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Processo nº 1047/2006
2ª Secção
Relatora: Conselheira Maria Fernanda Palma
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
I
Relatório
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, o
Tribunal da Comarca de Castelo Branco proferiu a seguinte decisão:
O Tribunal é competente.
A arguida tem legitimidade para impugnar judicialmente a decisão da entidade
administrativa e está em tempo.
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Pela arguida foi arguida a inconstitucionalidade do diploma aplicável em causa.
Para tanto alega que o diploma em causa ao definir a taxa a pagar ao Estado
está, a final, a estabelecer um imposto e que tal viola o que vai no artº 165º,
nº 1, al. i) da Constituição da República. Ou seja, padece a norma de uma
inconstitucionalidade orgânica por não ter o Governo legislado sobre a matéria.
Dispõe tal norma que:
É da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as
seguintes matérias, salvo autorização ao Governo:
(...)
i) Criação de impostos e sistema fiscal e regime geral das taxas e demais
contribuições financeiras a favor das entidades públicas.
Ao atribuir às autarquias competência para a fixação de taxas, o
Decreto-Lei não está a legislar ao abrigo de uma qualquer autorização
legislativa sobre a matéria.
Na verdade, o Governo ao criar o diploma deveria, no seu preâmbulo, referir que,
ao atribuir competência às câmaras para a prática desse acto – criação de taxas
– estava, ele próprio, a agir ao abrigo de uma autorização legislativa coisa que
não fez limitando-se a, pura e simplesmente, legislar e atribuir competências
sem olhar para a C.R.P..
Assiste, pois, razão à recorrente pelo que declaro inconstitucional, padecendo
de constitucionalidade orgânica, o artº 53º do Decreto-Lei nº 310/2002 de 18.2,
por violação do artº 165º, nº 1, al. i) da Constituição da República Portuguesa.
O Ministério Público interpôs recurso de constitucionalidade obrigatório nos
seguintes termos:
O magistrado do Ministério Público, nesta comarca, nos termos do disposto nos
arts. 280º, n°s 1, al. a) e 3, da Constituição da República Portuguesa e 70°, n°
1. al. a) e 72°, n° 3, da Lei do Tribunal Constitucional (Lei n° 28/82, de
15.11), vem interpor recurso obrigatório da douta sentença de fls. 52 a 54, para
o Venerando Tribunal Constitucional.
O presente recurso tem em vista a apreciação da constitucionalidade do art. 53º
(n°2) do D.L. n° 310/2002, de 18.12. (Regime jurídico do licenciamento e
fiscalização pelas Câmaras Municipais de actividades diversas anteriormente
cometidas aos Governos Civis), cuja aplicabilidade foi recusada naquela peça
processual com o fundamento em que tal disposição legal está ferida de
inconstitucionalidade orgânica por atentar contra o disposto no art. 165°, n°1,
al. i), da Constituição da República Portuguesa.
O recurso deverá subir nos próprios autos, de imediato, e com efeito suspensivo.
Junto do Tribunal Constitucional o Ministério Público alegou, concluindo o
seguinte:
1 – Não cabe obviamente no âmbito da reserva de competência legislativa da
Assembleia da República, prevista na alínea i) do n° 1 do artigo 165° da
Constituição da República Portuguesa, a fixação, em regulamentos municipais, das
taxas devidas como contrapartida pecuniária do exercício de uma actividade de
licenciamento pelo município.
2 – É, pois, manifestamente improcedente o juízo de inconstituciona-lidade
orgânica, emitido quanto à norma que constitui objecto do presente recurso, que
deverá proceder, em consonância com a plena conformidade a Lei Fundamental de
tal preceito legal.
A recorrida não contra‑alegou.
2. Cumpre apreciar.
II
Fundamentação
3. A norma cuja aplicação o tribunal recorrido recusou com fundamento em
inconstitucionalidade orgânica determina que as taxas devidas pelos
licenciamentos das actividades previstas pelo diploma legal, nas quais se inclui
a de exploração de máquinas de diversão, são fixadas por regulamento municipal.
Na decisão recorrida, o juiz a quo considerou, respondendo à questão de
constitucionalidade suscitada pela arguida (que alegou que a norma impugnada
procedia à criação de um imposto), que a norma desaplicada se refere a matérias
abrangidas pela alínea i) do nº 1 do artigo 165º da Constituição (alínea segundo
a qual é abrangida pela reserva relativa de competência parlamentar a criação de
impostos, o sistema fiscal e o regime geral das taxas e demais contribuições
financeiras a favor das entidades públicas).
Ora, não só o montante cujo pagamento é devido (ao consubstanciar a
contrapartida da remoção de um obstáculo jurídico à actividade de exploração de
máquinas de diversão através do respectivo licenciamento) tem um carácter
essencialmente sinalagmático das prestações, pelo que, na perspectiva
jurídico‑constitucional, a prestação em causa consubstancia uma taxa e não um
imposto, como também, estando apenas em questão a fixação do montante dessa taxa
(em concreto), não é pertinente invocar o regime geral das taxas, como, de
resto, o Tribunal Constitucional por diversas vezes já entendeu (cf., entre
outros, os Acórdãos nºs 377/94 e 365/2003 – www.tribunalconstitucional.pt; cf.,
também, José Manuel Cardoso da Costa, Sobre o princípio da legalidade das
“taxas” e das “demais contribuições financeiras”, em Estudos em Homenagem ao
Professor Doutor Marcello Caetano no Centenário do seu Nascimento, FDL, Coimbra
Editora, 2006, p. 789 e ss., em especial p. 798 e ss.
É, pois, manifestamente improcedente o juízo de inconstitucionalidade constante
da decisão recorrida.
4. Conclui‑se, assim, pela não inconstitucionalidade orgânica da norma em
apreciação.
III
Decisão
5. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide não
julgar organicamente inconstitucional a norma do artigo 53º, nº 2, do
Decreto-Lei nº 310/2002, de 18 de Dezembro, revogando‑se, consequentemente, o
juízo de inconstitucionalidade constante da decisão recorrida.
Lisboa, 8 de Março de 2007
Maria Fernanda Palma
Paulo Mota Pinto
Mário José de Araújo Torres
Benjamim Rodrigues
Rui Manuel Moura Ramos