Imprimir acórdão
Processo n.º 252/12
3.ª Secção
Relatora: Conselheira Ana Maria Guerra Martins
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Tribunal da Relação de Coimbra, a Relatora proferiu a Decisão Sumária n.º 248/2012:
«I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos, em que é recorrente A., Lda e recorrida Câmara Municipal da Guarda, foi interposto recurso, em 21 de março de 2012 (fls. 730 a 732), ao abrigo da alínea b) do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), do acórdão proferido pela 2ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra, (fls. 707 a 725), para que seja apreciada a constitucionalidade das seguintes interpretações normativas:
a) “normas do art. 25.º e 26.º-2 do CExp. de 1991, face às normas e princípios constitucionais da igualdade e da justa indemnização consagrados nos arts. 13.º e 62.º da CRP, quando interpretadas e aplicadas com a dimensão e sentido normativo que lhes foram atribuídos no douto acórdão recorrido, na parte em que fixou a justa indemnização devida com base no custo da construção, como tal fixado e considerado nos respetivos relatórios e respostas periciais” (fls. 731);
b) “norma do art. 25.º-4 do CExp. de 1999 [sic], face às normas e princípios constitucionais da igualdade e da justa indemnização consagrados nos arts. 13.º e 62.º da CRP, quando interpretadas e aplicadas com a dimensão e sentido normativo que lhes foram atribuídos no douto acórdão recorrido, na parte em que se deduziu dupla e cumulativamente ao valor da indemnização os montantes alegadamente necessários à realização ou construção de infraestruturas urbanísticas destinadas a servir a parcela expropriada, não considerando a existência, (i) em primeiro lugar, na fixação do índice fundiário e, (ii) em segundo lugar, deduzindo ainda por inteiro ao valor da justa indemnização os montantes que seriam alegadamente necessários à sua execução (€ 65.000,00)” (fls. 731 e 732).
Posto isto, cumpre apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
2. O recurso foi admitido por despacho do Relator junto do tribunal “a quo”, proferido em 27 de março de 2012 (fls. 735). Porém, por força do n.º 1 do artigo 76º da LTC, essa decisão não vincula o Tribunal Constitucional, conforme resulta do n.º 3 do mesmo preceito legal, pelo que deve começar-se por apreciar se estão preenchidos todos os pressupostos de admissibilidade do recurso previstos nos artigos 75º-A e 76º, nº 2, da LTC.
Se o Relator verificar que algum, ou alguns deles, não foram preenchidos, pode proferir decisão sumária de não conhecimento, conforme resulta do n.º 1 do artigo 78º-A da LTC.
3. Deve começar por frisar-se que o modo como a recorrente configurou o recurso de constitucionalidade ora em apreço priva-o de um verdadeiro objeto normativo. Com efeito, nenhuma das duas questões individualizadas no recurso assume qualquer dimensão normativa, antes expressando uma mera discordância face à decisão de fixação do montante expropriatório, que não cabe ao Tribunal Constitucional sindicar. Por si só esta seria razão suficiente para não conhecer do objeto deste recurso.
Além disso, a recorrente não precisa que dimensão e sentido normativo foram atribuídos no douto acórdão, impossibilitando este Tribunal deles conhecer. A Relatora não se teria, todavia, escusado a proceder ao convite de aperfeiçoamento do recurso, nos termos do n.º 6 do artigo 75º-A da LTC, de modo a permitir que a recorrente viesse explicitar que dimensão e sentido normativos seriam esses. Porém, no caso concretamente em apreço nos autos, tal convite seria processualmente inútil, porque sempre subsistiriam outros fundamentos que obstariam ao conhecimento do objeto do recurso.
