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Processo n.º 439/06
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
I. Relatório
1. O representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional, vem
reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da
Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, da
decisão sumária de 29 de Janeiro de 2007, que decidiu não tomar conhecimento do
recurso interposto ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do
Tribunal Constitucional, por não se acharem preenchidos os pressupostos
necessários a tanto, designadamente por a decisão recorrida não ter assentado,
como ratio decidendi, na recusa de aplicação, pelo tribunal recorrido, de
qualquer norma legal com fundamento em inconstitucionalidade. Tal decisão
sumária teve o seguinte teor:
«1.Notificado do acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 18 de Abril
de 2006, proferido nos autos de recurso de apelação em que é apelante IEP –
Instituto de Estradas de Portugal (actual E.P. – Estradas de Portugal, E.P.E.) e
são apelados A. e esposa, B., veio a magistrada do Ministério Público junto
daquele tribunal interpor o presente recurso de constitucionalidade, ao abrigo
do disposto nos artigos 70.º, n.º 1, alínea a), e 72.º, n.ºs 1, alínea a), e 3,
da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei
do Tribunal Constitucional), dizendo, no que ora interessa, o seguinte:
«[…]
2.º
O douto acórdão recorrido, ao confirmar a sentença de 1ª instância, nos termos
do n.º 5 do art. 713.º do CPC,
3.º
Maxime, na parte em que, para o cálculo da indemnização devida pela
expropriação, se classificaram as parcelas de terreno expropriado como solo apto
para a construção, embora considerando-se assente que, à excepção da sub parcela
n.º 64.4, a fls. 361, as demais se inserem em área da RAN segundo o PDM em vigor
à data da expropriação (al. f), a fls. 361 e facto provado 6.º do douto acórdão
recorrido, a fls. 447 dos autos),
4.º
Recusou, implicitamente, aplicar as normas dos arts. 23.º e 25.º, n.º 3, do
Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18/09,
5.º
Com o fundamento de que, para fixar a justa indemnização em caso de
expropriação, conforme prescreve o art. 62.º, n.º 2, da CRP, em relação aos
terrenos integrados em área de RAN, não desafectados e expropriados para neles
se construírem vias de comunicação, ter-se-ão de classificar esses terrenos como
“solo apto para a construção”, desde que eles reúnam algumas das características
previstas no art. 25.º, n.º 2, do Código das Expropriações de 1999, sob pena de,
se assim se não procedesse, se violar o princípio da igualdade, consignado no
art. 13.º da Constituição porque o art. 26.º, n.º 12, do mesmo Código das
Expropriações permite que a indemnização devida pela expropriação de outros
solos em situação semelhante — os classificados em PDM em vigor como zona verde,
de lazer ou para a instalação de infra‑estruturas ou equipamentos públicos —
seja calculada de acordo com os critérios legais previstos para o “solo apto
para a construção” — cf. 368 e ss.
6.º
Todavia, o Tribunal Constitucional, no douto Acórdão n.º 275/2004, in DR, II,
n.º 134, de 08/06/2004, decidiu:
«julgar inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, consagrado no
artigo 13.° da Constituição, as normas contidas no n.° 1 do artigo 23.° e no n.°
1 do artigo 26.° do Código das Expropriações (1999), quando interpretadas no
sentido de incluir na classificação de “solo apto para a construção” e,
consequentemente, de como tal indemnizar, o solo, integrado na Reserva Agrícola
Nacional, expropriado para implantação de vias de comunicação.»
[…].»
O acórdão recorrido tem a seguinte fundamentação de direito:
«A questão fulcral a decidir no presente recurso é a fixação da indemnização
devida pelo expropriante aos expropriados.
Os Ex.m.ºs Peritos nomeados pelo Tribunal e pelos expropriados, cujo critério de
avaliação veio a merecer acolhimento na sentença recorrida, entenderam que o
valor da parcela expropriada era de € 122.162.07, a que fizeram acrescer,
todavia, a quantia de € 14.586,25, a título de benfeitorias, quantia esta que a
sentença recorrida considerou não ser devida. Esta parte da sentença não vem
impugnada, já que os expropriados não recorreram, pelo que a questão das
benfeitorias está definitivamente decidida e não é objecto do presente recurso.
O que aqui está em causa é saber se a indemnização deve descer para o valor
encontrado pelo Ex.m.º Perito do expropriante, fazendo tábua rasa do relatório
dos Ex.m.ºs Peritos que subscreveram o laudo maioritário e no qual, como se
disse, a sentença recorrida se estribou.
Ora, tendo em conta os factos dados como provados, não restam dúvidas de que a
sentença não merece qualquer reparo.
O apelante defende que a justa indemnização a pagar ao expropriado deve ser
fixada em valor que nada tem a ver com o que foi encontrado por quatro dos cinco
peritos nomeados, onde se incluem aqueles que foram nomeados pelo Tribunal.
Salvo o devido respeito, não acompanhamos o apelante, o qual naturalmente
defende a posição do Perito por si indicado.
A sentença recorrida mostra-se bem fundamentada, em todos os seus aspectos,
tendo seguido, como se disse, o laudo dos Senhores Peritos nomeados pelo
Tribunal.
Ora, tem sido jurisprudência uniforme dos nossos tribunais superiores que a
indemnização por expropriação se deve fundamentalmente basear, em caso de
divergência, nos valores dados nos laudos dos peritos nomeados pelo tribunal,
não só pelas melhores garantias de imparcialidade que oferecem, como pela
existência de competência técnica que o julgador, ao escolhê-los, lhes reconhece
(v., por todos, Ac. desta Relação de 6/06/91, C. J., ano 16.º, 3.º, 252; Ac. da
R. de Lisboa de 12/04/94, C. J., ano 19.º, 2.º, 109; e Ac. da R. de Évora de
11/1/77, C. J., 1977, 1º, 185; e Acs. proferidos nos Recursos n.ºs 221/99 e
895/2000, que tiveram o mesmo relator destes autos).
Assim, sem necessidade de mais longas considerações, a decisão recorrida, bem
como os respectivos fundamentos, face aos factos dados como provados, merecem
total unanimidade por parte deste Tribunal no sentido da sua bondade, pelo que,
nos termos do n.º 5 do art.º 713.º do C. de Proc. Civil, remete-se para os
fundamentos da sentença da 1ª instância.
Improcedem, assim, as conclusões da alegação do apelante, pelo que a douta
sentença recorrida tem de se manter.»
O recurso foi admitido por despacho exarado a fl. 445 dos autos.
Cumpre decidir.
II. Fundamentos
2.O presente recurso foi admitido, mas tal decisão não vincula o Tribunal
Constitucional (artigo 76.º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional), e,
analisados os autos, verifica-se que não se pode tomar conhecimento do recurso,
pelo que é caso de proferir decisão sumária, nos termos do artigo 78º-A, n.º 1,
da Lei do Tribunal Constitucional.
3.Como se sabe, constituem requisitos específicos do recurso interposto ao
abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea a), da Lei do Tribunal Constitucional, que
o Tribunal a quo haja rejeitado, como ratio decidendi da decisão proferida, a
aplicação de uma norma ao caso concreto com fundamento em inconstitucionalidade.
Ora, no caso concreto, não houve recusa de aplicação, pelo tribunal recorrido,
de qualquer norma legal com fundamento em inconstitucionalidade, nem expressa
nem implicitamente.
