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Processo nº 278/95
1ª Secção
Rel. Cons. Tavares da Costa
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
1.- Nos presentes autos em que são recorrentes A. e B. e
recorrido o banco C., o relator elaborou exposição preliminar ao abrigo do
artigo 78º-A, nº 1, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, por considerar não ser
de admitir o recurso ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º desse texto
da lei, por falta de verificação dos respectivos pressupostos.
2.- Ouvidas as partes, veio o Banco recorrido concordar
com aquela exposição, não tendo os recorrentes oferecido qualquer resposta.
3.- Assim, pelas razões constantes da exposição
preliminar, decide‑se não tomar conhecimento do recurso.
Custas pelos recorrentes, com imposto de justiça
que se fixa em 5 (cinco) Uc's.
Lisboa, 28 de Setembro de 1995
Alberto Tavares da Costa
Vítor Nunes de Almeida
Armindo Ribeiro Mendes
Antero Alves Monteiro Dinis
Maria da Assunção Esteves
Maria Fernanda Palma
Luís Nunes de Almeida
Processo nº 278/95
1ª Secção
Rel. Cons. Tavares da Costa
Exposição preliminar a que se refere o artigo 78º-A
da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro.
1.- A. e B., identificados nos autos, intentaram, no
Tribunal de Trabalho de Viseu, contra o banco C., com sede em Lisboa, em 10 de
Dezembro de 1992 e 4 de Março de 1993, respectivamente, acções com processo
sumário, emergentes de contrato individual de trabalho, com fundamento no
incumprimento da obrigação retributiva do Banco réu, resultante da suspensão
do subsídio mensal de valorização profissional de montante equivalente a 10% do
vencimento base, atribuído por deliberação do Conselho de Gestão, de 5 de
Janeiro de 1983, com efeitos a partir do dia 1 desse mês e ano.
Os processos seguiram a tramitação natural,
determinando-se, por despacho de 22 de Outubro de 1993, a apensação da segunda
das acções à primeira, nos termos dos artigos 275º do Código de Processo Civil e
36º do Código de Processo do Trabalho.
As acções foram julgadas improcedentes e dos
respectivos pedidos foi o réu absolvido - sentença de 3 de Junho de 1994
(fls. 897 e segs.).
Entendeu-se, em síntese, que a deliberação do
Conselho de Gestão do BPSM acima aludida, 'ao conceder subsídios que se
traduziam em aumentos genéricos das remunerações dos trabalhadores do Banco, se
não fosse nula, desde logo, por violar a Resolução do C.M. (Conselho de
Ministros) nº 163/80, sempre seria ineficaz, por constituir um acto relativo ao
estatuto do pessoal e à fixação de remunerações e não ter sido aprovada, nos
termos do artigo 13º, nº 2, alínea g) e 4 do DL. nº 260/76, pelos Ministros da
Tutela (das Finanças) e do Trabalho', não podendo, pois, em qualquer caso,
produzir efeitos na esfera jurídica dos autores.
Do assim decidido recorreram estes para a Relação.
2.- O Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão de 9
de Março de 1995, confirmou a decisão recorrida, julgando improcedente o
recurso.
Para assim ajuizar, o Tribunal considerou
particularmente relevante para a resolução do problema em causa saber se o
subsídio de valorização profissional criado pela deliberação de 5 de Janeiro de
1983 do Conselho de Gestão do Banco réu constitui, ou não, retribuição - isto
porque, em seu entender, a questão da necessidade de autorização ou aprovação
só faz sentido no caso de o subsídio ser tido como retribuição.
Ora, para o acórdão recorrido, o subsídio em causa
deve ser considerado parte integrante da retribuição, dado o carácter regular e
periódico implícito à sua atribuição, constituindo contrapartida do trabalho
dos recorrentes, tendo em conta o conceito desta decorrente do artigo 82º da Lei
do Contrato de Trabalho. Suplemento válido e juridicamente eficaz, observa-se,
'a menos que o respectivo acto administrativo do Conselho de Gestão estivesse
dependente de autorização e/ou aprovação do Governo', não chegou, no entanto, a
ser pago, por suspensão da sua atribuição na sequência do despacho do
Secretário de Estado do Tesouro de 19 de Janeiro de 1983.
