Imprimir acórdão
Proc. n.º 322/03 TC - 1ª Secção Rel.: Consº Artur Maurício
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 - A. e outros, identificados nos autos, reclamam por nulidade e pedem a reforma do Acórdão n.º 297/03, dizendo em síntese que:
- o acórdão não tomou em consideração a reapreciação da prisão preventiva dos arguidos efectuada pela Juíza B. bem como do despacho a ordenar declarações para memória futura e da tomada, em si, dessas mesmas declarações;
- tal constitui omissão do acórdão (falta de pronúncia sobre aquela segunda questão) e manifesto lapso (por não se ter considerado o facto da mesma Juíza ter reapreciado os pressupostos da prisão preventiva, mantendo-a), 'o que, só por si, implica, necessariamente, uma decisão diversa da proferida no acórdão reformando'.
O Exmo Magistrado do Ministério Público pronuncia-se no sentido da manifesta improcedência do requerido, entendendo que se trata de uma 'manobra dilatória para protelar artificiosamente o termo do presente recurso de constitucionalidade e o normal prosseguimento dos autos no tribunal 'a quo'.
Cumpre decidir.
2- O que vem requerido assenta num equívoco grosseiro sobre os poderes de cognição do Tribunal Constitucional em matéria de fiscalização concreta de constitucionalidade.
Com efeito, sendo o recurso de constitucionalidade um meio impugnatório que visa apreciar a constitucionalidade de normas (ou de uma sua interpretação) aplicadas nas decisões recorridas, está fora dos poderes de cognição do Tribunal Constitucional sindicar o decidido, noutras vertentes, designadamente, os elementos de facto que nele se consideram como relevantes para se formular a solução de direito.
A interpretação normativa feita na decisão recorrida e que delimita o âmbito do recurso de constitucionalidade resulta, frequentemente, dos pressupostos fácticos que a decisão acolhe e sobre os quais se constrói o juízo de direito.
Ora se o Tribunal Constitucional sindica - e só - tal interpretação, há-de necessariamente tomar como um dado esses mesmos pressupostos, sem que lhe seja, pois, permitido, ponderar outros que considere relevantes; de outro modo, não seria já ajuizada sub specie constitucionis a norma , tal como ela fora aplicada
(ou recusada) na decisão impugnada, mas uma outra que resultaria da ponderação desses novos elementos.
No caso, isto significou, como se deixou claramente exposto na parte do acórdão em causa em que se delimitou o objecto do recurso, que a norma (ou a sua interpretação) em apreço, que o Tribunal da Relação de Lisboa recusou por suposta inconstitucionalidade, se recortava de acordo com o que aquele Tribunal entendera como relevante para formular o seu juízo de inconstitucionalidade - o decretamento da prisão preventiva, o primeiro interrogatório dos arguidos e a autorização de uma busca.
E a verdade é que, não obstante a parte decisória do acórdão recorrido se ter limitado a ponderar, na intervenção da Juíza B., a realização do primeiro interrogatório dos arguidos e a assinatura de mandados de busca, o Tribunal Constitucional, numa perspectiva mais favorável para os recorridos, admitiu, ainda, por constar da parte inicial do acórdão, quando nela se concretizou o que resultava dos autos, o decretamento da prisão preventiva.
Mas já lhe estava de todo vedado ponderar circunstâncias como a audição para memória futura e a manutenção da prisão preventiva, que o acórdão recorrido omitira e que, portanto, não haviam sido considerados para efeitos do juízo de inconstitucionalidade formulado.
É, assim, manifesto que o Tribunal não omitiu pronúncia pois não tinha que se pronunciar sobre tal questão.
De igual modo, não se verifica qualquer lapso manifesto no Acórdão n.º 297/03 que justifique a sua reforma nos termos do artigo 669º n.º 2 do CPC uma vez que o Tribunal não podia ponderar circunstâncias que, para a decisão recorrida, não relevaram para recusar a aplicação do disposto no artigo 40º do Código de Processo Penal.
3 - Decisão:
Pelo exposto e em conclusão, decide-se desatender a arguição de nulidade e indeferir o pedido de reforma deduzidos pelos recorridos.
Custas pelos requerentes, fixando-se a taxa de justiça em 10 Ucs, por cada um dos requerentes.
Lisboa, 2 de Julho de 2003
Artur Maurício Maria Helena Brito Carlos Pamplona de Oliveira Rui Manuel Moura Ramos Luís Nunes de Almeida