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Processo n.º 748-A/05
1.ª Secção
Relator: Conselheiro Rui Moura Ramos
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional.
1. A., notificado da decisão sumária proferida a fls.13569/13576
(certificada no presente traslado a fls.339/346), veio deduzir reclamação para a
Conferência, nos termos do artigo 78º.-A, nº. 3 da Lei nº. 28/82, de 15 de
Novembro (LTC).
É o seguinte o teor da decisão sumária impugnada:
“1. A. foi condenado (Acórdão de fls.12820/13055 do Tribunal da Relação do
Porto) na pena única de 8 anos e 5 meses de prisão (cfr. fls. 13055).
Pretendendo recorrer desta decisão para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ),
apresentou no dia 22/02/2005 na referida Relação o requerimento de fls.
13214/13215, contendo a seguinte alegação de «justo impedimento», relativo à
prática do acto consubstanciado na interposição de tal recurso:
“O mandatário de A.,
vem invocar justo impedimento na apresentação tempestiva do recurso que anexa,
pelo seguinte:
1. Por se tratar de matéria complexa, acabou a motivação cerca das
23.30 horas de hoje [refere-se o recorrente, seguramente, ao anterior dia 21 de
Fevereiro].
2. De então para cá tentou sucessivamente socorrer-se do fax que dava
sistemático e ininterrupto sinal de linha ocupada.
3. Tentou fazer o envio pelo mail certificado, mas não obteve recibo.
4. Desconhece se foi ou não recebido aquele.
5. Para o caso de não ter sido, só agora chegará a motivação por o fax
funcionar finalmente.
6. A chegada tardia, mas a tempo das notificações a efectuar amanhã
mesmo [refere-se o recorrente ao próprio dia 22 de Fevereiro] em nada atrasa o
processo nem prejudica outras partes.
7. A não admissão do recurso por esta dificuldade formal, traria séria
complicação à defesa do recorrente e mostrar-se-ia desajustada do ponto de vista
da justiça material.
8. Requer que seja julgado procedente o impedimento invocado e
admitida a prática do acto.
Prova: [...], com o domicilio profissional do mandatário, seus funcionários que
apresentará. [...]”
Junto com esta peça apresentou o mandatário requerente (cfr. fls. 13216/13275) o
requerimento de interposição do recurso pretendido e a respectiva motivação.
Recaiu sobre tal alegação de justo impedimento o seguinte despacho do Exmo.
Desembargador Relator:
“[...] A invocação da complexidade da matéria para justificar a interposição
tardia de recurso para o STJ é manifestamente irrelevante, uma vez que a lei não
prevê tal motivo como causa de dilação do prazo para interposição de recurso.
Os motivos invocados como justo impedimento também não procedem.
Assim, indefere-se o invocado justo impedimento. [...]
[transcrição de fls.13385 vº/13386]
Apresentou-se então A. (cfr. fls. 13407/13412) a requerer, nos termos do artigo
700º, nº3 do Código de Processo Civil (CPC), que sobre a matéria de tal despacho
do relator recaísse acórdão da conferência, incluindo nesse requerimento o
seguinte trecho:
“[...] Por fim, e ainda cautelarmente, a norma do artigo 146º, nº2 do CPC,
interpretada no sentido de que o Tribunal pode dispensar a audição da prova que
a parte que invocou o justo impedimento, ofereceu atempadamente, padece de
inconstitucionalidade material por violação do princípio constitucional do
contraditório consagrado no artigo 32º, nº5 da [ Constituição da República
Portuguesa], e surge em tal interpretação como impeditiva do direito ao recurso,
previsto no nº1 do mesmo preceito constitucional [...].”
A este respeito proferiu a conferência o Acórdão de fls. 13456/13470,
indeferindo a pretensão do requerente, nos seguintes termos:
“[...] O arguido invocara, para fundamentar justo impedimento, a manifesta
complexidade do processo e a dificuldade de enviar a motivação por fax e por
email certificado.
O relator indeferiu o requerido [...].
Requerendo o arguido que sobre tal despacho recaia acórdão aqui se reitera, sem
necessidade de mais considerações, que a complexidade do processo não é, por si,
causa prevista na lei, para a dilação do prazo de interposição de recurso.
Por outro lado a alegada impossibilidade de enviar por fax ou por email
certificado a motivação de recurso não consubstancia justo impedimento já que
deixar para a última hora o envio da motivação acarreta necessariamente riscos
pois nada garante o normal funcionamento da aparelhagem electrónica.
