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Processo n.º 58-A/05
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
1.Nos presentes autos, em que figuram como reclamantes A. e mulher, B., melhor
identificados nos autos, o Tribunal Constitucional proferiu o acórdão n.º
109/2005, pelo qual decidiu indeferir a reclamação apresentada e,
consequentemente, “condenar os reclamantes em custas, com 20 (vinte) unidades de
conta de taxa de justiça”, e o acórdão n.º 231/2005, pelo qual se decidiu
desatender o pedido de aclaração daquele acórdão n.º 109/2005 e “condenar os
requerentes em custas, fixando em 15 (quinze) unidades de conta a taxa de
justiça.”
Elaborada a conta de custas n.º 882/2005, vieram os reclamantes dela reclamar,
nos termos seguintes:
«1.º
Incluem-se na nota de custas 20 UC.s a pagar pelas partes recorrentes.
2.º
Todavia, não existe em nenhum – mui douto – despacho, e/ou decisão subjacente,
qualquer fundamento em que o Tribunal alicerce tal decisão.
3.º
Na verdade, tal decisão não apresenta qualquer fundamentação – directa ou
indirecta, subjectiva ou objectiva...(!)
Nenhuma(!)
4.º
Como já desde os tempos imemoriais anteriores à Revolução Francesa que as
decisões judiciais – ainda que doutas – não podem deixar de ser fundamentadas,
5.º
não posso deixar de invocar a nulidade de tal decisão.
6.º
Baseamo-nos no teor do artigo 668.º, n.º 1, alínea b), do Cód. Proc. Civil,
7.º
por via do disposto no artigo 48.º da Lei do Tribunal Constitucional.
8.º
Aliás, estas disposições processuais encontram-se em perfeita consonância com o
teor dos artigos 203.º e 204.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.
9.º
Em suma: as 20 UC.s que foram fixadas às partes recorrentes são nulas e de
nenhum efeito; de acordo com as normas processuais mobilizadas supra; e como
tal, devem ser julgadas sem qualquer efeito. (E não se diga que as partes não
chamaram a atenção (humildemente) do Tribunal para esta insuficiência
processual, uma vez que – por requerimento atempado e adequado – tentaram dar
disso a devida nota. Todavia, debalde o fizeram porquanto receberam – com o
devido respeito – “o estigma da mais vil ignorância...”).»
2.O representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional
pronunciou-se, afirmando:
“A presente reclamação é perfeitamente infundada, já que a conta de custas se
mostra estritamente elaborada em consonância com o teor da condenação constante
do acórdão proferido por este Tribunal.”
Cumpre apreciar e decidir.
3.Como tem sido repetidamente afirmado na jurisprudência deste Tribunal,
“A reforma quanto a custas – sublinhou-se no acórdão n.º 27/94 (publicado no
Diário da República, II série, de 31 de Março de 1994, e no Boletim do
Ministério da Justiça, n.º 433, página 141) – representa uma abertura à
modificação do julgado (e, assim, uma excepção à regra enunciada no n.º 1 do
artigo 666.º do Código de Processo Civil). Tal reforma só pode ter lugar, quando
tiver havido uma condenação ilegal em custas.”
(ver ainda, além do citado Acórdão n.º 27/94, por exemplo, os Acórdãos n.ºs
27/96, 1173/96 e 652/98, todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt).
Ora, é evidente que a condenação dos reclamantes nas custas do processo não foi
desconforme com os critérios legais. Mesmo considerando apenas a “moldura” de
custas prevista (no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro) para
os casos em que o Tribunal indefira reclamações, incluindo de decisões sumárias,
verifica-se que o montante em que os reclamantes foram condenados se fixou, no
acórdão n.º 109/2005, abaixo sequer da sua média – foi fixado em 20 unidades de
conta, quando o mínimo é de 5 e o máximo de 50 unidades de conta. Tal montante
correspondeu ao resultado de uma ponderação dos factores referidos no artigo 9.º
do citado Decreto-Lei n.º 303/98 – “a complexidade e a natureza do processo, a
relevância dos interesses em causa e a actividade contumaz do vencido” –,
cumprindo, aliás, notar que esta última pode resultar também da clareza da falta
de preenchimento dos requisitos para se poder tomar conhecimento do recurso (e
recorda‑se que os reclamantes nunca imputaram sequer inconstitucionalidades a
quaisquer normas), e que não se verificava presente no caso vertente qualquer
factor específico que impusesse – ou, sequer, recomendasse – uma redução da
condenação em custas ao mínimo legal.
