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Processo nº 740/92
2ª Secção Relator : Cons. Sousa e Brito
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I A CAUSA
1. A e outras dezassete trabalhadoras da empresa B., intentaram contra esta no Tribunal do Trabalho de Almada, acção declarativa emergente de contrato individual de trabalho, com processo sumário, peticionando da mesma entidade patronal a quantia global de 702.746$40, correspondente à soma das indemnizações parcelares, a cada uma das autoras, por não gozo de determinado período de férias.
Ordenada a citação da ré, '... através de funcionário' (despacho de fls.41), foi lavrada, pelo funcionário encarregue da diligência, a certidão de fls.44, certificando essa citação em 9.7.91, 'na pessoa do legal representante', anotando no final da mesma : 'A citanda recusou-se assinar esta certidão, alegando que não aceita a queixa'. Foi nesse mesmo dia expedida para o 'gerente' da firma ré a carta registada com aviso de recepção cujo teor consta de fls.45, tendo o respectivo a.r. sido devolvido assinado, como se alcança de fls.46. Estão juntas aos autos (não pagas) as guias referentes ao preparo para contestação da ré (incluindo as emitidas ao abrigo do artigo 110 do Código das Custas Judiciais) e a fls.55 proferiu o juiz do processo o seguinte despacho :
'Citada para contestar a Ré veio juntar aos autos a carta de fls 42, que não foi sequer subscrita por advogado.
Notificada para efectuar o preparo inicial nos termos do art.110º do C.C. judiciais não o fez.
Mesmo que se entendesse que a aludida carta consubstanciassse uma contestação ao pedido formulado pelas autoras não poderia ser considerada por falta de pagamento do preparo inicial (art.110º do C.C.Judiciais).
Assim e ainda nos termos da disposição legal referida considero ineficaz a oposição deduzida e ordeno o desentranhamento dos autos da mesma.
Notifique.'
Encontramos, com efeito, a fls.42, o termo de desentranhamento da mencionada peça processual.
Culminando esta sequência, foi proferida (fls.82/85) sentença que, após exposição do pedido formulado pelas autoras, concluíu :
' Regularmente citada a Ré não contestou. Assim, e nos termos do art.86º do C.P.T., condeno a ré B., no pedido.
Custas pela Ré, com T.J. reduzida a metade.
Registe e notifique, com observância do disposto no art. 71º do CPT. '
Foi esta decisão notificada à referida ré (v.registo postal datado de 6.2.92, junto a fls 85 vº).
1.1. Em 7 de Fevereiro de 1992, atravessou a mesma ré no processo o requerimento de fls.86/87, no qual requer que seja julgado nulo todo o processado posterior ao despacho de citação e a admissão de uma contestação que anexa ao requerimento (v.fl. 89/90). Apoia tal pretensão, no essencial, no entendimento de que o artigo 23º, nº 1 do Código de Processo do Trabalho (CPT), ao abrigo do qual afirma ter sido citada, padece de manifesta inconstitucionalidade por ofensa do preceituado no artigo 20º, nº 1, da Constituição. Mais tarde, em 14 de Fevereiro de 1992, através do requerimento de fls.93/94, reafirmou tal entendimento nos exactos termos em que o fizera na peça anterior, estendendo apenas o pedido de anulação de todo o processado à sentença.
Através do despacho de fls.101/102, foi-lhe desatendida tal pretensão, fundamentando-se a decisão em causa nos seguintes termos :
'Pelo despacho de fls.41 foi ordenada a citação da R. através de funcionário.
Como se pode observar através da certidão de fls.44 o legal representante da R. recusou-se a assinar a certidão, declarando 'que não aceitava a queixa'. Foi-lhe então enviada carta registada com a.r. (fls.45 e 46).
A R. teve conhecimento da acção, porque veio juntar uma carta aos autos, que eventualmente teria sido considerada como contestação se o preparo inicial tivesse sido efectuado, o que não aconteceu (fls.42 e 55).
Não se vislumbra que o artigo 23º, nº 1 do CPT ofenda o preceituado no artigo
20º, nº 1 da CRP. '
A ré foi notificada deste despacho indicando o registo postal respectivo (v.fls.102) como data de expedição 10.3.92.
1.2. Reagiu então a ré interpondo em 24 de Março de
1992, com o requerimento de fls.103, recurso para o Tribunal Constitucional, relativamente ao despacho de indeferimento da anulação de todo o processado, fundando esse recurso no artigo 70º, nº 1, alínea b) da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro (LTC) indicando como norma objecto deste, o artigo 23º, nº 1 do CPT, por violação do artigo 20º,nº 1, da Constituição, acrescentando que a interposição de tal recurso interrompia 'o prazo de interposição do recurso de apelação da sentença para o Venerando Tribunal da Relação (artigo 75º da citada Lei nº 28/82...)'.
Foi este recurso admitido a fls.104 pelo Tribunal a quo
II FUNDAMENTAÇÃO
2. Vejamos então se deve conhecer-se do recurso.
Estamos perante uma acção sumária de natureza laboral
(v.artigo 47º, nº2 in fine e nº 3 a contrário do CPT), cujas decisões, tendo presente o valor da causa (702.746$40), são passíveis de recurso (v.artigo 74º, nº 4 do CPT; cfr., quanto ao valor das alçadas, artigo 20º, nº 1, da Lei nº
38/87, de 23 de Dezembro). Assim, da decisão em causa neste recurso de constitucionalidade cabia - mas não foi interposto - um recurso para o Tribunal de Relação e a ora recorrente interpôs desde logo, como se alcança de fls 103, recurso para o Tribunal Constitucional, quando ainda se não encontrava esgotado o prazo de 8 dias (v. artigo 75º, nº 1 do CPT) de interposição do recurso para a Relação (veja-se a data de expedição constante do registo de fls.102 -
10.3.92 - e a data de entrada - 24.3.92 - do requerimento de fls. 103; cfr. artigo 1º, nº3, do DL nº121/76, de 11 de Fevereiro).
O recurso de constitucionalidade nesta espécie prevista na alínea b), do nº 1 do artigo 70º da LTC, só é possível, nos termos do nº 2 da mesma disposição, de decisões que não admitam recurso ordinário (como o era neste caso o recurso não interposto para a Relação), por a lei o não prever (e já vimos que a lei o prevê) ou por já haverem sido esgotados todos os que no caso cabiam (e o prazo do recurso para a Relação ainda não se encontrava, como também já vimos, esgotado).
A situação configurada leva a que se não mostre preenchido o apontado pressuposto da exaustão dos recursos ordinários - caracterizando-se o conceito de esgotamento como afastamento dos recursos possíveis 'pelo decurso do prazo (preclusão por caducidade)' (Armindo Ribeiro Mendes, Recursos em Processo Civil, 2ª.ed., Lisboa 1994, pág.332).
Faltando um condicionalismo de acesso ao Tribunal Constitucional, resta concluir pelo não conhecimento do recurso.
III DECISÃO
3. Termos em que se decide não tomar conhecimento do presente recurso, fixando-se a taxa de justiça em cinco unidades de conta.
Lisboa, 23 de Janeiro de 1996 José de Sousa e Brito Bravo Serra Fernando Alves Correia Guilherme da Fonseca Messias Bento José Manuel Cardoso da Costa