A ter-se verificado a impossibilidade de envio da motivação de recurso por fax
ou por email certificado por volta da meia noite do último dia do prazo é
circunstância que o arguido terá de imputar a si próprio [...].
O arguido, ora recorrente, imputa ao despacho em causa a nulidade por omissão de
pronúncia – artigo 379º,nº1, alínea c) do Código de Processo Penal – por dever
pronunciar-se sobre o recibo do email constante dos autos e a atinente alegação
onde também sustentou o justo impedimento.
Mas não se verifica a invocada nulidade. É que o despacho do relator [...]
apenas versou sobre o requerimento de fls. 13319 do arguido onde este invoca o
justo impedimento e nada mais.
Acresce que para a prova do justo impedimento o impetrante deve juntar logo com
a invocação do mesmo toda a prova, e não posteriormente, como o fez – cfr.
requerimento de fls. 13319 de 23/02/2005 (invocação de justo impedimento) e
requerimento de fls. 13383 de 25/02/2005 a requerer a passagem de guias de multa
para liquidação e a junção aos autos do comprovativo de envio dos articulados
por email (fls. 13383 e 13384).
De qualquer modo sempre se dirá que o referido comprovativo apenas indica o
envio dos articulados para esta Relação no dia 22/02/2005, pelas 02:08:37 horas.
O facto de no cabeçalho desse comprovativo constar, em letra de impressão do
escritório do mandatário do arguido [:] “Segunda-feira, 21 de Fevereiro de 2005
18:09”, nada certifica, apesar da nota manuscrita no mesmo acrescentar “o
computador, nas definições de controlo estava mal configurado em data/hora tinha
um atraso de cerca de 5 H: 30 m.”
[...].
Por último, o arguido invoca a inconstitucionalidade material do artigo 146º,
nº2 do CPC, se interpretado no sentido de que o tribunal pode dispensar a
audição da prova que a parte que invocou o justo impedimento ofereceu
atempadamente, por violação do princípio do contraditório consagrado no artigo
32º, nº 5 da CRP e surge, em tal interpretação, como impedimento do direito ao
recurso, previsto no nº 1 do mesmo preceito constitucional.
Todavia, não está em causa a apontada interpretação do artigo 146º, nº 2 do CPC.
In casu, não foram inquiridas as testemunhas oferecidas por se ter considerado
que tal diligência seria inútil uma vez que mesmo que fosse verdade o
circunstancialismo invocado para o justo impedimento, nem por isso tal
circunstancialismo bastaria para configurar uma situação de justo impedimento.
Não foi, pois, aplicado o disposto no artigo 146º, nº 2 do CPC com a
interpretação que o arguido lhe confere. [...]”
Na sequência desta decisão veio o recorrente A., invocando o disposto no artigo
669º, nº1, alínea a) do CPC, pedir diversos esclarecimentos (cfr. fls.
13473/13476) que o Tribunal da Relação rejeitou, através do Acórdão de fls.
13499/13501.
1.1 Surge então (cfr. fls. 13543/13545) a interposição do presente recurso de
constitucionalidade (no dia 9/08/2005), expressando o recorrente tal pretensão
nos seguintes termos:
“[...] o recurso é interposto ao abrigo da alínea b) do nº1 do artigo 70º da Lei
nº28/82, de 15 de Novembro [...].
Pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade material da norma do artigo
146º, nº2 do CPC, quando interpretada no sentido de que alegando a parte a
existência de justo impedimento para a interposição do recurso após as 24 horas
do último dia do prazo para o efeito; que tal impedimento ocorreu dentro do
prazo legal de interposição de recurso; identificando o impedimento como
consistente no facto de após as 23h20m desse último dia e até às 00h25m do dia
seguinte, não conseguir enviar tal articulado por fax, por o aparelho dar
sistemático e ininterrupto sinal de linha ocupada e por não ter obtido recibo
comprovativo do envio por email que fizera e que só no dia seguinte
estranhamente viu ser impresso, certificando aliás envio atempado, do que logo
deu conta ao Tribunal; e juntando prova testemunhal e documental, pode o
Tribunal declarar a inexistência de justo impedimento sem proceder à inquirição
e análise da prova oferecida.