4. Com efeito, a interposição de um recurso ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC implica que cabia à recorrente ter suscitado, prévia e adequadamente, perante o tribunal recorrido as questões de inconstitucionalidade normativa que pretende agora ver apreciadas pelo Tribunal Constitucional. É precisamente isso que determina o artigo 72º, n.º 2, da LTC. Ora, a recorrente nunca colocou qualquer questão de efetiva inconstitucionalidade normativa, de modo a que o tribunal recorrido pudesse decidi-la. Se atentarmos nas conclusões das alegações de recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, verificamos que apenas foi dito:
“4ª. Os valores fixados na douta sentença recorrida violam frontalmente os princípios da igualdade e da justa indemnização, constitucionalmente consagrados (v. arts. 13º e 62º da CRP), bem como o disposto nos arts. 25º e 26º/2 do CE 91” (fls. 681);
“9ª. A aliás douta sentença recorrida, ao classificar a parcela expropriada como solo apto para outros fins, enferma de manifestos erros de julgamento e violou frontalmente os princípios da igualdade e da justa indemnização, constitucionalmente consagrados (v. arts. 13º e 62º da CRP), bem como o disposto nos arts. 1º, 22º, 23º, 24º, 25º, 26º e 27º do CE 91” (fls. 683 e 684);
“11ª. Os custos unitários de construção considerados na douta sentença recorrida violam clara e frontalmente o disposto nos arts. 13º e 62º da CRP, pelo que o valor de construção atendível (…) deverá ser fixado in casu, pelo menos, em € 542,19/m2 para habitações e € 271,09 m2 para as zonas de garagens e arrumos, mesmo considerando os critérios redutores e limitativos da Portaria nº. 1089-E/97, de 31 de outubro;
12ª. A fixação da justa indemnização com base no custo de construção ou em valores administrativamente fixados, com base em critérios sociais, redutores e limitativos, não permite alcançar o valor real e corrente de mercado do bem expropriado, pelo que tal dimensão normativa do art. 25º do CE 91 é claramente inconstitucional (v. arts 13º e 62º da CRP…)” (fls. 684 e 685);
“17ª. A douta sentença recorrida enferma assim de manifestos erros de julgamento, tendo violado frontalmente, além do mais, o disposto nos arts. 2º, 9º, 13º, 62º e 204º da CRP e os arts. 22º a 26º do CE 91” (fls. 686).
Da análise exaustiva destas alegações de recurso, conclui-se que a recorrente nunca invocou qualquer inconstitucionalidade normativa, tendo antes reputado de inconstitucional a própria decisão jurisdicional impugnada, mediante a invocação vaga e genérica de vários preceitos constitucionais. Sucede que tal não basta para que se dê por preenchido o requisito de prévia e adequada suscitação de uma questão de inconstitucionalidade normativa. O Tribunal Constitucional apenas conhece da inconstitucionalidade de “normas jurídicas” (artigo 277º, n.º 1, da CRP), pelo que cabia à recorrente ter especificado qual a concreta interpretação das normas infraconstitucionais por si referida considerava ferida de inconstitucionalidade. Nunca o fez, porém. Limitou-se a colocar em crise a decisão quanto ao montante indemnizatório fixado, alegando que a concreta determinação do valor colocava em causa os princípios da igualdade e da propriedade privada. Ora, como é evidente, tal não consubstancia uma adequada suscitação de qualquer questão de inconstitucionalidade normativa.
Assim sendo, mais não resta do que reiterar a impossibilidade de conhecimento do objeto do presente recurso.
III – DECISÃO
Pelo exposto, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de fevereiro, decide-se não conhecer do objeto do recurso interposto.
Custas devidas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 UC´s para o recorrente, nos termos do n.º 2 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de outubro.»
2. Inconformado com a decisão proferida, a recorrente veio deduzir a seguinte reclamação, cujos termos ora se resumem:
«2. A douta Decisão Sumária em análise considerou que a ora reclamante «não precisa que dimensão e sentido normativo foram atribuídos no douto acórdão», tendo decidido «não conhecer do objeto do recurso interposto».
3. Mas, salvo o devido respeito – e é verdadeiramente muito –, cremos que aquela premissa não é exata e que, pois, o recurso interposto pela ora reclamante não podia deixar de ser admitido, com fundamento nas invocadas inconstitucionalidades.
