enunciou no requerimento de interposição do
recurso de constitucionalidade (recorte esse, aliás, que se não mostra
efectivado de plena curialidade) – uma tal decisão nenhuma repercussão poderia
ter no acórdão exarado pelo Supremo Tribunal de Justiça, precisamente porque a
decisão nele ínsita haveria de ser a mesma, isto é, não poder tomar conhecimento
dessa questão, pois que a mesma não foi objecto de equacionamento perante o
Tribunal da Relação de Lisboa e, por isso, o aresto nesta lavrado não teve
ocasião de sobre ela se pronunciar”.
5. Notificado deste acórdão, o reclamante vem agora aos autos requerer a sua
aclaração, através de um requerimento em que, para o que ora releva, diz o
seguinte:
“35° O reclamante não consegue perceber a ratio essendi do acórdão de que ora
pede aclaração, por ele ser obscuro e imperceptível.
36° Com o devido respeito, não se alcança do teor do acórdão porque razão se
fosse julgada inconstitucional a norma do art° 123° do CPP não poderia ter
qualquer efeito na decisão de fundo dos tribunais judiciais, mormente do Ac. Do
STJ,”
6. O Ministério Público, por seu turno, sustentou que o requerido carece
manifestamente de fundamento, uma vez que “no – desnecessariamente prolixo –
requerimento ora apresentado, o reclamante não enuncia, em termos inteligíveis,
qualquer obscuridade ou ambiguidade que se possa imputar ao claríssimo Acórdão
proferido neste Tribunal Constitucional sobre a reclamação deduzida.”
7. Tendo cessado funções de Juiz do Tribunal Constitucional o primitivo relator,
foram os autos conclusos ao presente relator, cumprindo agora decidir.
II. Fundamentação
8. Na única parte da presente reclamação que aqui importa considerar, refere o
reclamante que “não consegue perceber a ratio essendi do acórdão de que ora pede
aclaração, por ele ser obscuro e imperceptível”, uma vez que, segundo alega, não
se alcança do seu teor “porque razão se fosse julgada inconstitucional a norma
do artº 123º do CPP não poderia ter qualquer efeito na decisão de fundo dos
tribunais judiciais, mormente do Ac. do STJ”. Porém, manifestamente, sem razão.
Se, como afirma, o reclamante não consegue perceber a ratio essendi do acórdão
de que ora pede aclaração, tal não se deve seguramente ao facto de o mesmo ser
“obscuro e imperceptível” na sua fundamentação, uma vez que nele se enunciam com
toda a clareza, como se pode verificar na transcrição supra efectuada, as razões
do decidido, designadamente a razão porque se afirma que mesmo que fosse julgada
inconstitucional a norma do artigo 123º do Código de Processo Penal não poderia
esse julgamento ter qualquer efeito na decisão proferida pelo Supremo Tribunal
de Justiça.
Assim, porque o acórdão aclarando não enferma de qualquer obscuridade ou
ambiguidade que careça de ser esclarecida, há que desatender o pedido de
aclaração formulado.
III - Decisão
Em face do exposto, decide-se desatender a requerida aclaração.
Custas pelo requerente, fixando-se a taxa de justiça em 15 (quinze) unidades de
conta.
Lisboa, 3 de Maio de 2007
Gil Galvão
Vítor Gomes
Rui Manuel Moura Ramos