Tal norma, naquela interpretação, viola o dispositivo constitucional do artigo
32º, nº1 da CRP, impedindo o direito fundamental do arguido ao recurso e
diminuindo irremediavelmente as suas garantias de defesa, assim como o princípio
do contraditório expresso na norma do nº5 do citado artigo 32º [...].
A questão de inconstitucionalidade foi levantada nos autos, logo no requerimento
apresentado em 22/03/2005 que visou a prolação de acórdão, sobre o despacho do
Sr. Desembargador relator que indeferiu o justo impedimento e rejeitou o recurso
[...]”
A fls.13560 (no dia 21/09/2005) foi este recurso admitido no Tribunal da Relação
do Porto, dando entrada no Tribunal Constitucional em 29/09/2005.
1.2 Importa entretanto consignar que, após a já referida decisão negando a
aclaração (o Acórdão de fls. 13499/13501), foi proferido pelo Exmo.
Desembargador Relator a fls. 13504 e vº um outro despacho não admitindo o
(mesmo) recurso para o STJ que o recorrente interpôs a fls. 13216 (que é o
recurso a respeito do qual se coloca a questão do justo impedimento aqui em
causa), isto por aquele Magistrado entender que, “[...] independentemente de se
considerar o justo impedimento alegado [...], nunca o referido recurso poderia
ser admitido face ao [...] artigo 400º, nº1, alínea f) do Código de Processo
Penal” (transcrição de fls. 13504 vº).
Relativamente a este despacho deduziu o recorrente A. reclamação (cfr. fls.
13534/13537), nos termos do artigo 405º, nº1 do CPP. Foi ordenada a instrução
por apenso desta reclamação (cfr. despacho de fls. 13560) que, seguramente, dada
a data do despacho respectivo, não foi ainda decidida.
Importa, assim, apreciar o presente recurso de constitucionalidade, sendo que o
mesmo se refere, como flui de todo o anterior relato, à questão do justo
impedimento, tal qual o recorrente a configurou no requerimento de interposição
de fls. 13543/13545.
2. Tal apreciação pode, não obstante o despacho de admissão proferido pelo
Tribunal a quo, revestir a forma de uma decisão sumária, nos termos do artigo
78º-A, nº1 da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro (LTC), quando – e é esse o caso,
no entendimento do ora relator – o recurso pretendido interpor não preencha os
necessários pressupostos de admissão.
Com efeito, analisando a caracterização do que o recorrente apresenta como sendo
a dimensão interpretativa da norma objecto, verifica-se facilmente não estar em
causa qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, mas antes, pura e
simplesmente, a apreciação da própria decisão recorrida. De resto – e este
sempre constituiria um segundo fundamento de inadmissão do recurso – , a decisão
recorrida, como adiante se verá, não assentou no fundamento especifico ao qual o
recorrente pretendeu conferir uma dimensão de inconstitucionalidade no trecho
processual (constante do item 32 da reclamação para a conferência de fls.
13407/13412) no qual situa a alegada suscitação prévia.
2.1. Quanto à ausência da imprescindível dimensão normativa do recurso, basta a
simples leitura do requerimento de interposição para se verificar que aquilo que
o recorrente pretende fazer passar por uma determinada interpretação do artigo
146º, nº2 do CPC ( aqui aplicável ex vi do artigo 4º do CPP), mais não é que o
somatório das incidências fácticas que conduziram à não aceitação de que a
entrega tardia do recurso se deveu a justo impedimento. Trata-se, enfim, de uma
descrição tão “agarrada” a aspectos de facto, que a sua consideração levaria ao
absurdo – enquanto formulação de uma proposição de carácter normativo – da
inclusão de trechos aludindo a períodos horários específicos ( “[...] alegando a
parte a existência de justo impedimento para a interposição do recurso após as
24 horas do último dia do prazo [...] identificando o impedimento como
consistente no facto de após as 23h20m desse último dia e até às 00h25m do dia
seguinte [...]”), ou aludindo a situações como “[...] não conseguir enviar [um]
articulado por fax, por o aparelho dar sistemático e ininterrupto sinal de linha
ocupada [...]” ( citações extraídas do requerimento de interposição do recurso;
cfr. fls. 13543/13544).
