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Processo n.º 64/2006
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
 
  
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 A – Relatório
 
  
 
  
 
             1 – A., melhor identificado nos autos, reclama para a conferência, 
 nos termos do disposto no artigo 78.º-A, n.º 3, da Lei n.º 28/82, de 15 de 
 Novembro (LTC), da decisão sumária proferida pelo relator, na qual se decidiu 
 não tomar conhecimento do recurso interposto para este Tribunal.
 
  
 
             2 – A decisão sumária tem o seguinte teor:
 
  
 
 «(…)
 
 [1 –] A., melhor identificado nos autos, recorre para o Tribunal Constitucional, 
 
 “nos termos dos artigos 69.º e seguintes da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro, 
 pretendendo a apreciação da inconstitucionalidade da norma constante do artigo 
 
 411.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, por violação do artigo 32.º, nºs 1 e 
 
 2, da Constituição da República Portuguesa”.
 
  
 
             [2 –] Compulsados os autos, deles resulta que:
 
  
 
             [2.1 –] O Recorrente foi julgado e condenado no 2.º Juízo do 
 Tribunal do Montijo como autor material de um crime de violação, p. e p. pelo 
 artigo 164.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 6 anos de prisão e, como autor 
 material de um crime de condução ilegal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.º 2, do 
 Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 7 meses de prisão, 
 condenando-o o Tribunal, em cúmulo jurídico, na pena conjunta de 6 anos e 4 
 meses de prisão.
 
  
 
             [2.2 –] Inconformado, o Arguido recorreu para o Tribunal da Relação 
 de Lisboa que, por Acórdão de 15 de Junho de 2005, rejeitou o recurso com 
 fundamento em “inadmissibilidade legal”, designadamente, por ter sido interposto 
 para além do respectivo prazo legal.
 
  
 
             [2.3 –] Discordando deste entendimento, o Arguido recorreu para o 
 Supremo Tribunal de Justiça, argumentando, em síntese, que:
 
  
 
 «1 - No acórdão de fls... proferido nos autos à margem referenciados, o tribunal 
 
 'a quo' considerou manifestamente improcedente o recurso apresentado pelo 
 recorrente e condenou o mesmo nas custas do recurso, com taxa de justiça em 4 
 UCs e na sanção processual correspondente a 5 UCs,
 
 2 - O douto tribunal 'a quo' fundamentou a sua decisão no facto de considerar 
 que o acesso à transcrição não pode ser encarado como essencial à preparação do 
 recurso, uma vez que a mesma não é mais do que um traslado destinado a facilitar 
 o conhecimento do recurso pelo Tribunal Superior,
 
 3 - Ora, salvo o devido respeito o tribunal 'a quo' não tem razão quando 
 considera improcedente o recurso com base no fundamento mencionado supra.
 
 4 - A leitura do douto acórdão realizou-se no dia 31/01/2005, tendo o mesmo sido 
 depositado no dia 2/02/2005,
 
 5 - No dia da leitura do acórdão, 31/01/2005, foi entregue pelo recorrente, no 
 Tribunal 'a quo', um requerimento a solicitar a entrega das cassetes referentes 
 
 à gravação da audiência de discussão e julgamento. E,
 
 6- O Tribunal 'a quo' facultou as cassetes ao recorrente no dia 7/02/2005.
 
 7 - Em 25/02/2005, o recorrente interpôs o recurso.
 
 8 - Alega o Tribunal 'a quo' que, em virtude do acórdão ter sido depositado no 
 dia 2/02/2005 o último dia para interposição do recurso era 17/02/2005, sendo 
 
 22/02/2005 o 3º dia útil após o termo desse prazo (art. 145º, nºs.5 e 6 C.P.C.). 
 Pelo que,
 
 9- A interposição do recurso no dia 25/02/2005 seria extemporânea. Todavia, 
 
 10 - Salvo o devido respeito, não assiste razão ao Tribunal 'a quo', já que o 
 recurso foi interposto no prazo legal.
 
 11 - Conforme entendimento da jurisprudência o prazo para interposição do 
 recurso da matéria de facto suspende-se entre o dia em que é solicitada a 
 entrega das cassetes e o dia em que efectivamente as mesmas são entregues pelo 
 Tribunal ' a quo'. 
 
 12 - Outro entendimento não seria plausível porque quando as provas tenham sido 
 gravadas, as especificações previstas nas al. b) e c) do nº.3 do art. 412º do 
 C.P.P. fazem-se, conforme dispõe o nº 4 do mesmo artigo por referência aos 
 suportes técnicos, havendo lugar a transcrição.
 
 13 - Além de que, nos termos do art. 698º, nº.6 do C.P.C. por remissão do art. 
 
 4º do C.P.P. é concedido o prazo de 10 dias de dilação quando são requeridas as 
 cassetes e o recurso versa sobre matéria de facto. Assim,
 
 14 - O prazo legal para interposição do recurso só se iniciou no dia 7/02/2005, 
 data em que as cassetes foram entregues ao recorrente pelo Tribunal 'a quo', 
 pois o requerimento para entrega das mesmas tinha sido entregue no dia 
 
 31/01/2005 e o depósito do acórdão só ocorreu no dia 2/02/2005.
 
 15 - Donde se conclui que, o último dia para interposição do recurso foi 
 
 22/02/2005, podendo o acto ser praticado, nos termos do art. 145º, nº.5 e 6, até 
 ao 3º dia útil subsequente, ou seja, 25/02/2005, como efectivamente sucedeu.
 
 (…)».
 
  
 
  
 
             [2.4 –] Por Acórdão de 21 de Dezembro de 2005, o Supremo Tribunal de 
 Justiça considerou o recurso “manifestamente improcedente”, rejeitando-o com 
 base na seguinte argumentação:
 
  
 
                         «(…)
 
 2.2. Como bem refere a Senhora Procuradora-Geral Adjunta no seu parecer de fls. 
 
 652 e segs., «depois de alguma hesitação, o Supremo Tribunal de Justiça passou 
 francamente a entender [cita diversos acórdãos nesse sentido] que, tendo sido 
 opção, e não devido a qualquer lapso, que em 1998 o legislador (conhecendo o 
 regime de recurso em matéria de facto consagrado no processo civil em resultado 
 da revisão ao mesmo operada pelo Dec.-Lei nº 329-A/95 de 12.02) não previu a 
 possibilidade de prorrogação do prazo fixado nº 1 do art. 411º do C.P.P. para 
 interposição do recurso que vise a impugnação da matéria de facto. Daí 
 considerar-se que na lei processual penal não existe, em matéria de prazo de 
 interposição de recurso visando a impugnação da matéria de facto, qualquer 
 lacuna que careça de ser integrada, nos termos do art. 4º e por aplicação 
 subsidiária de normas do processo civil, 'maxime ' do nº 6 do art. 698».
 De facto, estando como estamos no âmbito de um processo penal, as normas 
 aplicáveis são naturalmente as do respectivo Código, só sendo lícito recorrer às 
 do Código de Processo Civil se depararmos com uma lacuna – art. 4º do primeiro.
 Todavia, importa reter que o legislador de 87 conferiu ao sistema dos recursos 
 em processo penal «uma tendencial autonomia relativamente ao processo civil. 
 Salvo pormenores de regulamentação que devem procurar-se, por via analógica, no 
 Código de Processo Civil (...), os recursos penais passaram a obedecer a 
 princípios próprios, possuem uma estrutura normativa autónoma e desenvolvem-se 
 segundo critérios a que não é alheia uma opção muito clara sobre a necessidade 
 de valorizar a atitude prudencial do juiz. O Código rompe abertamente com a 
 tradição que, há quase um século, geminou os recursos penais e cíveis» (Cunha 
 Rodrigues, em 'Recursos', Jornadas de Direito Processual Penal, 384).
 Por outro lado, para afastar qualquer ideia de justo impedimento pretensamente 
 decorrente de só na data acima assinalada terem sido entregues à Mandatária do 
 Recorrente cópias das cassetes de gravação da prova, basta recordar que, nos 
 termos do nº 2 do art. 7º do DL 39/95, de 15 de Fevereiro, que regulamenta o 
 registo da prova, os sujeitos processuais têm direito, desde que o requeiram, a 
 cópia desse registo no prazo máximo de 8 dias após a realização da diligência 
 respectiva e que, no caso sub judice, tendo a produção da prova encerrado, como 
 vimos, no dia 7 de Janeiro de 2005, o Recorrente só solicitou as cópias das 
 cassetes no dia 31 seguinte.
 
  
 Assim, contendo o CPP um regime completo sobre o prazo da interposição dos 
 recursos, mesmo quando tenham por objecto a decisão da matéria de facto – o que 
 veda o acesso ao CPC, designadamente ao nº 6 do seu art. 698, como regime 
 subsidiário –, e não tendo ocorrido motivo de justo impedimento, é manifesto que 
 o Arguido interpôs o seu recurso para o Tribunal da Relação para além do prazo 
 peremptório fixado no art. 411º, nº 1 daquele diploma: o acórdão da 1ªinstância 
 foi depositado na secretaria no dia 02.02.05; o 15º dia posterior caiu no dia 17 
 seguinte; o 3º dia útil posterior (arts. 107º, nº 5, do CPP e 145º, nº 5, do 
 CPC), foi o dia 22 do referido mês de Fevereiro; o requerimento de interposição 
 do recurso foi apresentado em 25 seguinte).
 Entretanto, foi publicado no DR Iª Série-A, de 6 do corrente mês, o acórdão 
 deste Tribunal, nº 09/05, de 11 de Outubro que fixou jurisprudência no mesmo 
 sentido, ou seja que, «quando o recorrente impugne a decisão em matéria de facto 
 e às provas tenham sido gravadas, o recurso deve ser interposto no prazo de 15 
 dias, fixado no artigo 411º nº 1, do Código de Processo Penal, não sendo 
 subsidiariamente aplicável em processo penal o disposto no artigo 698º nº 6, do 
 Código de Processo Civil».
 
  
 Por isso que o recurso agora interposto, com vista à impugnação da decisão do 
 Tribunal da Relação de Lisboa de rejeição do anterior recurso, seja, também ele, 
 de rejeitar, por se mostrar manifestamente improcedente – arts. 420º, nº 1, do 
 CPP.
 
 3. Nesta conformidade, acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça 
 em rejeitar o recurso interposto pelo Arguido A., por ser manifestamente 
 improcedente, confirmando, consequentemente, o acórdão recorrido.
 
 (…)».
 
  
 
             [2.5 –] Novamente inconformado, o Arguido interpôs, nos termos supra 
 descritos, recurso para o Tribunal Constitucional.
 
  
 
             [3 –] Enquadrando-se o recurso na previsão da norma do artigo 
 
 78.º-A, n.º 1, da LTC, passa a decidir-se.
 
  
 
             [4 –] Importa começar por referir que o Recorrente não indica a 
 alínea do n.º 1 do artigo 70.º da LTC ao abrigo da qual o recurso é interposto, 
 sendo manifesto que o Tribunal Constitucional não pode tomar conhecimento do 
 mesmo pelo facto de não estarem reunidos in casu os pressupostos processuais 
 estabelecidos quanto às decisões de que pode recorrer-se para o Tribunal 
 Constitucional.
 
             Desde logo, não houve, na decisão recorrida, qualquer recusa de 
 aplicação de norma nos termos estabelecidos nas alíneas a), c), d), e) e i) do 
 artigo 70.º, n.º1, da LTC.
 
             Do mesmo passo, o Recorrente não suscitou qualquer questão de 
 constitucionalidade/ilegalidade nos termos das alíneas b) e f) do artigo 70.º, 
 n.º 1, da LTC.
 
             Por fim, não está também em causa a aplicação de uma norma já 
 julgada anteriormente inconstitucional por este Tribunal ou pela Comissão 
 Constitucional (alíneas g) e h) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC), 
 acrescentando-se, de resto, que a questão normativa colocada pelo Recorrente foi 
 já considerada por este Tribunal no seu Acórdão n.º 542/04 (publicado no Diário 
 da República II Série, de 22 de Novembro de 2004), tendo-se aí decidido não 
 julgar inconstitucional a norma constante do artigo 411.º, nºs 1 e 3, do Código 
 de Processo Penal, na interpretação segundo a qual ao prazo de 15 dias aí 
 previsto para a interposição e motivação do recurso não acresce o prazo de 10 
 dias a que se refere o artigo 698.º, n.º 6, do Código de Processo Civil, em caso 
 de recurso que tenha por objecto a reapreciação de prova gravada.
 
  
 
             Refira-se ainda que, para efeitos da alínea b) do artigo 70.º, n.º 
 
 1, da LTC, o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal 
 Constitucional não constitui momento idóneo para suscitar um problema de 
 constitucionalidade normativa.
 Na verdade, como tem sido reiteradamente assumido pela jurisprudência deste 
 Tribunal, o ónus de suscitação da questão de constitucionalidade deve ser 
 entendido “não num sentido meramente formal (tal que a inconstitucionalidade 
 pudesse ser suscitada até à extinção da instância)”, mas “num sentido 
 funcional”, de tal modo que essa invocação haverá de ter sido feita em momento 
 em que o tribunal a quo ainda pudesse conhecer da questão, “antes de esgotado o 
 poder jurisdicional do juiz sobre a matéria a que (a mesma questão de 
 constitucionalidade) respeita” – cf. Acórdão n.º 352/94, publicado no Diário da 
 República II Série, de 6 de Setembro de 1994.
 Por seu lado, afirma-se, igualmente, no Acórdão n.º 560/94, publicado no Diário 
 da República II Série, de 10 de Janeiro de 1995, que «a exigência de um cabal 
 cumprimento do ónus de suscitação atempada - e processualmente adequada - da 
 questão de constitucionalidade não é [...] “uma mera questão de forma 
 secundária”. É uma exigência formal, sim, mas essencial para que o tribunal 
 recorrido deva pronunciar-se sobre a questão de constitucionalidade para que o 
 Tribunal Constitucional, ao julgá-la em via de recurso, proceda ao reexame da 
 questão (e não a um primeiro julgamento de tal questão». 
 Neste domínio há que acentuar que, nos processos de fiscalização concreta, a 
 intervenção do Tribunal Constitucional se limita ao reexame ou reapreciação da 
 questão de (in)constitucionalidade que o tribunal a quo apreciou ou devesse ter 
 apreciado. Ainda na mesma linha de pensamento podem ver-se, entre outros, o 
 Acórdão n.º 155/95, publicado no Diário da República II Série, de 20 de Junho de 
 
 1995, e, aceitando os termos dos arestos acabados de citar, o Acórdão n.º 
 
 192/2000, publicado no mesmo jornal oficial, de 30 de Outubro de 2000 - sobre o 
 sentido de um tal requisito, cfr. José Manuel Cardoso da Costa, «A jurisdição 
 constitucional em Portugal», separata dos Estudos em Homenagem ao Prof. Afonso 
 Queiró, 2ª edição, Coimbra, 1992, pp. 51).
 
 É certo que tal doutrina sofre restrições, como se salientou naquele Acórdão n.º 
 
 354/94, mas isso apenas acontece em situações excepcionais ou anómalas, nas 
 quais o interessado não dispôs de oportunidade processual para suscitar a 
 questão de constitucionalidade antes proferida ou não era exigível que o 
 fizesse, designadamente por o tribunal a quo ter efectuado uma aplicação de todo 
 insólita e imprevisível. 
 Usando os termos do recente Acórdão n.º 192/2000, dir-se-á, ainda, que “quem 
 pretenda recorrer para o Tribunal Constitucional com fundamento na aplicação de 
 uma norma que reputa inconstitucional tem, porém, a oportunidade de suscitar a 
 questão de constitucionalidade perante o tribunal recorrido, antes de proferido 
 o acórdão da conferência de que recorre...”. 
 E é claro que não poderá deixar de entender-se que o recorrente tem essa 
 oportunidade quando a apreensão do sentido com que a norma é aplicada numa 
 decisão posteriormente proferida poderá/deverá ser perscrutado no(s) 
 articulado(s) processual(ais) funcionalmente previsto(s) para discretear 
 juridicamente sobre as questões cuja resolução essa decisão tem de ditar, por 
 antecedentemente colocadas, e em que aquele sentido, cuja constitucionalidade se 
 poderá questionar, se apresenta como sendo um dos plausíveis a ser aplicados 
 pelo juiz. 
 Ao encararem ou equacionarem na defesa das suas posições a aplicação das normas, 
 as partes não estão dispensadas de entrar em linha de conta com o facto de estas 
 poderem ser entendidas segundo sentidos divergentes e de os considerar na defesa 
 das suas posições, aí prevenindo a possibilidade da (in)validade da norma em 
 face da lei fundamental. 
 Digamos que as partes têm um dever de prudência técnica na antevisão do direito 
 plausível de ser aplicado e, nessa perspectiva, quanto à sua conformidade 
 constitucional. 
 O dever de suscitação da inconstitucionalidade durante o processo e pela forma 
 adequada enquadra-se dentro destes parâmetros acabados de definir, sendo que, in 
 casu, não restam quaisquer dúvidas de que o Recorrente dispôs de clara 
 oportunidade processual para suscitar a questão de constitucionalidade.
 
  
 
 [5 –] Destarte, atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide não tomar 
 conhecimento do objecto do presente recurso.
 
 (…)».
 
  
 
  
 
             3 – Discordando deste entendimento, o Reclamante alega que:
 
             
 
             «(…)
 
 1 - A douta decisão sumária começa por referir no ponto 4 que o recorrente não 
 indica a alínea do nº 1 do art. 70º da LTC ao abrigo do qual o recurso é 
 interposto, no entanto,
 
 2 - Como consta do requerimento de interposição de recurso, em sede de 
 apresentação da Motivação do recurso, o recorrente referiu que o recurso vinha 
 interposto ao abrigo do disposto na al. b) do nº 1 do art. 70º LTC, pelo que,
 
 3 - Salvo o devido respeito, ao contrário do vertido na douta decisão sumária, o 
 recorrente indica a alínea do mencionado artigo, ao abrigo da qual interpõe o 
 seu recurso,
 
 4 - Estando assim no requerimento do recurso reunidos todos os pressupostos 
 processuais a que o art. 75º-A do referido diploma legal faz referência.
 
 5 - No que concerne ao facto de constar da douta decisão sumária que o ora 
 reclamante não suscitou qualquer questão de inconstitucionalidade/ilegalidade 
 nos termos das al. b) e f) do art.70º nº 1 da LTC, cumpre referir-se que é 
 inquestionável que nos recursos de fiscalização concreta da constitucionalidade, 
 esse Tribunal só pode tomar conhecimento do seu objecto desde que a questão de 
 inconstitucionalidade seja suscitada durante o processo e antes da prolação da 
 decisão recorrida. Acresce que,
 
 6 - O recurso da constitucionalidade tem sempre como objecto normas jurídicas 
 efectivamente aplicadas nessa mesma decisão. Porém,
 
 7 - Como bem se sabe, o Tribunal Constitucional tem considerado que cabe no seu 
 
 âmbito de fiscalização decidir se o sentido interpretativo de uma norma aplicada 
 numa decisão judicial concreta é conforme com as garantias definidas pelo 
 legislador constitucional.
 
 8 - Ora, in casu, salvo o devido respeito, entende-se que a questão da 
 constitucionalidade normativa invocada pelo recorrente preenche, minimamente, os 
 requisitos que lhe permitem merecer urna apreciação da constitucionalidade. De 
 facto, 
 
 9 - O reclamante interpôs recurso, versando sobre a matéria de facto, para o 
 Tribunal da Relação de Lisboa, o qual decidiu rejeitá-lo por, alegadamente, o 
 mesmo ser intempestivo, uma vez que, segundo entendimento dos Venerandos 
 Desembargadores o prazo de 15 dias, previsto no art. 411º nº 1 CPP, é um prazo 
 peremptório, não se suspendendo, ainda que o recorrente solicite a entrega das 
 cassetes contendo a gravação da prova. Pelo que.
 
 10 - Não se conformando com o douto acórdão, o ora reclamante recorreu para o 
 Supremo Tribunal de Justiça, tendo, no requerimento de interposição de recurso, 
 identificado a interpretação que deveria ser colhida do preceito em causa, ou 
 seja, o nº 1 do art. 411º CPP e identificado a dimensão normativa contra a qual 
 se insurgia. Além de que.
 
 11 - Quando notificado da questão prévia suscitada pelo Digníssimo Magistrado do 
 M.P., o reclamante respondeu, nos termos do art. 417º nº 2 CPP, tendo feito 
 referência ao douto acórdão do Tribunal de Lisboa proferido no âmbito do Proc. 
 nº 3165I04 – 3ª Secção no qual é referido que 'Se o legislador tivesse 
 considerado a situação em que o recorrente pretende impugnar a decisão de facto, 
 não leria fixado para o efeito um prazo extremamente reduzido quando, pela 
 complexidade da elaboração da motivação nesse caso se justificaria, senão o 
 alongamento do prazo, pelo menos o seu não encurtamento, sob pena de se negar o 
 próprio direito ao recurso, uma das garantias de defesa do arguido (art. 32º 
 CRP), E,
 
 12 - Na mesma peça o reclamante volta a referir a interpretação que considera 
 conforme ao art. 32º CRP, apesar de, por lapso, não fazer referência ao indicado 
 preceito. Sucede ainda que,
 
 13 - O acórdão de fixação de jurisprudência proferido no âmbito do Proc. nº 
 
 09/05 e publicado no DR 1ª Série-A em 06/12/2005, constituiu, no entender do 
 reclamante, uma decisão surpresa, uma vez que até à data eram abundantes as 
 decisões jurisprudenciais em sentido inverso, e,
 
 14 - É de notar que o mencionado acórdão só foi proferido e publicado depois da 
 interposição do recurso pelo ora reclamante.
 
 15 - Finalmente, deve ainda referir-se que tanto na reposta à questão prévia 
 suscitada pelo Digníssimo Magistrado do M.P. junto do Tribunal da Relação de 
 Lisboa, como no requerimento de interposição de recurso para o Supremo Tribunal 
 de Justiça e, mais tarde, na resposta à questão prévia suscitada pelo Ministério 
 Público junto deste último Tribunal, é indubitável que o recorrente pretende 
 saber se efectivamente a norma constante do art. 411º nº 1 CPP é constitucional 
 e, nomeadamente, se é constitucional a interpretação que é feita da mesma, ao 
 considerar peremptório o prazo de 15 dias que o preceito faz referência.
 
 16 - Tanto assim é que na última peça processual referida o recorrente faz 
 inclusivamente referência ao acórdão proferido no âmbito do Proc. nº 3165/04 – 
 
 3ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, o qual refere que a interpretação do 
 art. 411º nº 1 que considera que o prazo de 15 dias é peremptório é uma 
 interpretação que colide com o vertido no art. 32º CRP e consequentemente nega o 
 direito ao recurso que ao arguido assiste.
 
 17 - Pelo exposto, dúvidas não restam de que foi efectivamente suscitada a 
 inconstitucionalidade da norma legal do art. 411º nº 1 CPP, assim, como foi 
 referida a alínea do nº 1 do art. 70º LTC ao abrigo da qual o recurso era 
 interposto.
 
 (…)»
 
  
 
  
 
             4 – O Representante do Ministério Público junto deste Tribunal, em 
 resposta, perante a “evidente inverificação dos pressupostos do recurso 
 interposto”, considera a reclamação manifestamente improcedente.
 
  
 
             Cumpre agora julgar.
 
  
 
  
 
  
 B – Fundamentação
 
  
 
             5 – Previamente à consideração dos argumentos constantes da presente 
 reclamação, importa reiterar que, contrariamente ao sustentado pelo Reclamante, 
 o requerimento de interposição de recurso constante de fls. 693, não indica a 
 alínea do artigo 70.º, n.º 1, da LTC, ao abrigo da qual o recurso foi 
 interposto. Essa menção apenas consta da “Motivação do Recurso” e das 
 respectivas “Conclusões” que acompanham indevidamente, à luz do disposto nos 
 artigos 75.º-A, nºs 1 e 2 e 79.º da LTC, o requerimento de interposição.
 
             Independentemente disso, o Tribunal aferiu da verificação dos 
 pressupostos processuais condicionadores do conhecimento do recurso, deixando 
 expressamente consignado, no que tange com a alínea b) do artigo 70.º, n.º 1, da 
 LTC, que o recorrente não havia suscitado adequadamente durante o processo a 
 questão de constitucionalidade que erigiu em objecto do recurso.
 
             Na perspectiva do Reclamante, a questão de constitucionalidade foi 
 suscitada na resposta à questão prévia suscitada pelo Representante do 
 Ministério Público junto do Supremo Tribunal de Justiça, quando sustentou, 
 transcrevendo um excerto de um Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, que “se 
 o legislador tivesse considerado a situação em que o recorrente pretende 
 impugnar a decisão de facto, não teria fixado para o efeito um prazo 
 extremamente reduzido quando, pela complexidade da elaboração da motivação nesse 
 caso se justificaria, senão o alongamento do prazo, pelo menos o seu não 
 encurtamento, sob pena de se negar o próprio direito ao recurso, uma das 
 garantias de defesa do arguido (art. 32.º CRP)”, admitindo, porém, não ter 
 feito, “por lapso”, qualquer referência à norma do artigo 411.º do Código de 
 Processo Penal.
 
             Ora, como transparece da leitura dessa peça processual – 
 considerando principaliter o excerto supra transcrito –, o Reclamante não imputa 
 
 à norma do artigo 411.º do Código de Processo Penal a violação de qualquer 
 parâmetro constitucional, devendo sempre exigir-se, para efeitos de uma 
 suscitação adequada de um problema de constitucionalidade normativa, a 
 referência imediata à norma que se considera inconstitucional de forma a que o 
 tribunal recorrido se tenha por vinculado à sua fiscalização. 
 
             Ademais, sempre se dirá que, tendo o reclamante sempre pugnado pela 
 aplicação do artigo 411.º do Código de Processo Penal num determinado sentido, 
 não poderá considerar-se “desculpável”, na perspectiva do recurso de 
 constitucionalidade, o “lapso” de não ter individualizado e suscitado o problema 
 de constitucionalidade que trouxe a este Tribunal.
 
             Por outro lado, apesar do Reclamante invocar também que “o acórdão 
 de fixação de jurisprudência (…), constituiu uma decisão surpresa, uma vez que à 
 data eram abundantes as decisões jurisprudenciais em sentido inverso”, a verdade 
 
 é que, como o próprio admite – e resulta claro em face das conclusões do seu 
 recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, primeiro, e pelo teor da “questão 
 prévia” suscitada no Supremo Tribunal de Justiça pelo Ministério Público, depois 
 
 –, a questão de constitucionalidade poderia ter sido suscitada antes da prolação 
 da decisão recorrida, não sendo de considerar “surpreendente” a decisão de 
 rejeitar o recurso.
 
  
 
  
 C – Decisão
 
  
 
             6 – Destarte, atento e exposto, o Tribunal Constitucional decide 
 indeferir a presente reclamação.
 
  
 
             Custas pelo Reclamante com 20 UCs de taxa de justiça.
 Lisboa, 15 de Fevereiro de 2006
 Benjamim Rodrigues
 Maria Fernanda Palma
 Rui Manuel Moura Ramos