Acresce que, em casos como o presente, a fixação de custas num montante de 20
unidades de conta corresponde à jurisprudência reiterada deste Tribunal.
Quanto à invocação dos artigos 668.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo
Civil e 48.º da Lei do Tribunal Constitucional, nota-se, desde logo, que este
último só pode ser referido pelos reclamantes por lapso, uma vez que essa norma
faz uma remissão para as disposições do Código de Processo Civil, em tudo aquilo
que não se achar especialmente regulado na Lei do Tribunal Constitucional,
apenas no que diz respeito à distribuição de processos, pelo que não tem aqui
qualquer aplicação (quereriam, com certeza, invocar antes o artigo 69.º da mesma
Lei do Tribunal Constitucional). E no que toca ao artigo 668.º, n.º 1, alínea
b), do Código de Processo Civil, haveria que reiterar que a condenação em custas
não foi ilegal, tendo sido imposta ao abrigo do disposto nos artigos 84.º, n.º
4, da Lei do Tribunal Constitucional, e 7.º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de
Outubro, por um valor mais próximo do mínimo do que do máximo legal, e em
resultado da consideração dos factores relevantes, sendo estes dados legais que
se afiguram evidentes e conhecidos – ou que devem ser conhecidos – por
operadores jurídicos profissionais que litigam perante o Tribunal
Constitucional.
4.Verifica-se, porém, que a decisão do presente requerimento não é já, sequer, o
momento próprio para discutir a legalidade da condenação em custas, pois o
acórdão n.º 109/2005, no qual se contém a condenação em custas contra a qual se
insurgem os reclamantes, transitou em julgado, sendo apenas depois de notificado
da conta de custas que aqueles vieram pôr o problema da fundamentação dessa
condenação.
Ora, tendo a decisão condenatória em custas transitado em julgado, já não pode
reagir-se contra elas através do meio próprio, que seria o recurso ou o pedido
de reforma da decisão quanto a custas, invocando a sua ilegalidade. A reclamação
da conta de custas, única via processual ora disponível, depois de se ter
deixado transitar a condenação em custas, não é meio para obter a alteração
dessa condenação, porquanto, como se escreveu no acórdão n.º 195/99 (publicado
no Diário da República, II série, de 5 de Novembro de 1999):
“No momento da elaboração da conta de custas só pode estar em causa o respectivo
modo de execução, afigurando‑se natural que a decisão que decide das custas já
não possa ser impugnada.”
Tal decorre, aliás, da parte final do n.º 1 do artigo 60º do Código das Custas
Judiciais, que reproduz o conteúdo da parte final do n.º 1 do artigo 138º do
Código das Custas Judiciais de 1962, vigente até 31 de Dezembro de 1996, e a que
se reportava o Acórdão citado, que acrescentava, reproduzindo jurisprudência e
doutrina pacíficas:
“A reclamação da conta de custas é um mecanismo por via do qual se reage contra
o modo como a conta foi elaborada, quando se verifiquem erros técnicos,
contabilísticos ou violação das disposições legais aplicáveis.
(...)
Se a parte entende que não deve ser condenada no pagamento de custas terá de
impugnar a decisão que condena em custas e não o acto de secretaria consistente
na elaboração da respectiva conta.”
O presente requerimento, apresentado depois do trânsito em julgado da decisão
condenatória em custas, por esta não ter sido impugnada (designadamente, quanto
à sua referência ao requerente), tem, pois, de ser indeferido, nada mais havendo
a declarar ou a consignar na presente decisão.
5.Pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a presente reclamação, e, em
consequência, nos termos dos artigos 84.º, n.º 4, da Lei do Tribunal
Constitucional e 7.º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro, condenar os
reclamantes nas custas do incidente, com 20 (vinte) unidades de conta de taxa de
justiça.
Lisboa, 21 de Setembro de 2005
Paulo Mota Pinto
Mário José de Araújo Torres
Rui Manuel Moura Ramos