O Banco recorrido tinha, então, a natureza de
empresa pública e estava sujeito ao regime jurídico do Decreto-Lei nº 260/76,
de 8 de Abril, diploma onde se definiram as bases gerais da constituição,
organização e funcionamento das empresas públicas e bem assim os princípios
gerais fundamentais, designadamente o da subordinação da sua actividade ao
direito privado e do regime geral de controle das deliberações dos órgãos das
empresas públicas relativos ao estatuto do pessoal, em particular no que
respeita à fixação de remunerações [cfr., os artigos 4º e 13º, nº 2, alínea g),
do diploma].
Assim sendo, não há preceito legal, geral ou
especial - diz-nos o aresto - que excepcione a aplicação do Decreto-Lei nº
269/76 às instituições públicas de crédito. Antes, os princípios constantes do
aludido diploma passaram, a partir da nova redacção dada ao nº 2 do seu artigo
49º, pelo artigo 1º do Decreto-Lei nº 353-A/77, de 29 de Agosto, a ser
aplicáveis às instituições de crédito.
Partindo desta premissa, entende o acórdão ser de
concluir que 'foi com vista ao controlo da legalidade - tutela correctiva -
que a lei determinou a intervenção do Governo através do Ministro da Tutela, in
casu o poder-dever de rever os actos administrativos praticados pelo Conselho de
Gestão, podendo aprová-los, suspendê-los ou revogá-los'.
E acrescenta:
'E havendo sido expressamente reprovada pelo Secretário de Estado
do Tesouro a deliberação do Conselho de Gestão que, em 5 de Janeiro de 1983,
estabeleceu o mencionado subsídio de autorização profissional, tal deliberação
carece de validade e eficácia, sendo, por isso, insusceptível de produzir
efeitos jurídicos nas esferas individuais dos trabalhadores visados.
E que a aprovação da deliberação era requisito essencial da sua
executoriedade. Sem ela o acto não chegou a consolidar-se, não passou a
definitivo, isto é, a acto jurídico perfeito e acabado. Daí a sua ineficácia.
E não se diga que o artigo 13º do Decreto-Lei nº 260/76 não contém
princípios gerais mas regras que concretizam formas de tutela económica e
financeira sobre as empresas públicas, uma vez que as alterações que lhe foram
introduzidas pelo Decreto-Lei nº 353-A/77 respeitam a orientações, princípios
gerais sobre a matéria de tutela, com vista ao exercício dos poderes tutelares
do Governo na vida activa dessas empresas, instituições de crédito incluídas.
Ficaram, pois, as instituições bancárias sujeitas aos princípios
jurídicos contidos no Decreto-Lei nº 260/76, nomeadamente ao princípio da
sujeição à intervenção tutelar do Governo na actividade de gestão dos seus
órgãos, consagrado nos artigos 12º, 13º e 14º do referido diploma.
Assim sendo, importa saber se a tutela correctiva é preventiva mas
de controlo a posteriori, como atrás referimos, cuja falta gera a ineficácia do
acto.
Elucida-nos a este respeito a Resolução nº 163/80, publicada no
DR. - I Série - nº 197, de 9/5/980, quando nos seus nºs. 3 e 4 refere
expressamente a 'necessária aprovação tutelar'.
É que as instituições de crédito, como decorre do nº 1 do artigo
49º do Decreto-Lei nº 260/76, ficaram dispensadas da adaptar os respectivos
estatutos aos princípios consagrados no mencionado diploma.
Embora a predita Resolução não seja fonte imediata de direito, as
suas directivas tutelares, como medidas administrativas que são, impõem-se à
Administração autónoma das empresas públicas, sem que entre estas se faça
qualquer distinção, e constituem valiosa indicação, precioso auxiliar, para
precisar, por via de interpretação, a modalidade de tutela correctiva
aplicável ao caso vertente.'