(…)
5. Contrariamente ao decidido na douta Decisão reclamada, cremos ser manifesto que a ora reclamante suscitou no decurso do processo as referidas questões de inconstitucionalidade, como resulta claro do seguinte:
a) nas conclusões das alegações de apelação para o Tribunal da Relação de Coimbra, de 2011.11.10, invocou expressamente que
* «a fixação da justa indemnização com base no custo de construção ou em valores administrativamente fixados, com base em critérios sociais, redutores e limitativos, não permite alcançar o valor real e corrente de mercado do bem expropriado, pelo que tal dimensão normativa do art. 25º do CE 91 é claramente inconstitucional (v. arts. 13º e 62º da CRP, cfr. Ac. TC n.º 677/2006, de 2006.12.12, www.tribunalconstitucional.pt, Ac. RL de 2011.06.30, Proc. 156/09.7T2AMD.L1, 8ª Secção e Ac. RP de 2011.05.31, Proc. 3774/07.4TBVNG.P1, ambos in www.dgsi.pt)»
** vide conclusão 12.ª; cfr. texto n.ºs 18 e 19;
b) nas mesmas conclusões das alegações de apelação a ora reclamante invocou ainda que:
* «o valor de € 65.000,00, deduzido ao montante expropriativo, além de absolutamente conclusivo e infundamentado (v. art. 342º do C. Civil e arts. 264º, 511º, 513º e 659º do CPC), sempre violaria frontalmente o disposto no art. 25º/4 do CE 91, pois in casu não se demonstrou nem provou a necessidade de tal dedução»
* e bem assim «o disposto nos arts. 13º e 62º da CRP»
** vide conclusão 14.ª; cfr. texto n.ºs. 22 a 24);
6. Assim, conforme resulta de simples leitura de cada uma das conclusões referidas, a ora reclamante invocou expressamente diversas questões de inconstitucionalidade normativa, indicando ainda de forma especificada e em abono das questões suscitadas, anterior decisão deste Venerando Tribunal que, em situação semelhante, em sede de fiscalização concreta de constitucionalidade, julgou inconstitucional «a norma do n.º 2 do artigo 25.º do Código das Expropriações de 1991, interpretada no sentido de equiparar ao custo da construção o valor da construção, relevante para se determinar o valor do solo apto para a construção»
* Ac. TC n.º. 677/2006, de 12.12.2006.
todavia:
7. Por um lado, no douto acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra ora recorrido, apesar de se considerar que «o M.º Juiz deveria ter aderido integralmente ao relatório maioritário, definindo o valor médio da construção existente ou a construir no local e rejeitando a proposta do perito da entidade expropriante»,
a verdade é que fixou a indemnização com base no custo de construção, pois decidiu expressamente «ser o valor da construção determinado a partir do seu custo» (sic – v. fls. 33 do acórdão).
8. Por outro lado, o douto acórdão recorrido decidiu expressamente aceitar o valor fixado na sentença de 1ª instância, na qual foram consideradas deduções dos «custos adicionais com a bombagem de esgotos e com a realização de infraestruturas (…) nos termos do nº 4 do artigo 25º» do CE91 (sic – v. fls. 31 do acórdão).
Assim sendo, como é:
9. Temos de concluir que a ora reclamante invocou no presente processo as referidas questões de inconstitucionalidade que foram expressamente alegadas nos n.ºs 18., 19. e 22. a 24. do texto e nas conclusões 12.ª e 14.ª das alegações de apelação, apresentadas no Tribunal da Relação de Coimbra, inscrevendo-se assim na sua esfera de «competência vinculada»
* vide Ac. TC n.º 162/92, de 06.05.1992, Proc. 241/91 (Cons. Messias Bento) in www.tribunalconstitucional.pt).
