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Processo nº 558/95
2ª Secção
Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do
Tribunal Constitucional:
Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal Administrativo, em
que figuram como recorrente A. e como recorrido o B., considerando os
esclarecimentos constantes da resposta da recorrente à EXPOSIÇÃO do Relator, a
fls. 88 e seguintes, decide-se ordenar o prosseguimento dos autos.
Lisboa, 6 de Dezembro de 1995
Guilherme da Fonseca
Bravo Serra
Fernando Alves Correia
Messias Bento
José Sousa e Brito
Luís Nunes de Almeida
Processo nº 558/95
2ª Secção
Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
EXPOSIÇÃO
1. A., com os sinais identificadores dos autos, veio interpor
recurso para este Tribunal Constitucional do acórdão do Supremo Tribunal
Administrativo (Secção do Contencioso Administrativo), de 16 de Maio de 1995,
que, negando provimento ao recurso jurisdicional por ela interposto, confirmou
a sentença recorrida do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, de 7 de
Abril de 1994, que havia rejeitado o recurso contencioso, na base da
'inconstitucionalidade dos actos meramente confirmativos'.
No requerimento de interposição do recurso para este Tribunal
Constitucional, diz a recorrente que o faz ' nos termos e ao abrigo do disposto
no artº. 75º-A e alínea b) do nº 1 do art. 70º da Lei nº 28/82, de 15 de
Novembro, porquanto no acórdão ora impugnado foi feita uma interpretação da
norma constante do artigo 25º, nº 1, da Lei de Processo nos Tribunais
Administrativos (Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho) que conduz à
inconstitucionalidade da norma interpretada por violação do artigo 268º, nº 4,
da Constituição da República Portuguesa' (e acrescenta: 'A aludida
inconstitucionalidade foi suscitada pela ora recorrente no requerimento em que
se pronunciou perante o Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa sobre a
questão da irrecorribilidade contenciosa do acto impugnado, e ainda, nas
alegações de recurso para a Secção de contencioso do Supremo Tribunal
Administrativo').
2. Neste Tribunal Constitucional foi a recorrente convidada pelo
Relator a esclarecer 'a indicação do sentido da interpretação feita no acórdão
recorrido da norma legal questionada' e ainda 'a indicação do sentido da
interpretação que a recorrente entenda dever ser feita da mesma norma legal',
tendo, em resposta, prestado 'os seguintes esclarecimentos':
'1. O acórdão recorrido entendeu que as decisões administrativas posteriores à
resolução de 3/09/92, incluindo o despacho de 14/06/93 do B., que indeferiu a
pretensão da Recorrente, mantendo a situação definida por aquela resolução,
constituem actos meramente confirmativos, insusceptíveis de recurso
contencioso, por força do art. 25º, nº 1, da Lei do Processo nos Tribunais
Administrativos (DL nº 267/85, de 16/7); sendo que, a irrecorribilidade dos
actos meramente confirmativos não afronta a garantia de recurso contencioso a
que alude o art. 268º, nº 4 da Constituição da República Portuguesa.
2. Ao rejeitar o recurso com fundamento na irrecorribilidade contenciosa do
despacho de 14/ /06/93, por se tratar de um acto meramente confirmativo do
despacho de 3/09/92, o acórdão impugnado entendeu que semelhante resolução não
integrava a categoria de actos definitivos e executórios a que se refere o
citado art. 25º, nº 1, da Lei do Processo nos Tribunais Administrativos, pelo
que, por aplicação desta disposição, dela não cabia recurso contencioso.
3. Entende a recorrente que o despacho de 14/06/93 não tem a natureza de acto
meramente confirmativo, nele se tendo voltado a apreciar a situação da
recorrente; mas mesmo que assim se não entenda, o art. 25º, nº 1, deverá ser
interpretado no sentido de abranger também aquele acto, sob pena de violação do
artº 268º, nº 4 da CRP, que garante a todos os interessados recurso contencioso
contra quaisquer actos administrativos que lesem os seus direitos ou interesses
legalmente protegidos.'
3. Entendo que não pode tomar-se conhecimento do presente recurso de
constitucionalidade, porque a recorrente não chegou a indicar o sentido ou
interpretação da norma do artigo 25º, nº 1, do Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de
Julho, que ela tem por violador da Constituição.
De facto, tendo a questão de constitucionalidade que ser suscitada
de forma clara e perceptível (cf., entre outros, o Acórdão nº 269/94, publicado
Diário da República, II série, de 18 de Junho de 1994), impõe-se que, quando se
questiona apenas uma certa interpretação de determinada norma legal, se
indique esse sentido (essa interpretação) em termos de que, se este Tribunal o
vier a julgar desconforme com a Constituição, o possa enunciar na decisão que
proferir, por forma a que o tribunal recorrido que houver de reformar a sua
decisão, os outros destinatários daquela e os operadores jurídicos em geral
saibam qual o sentido da norma em causa que não pode ser adoptado, por ser
incompatível com a Lei Fundamental.
Escreveu-se a propósito no Acórdão nº 367/94 (publicado no Diário
da República, II série, de 7 de Setembro de 1994):
'Ao suscitar-se a questão de inconstitucionalidade, pode questionar-se todo um
preceito legal, apenas parte dele ou tão-só uma interpretação que do mesmo se
faça. [...] esse sentido (essa dimensão normativa) do preceito há-de ser
enunciado de forma que, no caso de vir a ser julgado inconstitucional, o
Tribunal o possa apresentar na sua decisão em termos de, tanto os destinatários
desta, como, em geral, os operadores do direito ficarem a saber, sem margem para
dúvidas, qual o sentido com que o preceito em causa não deve ser aplicado, por,
desse modo, violar a Constituição.
Ora, não tendo a recorrente indicado o sentido da norma do artigo
25º, nº 1, do Decreto-Lei nº 267/85 que tem por inconstitucional, há-de
concluir-se que a questão de constitucionalidade não foi suscitada de forma
clara ou perceptível, ou seja, que o não foi em termos processualmente
adequados.
Na verdade, o que sempre a recorrente contrariou ao longo do
processo foi a natureza de acto meramente confirmativo do despacho
contenciosamente impugnado, carecendo de fundamento a invocada
irrecorribilidade daquele despacho ' e que fundamentou a rejeição do recurso,
mostrando-se a interpretação da norma do artigo 25º, nº 1, da Lei de Processo
nos Tribunais Administrativos (Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho) acolhida
pelo meretíssimo juiz a quo contrária ao artigo 268º, nº 4, da Constituição da
República Portuguesa' (linguagem da recorrente nas alegações do recurso
jurisdicional apresentado perante o Supremo Tribunal Administrativo).
Posição reafirmada pela recorrente neste Tribunal Constitucional, em
resposta ao convite do Relator, pois, no fundo, é o que quer dizer com a
afirmação de que, mesmo entendendo tratar-se de acto meramente confirmativo, 'o
art. 25º, nº 1, deverá ser interpretado no sentido de abranger também aquele
acto'. Mas, por esta via, não se chega a saber qual o sentido da norma daquele
artigo que a recorrente tem por inconstitucional, o que se sabe é que ela
discute a qualificação do acto, matéria que escapa à apreciação e decisão deste
Tribunal Constitucional.
Tanto basta para concluir que não pode, assim, o Tribunal conhecer
do presente recurso.
4. Ouçam-se as partes, por cinco dias, nos termos e para os efeitos
do disposto no artigo 78º-A, da Lei nº 28/82, aditado pelo artigo 2º da Lei nº
85/89, de 7 de Setembro.
Guilherme da Fonseca