A decisão do Tribunal Judicial de Castelo de Paiva que era objecto do recurso em
que foi proferido o acórdão ora recorrido, do Tribunal da Relação do Porto (e
para a qual este remeteu), assentou, não em qualquer recusa de aplicação das
normas dos artigos 23.º e 25.º, n.º 3, do Código das Expropriações aprovado pela
Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro (sendo que esta última norma, do artigo 25.º,
n.º 3, define, negativamente, os solos considerados aptos para outros fins que
não a construção) com base num juízo de inconstitucionalidade de tais normas,
mas simplesmente numa subsunção dos factos do caso ao disposto nos artigos 25.º,
n.º 2, alínea a), e 26.º, n.º 12, do mesmo diploma.
Nessa decisão da 1.ª instância considerou-se o seguinte:
«[…]
Assim, não pode deixar de concluir-se que, para efeitos indemnizatórios, é
suficiente para classificar um solo como apto para a construção, ainda que
integrado em zona de R.A.N. e/ou R.E.N., a circunstância de se verificar a
existência de algum dos elementos aludidos nas diversas alíneas do n.º 2 do art.
25.º.
Em suma: a integração dos solos na R.A.N. ou na R.E.N. não impede que sejam
classificados como solos aptos para a construção, desde que se verifiquem os
requisitos de que o Cód. das Expropriações faz depender a inclusão nesta
categoria.
Logo, não obsta à qualificação de um terreno como solo apto para a construção a
circunstância de a parcela expropriada estar inserida em zona de R.A.N. e/ou de
R.E.N., desde que a sua capacidade edificativa resulte quer do facto de estar
dotada das infra‑ estruturas aludidas no art. 25.º, n.º 2, al. a), quer do facto
de se destinar a equipamentos públicos, nos termos do n.º 12 do art. 26.º (cfr.,
entre muitos, os Acs. da RG de 24/09/2003, CJ, XXVIII, 4.º, pág. 274, de
14/04/2004, Apelação nº 530/2004 — 2ª Secção (Relatora : Exma Desembargadora
Rosa Tching), e de 11/10/2004, Proc. n.º 890/04 — 2ª Secção (Relatora: Exma
Desembargadora Rosa Tching), in www.dgsi.pt; da RP de 06/11/2003, n.º
convencional JTRP00035650 (Relator : Exm.º Desembargador Fernando Baptista), in
www.dgsi.pt, de 13/11/2003, Proc. n.º 5210/03 (Relator: Exm.º Desembargador
Fernando Baptista), de 13/01/2005, nº convencional JTRP00037574 (Relator: Exmº
Desembargador Gonçalo Silvano), in www.dgsi.pt, e de 11/04/2005, Proc. n.º
671/05 (Relator: Exm.º Desembargador Pinto Ferreira), e da RC de 16/12/2003, CJ,
XXVIII, 5.º, pág. 36, e de 22/06/2004, CJ, XXIX, 3.º, pág. 30; apesar do
entendimento contrário recentemente preconizado pelo Tribunal Constitucional no
Ac. n.º 275/2004, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 134, de
08/06/2004.»
4.Como resulta do transcrito, não pode afirmar-se que a ratio decidendi da
decisão confirmada pelo aresto ora intentado recorrer tenha estado em qualquer
recusa de aplicação com fundamento em inconstitucionalidade das normas dos
artigos 23.º e 25.º, n.º 3, do Código das Expropriações.
Antes o Tribunal Judicial de Castelo de Paiva equacionou a questão de saber
“quando é que os bens expropriados envolvem uma muito próxima ou efectiva
potencialidade edificativa”, dizendo que “nenhum impedimento existe a que o solo
continue «a ser considerado apto para a construção, ainda que, por lei ou
regulamento, designadamente um plano urbanístico vinculativo, não esteja
destinado a esse fim» (cfr., neste sentido, Perestrelo de Oliveira, op. cit.,
pág. 97, e Alípio Guedes, «Valorização de Bens Expropriados», págs. 81 e 89)”,
daqui resultando “que o terreno em que legalmente não pode construir-se, por
pertencer à R.A.N. ou R.E.N., mas que dispõe de todas as infra‑estruturas para
nele se poder construir ou que se integra em núcleo urbano, passa a ser
equiparado a zonas verdes, de lazer ou para instalação de infra-estruturas e
equipamentos públicos e avaliado pela regra referida no nº 12 do art. 26º (cfr.
os Acs. da RG de 24/09/2003, C.J., XXVIII, 4º, pág. 274, e de 14/04/2004,
Apelação nº 530/2004 — 2 Secção, Relatora Exmª Desembargadora Rosa Tching)”.
Seguidamente, afirmou que “o facto de o referido normativo se referir
directamente a terrenos classificados no plano municipal de ordenamento do
território como zona verde, de lazer ou para instalação de infra-estruturas e
equipamentos públicos – como é o caso dos autos – não impede, antes impõe, que
se faça a sua aplicação extensiva ou analógica a outras situações
substancialmente idênticas, sob pena de violação do princípio da igualdade (cfr.
o Ac. da RC de 22/06/2004, CJ, XXIX, 3º, pág. 30).” E acrescentou: “Do mesmo
modo, basta que o solo a expropriar reúna alguma das características definidas
pelo art. 25.º, n.º 2, para ser classificado como apto para construção, ainda
que integrado em R.A.N. ou R.E.N.. (…). Com efeito, o art. 25º tem de ser
interpretado extensivamente”.
A não aplicação ao caso dos artigos 23.º e 25.º, n.º 3, do Código das
Expropriações, deveu-se, pois, na interpretação que o acórdão recorrido,
confirmativo da sentença do Tribunal Judicial de Castelo de Paiva, fez dos
preceitos dos artigos 25.º, n.º 2, alínea a), e 26.º, n.º 12, do mesmo diploma
(interpretação cuja bondade não cumpre ao Tribunal Constitucional sindicar em si
mesma), apenas à circunstância de se entender que o regime da Reserva Agrícola
Nacional não obsta à qualificação da parcela expropriada como solo apto para
construção. Mas não se detecta na decisão recorrida qualquer recusa de
aplicação, explícita ou implícita, das normas dos artigos 23.º e 25.º, n.º 3, do
Código das Expropriações, com fundamento na sua desconformidade com a
Constituição.
Pelo que não se verifica o pressuposto do recurso previsto no artigo 70.º, n.º
1, alínea a), da Lei do Tribunal Constitucional e não pode tomar-se conhecimento
do recurso de constitucionalidade interposto.»
2. Diz-se na reclamação apresentada:
«1 – Afigura-se, salvo melhor opinião, que – no caso dos autos – o raciocínio
jurídico expressado na decisão recorrida – sendo certo que o acórdão da Relação
acolheu inteiramente a fundamentação da decisão proferida na 1.ª instância,
assimilando-a – implicou a formulação implícita de um juízo de desconformidade
das normas que constituem objecto do recurso com a Lei Fundamental, “maxime” com
o princípio da “justa indemnização”.
2 – Esta nossa conclusão assenta decisivamente em dois segmentos da sentença
proferida no Tribunal Judicial de Castelo de Paiva – a que o acórdão recorrido
aderiu inteiramente, face ao uso do mecanismo processual previsto no artigo
713.º, n.º 5, do Código de Processo Civil:
─ em primeiro lugar, a constatação de que a orientação seguida – desvalorizando
totalmente, na fixação do montante indemnizatório, a existência de restrições
legais ou regulamentares ao “ius aedificandi” – colocava problemas de natureza
constitucional, expressos na referência à adopção de “entendimento contrário
recentemente preconizado pelo Tribunal Constitucional no acórdão n.º 275/04”;
(cfr. fls. 369);
─ em segundo lugar – e decisivamente – a afirmação feita, a fls. 370, de que a
circunstância de se classificar todo o solo das parcelas expropriadas como “solo
para outros fins”, pela razão de a parcela estar inserida em zona classificada
pela P.D.M. de Castelo de Paiva como “Zona Agrícola RAN”, “seria, sem margem
para dúvidas, ofender o princípio da «justa indemnização»”.
