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Proc. nº 385/93
1ª Secção
Rel. Cons. Monteiro Diniz
Acordam no Tribunal Constitucional:
1 - A. interpôs, perante o Supremo Tribunal Administrativo, recurso
contencioso directo do despacho do Secretário de Estado do Tesouro, de 10 de
Julho de 1990, publicado no Diário da República, II série, de 31 de Julho de
1990, que homologou apenas parcialmente a decisão da comissão arbitral,
constituída nos termos do Decreto-Lei nº 51/86, de 14 de Março, para avaliação
das acções do banco B., recusando em parte a homologação e fixando o valor
unitário em 4501$50, para efeitos de indemnização por nacionalização.
Aquele Tribunal, por acórdão de 18 de Fevereiro de 1993, concedeu
provimento ao recurso e declarou nulo o acto impugnado, recusando para tanto,
com fundamento em inconstitucionalidade, por violação dos princípios consignados
no artigo 206º da Constituição, a aplicação dos artigos 16º, nº 6, da Lei nº
80/77, de 26 de Outubro, na redacção do Decreto-Lei nº 343/80, de 2 de Setembro,
e 24º do Decreto-Lei nº 51/86, de 14 de Março.
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2 - Deste acórdão foram interpostos recursos de constitucionalidade
pelo Ministério Público e pelo Secretário de Estado do Tesouro, concluindo-se em
ambas as alegações, pela não inconstitucionalidade das normas cuja aplicação foi
rejeitada na decisão recorrida.
O senhor Procurador-Geral Adjunto aduziu, em síntese conclusiva, a
fundamentação seguinte:
'1º - A função jurisdicional traduz-se numa actividade de heterocomposição de
conflitos de interesses, realizada por um órgão neutro, independente e imparcial
relativamente aos interessados que solicitam tal composição, a efectivar através
da estrita aplicação do Direito (ou da equidade, quando a lei o permite) aos
casos concretos.
2º - Embora normalmente a função administrativa envolva a prossecução activa
de interesses públicos diversos do da realização do Direito e da Justiça, pode a
lei atribuir à Administração um poder de autocomposição dos conflitos de
interesses subjacentes às relações jurídico-administrativas, como expressão do
privilégio da execução prévia.
3º - Não representa usurpação da função jurisdicional a possibilidade
legalmente conferida aos órgãos da Administração de tomarem unilateral e
autoritariamente decisões vinculativas para os particulares, dirimindo
liminarmente conflitos de interesses ou aplicando sanções em áreas regidas pelo
Direito Administrativo, mesmo quando as decisões da Administração envolvam a
aplicação de critérios estritamente jurídicos.
4º - A questão do arbitramento e liquidação das indemnizações devidas por
nacionalizações situa-se plenamente no campo do Direito público, havendo,
consequentemente, interesse público autónomo e relevante na fixação da
contrapartida devida pela apropriação colectiva de meios de produção, ditada por
razões de natureza político-económica.
5º - Regendo-se as relações emergentes de nacionalizações inteiramente pelos
princípios do Direito público, nada impede que sobre elas possa recair um acto
administrativo definitivo e executório, como expressão do atrás aludido poder
autotutelar da Administração.
6º - As comissões arbitrais, na versão decorrente do estatuído nos
Decretos-Leis nºs 343/80, de 2 de Setembro e 51/86, de 14 de Março, não podem
ser qualificadas como tribunais arbitrais, já que a lei que as institui e
regulamenta não confere força vinculativa própria às decisões que proferem sobre
a liquidação das indemnizações devidas por nacionalizações.
7º - Exercem, pelo contrário, tais comissões uma função de arbitragem no
âmbito do procedimento administrativo 'gracioso', que culmina na prática de um
acto administrativo definitivo e executório que, controlando a regularidade e
legalidade da arbitragem efectuada, confere força vinculativa à decisão dos
árbitros.
8º - Não sendo legalmente as comissões arbitrais órgãos jurisdicionais, não
representa qualquer intromissão constitucionalmente ilegítima da Administração
no exercício da função jurisdicional a necessidade legal de ser homologada por
acto administrativo definitivo e executório a decisão proferida pelos árbitros.
