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Proc. nº 30/95
1ª Secção
Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal
Constitucional:
I
1. O recorrente A. vem reclamar para a conferência do
despacho da relatora proferido a fls. 232‑234 (datado de 14 de Março de 1995) e
que indeferiu o seu requerimento de fls. 222-223.
2. Esta reclamação para a conferência surge enquadrada
numa sequência processual que importa sumariamente relatar:
- tendo o ora reclamante interposto recurso para o
Tribunal Constitucional, foi proferido despacho pela relatora a fls. 220 (de 2
de Fevereiro de 1995), ao abrigo do artigo 75º-A, nº 5, da Lei do Tribunal
Constitucional, pelo qual se concedia um prazo de 5 dias para o recorrente
aperfeiçoar o seu requerimento de interposição de recurso;
- o ora reclamante foi notificado do despacho de fls.
220 por carta registada expedida em 6 de Fevereiro de 1995;
- o ora reclamante apresentou em juízo, em 22 de
Fevereiro de 1995, o requerimento de fls. 222-223, pelo qual pretendeu juntar
aos autos o requerimento de resposta ao convite formulado ao abrigo do artigo
75º-A, nº 5, da Lei do Tribunal Constitucional;
- nesse requerimento alegou o recorrente que
pretendia apresentar o requerimento de resposta ao convite em 21 de Fevereiro de
1995, ou seja, no terceiro dia útil subsequente ao termo do prazo, mediante o
pagamento da multa prevista no artigo 145º, nº 5, do Código de Processo Civil, e
invocou a ocorrência de 'justo impedimento', fundado em doença do mandatário
verificada durante um certo período desse dia, que impediu a entrega do
requerimento nesse dia 21 de Fevereiro.
3. No despacho reclamado decidiu-se não admitir o
recorrente a praticar o acto em causa (resposta ao convite formulado ao abrigo
do artigo 75º-A, nº 5, da Lei do Tribunal Constitucional) fora de prazo.
Assentou a decisão reclamada nas seguintes
considerações:
- tendo o recorrente sido notificado do despacho de fls.
220 por carta registada expedida em 6 de Fevereiro de 1995, essa notificação
presume-se feita no terceiro dia posterior ao do registo, em face do disposto no
artigo 1º, nº 3, do Decreto‑Lei nº 121/76, de 11 de Fevereiro, ou seja, em 9 de
Fevereiro de 1995, pelo que o prazo de 5 dias concedido terminou em 16 de
Fevereiro de 1995;
- o recorrente pretendeu praticar o acto respectivo em
21 de Fevereiro de 1995, ou seja, no terceiro dia útil subsequente ao termo do
prazo, ao abrigo do artigo 145º, nº 5, do Código de Processo Civil, mediante o
pagamento da multa aí prevista, mas acabou por o praticar em 22 de Fevereiro de
1995, invocando a ocorrência de um 'justo impedimento' verificado no dia 21 de
Fevereiro de 1995;
- a lei processual civil permite a prática de actos
processuais fora de prazo (peremptório) em caso de justo impedimento, que
consiste em evento normalmente imprevisível e estranho à vontade da parte, que
impossibilite a prática do acto, logicamente ocorrido no decurso daquele prazo;
- os três dias suplementares concedidos pelo nº 5 do
artigo 145º do Código de Processo Civil são já 'subsequentes ao termo do prazo',
conforme resulta do texto dessa disposição legal, pelo que não é juridicamente
concebível um 'justo impedimento' verificado num desses dias, e não no decurso
do prazo concedido;
- por não estarem verificados os pressupostos de
admissibilidade da invocação do 'justo impedimento', não pode o requerimento de
resposta ao convite ser considerado nos autos, entendendo-se extinto o direito
de praticar o respectivo acto pelo decurso do prazo.
Por isso se indeferiu aquele requerimento, sem
necessidade de apreciar se a situação invocada pelo recorrente configurava ou
não um 'justo impedimento', e se determinou o oportuno desentranhamento e
restituição do requerimento de resposta ao convite.
4. No presente requerimento de reclamação para a
conferência, o reclamante contesta os fundamentos do despacho reclamado, nos
seguintes termos:
'(...) Permitindo a lei (...) a possibilidade de prática do mesmo
acto nos três dias subsequentes, e considerando o art. 146º C.P.C. 'justo
impedimento' a impossibilidade de prática do acto nos termos dessa norma (que
foram alegados e comprovados) - é de concluir que a ocorrência do justo
impedimento tanto pode verificar-se no prazo concedido, como no período
subsequente ao seu termo, pois que concedendo a lei a faculdade de praticar um
acto tanto no prazo inicial como no período subsequente, nada há na lei que
circunscreva a invocação do 'justo impedimento' ao prazo inicial.
Isto é, o prazo peremptório estende-se até ao último dia do período
subsequente, e a ocorrência imprevisível pode ser, portanto, reportada ao
período em que a própria lei permite a prática do acto.
(...) Não se compreende, na verdade, que, podendo a parte por lei
praticar o acto no período subsequente e ocorrendo no seu decurso algum facto
imprevisível (doença, greve, incêndio, desastre) lhe seja vedada a invocação de
'justo impedimento'.
Tal decorre da letra da lei (das normas aplicáveis dos nºs 4 e 5 do
art. 145º do C.P.C. e, conjugadamente, do art. 146º C.P.C.), não se devendo
interpretar restritivamente o que tais normas não vedam expressamente, tudo em
obediência ao clássico e incontornável princípio 'Ubi lex non distinguit nec nos
distinguere debemus'. (...)'