3 – Deste modo – e na lógica argumentativa da decisão recorrida – a
interpretação normativa alcançada não assentou exclusivamente na interpretação
do direito infra-constitucional, tendo como elemento ou argumento decisivo a
constatação de que a ponderação das limitações legais ou regulamentares ao “ius
aedificandi” (tendo o terreno, expropriado para implantação de vias de
comunicação, aptidão “naturalística” próxima para a edificação) implicaria uma
solução incompatível com o princípio constitucional da “justa indemnização”.
4 – O que traduzirá, a nosso ver, ainda um juízo de desaplicação implícita, com
base em razões de ordem constitucional, de uma interpretação normativa
“plausível” dos preceitos legais indicados pelo recorrente – pelo que se
considera que os autos deveriam seguir a sua normal tramitação, com a produção
de alegações.»
3. Notificados os recorridos para, querendo, responder à apresentação da
referida reclamação, nada disseram.
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentos
4. Segundo o reclamante, o acórdão recorrido teria ainda formulado
implicitamente um juízo de desconformidade das normas que constituem objecto do
recurso com a Constituição da República Portuguesa, maxime com o princípio da
“justa indemnização”. Diversamente, na decisão reclamada negou-se “que a ratio
decidendi da decisão confirmada pelo aresto ora intentado recorrer tenha estado
em qualquer recusa de aplicação com fundamento em inconstitucionalidade das
normas dos artigos 23.º e 25.º, n.º 3, do Código das Expropriações”.
Vejamos.
Pode ler-se no acórdão recorrido (fls. 448-449 dos autos):
«(…) O DIREITO
A questão fulcral a decidir no presente recurso é a fixação da indemnização
devida pelo expropriante aos expropriados.
Os Ex.m.ºs Peritos nomeados pelo Tribunal e pelos expropriados, cujo critério de
avaliação veio a merecer acolhimento na sentença recorrida, entenderam que o
valor da parcela expropriada era de Euros 122.162.07, a que fizeram acrescer,
todavia, a quantia de Euros 14.586,25, a título de benfeitorias, quantia esta
que a sentença recorrida considerou não ser devida. Esta parte da sentença não
vem impugnada, já que os expropriados não recorreram, pelo que a questão das
benfeitorias está definitivamente decidida e não é objecto do presente recurso.
O que aqui está em causa é saber se a indemnização deve descer para o valor
encontrado pelo Ex.m.º Perito do expropriante, fazendo tábua rasa do relatório
dos Ex.m.ºs Peritos que subscreveram o laudo maioritário e no qual, como se
disse, a sentença recorrida se estribou.
Ora, tendo em conta os factos dados como provados, não restam dúvidas de que a
sentença não merece qualquer reparo.
O apelante defende que a justa indemnização a pagar ao expropriado deve ser
fixada em valor que nada tem a ver com o que foi encontrado por quatro dos cinco
peritos nomeados, onde se incluem aqueles que foram nomeados pelo Tribunal.
Salvo o devido respeito, não acompanhamos o apelante, o qual naturalmente
defende a posição do Perito por si indicado.
A sentença recorrida mostra-se bem fundamentada, em todos os seus aspectos,
tendo seguido, como se disse, o laudo dos Senhores Peritos nomeados pelo
Tribunal.
Ora, tem sido jurisprudência uniforme dos nossos tribunais superiores que a
indemnização por expropriação se deve fundamentalmente basear, em caso de
divergência, nos valores dados nos laudos dos peritos nomeados pelo tribunal,
não só pelas melhores garantias de imparcialidade que oferecem, como pela
existência de competência técnica que o julgador, ao escolhê-los, lhes reconhece
(v., por todos, Ac. desta Relação de 6/06/91, C. J., Ano 16.º, 3.º, p. 252; Ac.
da R. de Lisboa de 12/04/94, C. J., Ano 19.º, 2.º, p. 109; e Ac. da R. de Evora
de 11/1/77, C. J., 1977, 1.º, p. 185; e Acs. proferidos nos Recursos n.°s 221/99
e 895/2000, que tiveram o mesmo relator destes autos).
Assim, sem necessidade de mais longas considerações, a decisão recorrida, bem
como os respectivos fundamentos, face aos factos dados como provados, merecem
total unanimidade por parte deste Tribunal no sentido da sua bondade, pelo que,
nos termos do n.° 5 do art.° 713° do C. de Proc. Civil, remete-se para os
fundamentos da sentença da 1.ª instância.
Improcedem, assim, as conclusões da alegação do apelante, pelo que a douta
sentença recorrida tem de se manter.
DECISÃO
Nos termos expostos, decide-se julgar a apelação improcedente, confirmando-se,
em consequência, a sentença recorrida.
Sem custas, por delas estar isento o apelante.»
Devido a esta remissão, há que consultar a fundamentação da decisão do Tribunal
Judicial de Castelo de Paiva, que o tribunal recorrido fez sua. Pode ler-se
nessa decisão da 1.ª instância:
«(…)
15. Prioritariamente, urge ter presente que, atendendo a que o facto
constitutivo da relação jurídica expropriativa – a declaração de utilidade
pública (cfr. Ac. do S.T.J. de 24/02/94, B.M.J., 434, pág. 409) – teve lugar em
29/07/2002, a lei aplicável à situação vertente é o Código das Expropriações,
aprovado pelo Dec.-Lei n.º 168/99, de 18/09 (sendo certo que o que releva é a
data da publicação da declaração de utilidade pública – cfr., entre muitos, Ac.
da RP de 30/11/2004, relatado pelo Sr. Desembargador Henrique Araújo,
www.dsgi.pt; e Ac. da RL de 2 1/05/2002, in CJ, ano XXVII, Tomo III, pág. 75).
Com efeito, são as normas desse Diploma legal que se deverão ter em conta para a
aferição da justa indemnização no caso vertente.
Em seguida, cumpre expor algumas sumárias considerações a respeito das
indemnizações a arbitrar.
De acordo com o preceituado no art. 62°. n.° 2, da Constituição da República
Portuguesa, no processo expropriativo importa fixar a justa indemnização a
atribuir ao proprietário da parcela expropriada, com observância dos critérios
estabelecidos no Código das Expropriações.
Como é sabido, o art. 23° do Decreto Lei n.º 168/99, de 18/09 (são deste Diploma
os demais preceitos a citar sem menção expressa de proveniência), repetindo o
apontado comando constitucional, estabelece um critério geral para a
determinação da justa indemnização garantida nos casos de expropriação por
utilidade pública.
Segundo o referido normativo, a indemnização será fixada com base no valor dos
bens expropriados, visando-se, desse modo, compensar, não o beneficio alcançado
pelo expropriante, mas sim ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da
expropriação.
Deste modo, o dano do expropriado só é ressarcido de forma integral e justa se a
indemnização corresponder ao valor comum do bem expropriado.