9º - Não ocorre, pois, qualquer violação do disposto nos artigos 205º, nº 1,
206º e 208º, nº 2, da Constituição, pelo que deve, em consequência, conceder-se
provimento ao presente recurso, determinando-se a reforma da decisão recorrida,
na parte impugnada.'
E, na alegação daquele membro do Governo, aderiu-se integralmente,
nos respectivos termos e fundamentos, à argumentação desenvolvida pelo
Ministério Público.
De seu lado, a recorrida advogou um entendimento diverso que se
contém nas conclusões seguintes:
A) A actividade cometida às comissões arbitrais pelo nº 1 do art. 16º da Lei
nº 80/77, de 26 de Outubro, na redacção dada pelo Dec-Lei nº 343/80, de 2 de
Setembro, e pelos arts. 13º e 14º do Dec-Lei nº 51/86, de 14 de Março, tem
natureza jurisdicional;
B) O disposto no nº 6 do art. 16º da Lei nº 80/77, na redacção do Dec-Lei nº
343/80, e no art. 24º do Dec-Lei nº 51/86, ao fazer depender o efeito das
decisões das comissões arbitrais de acto do Governo, envolve violação da reserva
constitucional de jurisdição, pelo que aqueles preceitos são inconstitucionais,
por ofensa dos arts. 205º, nºs 1 e 2, e 114º, nº 1, da Constituição;
C) As comissões arbitrais previstas pela Lei nº 80/77, na redacção do Dec-Lei
nº 343/80, e pelo Dec-Lei nº 51/86 têm a natureza de tribunais arbitrais;
D) Em consequência, os citados nº 6 do art. 16º da Lei nº 80/77, na redacção
do Dec-Lei nº 343/80, e art. 24º do Dec-Lei nº 51/86 são ainda inconstitucionais
por ofensa do art. 208º, nº 2, da Constituição;
E) Por outro lado, os referidos preceitos violam a garantia constitucional de
plena jurisdição, imposta pelo nº 5 do art. 268º da Constituição (conjugado com
o art. 2º e o art. 20º, nº 1) e aplicável ao caso, salvo interpretação da lei
conforme com a Constituição, nos termos que ficaram referidos nos nºs 20 ou 21 e
22 das presentes alegações.'
Os autos seguiram os vistos de lei ficando depois a aguardar que
sobre a matéria objecto do presente recurso fosse emitida pronúncia pelo
plenário do Tribunal.
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3 - Com efeito, se bem que no processo de fiscalização abstracta
sucessiva de constitucionalidade nº 417/91, haja sido tirado o Acórdão nº
452/95, de 6 de Julho, ainda inédito, no qual não se chegou a tratar da questão
da inconstitucionalidade das normas objecto do presente recurso, o Tribunal
Constitucional, em conformidade com o disposto no artigo 79º-A, nº 1, da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro, aditado pela Lei nº 85/89, de 7 de Setembro, proferiu
o Acórdão nº 226/95, Diário da República, II série, de 27 de Julho de 1995, no
qual não foram julgadas inconstitucionais as normas dos artigos 16º, nº 6, da
Lei nº 80/77 (na redacção do Decreto-Lei nº 343/80) e 24º do Decreto-Lei nº
51/86.
E assim sendo, tendo em vista o propósito de uniformização
jurisprudencial que ditou aquele acórdão, importa agora, remetendo para a sua
fundamentação, proceder em conformidade com a solução ali encontrada.
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4 - Nestes termos, decide-se:
a) Não julgar inconstitucionais as normas constantes dos artigos 16º, nº 6,
da Lei nº 80/77, de 26 de Outubro, na redacção do Decreto-Lei nº 343/80, de 2 de
Setembro, e do artigo 24º do Decreto-Lei nº 51/86, de 14 de Março;
b) Conceder, consequentemente, provimento ao recurso e ordenar a reforma da
decisão impugnada, em harmonia com a presente decisão sobre a questão de
constitucionalidade.
Lisboa, 17 de Outubro de 1995
Antero Alves Monteiro Dinis
Maria Fernanda Palma
Maria da Assunção Esteves
Alberto Tavares da Costa
Vítor Nunes de Almeida
Armindo Ribeiro Mendes
José Manuel Cardoso da Costa