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Processo nº 161/2007.
3ª Secção.
Relator: Conselheiro Bravo Serra.
1. Em 12 de Fevereiro de 2007 o relator
proferiu a seguinte decisão: –
“1. Nos autos de oposição à execução fiscal instaurados no 1º
Juízo do Tribunal Tributário de 1ª Instância do Porto por A., Ldª, o Juiz
daquele Juízo, por despacho de 9 de Julho de 2003, entendendo que se não via
qualquer pertinência na produção de prova testemunhal oferecida pela oponente,
determinou que a requerida produção de prova não tivesse lugar.
Do assim decidido agravou a oponente para o Supremo Tribunal
Administrativo, formulando, na alegação adrede produzida, as seguintes
«conclusões»: –
‘1º O recurso vem do despacho que não admite a inquirição de testemunhas
arroladas.
2º A oposição, após a sua notificação ao representante da Fazenda Pública, segue
os termos da Impugnação Judicial.
3º Para além disso, em todo o procedimento Tributário têm que ser utilizados
todos os meios de prova legalmente previstos que sejam necessários ao correcto
apuramento dos factos.
4º Os artºs 211,50, 118 e 119 do C.P.P.T. e os artº.s 619 e seguintes do Código
de Processo Civil aplicável subsidiariamente, não autorizam que o julgador
prescinda de inquirição de testemunhas arroladas, tanto mais que existem factos
para provar.
5º Além disso, a atitude tomada pelo despacho recorrido representa uma
ilegalidade e uma inconstitucionalidade por ofensa directa ao artº 20 da
Constituição.
6º Foi violada toda a legislação citada nestas alegações e suas conclusões.’
Anote-se que, no «teor» da aludida alegação, não foi suscitada
qualquer questão de desconformidade constitucional reportadamente a normativo ou
normativos ínsitos no ordenamento jurídico ordinário.
Prosseguindo os autos seus termos, veio, em 2 de Março de 2004,
a ser proferida sentença por via da qual foi a oposição julgada improcedente.
Dessa sentença recorreu a oponente para o Tribunal Central
Administrativo Norte, rematando a alegação então produzida com o seguinte quadro
conclusivo: –
‘1º. Está interposto, recebido e alegado recurso do despacho que não admitiu a
inquirição de testemunhas;
2º. Tal recurso deve ser apreciado e decidido previamente ao da decisão final;
3º. A decisão final peca por muita carência de apreciação de prova que não foi
permitida;
4º. Em matéria de direito ela fundamenta-se em três acórdãos do S.T.A. que não
têm aplicação prática para além do caso concreto que julgaram;
5º. Nos presentes autos não se arguiu qualquer nulidade de falta de requisitos
dos artºs 162 e 163 do C.P.P.T. invocável nos termos da alínea b) do nº 1 do
artº 165;
6º. Igualmente não se pretendeu nem se pretende convolar o processo executivo em
processo declarativo, constituindo como única defesa da executada o processo de
oposição;
7º. Por outro lado, não se pretendeu atacar em concreto a liquidação que, em seu
entender caberia no artº 99 do C.P.P.T., embora tenha sido já decidido, nalguns
casos que se conhecem, embora erroneamente, que os fundamentos da impugnação,
são tão somente os constantes nas quatro alíneas daquele artº 99;
8º. Estão articulados factos conducentes à existência ou inexistência (a
decidir) dos fundamentos das alíneas f), h) e i) do nº 1 do artº 204 do
C.P.P.T.;
9º. À Administração, incluindo o Instituto de Gestão Financeira, compete actuar
dentro dos princípios dos artºs 3 e seguintes do Código de Procedimento
Administrativo e dos artºs 20,22, 52,209, 212, 266, 267, 268 e 271 da
Constituição da República Portuguesa.
10º. Foi violada toda a legislação citada nestas alegações e suas conclusões.’
Também nesta alegação não se surpreende qualquer asserção da
qual resulte o assacar de vício de enfermidade com a Lei Fundamental com reporte
a qualquer normativo infra-constitucional.
Tendo o Tribunal Central Administrativo Norte, por acórdão de
14 de Setembro de 2006, negado provimento ao recurso de agravo e àqueloutro
incidente sobre a sentença que julgou improcedente a oposição, veio a oponente
fazer juntar aos autos requerimento com o seguinte teor: –
‘A., LDA, no Recurso Jurisdicional nº 21/03-Porto, em que contende com a
FAZENDA PÚBLICA, notificada do acórdão de 14 de Setembro de 2006, e não se
conformando com o mesmo, dele vem recorrer para o Tribunal Constitucional.
Na realidade, a recorrente, desde sempre, vem suscitando no Processo a
questão da inconstitucionalidade e da ilegalidade de modo processualmente
adequado perante o Tribunal de 1ª Instância e este Tribunal Central
Administrativo Norte.
Estão preenchidos os requisitos do nº 2º do artº 72º da Lei do Tribunal
Constitucional.
Pretende-se recorrer não só com os fundamentos nas alíneas b) e f) do artº
70º, mas também com o fundamento da alínea c) do mesmo preceito.
Consideram-se violados os artºs 211º, 50º, 118º, 119º do Código de Processo e
do Procedimento Tributário e os artºs 619 e seguintes do Código de Processo
Civil, restringindo-se assim a, aplicação do artº 20º da Constituição da
República Portuguesa.
Nos termos expostos, requer que ao abrigo dos artºs 75º, 75º-A e do artº 76º
da Lei do Tribunal Constitucional (Lei nº 28/82, de 15 de Novembro), que lhe
seja admitido o recurso com os efeitos legais.’
Por despachos de 19 de Outubro de 2006 e 7 de Dezembro
seguinte, proferidos, aliás, por dois diferentes Relatores do Tribunal Central
Administrativo Norte, foi admitido o recurso interposto mediante o transcrito
requerimento.
2. Não obstante tais despachos, porque os mesmos não vinculam
este Tribunal (cfr. nº 3 do artº 76º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro) e
porque se entende que o recurso não deveria ter sido admitido, elabora-se, ex vi
do nº 1 do artº 78º-A da mesma Lei, a vertente decisão, por intermédio da qual
se não toma conhecimento do objecto da presente impugnação.
Efectivamente, é por demais óbvio [ ] que não é minimamente
cabível o recurso esteado na alínea c) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82,
justamente porque no acórdão intentado impugnar se não recusou a aplicação de
norma constante de acto legislativo com fundamento na sua ilegalidade por
violação de lei com valor reforçado.
Identicamente não é convocável a alínea f) daqueles número e
artigo, já que se não assistiu, precedentemente ao proferimento do acórdão de 14
de Setembro de 2006, à suscitação de qualquer ilegalidade de norma constante de
acto legislativo com fundamento na violação de lei de valor reforçado ou de
violação de estatuto de Região Autónoma, ou de qualquer ilegalidade de norma
constante de diploma regional com base em violação de estatuto de Região
Autónoma ou de lei geral da República.
Por fim, no que concerne à alínea b), ainda dos mencionados
número e artigo, deflui do «relato» supra efectuado que, aquando das alegações
produzidas no agravo e no recurso da sentença lavrada no 1º Juízo do Tribunal
Tributário de 1ª Instância do Porto, não foi aí impostada qualquer questão de
desarmonia constitucional referente a um dado normativo ordinários (ou a uns
dados normativos ordinários).
Ora, como sabido é, constitui pressuposto do recurso ancorado
naquela alínea b) o ónus de suscitação da questão de inconstitucionalidade
normativa antecedentemente a ser exarada a decisão judicial que se quer submeter
ao veredicto do Tribunal Constitucional.
Como esse ónus, na situação sub specie, não foi cumprido,
possível não será tomar conhecimento do objecto do recurso.
Custas pela impugnante, fixando-se a taxa de justiça em sete
unidades de conta.”
Da transcrita decisão veio a A., Ldª reclamar,
fazendo por intermédio de requerimento em que se consignou: –
“A., LDA, recorrente nos Autos de Recurso n.º 161/07, da 3.ª Secção, em que
contende com a FAZENDA NACIONAL, notificada da decisão sumária proferida, e não
se conformando com o teor da mesma, vem dela reclamar para a Conferência, nos
termos do n.º 3 do Art. 78.º-A da LCT, na redacção dada pela Lei n.º 13 –
A/1998, de 26 de Janeiro.”
Notificada da reclamação a Fazenda Pública veio
dizer que a mesma, deduzida pela recorrente, o foi sem apresentação de qualquer
fundamento ou razão justificadora e que, em face disso, haveria de concluir-se
que essa reclamação visava “apenas protelar o trânsito em julgado do acórdão do
TCA de 14 de Setembro de 2006”, pelo que uma tal actuação integrava “litigância
de má fé (art. 456. º, 2, d) in fine do C.P.C.)”, motivo pelo qual se solicitava
que a impugnante fosse “condenada em multa nos termos daquele preceito.
Cumpre decidir.
2. Independentemente da questão de saber se,
como se assinalou no Acórdão deste Tribunal nº 292/2001 (disponível em
www.tribunalconstitucional.pt), a reclamação para a conferência da decisão
proferida nos termos do nº 1 do artº 78º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro,
tem sempre que ser fundamentada com a exposição das razões para se discordar
dessa decisão – sendo que, no caso em espécie, isso se não surpreende –, o que é
certo é que se não lobriga minimamente qualquer motivo para se dissentir do que
se decidiu em 12 de Fevereiro de 2007.
Na verdade, para além de, na situação em
apreço, não ser cabido o recurso fundado na alínea c) e na alínea f) do nº 1 do
artº 70º da Lei nº 28/82, pelas razões carreadas à decisão reclamada, pelo que
tange ao recurso baseado na alínea b) dos mesmos número e artigo, é
inquestionável que, antes de ser proferido o aresto que se quis impugnar perante
este Tribunal, não foi equacionada qualquer questão de desconformidade
constitucional referida a um dado normativo ínsito no ordenamento jurídico
infra-constitucional, o que vale por dizer que a ora reclamante não cumpriu o
ónus de suscitação a que se reporta a alínea b) do nº 1 do artigo 280º da Lei
Fundamental e a já mencionada alínea b) do nº 1 do artº 70º.
É, pelo exposto, infundada a reclamação.
Não se extraem dos autos, todavia, dados
concretos e inequívocos que apontem no sentido de o recurso desejado interpor
para este Tribunal e a dedução da reclamação de que se cura constituiu, por
parte da recorrente, utilização de meios processuais que tão só tiveram por
desiderato protelar, seja o trânsito do aresto proferido pelo Tribunal Central
Administrativo Norte, seja o da decisão reclamada.
E, assim, na carência de tais dados, não poderá
este órgão de administração de justiça, pelo menos no momento, ser levado a
considerar que a actuação processual da recorrente integra má fé.
E daí não lançar mão do que se prescreve no
artº 456º do diploma adjectivo civil.
Em face do que se deixa dito, indefere-se a
reclamação, condenando-se a impugnante nas custas processuais, fixando-se a taxa
de justiça em vinte unidades de conta.
Lisboa, 12 de Março de 2007
Bravo Serra
Gil Galvão
Artur Maurício