Por outras palavras: apesar de a lei não ser hoje expressa (na medida em que se
refere apenas ao valor do bem expropriado), o prejuízo do expropriado mede-se
pelo valor real e corrente dos bens expropriados, isto é, pelo seu valor de
mercado ou valor de compra e venda e não pelas despesas a suportar para se obter
a substituição da coisa expropriada por outra equivalente (cfr., a este
propósito, Alves Correia, in As Garantias do Particular na Expropriação por
Utilidade Pública, pág. 129; Osvaldo Gomes, in Expropriações por Utilidade
Pública, pág. 154; e, entre outros, os Acs. da RP, de 14/02/89, in CJ, XIV, 1°,
pág. 191, e de 08/01/91, in BMJ., 403, pág. 484; Acs. da RL, de 03/10/93, in
BMJ, 410, pág. 866, e da RE, de 12/05/94, in CJ, XIX, 3.°, pág. 269; e Pedro
Elias da Costa, in Guia das Expropriações por Utilidade Pública, 2.ª ed.
revista, actualizada e aumentada, Almedina, 2003, pág. 257).
Logo, vale aqui o princípio da indemnização total ou integral (full
composition), devendo os danos patrimoniais suportados pelos expropriados ser
ressarcidos de forma integral e justa, para que a indemnização represente uma
adequada restauração da lesão por eles sofrida (cfr., Osvaldo Gomes, op. cit.,
pág. 147; Acs. n.° 39/88, de 9/2/88, in “O Direito”, 1989, IV, pág. 791, e n.°
316/92, de 6/10/92, in D.R., II Série, de 18/02/93; Acs. n.°s 381/89, 52/90 e
363/91, publicados no D.R., II Série, de 08/09/89, 1 Série, de 03/03/90 e II
Série, de 18/09/92).
16. Mas, para além deste critério geral, nos arts. 25.° e seguintes consignam-se
determinações especiais para avaliação dos terrenos, consoante, em primeira
linha, o solo seja apto para construção ou para outros fins.
Convém, numa primeira abordagem, referir que estes critérios são meramente
«instrumentais ou referenciais» (cfr., neste sentido, J. A. Santos, in Código
das Expropriações, 3.ª ed., Dislivro, pág. 339), ou seja, «apenas são válidos
enquanto atinjam ou sirvam para atingir uma justa indemnização, isto é, o valor
real e corrente dos bens a expropriar» (Ac. da RC, de 17/02/87, in CJ, XII, 10,
pág. 59).
Assim, a classificação dos terrenos numa destas duas categorias constitui uma
operação prévia relativamente à respectiva avaliação.
Dispõe o n.° 2 do art. 25°:
«Considera-se solo apto para construção:
a) O que dispõe de acesso rodoviário e de rede de abastecimento de água, de
energia eléctrica e de saneamento, com características adequadas para servir as
edificações neles existentes ou a construir;
b) O que apenas dispõe de parte das infraestruturas referidas na alínea
anterior, mas se integra em núcleo urbano existente;
c) O que esteja destinado, de acordo com instrumento de gestão territorial, a
adquirir as características descritas na alínea a);
d) O que, não estando abrangido pelo disposto nas alíneas anteriores, possui,
todavia, alvará de loteamento ou licença de construção em vigor no momento da
declaração de utilidade pública, desde que o processo respectivo se tenha
iniciado antes da declaração a que se refere n.° 5 do artigo 10.º».
Por seu turno, o n.º 3 do referido normativo determina que «considera-se solo
apto para outros fins o que não se encontra em qualquer das situações previstas
no número anterior».
Ou seja: «a delimitação dos solos não aptos para construção ou para outros fins
é feita por exclusão», pelo que, «antes de mais, deve apurar-se se a situação do
terreno em causa integra a previsão» das alíneas do n.º 2 do art. 25.º. «Em caso
negativo, tratar-se-á de solo apto para outros fins».
Por fim, refira-se com interesse que entre os instrumentos de gestão territorial
a que este preceito faz alusão «contam-se os planos de ordenamento do
território», como é o caso dos planos municipais de ordenamento do território,
dos planos directores municipais e dos planos gerais de urbanização (cfr.
Osvaldo Gomes, op. cit., pág. 200, e Perestrelo de Oliveira, in Código das
Expropriações, Anotado, págs. 90 e 91).
17. Em face destas regras, como classificar as parcelas n.° 64.1, 64.2, 64.3 e
64.4 em exame nos autos?
Como entenderam maioritariamente os Srs. Peritos e defenderam os Expropriados no
seu requerimento de interposição de recurso, todas as sub-parcelas deverão de
ser classificadas como solo apto para construção.
Liminarmente, dir-se-á que estamos em inteira concordância com a classificação
feita pelos aludidos peritos, quando entendem que tais parcelas devem ser
classificadas como solo apto para construção.
E isto, desde logo, porque a parcela n.ºs 64.1 dispõe de arruamento pavimentado
em calçada à fiada, na largura de 4 metros, de rede de abastecimento de energia
eléctrica, em baixa tensão, de rede pública de abastecimento de água e de rede
telefónica (cfr. Ponto 13., al. c)).
Também a sub-parcela n.º 64.2 apesar de não ter a servi-la qualquer arruamento
público, nem qualquer infra-estrutura, confronta com uma parte sobrante de 5.000
m2, de onde foi destacada, cumprindo aqui aderir à tese defendida pelos
Expropriados no seu Requerimento de Recurso.
Outra posição sempre constituiria um prejuízo injustificado dos Expropriados,
apenas resultante de novos estados exclusivamente resultantes da expropriação.
Por outro lado, também as duas restantes parcelas dispõem de infra‑estruturas a
que se reporta a al. a) do n.° 2 do citado art. 25°.
Perante estes factos, dúvidas não podem subsistir quanto à classificação das
parcelas expropriadas como solo apto para a construção, dado que é inequívoca a
sua integração na previsão do art. 25.º, n° 2, al. a).
Para esta conclusão deverá considerar-se, ainda, que, para que um solo possa ser
classificado como apto para construção, não é necessário que coexistam todas as
infra‑estruturas a que se reporta o mencionado normativo.
O art. 25.º, n.º 2, al. a), do actual Cód. das Expropriações reproduz
textualmente a redacção do art. 24.°, n.° 2, al. a), do Cód. das Expropriações
de 1991.
E a respeito da classificação prevista nessa al. a) do n.° 2 do art. 24.º do
Cód. das Expropriações de 1991, escrevia Osvaldo Gomes (op. cit., pág. 187) que
«a classificação do solo como apto para a construção não depende da existência
de todas as infra-estruturas» aí referidas, na medida em que não se trata «de
uma enumeração cumulativa».
Basta, pois, que o terreno «disponha apenas de acesso rodoviário, sem pavimento
em calçada, betuminoso ou equivalente», para que o solo seja classificado como
apto para a construção. A existência das demais infra‑estruturas «releva para
efeitos do cálculo do valor do solo apto para construção, mas não para a sua
qualificação» (cfr., no mesmo sentido, já no domínio do actual Cód. das
Expropriações, o Ac. da RC de 22/06/2004, CJ, XXIX, 3.°, pág. 30).
18. E como compatibilizar esta classificação com o regime previsto no Plano
Director Municipal de Castelo de Paiva?
Ora, segundo tal PDM, as parcelas n.°s 64.1, 64.2 e 64.3 encontram-se inseridas
em Espaço Agrícola RAN, sendo que a parcela n.° 64.4 se encontra inserida em
Espaço Urbano.
Donde há que ter em conta o disposto nos artigos 6.°, 7.° e seguintes e 33.º e
seguintes, sendo aplicável o Regime em vigor da Reserva Agrícola Nacional – cfr.
art. 34.º do PDM de Castelo de Paiva.
Sempre se dirá, entretanto, que, ao contrário do que sustenta a Expropriante na
sua resposta ao recurso interposto pelos Expropriados, a circunstância de as
parcelas expropriadas 64.1 a 64.3 se inserirem em zona classificada pelo P.D.M.
de Castelo de Paiva como «Espaço Agrícola», jamais seria susceptível de
determinar, por si só e desde logo, que o terreno tivesse de ser classificado
como solo para outros fins.
Basta ter em conta o entendimento majoritário sufragado pelos nossos Tribunais
Superiores a respeito das parcelas expropriadas inseridas em zonas de Reserva
Agrícola Nacional (R.A.N.) e/ou de Reserva Ecológica Nacional (R.E.N.).
Efectivamente, a jurisprudência maioritária dos nossos Tribunais Superiores tem
entendido que a circunstância de a parcela expropriada estar inserida em zona de
R.A.N. e/ou de R.E.N. não obsta à sua qualificação como «solo apto para a
construção», desde que a capacidade edificativa resulte de se encontrarem
dotadas das infra-estruturas aludidas no art. 25.º, n.º 2, al. a), ou de se
destinarem a equipamentos públicos, nos termos do n.° 12 do art. 26.°.
Vejamos.
A Constituição da República Portuguesa não tutela expressamente o direito a
edificar como um direito que se inclua, necessária e naturalmente, no direito de
propriedade (cfr. Alves Correia, O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade,
págs. 372 a 383).
Todavia, a jurisprudência do Tribunal Constitucional não deixou de se firmar,
uniformemente, no sentido de que o jus aedficandi deve ser considerado como
factor de valorização, ao menos naquelas situações em que os respectivos bens
envolvam uma muito próxima ou efectiva potencialidade edificativa (cfr., entre
muitos, os Acs. do Trib. Constitucional n.º 194/94, in D.R. II Série, de
27/01/99, n.º 20/2000, in D.R. II Série, de 28/04/2000, n.° 172/02, in D.R. II
Série, de 03/06/2002, e n.º 12/02, in D.R. II Série, de 12/12/02).
De todo o modo, a questão de saber quando é que os bens expropriados envolvem
uma muito próxima ou efectiva potencialidade edificativa é que se tornou uma
tarefa mais árdua.
19. Na vigência do Cód. das Expropriações de 1991, o art. 24.°, n.° 5,
determinava que, «para efeitos da aplicação do presente Código é equiparado a
solo para outros fins o solo que, por lei ou regulamento, não possa ser
utilizado na construção».
Simplesmente, com a entrada em vigor do actual Cód. das Expropriações, esta
norma foi suprimida, pelo que, não contendo este novo Código norma equivalente,
nenhum impedimento existe a que o solo continue «a ser considerado apto para a
construção, ainda que, por lei ou regulamento, designadamente um plano
urbanístico vinculativo, não esteja destinado a esse fim» cfr., neste sentido,
Perestrelo de Oliveira, op. cit., pág. 97, e Alípio Guedes, Valorização de Bens
Expropriados, págs. 81 e 89).
Daqui resulta, por conseguinte, que o terreno em que legalmente não pode
construir-se, por pertencer à R.A.N. ou R.E.N., mas que dispõe de todas as
infra‑estruturas para nele se poder construir ou que se integra em núcleo
urbano, passa a ser equiparado a zonas verdes, de lazer ou para instalação de
infra-estruturas e equipamentos públicos e avaliado pela regra referida no n.°
12 do art. 26.° (cfr. os Acs. da RG de 24/09/2003, CJ, XXVIII, 4°, pág. 274, e
de 14/04/2004, Apelação n.º 530/2004 – 2.ª Secção, Relatora: Exm.ª
Desembargadora Rosa Tching).
Na verdade, o facto de o referido normativo se referir directamente a terrenos
classificados no plano municipal de ordenamento do território como zona verde,
de lazer ou para instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos – como é
o caso dos autos – não impede, antes impõe, que se faça a sua aplicação
extensiva ou analógica a outras situações substancialmente idênticas, sob pena
de violação do princípio da igualdade (cfr. o Ac. da RC de 22/06/2004, CJ, XXIX,
3.°, pág. 30).
Do mesmo modo, basta que o solo a expropriar reúna alguma das características
definidas pelo art. 25.º, n.º 2, para ser classificado como apto para
construção, ainda que integrado em R.A.N. ou R.E.N..
Com efeito, o art. 25.º tem de ser interpretado extensivamente.
O Cód. das Expropriações de 1999 não contém preâmbulo, pelo que não nos fornece
quaisquer elementos sobre as razões que presidiram à elaboração do mesmo.
Apesar disso, razões de ordem histórica dão-nos a conhecer que as alterações
introduzidas pelo referido Diploma surgiram quando existiam divergências – quer
na doutrina, quer na jurisprudência – no tocante à valorização dos solos, nos
termos a que se reportava o n.° 5 do art. 24.° do Cód. das Expropriações de
1991.
Por isso, o legislador eliminou essa norma e, na nova redacção, evitou qualquer
referência a proibições ou restrições resultantes da lei, julgando suficiente
para a classificação dos solos aptos para a construção a verificação de algum
dos elementos enumerados no art. 25.°, n.° 2 – ainda que integrados na R.A.N.
e/ou na R.E.N. –, o que se alcança através de uma interpretação extensiva a dar
ao indicado preceito.
A idêntica conclusão nos conduz o elemento teleológico, se tivermos em conta que
o legislador de 1999 pretendeu pôr cobro à já referenciada divergência.
Assim, não pode deixar de concluir-se que, para efeitos indemnizatórios, é
suficiente para classificar um solo como apto para a construção, ainda que
integrado em zona de R.A.N. e/ou R.E.N., a circunstância de se verificar a
existência de algum dos elementos aludidos nas diversas alíneas do n.° 2 do art.
25.°.
Em suma: a integração dos solos na R.A.N. ou na R.E.N. não impede que sejam
classificados como solos aptos para a construção, desde que se verifiquem os
requisitos de que o Cód. das Expropriações faz depender a inclusão nesta
categoria.
Logo, não obsta à qualificação de um terreno como solo apto para a construção a
circunstância de a parcela expropriada estar inserida em zona de R.A.N. e/ou de
R.E.N., desde que a sua capacidade edificativa resulte quer do facto de estar
dotada das infra-estruturas aludidas no art. 25.°, n.° 2, al. a), quer do facto
de se destinar a equipamentos públicos, nos termos do n.º 12 do art. 26.° (cfr.,
entre muitos, os Acs. da RG de 24/09/2003, CJ, XXVIII, 4.°, pág. 274, de
14/04/2004, Apelação n.° 530/2004 – 2.ª Secção (Relatora: Exm.ª Desembargadora
Rosa Tching ), e de 11/10/2004, Proc. n.° 890/04 – 2.ª Secção (Relatora: Exm.ª
Desembargadora Rosa Tching), in www.dgsi.pt, da RP de 06/11/2003, n.°
convencional JTRP00035650 (Relator: Exm.° Desembargador Fernando Baptista), in
www.dgsi.pt, de 13/11/2003, Proc. n.° 5210/03 (Relator: Exm.° Desembargador
Fernando Baptista), de 13/01/2005, n.° convencional JTRP00037574 (Relator: Exm.°
Desembargador Gonçalo Silvano), in www.dgsi.pt, e de 11/04/2005, Proc. n.°
671/05 (Relator : Exm° Desembargador Pinto Ferreira), e da RC de 16/12/2003, CJ,
XXVIII, 5.º, pág. 36, e de 22/06/2004, CJ, XXIX, 3.º, pág. 30; apesar do
entendimento contrário recentemente preconizado pelo Tribunal Constitucional no
Ac. n.° 275/2004, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.° 134, de
08/06/2004).
20. Tendo presentes as considerações jurídicas acabadas de enunciar,
debrucemo‑nos sobre a análise da situação vertente.
Desde logo, dir-se-á que todas as parcelas confinam com caminho público, são
dotadas de rede de energia eléctrica de baixa tensão, de abastecimento de água e
de saneamento, dando-se aqui por reproduzido o entendimento já defendido supra
quanto à parcela n.° 64.2.
Assim, não pode deixar de concluir-se pela existência de capacidade edificativa,
nos termos do art. 25.°, n.° 2, al. a).
Por último, não deixará de acrescentar-se que a parcela expropriada estava
destinada a uma infra-estrutura pública (estrada).
Deste modo, quer em função das infra-estruturas de que dispõe, quer em função do
destino que lhe foi dado — implantação de uma estrada —, é incontroverso que a
parcela expropriada dispõe de aptidão edificativa.
Bem andaram, pois, os Srs. Peritos quando, maioritariamente, classificaram e
valorizaram a área de 674 m2 relativa à parcela n.º 64.1, a área de 1.442 m2
relativa à parcela n.° 64.2, a área de 2.222 m2 relativa à parcela n.° 64.3 e a
área de 39 m2 relativa à parcela n.° 64.4 como solo com aptidão para a
construção.
Perante estes factores e circunstâncias, classificar todo o solo das parcelas
expropriadas n.°s 64.1, 64.2 e 64.3 – como sustentou a Expropriante, na sua
resposta ao recurso interposto pelos Expropriados – como «solo para outros
fins», pela simples razão de a parcela estar inserida em zona classificada pelo
P.D.M. de Castelo de Paiva como «Zona Agrícola RAN» seria, sem margem para
dúvidas, ofender o princípio da «justa indemnização».
Em síntese: a área de todas as parcelas expropriadas tem de ser classificada
como solo apto para a construção.
21. Classificados os terrenos, determinemos, agora, as normas que devem presidir
à sua avaliação.
A expropriação por utilidade pública, já o referimos, passa pelo pagamento de
uma justa indemnização aos expropriados: assim o impõe a lei ordinária (art.
1310.º do Cód. Civil e arts. 1.º e 22.º do Cód. das Expropriações ) e o garante
a Constituição da República Portuguesa (art. 62.º, n.º 2).
Absteve-se a Constituição de fixar um critério de indemnização, mas, impondo que
esta seja justa, obriga a que os critérios da lei ordinária respeitem os
princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade.
Não podem, por isso, os critérios da lei ordinária conduzir a indemnizações
irrisíveis ou manifestamente desproporcionadas à perda do bem expropriado (cfr.
Gomes Canotilho/Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa anotada,
2.ª ed., vol. 1, pág. 331).
A indemnização há-de corresponder, pois, à perda que o património do expropriado
sofre com a transferência da coisa expropriada para o património do
expropriante, exigindo-se o respeito pelo princípio da equivalência de valores
(cfr. Ac. da RP, de 06/06/91, in CJ, XVI, 30, pág. 252).
Em síntese: para ser justa, a indemnização deve ressarcir integralmente o
prejuízo sofrido pelo expropriado; deve decorrer de uma valoração objectiva do
bem expropriado; deve excluir factores de pura especulação ou considerações de
ordem subjectiva, afectiva ou sentimental e deve medir-se pelo valor corrente,
de mercado, do bem expropriado, isto é, pelo preço que um comprador medianamente
prudente e avisado estaria disposto a pagar, em condições normais de mercado,
pela sua aquisição (cfr., entre outros, os Acs. da RC, de 21/05/91, in CJ, XVI,
3.°, pág. 73, e da RL, de 12/04/94, in CJ, XIX, 2.°, pág. 109).
22. Expostos os precedentes princípios jurídicos, abalancemo-nos na análise da
situação vertente.
Procedamos, então, à avaliação do solo apto para construção.
Esse solo, in casu, tem uma área total de 4.377 m2, assim divididos: a parcela
n.º 64.1 tem uma área de 674 m2; a parcela n.° 64.2 tem uma área de 1.442 m2; a
parcela n.° 64.3 tem uma área 2.222 m2; e a parcela n.° 64.4 tem uma área de 39
m2.
Ora, sendo as parcelas resultantes de um mesmo prédio, a avaliação a levar a
cabo deverá ser feita de uma forma global.
Como é sabido, o art. 25.º fixa o critério especial para a avaliação dos solos
aptos para construção, mandando atender ao aproveitamento economicamente normal
à data da declaração de utilidade pública.
E, como se constata dos laudos periciais, foi esse o critério seguido, de forma
unânime, pelos peritos nomeados pelo Tribunal, e pelo perito indicado pelos
Expropriados.
Note-se, antes de mais, que, como tem sido entendimento largamente dominante na
jurisprudência, uma vez que a sentença judicial há-de basear-se,
necessariamente, em factores de natureza eminentemente técnica, é
particularmente relevante e atendível o parecer dos peritos, nos quais se
incluem, na situação vertente, os 3 peritos designados directamente pelo
Tribunal.
Convém também esclarecer que, existindo disparidades de laudos, dar-se-á
preferência e concede-se mais credibilidade ao dos peritos escolhidos pelo
Tribunal, quer pela competência técnica que lhes é reconhecida, quer pelas
maiores garantias de isenção, independência e imparcialidade que estes oferecem
(cfr., entre muitos, os Acs. da RE de 16/03/89, BMJ, 385, pág. 628, e de
25/06/92, CJ, XVII, 3.º, pág. 343; da RP de 27/05/80, CJ, V, 30, pág. 82, de
03/07/90, BMJ, 399, pág. 578, e de 13/02/97, CJ, XXII, 1, pág. 235, de
06/11/2003, n.° convencional JTRP00035650, Relator : Exm.° Desembargador
Fernando Baptista, in www.dgsi.pt; da RC de 21/05/91, CJ, XVI, 3.º, pág 74; da
RL de 23/05/95, CJ, XX, 2.°, pág. 88, e da RG de 24/09/2003, CJ, XXVIII, 4°,
pág. 274).
23. Ora, de acordo com o n.° 1 do art. 26.°, «o valor do solo apto para a
construção calcula-se por referência à construção que nele seria possível
efectuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento
económico normal, de acordo com as leis e os regulamentos em vigor, nos termos
dos números seguintes e sem prejuízo do disposto no n.° 5 do art. 23.°».
Por outro lado, «o valor do solo apto para construção será resultante da média
aritmética actualizada entre os preços unitários de aquisições, ou avaliações
fiscais que corrijam os valores declarados, efectuadas na mesma freguesia e nas
freguesias limítrofes nos três anos, de entre os últimos cinco, com média anual
mais elevada, relativamente a prédios com idênticas características, atendendo
aos parâmetros fixados em instrumento de planeamento territorial, corrigido por
ponderação da envolvente urbana do bem expropriado, nomeadamente, no que diz
respeito ao tipo de construção existente, numa percentagem máxima de 10%»,
devendo, para esse efeito, os serviços competentes do Ministério das Finanças
fornecer, a solicitação da entidade expropriante, a lista de transacções e das
avaliações fiscais que corrijam os valores declarados efectuadas na zona e os
respectivos valores.
Trata-se de um critério de cariz comparativo e fiscal, o qual tem carácter
prioritário (cfr. Pedro Elias da Costa, op. cit., pág. 293)
No caso sub judice, revelou-se impossível a aplicação do aludido critério, por
falta de elementos, o que impõe o recurso ao critério supletivo prescrito e
enunciado nos n.°s 4 e seguintes do citado artigo 26.°.
24. Imposta a aplicação do critério supletivo enunciado nos n.°s 4 e seguintes
do artigo 26.°, o valor do solo apto para construção consistirá numa fracção do
custo de construção que nele seria possível efectuar à data da publicação da
D.U.P., em condições normais de mercado, de acordo com as leis e regulamentos em
vigor.
25. Adiantamos, desde já, que se considera como correcto o índice de construção
de 0,40 m2 / m2, adoptado pelo laudo pericial maioritário.
Neste domínio, torna-se necessário considerar, pois, não só a situação espacial
do imóvel, mas sobretudo o espaço existencial em que se integra e para o qual
relevam as infra-estruturas existentes.
Daí que seja indubitável que as parcelas em apreço se encontram bem situadas,
pelo que também nós consideramos tal índice como urbanisticamente aconselhável e
adequado para o local em que se inserem as parcelas expropriadas.
Como se escreveu no Ac. da RP de 20/11/97 (in CJ, XXII, 5.°, pág. 199), esta é
uma «questão predominantemente técnica» e para a sua avaliação pelo Tribunal não
existem outros elementos senão os pareceres dos peritos.
Perante este quadro, e tendo em conta a já aludida credibilidade dos peritos,
não vemos razão para não aceitar a sua opinião.
26. De igual modo, relativamente à aplicação das percentagens estabelecidas nos
n.°s 6 e 7 do art. 26.°, mostram-se as mesmas perfeitamente ajustadas à concreta
situação.
Vejamos.
Segundo o citado art. 26.°, n.° 6, «num aproveitamento economicamente normal, o
valor do solo apto para a construção deverá corresponder a um máximo de 15% do
custo da construção, devidamente fundamentado, variando, nomeadamente, em função
da localização, da qualidade ambiental e dos equipamentos existentes na zona ».
Na situação em apreço, os peritos fixaram o valor do solo apto para a construção
em 10% do custo da construção.
Percentagem que consideramos correcta e plenamente justificada.
Na verdade, considerando a matéria fáctica inventariada em 14., a fixação do
valor do solo apto para a construção em 10% do custo para a construção não é
merecedora de qualquer reparo, traduzindo a realidade local e ambiental da
parcela.
Com efeito, o referido art. 26.°, n.° 6, determina que na fixação do valor do
solo apto para a construção deve ter-se em conta a valoração que se faça da
localização e da qualidade ambiental do bem expropriado, mandando atender,
também, aos equipamentos existentes na zona.
Deste modo, como a percentagem do valor do solo apto para a construção tem a ver
não só com a localização da parcela, mas também com a qualidade ambiental,
importa reter que esta «depende, além do mais, da consideração do espaço urbano,
dos sistemas de infra-estruturas, dos transportes públicos e da proximidade de
equipamentos» (cfr. os Acs. da RP de 13/01/97, CJ, XXII, 1.°, pág. 233, e de
10/04/97, CJ, XXII, 2., pág. 212).
Ora, a este respeito urge ponderar que as parcelas expropriadas ficam situadas
na freguesia do Monte do Alvo, na encosta Sul do Rio Douro, a cerca de meia
distância entre Entre-os-Rios e Castelo de Paiva, encontrando-se dentro da bacia
visual do Douro, detêm confrontações várias com caminhos públicos e possuem
ligações à rede eléctrica, em baixa tensão, à rede telefónica e de abastecimento
de água.
Por outro lado, as parcelas expropriadas apresentam-se como terrenos onde se
encontram vinhas e árvores de grande e médio porte.
Paralelamente, do ponto de vista orográfico, as parcelas expropriadas
desenvolvem‑se em zona de socalcos, sendo que uma parte do prédio foi objecto de
uma operação de loteamento urbano, com realização de infra‑estruturas.
Logo, conjugando tudo quanto se expôs, pode concluir-se que dispõem de uma boa
localização geográfica e qualidade ambiental.
Por isso, ponderando os factos apurados e tendo presentes os factores constantes
do art. 26.°, n.° 6, acolhe-se a fixação, pelo laudo pericial tirado por
unanimidade, do valor do solo apto para construção em 10% do custo da
construção, fazendo-o, assim, necessariamente coincidir com o valor de mercado.
27. De acordo com o estatuído no art. 26.°, n.° 7, «a percentagem fixada nos
termos do número anterior poderá ser acrescida até ao limite de cada uma das
percentagens» estabelecidas nas als. a) a i) desse normativo, «e com a variação
que se mostrar justificada».
Dentre as percentagens previstas nas aludidas alíneas destacam-se
─ «acesso rodoviário, com pavimentação em calçada, betuminoso ou equivalente,
junto da parcela— 1,5%» (al. a));
─ «rede de abastecimento domiciliária de água, com serviço junto da parcela –
1%» (al. c));
─ «rede de distribuição de energia eléctrica em baixa tensão, com serviço junto
da parcela – 1%» (al. e)); e
─ «rede telefónica junto da parcela – 1%» (al. i)).
No caso vertente, os peritos nomeados pelo Tribunal e indicado pelos
Expropriados fizeram acrescer à percentagem de 10% – fixada, nos termos do n.° 6
do art. 26.°, para o valor do solo apto para a construção –, as percentagens
parciais de 1,5%, correspondente ao acesso rodoviário, com pavimentação a
betuminoso, com que confina com as parcelas expropriadas (al. a) do n.° 7 do
art. 26.°),de 1%, relativa à rede de abastecimento de água (al. c) do n.° 7 do
art. 26.°), de 1%, atinente à rede de distribuição de energia eléctrica em baixa
tensão (al. e) do n.° 7 do art. 26°) e de 1%, respeitante à rede telefónica (al.
i) do n.° 7 do art. 26.°).
Tendo em conta a factualidade discriminada em 14., é inquestionável a
razoabilidade da fixação de todas essas percentagens.
28. Quanto ao custo de construção por metro quadrado, utilizado para calcular o
preço global da construção, nenhum reparo nos merece o preço de € 481,23,00/ m2
indicado, unanimemente, por todos os peritos por referência à Portaria n.°
1261-C/2001.
Assim, como se escreveu no já citado Ac. da RP de 13/01/97, não havendo no
processo quaisquer elementos de facto que nos permitam duvidar da isenção e
imparcialidade dos peritos nomeados pelo Tribunal, não se vêem motivos para nos
afastarmos do respectivo laudo, nem, como tal, para censurarmos o preço com que
aí se jogou.
Nestes termos, pode concluir-se que, em função dos factores e critérios
precedentemente aludidos, bem andaram os peritos que elaboraram o laudo pericial
majoritário – e no qual se incluem os peritos escolhidos pelo Tribunal –, ao
considerarem o valor médio de € 481,23 por m2 de terreno para a área
expropriada, por ser aquele que – num aproveitamento económico normal, tal como
se prevê no art. 26.º, n.º 1, atenta a concreta apetência construtiva e os
encargos a suportar pelos Expropriados – não pode deixar de lhe corresponder, em
termos de valor de compra e venda, já que em tudo equivale ao valor real e
corrente da parcela expropriada.
Temos, pois, como acertado, fixar em € 481,23,00 o custo unitário do m2 de
construção.
29. Em suma: perante o explanado, dúvidas não podem subsistir de que se
apresenta como justa e adequada, para ressarcir os prejuízos que advêm para os
Expropriados da presente expropriação, a quantia proposta no laudo pericial
majoritário a título de indemnização pela mencionada área de 4.377 m2 – €
122.162,07.
*
30. Aqui chegados, importa averiguar, agora, se deve ou não haver lugar à
dedução ao referido valor da indemnização do diferencial de contribuição
autárquica prevista no art. 23.°, n.° 4.
(…)»
5. Resulta desta transcrição que a decisão do Tribunal Judicial de Castelo de
Paiva não procedeu a qualquer recusa expressa, ou explícita, de aplicação das
normas dos artigos 23.º e 25.º, n.º 3, do Código das Expropriações aprovado pela
Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro. Tal recusa de aplicação só poderia, pois, ter
sido implícita, sendo justamente essa a tese do reclamante, para o qual existiu
a “formulação implícita de um juízo de desconformidade das normas que constituem
objecto do recurso com a Lei Fundamental”, e em especial com o princípio da
“justa indemnização”.
O primeiro dos segmentos da decisão da 1.ª instância indicados pelo reclamante
não depõe, porém, nesse sentido. O que nele se pode ler é que “não obsta à
qualificação de um terreno como solo apto para a construção a circunstância de a
parcela expropriada estar inserida em zona de R.A.N. e/ou de R.E.N., desde que a
sua capacidade edificativa resulte quer do facto de estar dotada das
infra-estruturas aludidas no art. 25.°, n.° 2, al. a), quer do facto de se
destinar a equipamentos públicos, nos termos do n.º 12 do art. 26.°”, e isto,
“apesar do entendimento contrário recentemente preconizado pelo Tribunal
Constitucional no Ac. n.° 275/2004, publicado no Diário da República, 2.ª Série,
n.° 134, de 08/06/2004 )”. O que se poderia inferir daqui seria, obviamente,
quando muito, uma discordância em relação ao juízo de inconstitucionalidade
constante deste Acórdão n.º 275/2004, mas não qualquer formulação implícita de
um juízo de inconstitucionalidade, ou qualquer recusa implícita de aplicação de
uma norma com fundamento na sua inconstitucionalidade.
E também não é decisiva a afirmação feita a fls. 370 (final do n.º 20 da decisão
da 1.ª instância), no sentido de “classificar todo o solo das parcelas
expropriadas n.°s 64.1, 64.2 e 64.3 – como sustentou a Expropriante, na sua
resposta ao recurso interposto pelos Expropriados — como «solo para outros
fins», pela simples razão de a parcela estar inserida em zona classificada pelo
P.D.M. de Castelo de Paiva como «Zona Agrícola RAN» seria, sem margem para
dúvidas, ofender o princípio da «justa indemnização”. Desde logo, tal afirmação
não se reporta directamente a qualquer norma ou critério normativo, mas antes a
“classificar todo o solo das parcelas expropriadas n.°s 64.1, 64.2 e 64.3 (…)
como «solo para outros fins»”, bem podendo a classificação das parcelas em causa
depender, por exemplo, de outras circunstâncias.
E, decisivamente, entende-se que o Tribunal Judicial de Castelo de Paiva não
assentou decisivamente a sua conclusão numa recusa de aplicação daquelas normas
por motivos de inconstitucionalidade – isto é, que tal recusa de aplicação,
mesmo a ter existido, não foi ratio decidendi.
Como se afirmou na decisão reclamada, a 1.ª instância equacionou o problema logo
no plano infra‑constitucional, questionando “quando é que os bens expropriados
envolvem uma muito próxima ou efectiva potencialidade edificativa”, dizendo que
“nenhum impedimento existe a que o solo continue «a ser considerado apto para a
construção», ainda que, por lei ou regulamento, designadamente um plano
urbanístico vinculativo, não esteja destinado a esse fim”, daqui resultando “que
o terreno em que legalmente não pode construir-se, por pertencer à R.A.N. ou
R.E.N., mas que dispõe de todas as infra‑estruturas para nele se poder construir
ou que se integra em núcleo urbano, passa a ser equiparado a zonas verdes, de
lazer ou para instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos e avaliado
pela regra referida no n.º 12 do art. 26.º” (itálico aditado). E depois afirmou
que “o facto de o referido normativo se referir directamente a terrenos
classificados no plano municipal de ordenamento do território como zona verde,
de lazer ou para instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos – como é
o caso dos autos – não impede, antes impõe, que se faça a sua aplicação
extensiva ou analógica a outras situações substancialmente idênticas, sob pena
de violação do princípio da igualdade”, acrescentando: “Do mesmo modo, basta que
o solo a expropriar reúna alguma das características definidas pelo art. 25.º,
n.º 2, para ser classificado como apto para construção, ainda que integrado em
R.A.N. ou R.E.N.. (…). Com efeito, o art. 25º tem de ser interpretado
extensivamente” (itálico aditado).
A não aplicação ao caso dos artigos 23.º e 25.º, n.º 3, do Código das
Expropriações deveu-se, é certo, à circunstância de se entender que o regime da
Reserva Agrícola Nacional não obsta à qualificação da parcela expropriada como
solo apto para construção. Mas não se detecta na decisão recorrida uma recusa de
aplicação implícita destas normas dos artigos 23.º e 25.º, n.º 3, do Código das
Expropriações, com fundamento na sua desconformidade com a Constituição,
dizendo-se, antes: “Assim, não pode deixar de concluir-se que, para efeitos
indemnizatórios, é suficiente para classificar um solo como apto para a
construção, ainda que integrado em zona de R.A.N. e/ou R.E.N., a circunstância
de se verificar a existência de algum dos elementos aludidos nas diversas
alíneas do n.° 2 do art. 25.°. / Em suma: a integração dos solos na R.A.N. ou na
R.E.N. não impede que sejam classificados como solos aptos para a construção,
desde que se verifiquem os requisitos de que o Cód. das Expropriações faz
depender a inclusão nesta categoria”.
A decisão do Tribunal Judicial de Castelo de Paiva não assentou, pois, como
fundamento decisivo, numa recusa implícita de aplicação das normas dos artigos
23.º e 25.º, n.º 3, do Código das Expropriações aprovado pela Lei n.º 168/99, de
18 de Setembro (sendo que esta última norma, do artigo 25.º, n.º 3, define,
negativamente, os solos considerados aptos para outros fins que não a
construção), por motivos de inconstitucionalidade de tais normas, e antes numa
positiva qualificação por força da subsunção dos factos do caso ao disposto nos
artigos 25.º, n.º 2, alínea a), e 26.º, n.º 12, do mesmo diploma.
A decisão recorrida sempre poderia, pois, manter-se, ainda que o recurso de
constitucionalidade fosse provido, pelo que não podia dela tomar-se
conhecimento, e a decisão sumária reclamada merece ser confirmada.
III Decisão
Pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a presente reclamação e
confirmar a decisão sumária de não conhecimento do recurso.
Lisboa, 28 de Março de 2007
Paulo Mota Pinto
Mário José de Araújo Torres
Rui Manuel Moura Ramos