Conclui pedindo que o recorrente seja admitido a
praticar o acto para que foi notificado, com a apreciação prévia do justo
impedimento invocado.
5. Submetido à conferência o requerimento do reclamante,
cumpre decidir.
II
6. A questão essencial colocada pela presente reclamação
é a de saber se o recorrente deve ser admitido a praticar o acto para que foi
notificado, devido ao justo impedimento invocado. Primeiro passo (e
eventualmente passo decisivo) para responder a tal questão é a análise do teor
do artigo 146º do Código de Processo Civil. Segundo tal preceito, 'o justo
impedimento' pode ter lugar, em face das disposições legais aplicáveis, no
decurso do período suplementar de três dias para prática do acto fora de prazo,
concedido pelo nº 5 do artigo 145º do Código de Processo Civil.
7. Segundo o nº 4 do artigo 145º do Código de Processo
Civil, um acto só pode ser praticado fora de prazo (peremptório) em caso de
justo impedimento. Nos termos do nº 1 do artigo 146º do Código de Processo
Civil, justo impedimento é 'o evento normalmente imprevisível, estranho à
vontade da parte, que a impossibilite de praticar o acto'. Por outro lado, o nº
5 do artigo 145º do mesmo Código determina que, 'independentemente de justo
impedimento, pode o acto ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis
subsequentes ao termo do prazo', mediante o pagamento de multa.
Desses textos legais parece resultar o seguinte:
- o período suplementar de três dias não integra o prazo
peremptório: só assim se compreende a menção da lei de que esses três dias são
'subsequentes ao termo do prazo';
- a relevância do 'justo impedimento' para o afastamento
do prazo tem a sua justificação normativa como evento ocorrido no decurso do
prazo peremptório - se o acto tem de ser praticado dentro desse prazo, sob pena
de extinção do direito de praticar o acto (artigo 145º, nº 3, do Código de
Processo Civil), só um evento ocorrido (ou, pelo menos, iniciado, se duradouro)
dentro desse prazo gera uma situação que, segundo a expressão do nº 1 do artigo
146º daquele Código, 'impossibilite [a parte] de praticar o acto'.
Se o acto for praticado nos três dias subsequentes que a
lei admite, mediante pagamento de multa, haverá, aí, apenas uma outra excepção à
exigência da prática do acto no decurso do prazo, para além da excepção do
próprio justo impedimento. A cumulação da excepção à regra do prazo, através do
pagamento de multa, nos três dias subsequentes com a excepção do justo
impedimento enfraqueceria o sentido e a função da cominação de um prazo
peremptório e a excepcionalidade do prazo suplementar. À possibilidade
excepcional de praticar o acto no prazo suplementar acresceria a de o praticar
fora deste prazo por justo impedimento ocorrido fora do prazo geral e durante o
prazo suplementar, ampliando-se, por analogia, a excepção normativa (contra o
disposto no artigo 11º do Código Civil).
Poderá, pois, concluir-se que a lei não admite a
invocação de um 'justo impedimento' ocorrido no período suplementar de três dias
previsto no nº 5 do artigo 145º do Código de Processo Civil. Não se trata aqui
de estabelecer distinções onde a lei não distingue, mas de alcançar o correcto
sentido das normas.
8. Porém, mesmo que se admita interpretação jurídica
diversa, segundo a qual o justo impedimento é invocável '... dentro dos três
dias úteis subsequentes ao termo do prazo ...' (artigo 145º, nº 5, do Código de
Processo Civil) - o que não dispensará, obviamente, a parte que o alegar do
pagamento da correspondente multa processual -, deverá concluir‑se, no caso sub
judicio, que ele não ocorreu.
Com efeito, do atestado médico apresentado pelo
mandatário do recorrente não se infere a impossibilidade de apresentação do
requerimento de resposta ao convite para aperfeiçoamento, durante o terceiro dia
do prazo suplementar. Tal atestado apenas declara que o mandatário do recorrente
se encontrou, por período indeterminado, que abrangeu parte da tarde de um dia,
doente (com afectação da actividade profissional). E o recorrente afirma, ao
alegar o justo impedimento, que a situação de doença cessou às 15 horas.
Deste modo, o mandatário do recorrente terá estado
doente, por tempo indeterminado, entre as 12 e as 15 horas. Assim, é
inquestionável que ele poderia ter apresentado o requerimento no próprio
terceiro dia de prazo suplementar, tanto de manhã como de tarde. E, por outro
lado, não provou sequer que a doença temporária que o afectou na tarde desse dia
tenha ocorrido durante o período de funcionamento da Secretaria do Tribunal
Constitucional, que está encerrada entre as 12 e as 14 horas.
Por conseguinte, não se provou o justo impedimento de
que sempre dependerá a apresentação do requerimento fora de prazo, nos termos do
disposto nos artigos 145º, nº 4, e 146º do Código de Processo Civil.
III
9. Pelo exposto, acorda-se em desatender a presente
reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em
6 unidades de conta.
Lisboa, 8 de Novembro de 1995
Maria Fernanda Palma
Maria da Assunção Esteves
Alberto Tavares da Costa
Vítor Nunes de Almeida
Armindo Ribeiro Mendes
Antero Alves Monteiro Dinis
José Manuel Cardoso da Costa