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Processo n.º 543/12
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente, entre outros, A. e são recorridos o Ministério Público, B., C. e D., foi interposto recurso de constitucionalidade, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC).
2. Pela Decisão Sumária n.º 367/2012, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto. Tal decisão tem a seguinte fundamentação:
«Com a interposição do recurso de constitucionalidade do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de junho de 2012, a recorrente A. pretende a apreciação da inconstitucionalidade da decisão recorrida, por violação dos artigos 32.º, 20.º, n.º 1, e 205.º da Constituição. Segundo a recorrente, o Supremo Tribunal de Justiça, ao rejeitar a aclaração, violou estas disposições constitucionais, no que concerne à fundamentação das decisões dos tribunais.
Sucede, porém, que, segundo o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º da Constituição da República Portuguesa e na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, “identificando-se assim, o conceito de norma jurídica como elemento definidor do objeto do recurso de constitucionalidade, pelo que apenas as normas e não já as decisões judiciais podem constituir objeto de tal recurso” (cf. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 361/98, disponível em www.tribunalconstitucional.pt). Não pode, por isso, tomar-se conhecimento do objeto do recurso interposto, justificando-se a prolação da presente decisão (artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC).
É certo que a recorrente acaba por concluir que deverá ser declarada a inconstitucionalidade do artigo 434.º, quando interpretado no sentido de que o STJ só poderá conhecer o reexame de matéria de Direito, como causa para não fundamentar qualquer indeferimento de pedido de aclaração. Só que, ainda que se entenda que a recorrente está a requerer a apreciação de uma norma, o que é facto é que ela não foi aplicada pela decisão recorrida como razão de decidir. O que também obsta ao conhecimento do objeto do recurso, por não se poder dar como verificado um dos requisitos do recurso interposto – a aplicação pelo tribunal recorrido, como ratio decidendi, da norma cuja apreciação é requerida (artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC).
Com efeito, no acórdão de 20 de junho de 2012, o Supremo Tribunal de Justiça, porque estava a conhecer de um pedido de aclaração e uma arguição de nulidade aplicou, como razão de decidir, normas atinentes a estes incidentes pós-decisórios. De resto, atento o teor do artigo 434.º do Código de Processo Penal, relativo aos poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça, é manifesto que esta disposição legal não comporta sequer a interpretação identificada pela recorrente. Face ao teor do requerimento apresentado pela recorrente, o tribunal recorrido convocou aquele artigo com o objetivo estrito de afirmar que o acórdão aclarando, cuja nulidade também era arguida, reexaminou apenas matéria de direito, para daí concluir que o requerido se mostrava desprovido de qualquer fundamento».
3. Da decisão sumária vem agora a recorrente A. reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC, através de requerimento onde se pode ler o seguinte:
«A., tendo sido notificada da decisão sumária do recurso por si interposto vem mui respeitosamente reclamar da mesma para a conferência, ao abrigo do disposto n.º 3 do art.º 78-A da LTC (redação da Lei n.º 13-A/98, de 26 de fevereiro)».
4. Notificada a reclamação, respondeu apenas o Ministério Público, o que fez nos seguintes termos:
«3º
Considerou a Ilustre Conselheira deste Tribunal Constitucional, na Decisão Sumária 367/12, ora reclamada (cfr. fls. 26124-26126 dos autos), como fundamento da decisão de não conhecimento do objeto do recurso interposto pela arguida, que esta, desde logo, recorreu da decisão judicial, em si, do Supremo Tribunal de Justiça e não de uma norma jurídica propriamente dita, o que impediria o conhecimento do seu recurso.
Por outro lado, entendeu também, a Ilustre Conselheira Relatora, que a norma invocada – o art. 434º do Código de Processo Penal – não integrou a ratio decidendi do Acórdão recorrido, para além de não poder comportar, sequer, a interpretação identificada pela arguida.
Ora, tal justificação afigura-se admissível, em face dos dados constantes dos autos.
4º
No seu requerimento (cfr. fls. 26155 dos autos), a Ré limita-se a manifestar o seu desejo de reclamar para a conferência, ao abrigo do art. 78º-A, nº 3 da LTC, da Decisão Sumária 367/12, ora reclamada, sem apresentar, porém, nenhuma fundamentação em abono da sua posição.
Não contesta, pois, nenhum dos fundamentos apresentados pela Ilustre Conselheira Relatora, para justificar a decisão de não apreciar o objeto do seu recurso.
5º
Por esse motivo, crê-se que a reclamação para a conferência, em apreciação, não merece provimento, não havendo razões para alterar o sentido da Decisão Sumária 367/12, que determinou a sua apresentação».
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
A decisão reclamada conclui no sentido do não conhecimento do objeto do recurso de constitucionalidade interposto.
Na medida em que se pretende ver apreciada a inconstitucionalidade da decisão recorrida (o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de junho de 2012), por violação do artigo 32.º, 20.º, n.º 1, e 205.º da Constituição da República Portuguesa, o Tribunal não pode tomar conhecimento do objeto do recurso, uma vez que só as normas e não as decisões judiciais podem constituir objeto do recurso de constitucionalidade interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.
Por outro lado, ainda que a recorrente pretenda a apreciação do artigo 434.º do Código de Processo Penal, quando interpretado no sentido de que o Supremo Tribunal de Justiça só poderá conhecer o reexame de matéria de Direito, como causa para não fundamentar qualquer indeferimento de pedido de aclaração, entendendo-se que este enunciado corresponde à indicação de uma norma, é de concluir também pelo não conhecimento do objeto do recurso interposto, por não se poder dar como verificado um dos seus requisitos – a aplicação pelo tribunal recorrido, como ratio decidendi, da norma cuja apreciação foi requerida a este Tribunal (artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC). Atendendo ao que importava apreciar e decidir no acórdão de 20 de junho de 2012, o Supremo Tribunal de Justiça aplicou, como razão de decidir, normas que têm a ver com a aclaração de decisões judiciais e com a arguição de nulidade das mesmas. Face ao teor do requerido e aos poderes de cognição do tribunal de recurso (artigo 434.º do Código de Processo Penal), o Supremo Tribunal de Justiça entendeu que o pedido de aclaração e a arguição de nulidade apresentados se mostravam desprovidos de qualquer fundamento, o que acarretou o indeferimento dos mesmos.
A reclamante em nada contraria esta fundamentação, a qual é de reiterar. É de confirmar, por isso, a decisão reclamada.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão reclamada.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta.
Lisboa, 25 de setembro de 2012.- Maria João Antunes – Maria de Fátima Mata-Mouros – Rui Manuel Moura Ramos.