10. Acresce que, a propósito do requisito da aplicação efetiva da norma julgada inconstitucional, este Venerando Tribunal Constitucional tem pacifica e uniformemente entendido que «há aplicação da norma para efeitos da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82 não só nos casos de aplicação expressa, como também nos casos da aplicação implícita»
* vide Ac. TC n.º 406/87, de 07.10.1987, Proc. 82/87, in www.dgsi.pt;
* cfr., Acs. TC n.º 9/06, de 05.01.2006, Proc. 480/05; n.º 454/03, de 14.10.2003, Proc. 458/03; n.º 445/99, de 08.07.1999, Proc. 37/99; n.º 11/99, de 12.01.1999, Proc. 271/97; n.º 1081/96, de 23.10.1996, Proc. 438/96; n.º 226/94, de 08.03.1994, Proc. 47/93; 160/91, de 4 de abril, Proc. 720/00; 47/90, de 21 de fevereiro, Proc. 87/89, todos in www.tribunalconstitucional.pt;
* Acs. TC n.º 721/97, de 23.12.1997, Proc. 392/97; n.º 637/96, de 07.05.1996, Proc. 252/95; n.º 234/96, de 29.02.1996, Proc. 178/95; n.º 33/96, de 17.01.1996, Proc. 789/92; n.º 235/93, de 13.03.1993, Proc. 611/92; n.º 69/92, de 24.02.1992, Proc. 219/91; n.º 20/91, de 05.02.1991, Proc. 203/90; n.º 207/86, de 12.06.1986, Proc. 95/86; n.º 158/86, de 14.05.1986, Proc. 31/86; n.º 88/86, de 19.03.1986, Proc. 171/89; n.º 112/85, de 02.07.1985, Proc. 179/84, todos in www.dgsi.pt).
11. E, conforme tem decidido este Venerando Tribunal, verifica-se aplicação normativa implícita sempre que:
a) o Tribunal a quo possa e deva conhecer da questão de constitucionalidade invocada durante o processo
* vide Acs. TC n.º 318/90, de 12.12.1990, Proc. 291/89 (Cons. Alves Correia), in www.tribunalconstitucional.pt; n.º 176/88, de 14.07.1988, Proc. 310/87 (Cons. Cardoso da Costa), in www.dgsi.pt)
b) a sentença, pese embora não fazer qualquer alusão à norma, não poderia deixar de a ter aplicado, já que não poderia ter logicamente decidido ou decidido de uma determinada maneira, sem proceder à sua convocação como fundamento da decisão
* vide Acs. TC n.º 466/91, de 17.12.1991, Proc. 160/91 (Cons. Ribeiro Mendes), in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 20.º vol., p.p. 605 e segs; n.º 451/89, de 21.06.1989, Proc. 287/87 (Cons. Nunes de Almeida), in www.dgsi.pt; cfr. Blanco de Morais, Justiça Constitucional, 2005, II/702.
c) a aplicação da norma se deduza necessariamente da decisão recorrida ou é «extraível de um raciocínio lógico utilizado na decisão»
* vide Ac. TC n.º 9/06, de 05.01.2006, Proc. 480/05 (Cons. Maria dos Prazeres Beleza), in www.tribunalconstitucional.pt ; e, na segunda alternativa, Ac. TC n.º 231/91, de 23.05.1991, Proc. 164/91 (Cons. Bravo Serra), in www.dgsi.pt).
pois bem:
12. No caso sub iudice é manifesto que sempre teria ocorrido aplicação implícita das normas em causa:
12.1. Em primeiro lugar, a Relação de Coimbra podia e devia conhecer das questões de constitucionalidade, já que as mesmas foram expressamente suscitadas ao longo do presente processo, conforme se demonstrou, inscrevendo-se assim na sua esfera de “competência vinculada”
* vide Ac. TC n.º 162/92, de 06.05.1992, Proc. 241/91 (Cons. Messias Bento), in www.tribunalconstitucional.pt).
12.2. Em segundo lugar, o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra recorrido, não obstante, pronunciou-se sobre a questão do custo da construção, mantendo a aplicação de normas reputadas e invocadas de inconstitucionais, na sequência do entendimento do Tribunal Judicial da Guarda.
