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Proc. nº 25/03
3ª Secção Relator: Cons. Gil Galvão
Acordam, em Conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório
1. Por decisão do Tribunal Judicial da Comarca de Valença foi o ora recorrente, A, condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelos artigos 21º, nº1 e 24º, als. b) e c), do Decreto-Lei nº 15/93, de
22 de Janeiro, com referência às tabelas IA e IB anexas, na pena de 8 anos de prisão.
2. Inconformado com esta decisão o arguido recorreu para o Tribunal da Relação do Porto que, por acórdão de 5 de Junho de 2002 (fls. 2703 a 2738), negou provimento ao recurso.
3. Novamente inconformado o arguido recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça que, por acórdão de 27 de Novembro de 2002 (fls. 2793 a 2807), julgou o recurso improcedente.
4. Desta decisão foi interposto, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do art. 70º da LTC, recurso de constitucionalidade, através de um requerimento com o seguinte teor:
'A, arguido/recorrente nos autos à margem referenciados, tendo sido notificado do teor do douto acórdão que negou provimento ao seu recurso, dele pretende interpor recurso para o Tribunal Constitucional ao abrigo da alínea b) do nº 1, do artigo 75º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual redacção. Pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade da interpretação dada pelo Colendo Supremo Tribunal de Justiça ao nº 5 do art. 32º da CRP, que consagra o princípio do contraditório, bem como ao nº 1, do mesmo art. 32º, que consagra o princípio de que ao arguido são asseguradas todas as garantias de defesa. In casu, o Colendo Supremo Tribunal a quo, considerou ser admissível e legal a prova alicerçada no que dois agentes da autoridade terão ouvido dizer a dois indivíduos superficialmente apelidados de Tone Segundo e Jaime Dezoito – que não foram ouvidos em qualquer fase do processo – tendo, igualmente, aquele Colendo Supremo Tribunal considerado válido e legítimo o entendimento de que o teor do depoimento de testemunhas ajuramentadas pode ser «corrigido» pelo tribunal, sem que às mesmas tenha sido instaurado qualquer procedimento criminal por falsas declarações. A inconstitucionalidade atrás referida, foi suscitada nas alegações e nas conclusões do recurso interposto para o Colendo Supremo Tribunal'.
5. Na sequência, foi proferida pelo Relator do processo neste Tribunal, ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decisão sumária no sentido do não conhecimento do objecto do recurso (fls. 2816 a 2818).
É o seguinte, na parte decisória, o seu teor:
'Ora, como vai sumariamente ver-se, é manifesto que não pode conhecer-se do objecto do recurso. Nos termos do do artigo 75º-A, nº 1, da Lei do Tribunal Constitucional, o recorrente deve, logo no requerimento de interposição do recurso, indicar a norma cuja constitucionalidade pretende ver apreciada. Ora, sobre este ponto, refere o recorrente naquele requerimento pretender ver apreciada a
'inconstitucionalidade da interpretação dada pelo Colendo Supremo Tribunal de Justiça ao nº 5 do art. 32º da CRP, que consagra o princípio do contraditório, bem como ao nº 1, do mesmo art. 32º, que consagra o princípio de que ao arguido são asseguradas todas as garantias de defesa'. Mas, como é por demais evidente, o recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade não tem por objecto a fiscalização da compatibilidade com a Constituição de normas constitucionais, mas a fiscalização da constitucionalidade de normas infraconstitucionais. Nestes termos, e sem necessidade de maiores considerações, torna-se evidente que não pode conhecer-se do objecto do recurso que o recorrente pretendeu interpor'.
6. Inconformado com esta decisão o recorrente apresentou, ao abrigo do disposto no art. 78º-A, nº 3 da LTC, a presente reclamação para a Conferência (fls. 2828 a 2832), alegando, em síntese e para o que agora interessa, que:
'(...)
04 – (...) quer o Colendo Supremo Tribunal, quer o Ex.mo Senhor Conselheiro Relator, não deram cumprimento ao estipulado nos nºs 5 e 6 do art. 75º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro.
05 – Com efeito, salvo sempre o devido respeito por opinião contrária, se é um facto que o recorrente não procedeu à indicação das normas infraconstitucionais, cuja interpretação feita pelo Colendo Supremo Tribunal de Justiça considera ter violado os nºs 1 e 5 do art. 32º da Constituição, também o é que os nºs 5 e 6 do art. 75º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, consagram a prolação de um despacho de convite ao aperfeiçoamento quando tal não acontece.
(...)
07 – In casu, o lapso do recorrente foi manifesto, sendo que, da leitura do requerimento da interposição de recurso – nomeadamente da sua fundamentação fáctica – resulta claro que o recorrente pretendia colocar em crise a constitucionalidade da interpretação dada pelo Colendo Supremo Tribunal de Justiça a diversas normas do Cód. Proc. Penal.
(...)'.
7. O Representante do Ministério Público, notificado da presente reclamação, veio responder-lhe no seguintes termos:
'1º - A presente reclamação é manifestamente infundada.
2º - Na verdade, face ao teor do requerimento de interposição do recurso, não se justificava minimamente a prolação de um convite ao aperfeiçoamento, já que dele não constava qualquer deficiência ou omissão na delimitação das normas que integram o objecto do recurso.
3º - O objecto do recurso era, bem pelo contrário, erroneamente delimitado, com referência à interpretação de normas da Lei Fundamental – traduzindo tal definição do recurso uma evidente e manifesta inidoneidade, já que os poderes cognitivos deste Tribunal apenas se exercem a propósito do confronto com a Constituição de normas de direito infraconstitucional'.
Dispensados os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
III – Fundamentação
8. Contesta o reclamante, fundamentalmente, que, antes da prolação da decisão reclamada, não tenha sido proferido o convite ao aperfeiçoamento do requerimento de interposição do recurso a que se referem os nºs 5 e 6 do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional. A verdade, porém, é que não tinha de sê-lo. Efectivamente, nos termos do nº 5 daquele artigo 75º-A, apenas é de proferir convite ao aperfeiçoamento do requerimento de interposição do recurso quando o mesmo 'não indique algum dos elementos previstos no presente artigo'. Ora, in casu, verifica-se que do requerimento de interposição do recurso consta a indicação de todos os elementos exigidos pelos n.ºs 1 e 2 do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional, designadamente a indicação da norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade se pretende que o Tribunal aprecie. Nesse sentido pode ler-se naquele requerimento: 'Pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade da interpretação dada pelo Colendo Supremo Tribunal de Justiça ao n.º 5 do art. 32º da CRP, que consagra o princípio do contraditório, bem como ao n.º 1, do mesmo art. 32º, que consagra o princípio de que ao arguido são asseguradas todas as garantias de defesa'. Dessa forma, o problema não é - como, bem, evidencia o Ministério Público - de omissão ou deficiente indicação de um dos elementos previstos no artigo 75º-A, designadamente o que se refere ao objecto do recurso, a justificar um despacho de aperfeiçoamento, mas de inidoneidade do objecto efectivamente indicado. III - Decisão Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do objecto do recurso. Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em quinze unidades de conta Lisboa, 18 de Fevereiro de 2003- Gil Galvão Bravo Serra Luís Nunes de Almeida