E, após discretear sobre tutela correctiva:
'[...] não consente dúvidas a dependência de aprovação pelo Governo
dos actos dos órgãos das instituições de crédito nacionalizadas relativos a
remunerações e demais atribuições patrimoniais ao seu pessoal.
De resto, o facto de o exercício do poder tutelar se ter verificado
depois da deliberação do Conselho de Gestão, aponta igualmente no sentido da
tutela correctiva a posteriori (aprovação) emergente do artigo 13º do
Decreto-Lei nº 260/76.
Isto, a nosso ver, não viola o artigo 13º, nº 2, alínea g), do
Decreto-Lei nº 260/76, nem ultrapassa os seus limites; antes se quedando pela
interpretação dos textos aplicáveis, colhendo-lhes o verdadeiro sentido e
alcance.'
O acórdão recorrido, por último, debruça-se sobre a
invocada violação do artigo 13º, nº 2, alínea g), citado, por força da
interpretação da Resolução nº 163/80, no sentido de ser a tutela correctiva a
posteriori a seguida, quando, pela sua natureza regulamentar, aquela não podia
substituir-se aos Estatutos do Banco, onde devia consagra-se a modalidade de
tutela mais conveniente à sua especialidade.
Mas, neste ponto, pondera o acórdão:
'Atente-se, todavia, que não se aplicou a Resolução ela mesma,
apenas se atentou na orientação nela contida, na indicação dela constante,
relativamente ao exercício dos poderes de tutela do Governo, tutela correctiva a
posteriori emergente do citado artigo 13º, nº 2, alínea g). Consequentemente,
não se violou o artigo 207º da Constituição da República Portuguesa.
Também se não viola o princípio da Separação de Poderes
estabelecido no nº 1 do artº 114º da C.R.P.. Na verdade, aplicando-se a lei -
artigo 13º, nº 2, alínea g), do Decreto-Lei nº 260/76 e seguindo a valiosa
indicação da Resolução nº 163/80 no que respeita à tutela não se vai contra o
aludido princípio, pois que se aplicam regras jurídicas e princípios
informadores emanados de órgãos competentes. Seguindo umas e outros o Tribunal
não se substitui ao legislador, antes se limita a aplicar normas e princípios
emanados do legislador competente'.
3.- Do acórdão da Relação recorreram os autores para o
Tribunal Constitucional, ao abrigo do artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº
28/82, tendo o recurso por âmbito 'o apuramento da inconstitucionalidade do
entendimento nele [acórdão] dado à norma constante do artigo 13º - 2- g) do DL.
260/76 (8.4), na redacção do DL. 353-A/77 (29.8), que o recorrente [aliás
recorrentes] reputa violador do artº 114º da CRP.'
Recurso admitido pelo Desembargador relator, por
despacho de 31 de Março de 1995 - a subir imediatamente, nos próprios autos e
com efeito suspensivo.
Tal facto, porém, não vincula o Tribunal
Constitucional, de acordo com o disposto no nº 3 do artigo 76º da Lei nº 28/82.
Sendo assim e porque o recurso de
constitucionalidade fundamentado na alínea b) do nº 1 do artigo 70º do mesmo
diploma exige a congregação de vários pressupostos, entre eles constando a da
suscitação atempada de norma (que tenha sido aplicada na decisão sindicanda por
forma a constituir sua ratio decidendi) ou de interpretação dessa norma, com
igual repercussão na decisão, coloca-se o problema de saber se, no concreto
caso, esse requisito se verifica - qual seja, a conformidade constitucional da
norma contida na alínea g) do nº 2 do artigo 13º do Decreto-Lei nº 260/76, na
redacção do Decreto-Lei nº 353-A/77, interpretada no sentido de permitir a
intervenção tutelar - económica e financeira - por via da Resolução do
Conselho de Ministros nº 163/80 (e não tão só directamente aplicada).