* Registe-se que nesta linha já decidiu este Venerando Tribunal Constitucional – sendo hoje jurisprudência uniforme – o seguinte:
** «Porque a questão de constitucionalidade se prende diretamente com o objeto do recurso interposto – o seu julgamento acha-se dependente do próprio âmbito de cognição daquele tribunal – tem de considerar-se que no acórdão recorrido se fez aplicação implícita das normas cuja constitucionalidade se havia anteriormente suscitado»
(Ac. TC n.º 637/96 de 07.05.1996, Proc. 252/95 (Cons. Monteiro Diniz), in www.tribunalconstitucional.pt).
finalmente:
13. Sempre ressalvado o maior respeito, é de arguir que a interpretação restritiva do art. 70.º-1-b) da LTC, nos termos definidos pela douta Decisão Sumária em análise, sempre constituiria uma restrição, sem qualquer fundamento, ao direito de acesso aos Tribunais da ora reclamante, constitucionalmente consagrado, impossibilitando-a de obter tutela judicial efetiva (contra o que garantem os art.s 20.º e 268.º-4 da CRP), para o que militam razões de fundo que não podem ser esquecidas:
13.1. O artigo 20.º-1 da CRP determina que «A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos».
13.2. A garantia da via judiciária impõe-se, como direito de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, a todas as entidades públicas e privadas (v. art.s 17.º e 18.º-1 da CRP). aí incluídos, naturalmente, os Tribunais, sujeitos que estão à Constituição e à lei (v. art.s 203.º e 204.º da CRP):
* cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, CRP Anotada, 3ª ed., p.p. 161 e segs.; Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, 1988, IV/251 e segs.; Mário de Brito, Acesso ao Direito e aos Tribunais, in 'O Direito', 1995, III – IV/351-353; Carlos Lopes do Rego, Acesso ao Direito e aos Tribunais, in 'Estudos sobre a Jurisprudência do Tribunal Constitucional', 1993, p.p. 45 e segs.;
* Nesta linha, escreveu doutamente Garcia de Enterria: «La jurisprudencia no puede emplearse en crear impedimentos o limitaciones a los derechos fundamentales, y menos aún derecho a la tutela judicial efetiva, de cuyo ejercicio resulta justamente la posibilidad misma de que las decisiones judiciales se produzcan (… ) y lo que es inconstitucional, en efecto, es utilizar los poderes interpretativos y aplicativos de las leyes para crear impedimentos o limitaciones a los derechos fundamentales, y en particular al derecho de libre aseso de los ciudadanos a la justicia para obtener de ella una tutela efetiva a los derechos e intereses legítimos»
(in Revista Española de Derecho Administrativo, n.º 46, pp. 177).
* E o reputado administrativista espanhol refere ainda: «(...) lo esencial es llegar al fondo de los recursos, a lo que deben subordinarse las formalidades procesales, evitando su sustantivización; que las exceciones a la admisión de los recursos son de interpretación, no ya enunciativa o declarativa, sino positivamente restrictiva, en cuanto reglas odiosas por contradecir o limitar ese derecho fundamental y natural; que lo esencial es hacer posible el ejercicio de dicho derecho, para lo cual debe buscarse siempre en toda cuestión disputada sobre la materia la interpretación precisamente más favorable a este efecto»
(citado in Juán María Pemán Gavín, Algunas Manifestaciones del principio «Pro Actione» en la reciente Jurisprudencial del Tribunal Supremo, Revista de Administración Pública, Madrid, n.º 104, p.p. 252).
* O referido ensinamento foi acolhido e já por diversas vezes reiterado pela jurisprudência espanhola, referindo-se que: «la Sala no puede dejar de apuntar la también reciente doctrina jurisprudencial (…) que insiste en la necesidad de mantener que en la materia de los requisitos o presupuestos procesales (inadmisibilidad) los criterios informantes del sistema (...) son los de flexibilidad y apertura con la finalidad de lograr una completa o plena garantía jurisdiccional por parte de todos los litigantes (ya sean personas físicas o jurídicas) y que sólo se logra si el Tribunal da una respuesta adecuada y congruente con la temática planteada sin escudarse en razones formales que en la mayoría de los casos – y por las especialidades del proceso contencioso – suponen auténticas denegaciones de justicia (S. de febrero 1982, Arz. 931, Ponente: Martín Martín)»
(Juán María Pemán Gavín, ob. cit., p.p. 258).
13.3. O entendimento defendido pela ora reclamante é, de resto, o único compatível com o princípio constitucional da tutela jurisdicional efetiva (v. art. 20.º da CRP), e com o princípio da garantia do acesso aos Tribunais (v. art. 20.º da CRP e art. 2.º-2 do CPC), desconsiderando-se a aplicação de critérios contra cives e de formalismos processuais desnecessários e desconformes com o princípio pro actionem.
em suma:
14. É, pois, manifesto que, contrariamente ao decidido na douta Decisão Sumária reclamada, nunca se poderia entender que a ora reclamante «nunca colocou qualquer questão de efetiva inconstitucionalidade normativa».»
3. Notificada para o efeito, a recorrida Câmara Municipal da Guarda veio responder, limitando-se a pugnar pela manutenção da decisão (fls. 782).
Posto isto, importa apreciar e decidir.
II – Fundamentação
4. Em primeiro lugar, importa reiterar que a segunda questão de constitucionalidade suscitada pela recorrente, ora reclamante, não tem verdadeira dimensão normativa, antes incidindo sobre a concreta decisão jurisdicional proferida pelo Tribunal da Relação de Coimbra quanto à fixação do montante indemnizatório. O que a reclamante pretendeu colocar em crise foi o juízo subsuntivo que o tribunal recorrido formulou quanto ao concreto montante indemnizatório, não cabendo ao Tribunal Constitucional imiscuir-se nessa determinação.
5. Já no que diz respeito à primeira questão de constitucionalidade – independentemente da ausência ou não de dimensão normativa – um outro problema se coloca. A decisão recorrida não aplicou a norma com o alcance que a reclamante definiu no requerimento de recurso.
Com efeito, ao contrário do sustentando pela reclamante, a decisão recorrida não se baseou no critério do custo da construção, com resulta claro do seguinte excerto:
“Na tese, que nos parece pacífica, do Ilustre autor citado “Ao referir-se na alínea a) do n.º 1 deste artigo, ao valor da construção, a lei afastou a aplicação do critério do custo da construção a que se reportam os n.ºs 4 a 8 do artigo 26.º deste Código, ao que acresce ser o valor da construção determinado a partir do seu custo atualizado, tendo em conta a respetiva duração, localização e o ambiente envolvente.”
Ou seja, o legislador expressamente afastou a aplicação do fator previsto no n.º 4 do artigo 25.º do C.Exp91 e no n.º 8 do art.º 26.º do C.Exp.99, que têm exatamente a mesma redação: «Se o custo da construção for substancialmente agravado ou diminuído pelas especiais condições do local, o montante do acréscimo ou da diminuição daí resultante é reduzido ou adicionado ao custo da edificação a considerar para efeito da determinação do valor do terreno.»”
Assim sendo, não havendo coincidência entre a norma aplicada pela decisão recorrida e a norma cuja inconstitucionalidade foi invocada, não deve este Tribunal conhecer do objeto do presente recurso.
Em suma, improcede a reclamação deduzida.
6. Por fim, quanto à alegada inconstitucionalidade da “interpretação restritiva do art. 70.º-1-b) da LTC, nos termos definidos pela douta Decisão Sumária em análise, sempre constituiria uma restrição, sem qualquer fundamento, ao direito de acesso aos Tribunais da ora reclamante”, importa notar que o carácter normativo do recurso e a exigência de prévia suscitação decorrem da al. b) do n.º 1 do artigo 280.º da CRP e que o recorrente não foi impedido de aceder ao Tribunal Constitucional. Pelo contrário, não só a sua questão foi apreciada, numa primeira fase, pela Relatora, como agora a decisão por aquela proferida se encontra sob apreciação, por uma conferência composta por três membros deste Tribunal. Daí que o direito de acesso aos tribunais – de que goza a reclamante – nunca esteve em perigo.
III - Decisão
Em face do exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Fixam-se as custas devidas pela reclamante em 20 UC´s, nos termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de outubro.
Lisboa, 18 de dezembro de 2012. – Ana Maria Guerra Martins – Vítor Gomes – Joaquim de Sousa Ribeiro.