Este tipo de situações é apropriadamente descrito por Carlos Lopes do Rego como
consubstanciando um “[...] abuso ou ficção do conceito de interpretação
normativa, apenas com o objectivo de forjar uma norma sindicável pelo Tribunal
Constitucional [...]”, acrescentando o mesmo autor ser esta tendência “ [...]
perceptível [...] em numerosos recursos – embora sob a capa formal da invocação
da inconstitucionalidade de certo preceito legal tal como foi aplicado pela
decisão recorrida – [nos quais] o que realmente se pretende controverter é a
concreta e casuística valoração pelo julgador das múltiplas e específicas
circunstâncias do caso sub judicio [...]” ( O objecto idóneo dos recursos de
fiscalização concreta da constitucionalidade: as interpretações normativas
sindicáveis pelo Tribunal Constitucional ; in «Jurisprudência Constitucional»,
nº3, Julho/Setembro, 2004, p. 8).
2.2. Bastaria esta (notória) ausência de referencial normativo no recurso para
que o Tribunal dele não pudesse tomar conhecimento. De qualquer forma, admitindo
que a questão colocada pelo recorrente se prende com a decisão do incidente em
causa com dispensa de uma eventual “audição da prova que a parte que invocou o
justo impedimento ofereceu” (cfr. fls. 13411/13412), e admitindo ainda – o que,
aliás, in casu não ocorreu – que esta situação tivesse sido objecto de uma
configuração aceitável, sequer no requerimento de interposição do recurso,
enquanto dimensão interpretativa da norma, nem mesmo assim o recurso seria
admissível. É que, como se explicitou na decisão recorrida, a rejeição do justo
impedimento assentou na recusa de que o motivo invocado pudesse consubstanciar
um justo impedimento, e não na indemonstração desse motivo.
3. Nesta conformidade, nos termos do artigo 78º-A, nº1 da LTC, decide-se não
tomar conhecimento do recurso pretendido interpor por A..[…]”
1.1. São os seguintes os fundamentos da reclamação do recorrente:
“[…]
A) A douta decisão sumária de que se reclama andou mal […] ao entender que o
recurso pretendido interpor não visava qualquer questão de inconstitucionalidade
normativa, mas antes, a apreciação da decisão recorrida.
B) Trata-se da interpretação do artigo 146º, nº2 do CPC que a Relação e o
STJ fizeram contrariamente ao artigo 32º, nº1 e 5 da CRP, na medida em que,
contra jurisprudência existente admitiram que seja possível declarar não
verificado um invocado justo impedimento sem análise ou inquirição da prova
oferecida.
C) Esta é matéria de direitos, liberdades e garantias, directamente
aplicável, que vincula inclusive o Tribunal Constitucional.
D) Como defendem os Professores Jorge Miranda e Rui Medeiros (CRP anotada) a
vinculação dos tribunais aos preceitos constitucionais sobre direitos,
liberdades e garantias, envolve positivamente a interpretação integração e
aplicação de modo a conferir-lhes a máxima eficácia possível dentro do sistema
jurídico.
E) A dimensão normativa do recurso, é a mesma que foi invocada aquando da
arguição da inconstitucionalidade, como resulta do sublinhado do texto de
interposição do recurso.
F) Em ambos os casos o que se defende é que foi feita interpretação
contrária à Constituição quando o Tribunal aplicou a norma do artigo 146º, nº2
do CPC no sentido de não existir justo impedimento, sem ao menos ouvir a prova e
curar de saber as razões invocadas, no que limitou objectivamente a defesa do
arguido.
G) Nesta interpretação a norma é contrária ao artigo 31º, nºs1 e 5 da CRP e
ao artigo 8º da DUDH e inconstitucional por assim violar o princípio do
contraditório e o direito ao recurso.
H) Deve ser revogada a decisão sumária e o recurso admitido seguindo-se o que
for de lei.
I) Afirmar que a rejeição do justo impedimento assentou na recusa [de] que
o motivo invocado pudesse consubstanciar um justo impedimento e não na
indemonstração desse motivo, é também errada conclusão.
J) [Trata-se de] aspecto de que a decisão sumária reclamada objectivamente
não conheceu.
K) O recorrente não invocou sequer a complexidade como motivo de impedimento.
L) Estando o Tribunal vinculado à interpretação, integração e aplicação dos
direitos, liberdades e garantias de modo a conferir-lhes a máxima eficácia
possível e em ordem a assegurar a máxima defesa do arguido, também por aqui
haveria de [s]er admitido o recurso.
