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Proc. nº 44/03 TC – 1ª Secção Rel.: Consº Artur Maurício
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 – A reclama do despacho de fls. que não admitiu o recurso interposto para o Tribunal Constitucional ao abrigo do artigo 70º nº 1 alínea b) da LTC.
Na sua reclamação formula as seguintes conclusões:
'No caso vertente o recurso interposto para o Tribunal Constitucional não teve por objecto o despacho do Senhor Conselheiro Relator que não admitiu o recurso para uniformização de jurisprudência mas, outrossim, tal recurso foi interposto no seguimento do Ac. da Conferência que confirmou o despacho do mesmo Senhor Conselheiro Relator de não conhecer do recurso de revista por motivo concernente ao valor da causa.
Dito por outras palavras, a reclamante não pretendeu impugnar mediante recurso de constitucionalidade o despacho do Senhor Relator que não lhe admitiu o recurso para uniformização de jurisprudência mas muito singelamente e uma vez esgotados os recursos ordinários – lembramos que o despacho de não conhecer do recurso de revista havia sido já confirmado em acórdão da conferência – subir o degrau que imediatamente se lhe seguia e recorrer para o Tribunal Constitucional.
Conforme resulta do exposto, no caso sub judice a Recorrente e ora Reclamante esgotou todos os recursos ordinários ao seu dispor;
E mesmo que se entendesse que era ainda possível numa segunda reclamação para a conferência do despacho que não admitiu o recurso para uniformização de jurisprudência, sempre tal reclamação seria inadmissível – por decurso do prazo – pelo que sempre estariam preenchidos os requisitos do nº 4 do artº 70º da Lei do Tribunal Constitucional.
Assim, e porque conforme dispõe o nº 4 do artº 70º da Lei do Tribunal Constitucional, conjugado com o nº 2 do mesmo preceito, entende-se que se acham esgotados todos os recursos ordinários, deverá a presente reclamação ser atendida e, consequentemente, admitido o recurso, sob pena de assim não acontecer, serem violados os mais elementares princípio de direito.'
O Ministério Público emite parecer no sentido do indeferimento da reclamação.
2 – Resulta dos autos:
- A ora reclamante interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação do Porto que negara provimento à apelação de sentença do Tribunal de Trabalho de Oliveira de Azeméis, proferida em acção conta si interposta por B e outros.
- Quer na 1ª instância, quer no recurso para a Relação, a reclamante suscitou a questão da inconstitucionalidade da norma do artigo 6º nº 2 do Decreto-Lei nº 25/89, de 20 de Janeiro, na interpretação dada pelo Acórdão do STJ, de uniformização de jurisprudência, nº 1/2000
- Por despacho do Relator, no STJ, decidiu-se não conhecer do objecto do recurso por razões atinentes ao valor da causa.
- A A reclamou deste despacho para a conferência que, por acórdão de fls. 605 e segs., indeferiu a reclamação.
- Invocando contradição com jurisprudência do STJ, a reclamante recorreu daquele acórdão, ao abrigo do disposto no artigo 732º-A do CPC.
- Por despacho de fls. 625, o recurso não foi admitido.
- Por requerimento de 4/12/02, a reclamante apresentou o seguinte requerimento, encabeçado com os dizeres 'Supremo Tribunal de Justiça' e dirigido ao 'Exmo Sr. Dr. Juiz Conselheiro Relator'
'A ., Recorrente nos autos à margem identificados, notificada da decisão que não admitiu o recurso interposto tempestivamente a fls. 620 e 621 ao abrigo do artº 732º-A do Cód. Proc. Civil vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional com base no disposto na al. b) do nº 1 do artº 70º da Lei do tribunal Constitucional.
Dando seguimento ao disposto no nº 2 do artº 75º-A da mesma lei pretende-se, tal como já foi alegado ao longo do processo, designadamente em 1ª Instância e nas alegações e conclusões dos recursos interpostos para o Tribunal da Relação do Porto e para o Supremo Tribunal de Justiça, que seja considerado inconstitucional – inconstitucionalidade material e orgânica – o disposto no º 2 do artº 6º do Decreto-Lei nº 25/89, de 2o de janeiro, na interpretação que lhe é dada quer pela decisão de 1ª instância, quer pela Acórdão da Relação do Porto que neste ponto a confirmou, por violação do princípio da igualdade consagrado no artº 13º da Constituição e ainda no que concerne a inconstitucionalidade orgânica pela violação dos artºs 56º nº 3 e 165º, nº 1, al. b) , ambos da Constituição da República e bem como decidido nos acórdãos do Tribunal Constitucional nºs 517/98 e 634/98.
........................................................................................................'