4. Não se crê, na verdade, que semelhante
interpretação tenha sido seguida pelo acórdão recorrido.
Transcreve-se, a este respeito, parte da exposição
preliminar lavrada no processo nº 144/95, deste Tribunal, que viria a ser
acolhida pelo acórdão nº 243/95, por publicar, e a constituir o seu núcleo de
fundamentação, mediante o qual se entendeu não ser de tomar conhecimento do
recurso.
Aí se escreveu, a dado passo, após se sublinhar
decorrer da decisão a quo que a fiscalização tutelar flui do próprio artigo 13º,
nº 2, alínea g), nomeadamente no respeitante ao estatuto do pessoal e
respectivas remunerações:
'Assente [...] que era inquestionável a imposição dessa forma de
intervenção tutelar - imposição decorrente directamente da citada norma no
que tange ao estatuto de pessoal das «instituições públicas de crédito» e
respectivas remunerações - havia, seguidamente, de saber-se qual a forma de
operar a mencionada intervenção, ou seja, se a fiscalização se perspectivaria
como um controlo prévio ao acto praticado pelo Conselho de Gestão da Ré (assim
se caracterizando como uma autorização) ou como um controlo posterior a esse
mesmo acto (desse jeito se caracterizando como uma aprovação).
Ora, e porque, perante o teor da alínea g) do nº 2 do artº 13º do
DL. 260/76, é defensável, quer o entendimento de que o controlo há-de assumir a
forma de autorização, quer o entendimento de que o controlo deve assumir a forma
de aprovação, a Relação de Coimbra, na decisão em análise, optou pelo primeiro.
E fê-lo por interpretação daquela norma, interpretação a que chegou
servindo-se de determinada metodologia, na qual, por entre outros elementos, se
serviu das determinações constantes da Resolução do Conselho de Ministros nº
163/80.
Significa isto, como é bom de ver, que, de todo em todo, o acórdão
impugnado não interpretou a norma da alínea g) do nº 2 do artº 13º do DL. nº
260/76 como permitindo que fosse por intermédio de uma Resolução do Conselho de
Ministros que :
fossem definidos os actos dos órgãos das «instituições
de crédito público» que devem estar sujeitos à fiscalização tutelar;
que se alargasse essa fiscalização a tais instituições,
ou
que, fossem sujeitos a este género de controlo os actos
dos referidos órgãos referentes ao estatuto do pessoal e respectivas
remunerações.
E isto, novamente se assinala, porque, segundo o acórdão, é
directamente da citada norma que tal resulta.'
E, mais adiante, após considerar que a
inconstitucionalidade vem reportada a uma interpretação da norma de forma a que
dela se extraísse que seria por um acto não legislativo do Governo que se
determinaria a fiscalização tutelar dos actos dos órgãos das instituições
bancárias, parabancárias e seguradoras (ao menos quanto ao estatuto de pessoal
e respectivas remunerações), como violação do princípio 'da Separação de
Poderes', consagrado no artigo 114º da Lei Fundamental, conclui-se (em termos
totalmente transponíveis para o caso em apreço) que 'a decisão ora sob recurso
não fez uma aplicação da norma contida na alínea g) do nº 2 do artº 13º do D.L.
nº 260/76 com o sentido ou na dimensão que o recorrente considerou
inconstitucional ', havendo, assim, que concluir que, 'no caso, se não mostra
presente o requisito exigido para a abertura da via do recurso de
constitucionalidade prescrito na alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82,
isto é, o consistente na aplicação, na decisão de que se recorre, da norma
arguida de incompatível com a Constituição.'
5.- Em face do exposto e porque não oferece reservas a
posição acolhida naquele Acórdão nº 144/95, emite-se parecer, nos termos do
artigo 78º-A, nº 1, da Lei nº 28/82, no sentido de não se tomar conhecimento do
objecto do recurso.
Ouçam-se as partes, por 5 dias, nos termos da parte
final do citado preceito.
Lisboa, 14 de Junho de 1995
Alberto Tavares da Costa