M) De qualquer modo, e em ambos os casos, se alguma razão existisse apta a
obstar ao seu recebimento, sempre seria de notificar o recorrente, convidando ao
aperfeiçoamento do requerimento, e nunca seria de rejeitar pura e simplesmente o
recurso por tal acto violar frontalmente as garantias de defesa eo direito a
este como se […] consignou no Acórdão [nº] 320/2000.
N) Deverá assim ser recebido o recurso. […]”
1.2. O Ministério Público respondeu a fls. 390, pugnando pela improcedência da
reclamação.
2. A decisão sumária ora reclamada – que foi objecto de transcrição no item 1.
deste Acórdão – entendeu não dispor o recurso de constitucionalidade pretendido
interpor de condições de admissibilidade. Com efeito, considerou-se nessa
decisão faltar ao recurso, tal qual o recorrente o construiu, a dimensão
normativa que no sistema constitucional português funciona como pressuposto da
intervenção do Tribunal Constitucional [v. artigo 280º, nºs1 e 2 da Constituição
da República Portuguesa (CRP); cfr. artigo 70º, nº1 da LCT ]. Paralelamente a
este fundamento de inadmissibilidade, entendeu-se – e tratou-se, como então se
disse (item 2.2. da decisão), de formular uma mera hipótese argumentativa sem
uma correspondência efectiva no recurso interposto pelo recorrente – que mesmo
que a questão colocada fosse a da desconformidade constitucional do artigo 146º,
nº2 do Código de Processo Civil (CPC), interpretado no sentido de a rejeição do
justo impedimento poder ocorrer sem a produção da prova oferecida por quem o
invoca, mesmo neste caso, disse-se na decisão ora reclamada, o recurso
permaneceria inadmissível por não ter essa interpretação funcionado como ratio
decidendi da decisão recorrida.
2.1. Apreciando os fundamentos da reclamação – e as conclusões desta foram
objecto de transcrição no item 1.1. deste Acórdão – verifica-se que o recorrente
pretende que este Tribunal o «ampare» naquilo que entende ter constituído uma
violação dos seus direitos de defesa. Porém, tal pretensão, que noutros
sistemas de fiscalização legitima o acesso à jurisdição constitucional, não
corresponde ao tipo de controlo exclusivamente normativo previsto na CRP, não
podendo fundar o recurso de constitucionalidade que o recorrente pretende
interpor. O Tribunal Constitucional pode – e tudo isto já foi devidamente
explicitado na decisão sumária – , é certo, apreciar normas em determinada
interpretação, mas isso não se confunde com julgamentos que impliquem, como se
diz noutro passo do estudo já citado na decisão reclamada, “sindicar o puro acto
de julgamento, enquanto ponderação casuística da singularidade própria e
irrepetível do caso concreto, daquilo que representa já uma autónoma valoração
ou subsunção do julgador, exclusivamente imputável á latitude própria da
conformação interna da decisão judicial” ( O objecto idóneo dos recursos de
fiscalização concreta..., cit. p.7). A este propósito, repete-se, o recorrente
caracterizou, no requerimento de interposição do respectivo recurso, a suposta
interpretação normativa em causa, por referência aos seguintes elementos: “[...]
identificando o impedimento como consistente no facto de após as 23h20m desse
último dia e até às 00h25m do dia seguinte, não conseguir enviar tal articulado
por fax, por o aparelho dar sistemático e ininterrupto sinal de linha ocupada
[...]” (transcrição do requerimento de interposição do recurso certificado a
fls. XXX).
É certo que o recorrente pretende agora reduzir tudo à questão da decisão do
incidente de justo impedimento “[...] sem ao menos ouvir a prova e curar de
saber as razões invocadas [...]” (transcrição do trecho final da alínea F) das
conclusões, a fls.367). Porém, mesmo que esta questão, nos termos em que foi
enunciada, configurasse uma interpretação normativa sindicável, sempre
constituiria aspecto não determinante do sentido da decisão, que subsistiria,
com ou sem prova dos factos alegados, assente no entendimento de que esses
mesmos factos, verificados ou não, não integravam causa de justo impedimento.
3. Pelo exposto, indefere-se a presente reclamação.
Custas pelo recorrente ora reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20
(vinte) unidades de conta.
Lisboa, 2 de Novembro de 2005
Rui Manuel Moura Ramos
Maria João Antunes
Artur Maurício