- O recurso não foi admitido pelo despacho ora reclamado nos seguintes termos:
'A recorrente A, veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, do despacho do relator de fls. 625, que não admitiu o recurso interposto ao abrigo do artigo 732º-A do Código de Processo Civil, pretendendo-se que seja apreciada a inconstitucionalidade material e orgânica da norma do nº 2 do artigo 6º do Decreto-Lei nº 25/89, de 20 de Janeiro, por pretensa violação dos artigos 13º, 56º, nº 3, e 165º, nº 1 alínea b), da Constituição, questão que teria sido suscitada ao longo do processo, designadamente em 1ª instância e nas alegações dos recursos interpostos para o Tribunal da Relação do Porto e para o Supremo Tribunal de Justiça.
O recurso previsto na alínea b) do nº 1 do citado artigo 70º exige, por um lado, que a decisão recorrida tenha aplicado norma cuja inconstitucionalidade tenha sido suscitada durante o processo e, por outro lado, apenas cabe de decisões que não admitam recurso ordinário (nº 2 do mesmo preceito).
No presente caso, tal recurso não é admissível por duas ordens de razões:
· o despacho em causa não fez aplicação da norma cuja constitucionalidade a recorrente pretende ver apreciada (artº 6º nº 2 do Decreto-Lei nº 25/89: 'os direitos, obrigações e regalias dos trabalhadores que fiquem afectos à A, serão transferidos para as empresas a criar a partir desta sociedade, a partir da data em que sejam constituídas, e conforme a respectiva subordinação'), mas tão-somente a norma do artigo 732º-A do Código de Processo Civil, interpretada no sentido de que o julgamento ampliado do recurso tem de ser determinado (e consequentemente requerido) antes de proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça o acórdão a decidir o recurso, não existindo actualmente recurso dos acórdãos proferidos pelas secções deste Supremo Tribunal para qualquer formação alargada;
· do despacho em causa cabia reclamação para a conferência, que é expressamente equiparada a 'recurso ordinário' (nº 3 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional). Pelas razões expostas, não admito o recurso interposto para o Tribunal Constitucional.'
3 - A presente reclamação (do despacho que acabou de se transcrever) assenta basicamente num ponto: o erro do despacho reclamado ao pressupor que a decisão recorrida para o Tribunal Constitucional era o despacho nele referido (despacho que não admitiu o recurso para julgamento ampliado) quando a decisão impugnada era o acórdão da Relação do Porto, anteriormente proferido, de que a reclamante recorrera para o STJ, recurso de que se não conhecera por razões atinentes ao valor da causa; o recurso interposto para o Tribunal Constitucional deveria, assim, ser admitido, uma vez que os recursos ordinários estavam esgotados e não ser possível reclamar para a conferência do despacho referido na decisão reclamada
Não se suscitam quaisquer dúvidas de que o despacho ora reclamado não admitiu o recurso interposto para o Tribunal Constitucional considerando que ele tinha como objecto o despacho de fls. 625; e também é incontroverso que este se não pronunciara (não aplicara) a norma cuja constitucionalidade a reclamante pretendia ver apreciada pelo Tribunal Constitucional, o que constitui razão bastante para não ser admitido o recurso interposto ao abrigo do artigo 70º nº 1 alínea b) da LTC. E a verdade é que no despacho reclamado não se poderia supor que o recurso de constitucionalidade tinha como objecto o aludido acórdão da Relação do Porto. Com efeito, como se deixou transcrito, impendia sobre a reclamante o ónus de, no requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, especificar de que decisão recorria; não o cumprindo, a reclamante sujeitou-se a que aquele requerimento fosse interpretado como de facto o foi. Por outro lado, e decisivamente, uma razão impunha que o despacho fizesse aquela interpretação. É que o requerimento de interposição de recurso vinha endereçado ao Juiz Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça, quando, a ser intenção da reclamante recorrer do acórdão da Relação do Porto, ele deveria ter sido endereçado ao relator deste acórdão, muito embora – e por os autos se encontrarem no STJ – o pudesse apresentar neste Tribunal. Em suma, a reclamante só de si se pode queixar, pois, dado o seu procedimento processual, compreende-se que o despacho se tenha pronunciado sobre a admissibilidade do recurso de constitucionalidade supondo que o objecto da impugnação era o despacho de fls. 625; e, como diz o Magistrado do Ministério Público no seu parecer, não é 'obviamente possível que, no âmbito da presente reclamação, se pretenda 'transmutar' tal recurso, em termos de passar a visar a impugnação de precedentes decisões das instâncias'. Ora, como se disse e a reclamante não o contesta, o despacho que se supôs recorrido não fez aplicação da norma cuja constitucionalidade a reclamante pretendia ver apreciada pelo Tribunal Constitucional, pelo que o recurso não podia ser admitido – como não foi – nos termos do artigo 70º nº 1 alínea b) da LTC.
4 – Decisão: Pelo exposto e em conclusão, decide-se indeferir a reclamação. Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 Ucs. Lisboa, 19 de Fevereiro de 2003 Artur Maurício Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa