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Processo nº 80/2001 Conselheiro Messias Bento
Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
Recorrente(s): J... Recorrido(s): Director da Caixa Geral de Aposentações
I. Relatório:
1. O presente recurso foi interposto do acórdão do Tribunal Central Administrativo, de 18 de Janeiro de 2001, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, 'visando a apreciação da inconstitucionalidade do artigo 7º-A do Decreto-Lei nº 110-A/81, de 14 de Maio, e do nº 4 da Portaria nº 54/91, de 19 de Janeiro, na interpretação que deles foi feita pelo douto acórdão recorrido, no sentido de que apenas contêm duas medidas pontuais de correcção de pensões de aposentação, reportando-se ademais a segunda aos montantes de pensões fixados dez anos antes'.
O recorrente, em resposta ao convite que lhe foi feito nesse sentido, veio dizer que suscitou a inconstitucionalidade no artigo 32º da alegação apresentada no Tribunal Central Administrativo e na respectiva conclusão h).
O relator, por entender não poder conhecer-se do recurso, por falta de verificação dos respectivos pressupostos - que são, entre outros, ter o recorrente suscitado, durante o processo, de forma processualmente adequada, a inconstitucionalidade de determinada norma jurídica ou de uma sua interpretação
[cf. artigos 70º, nº 1, alínea b), e 72º, nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional] e haver tal norma ou interpretação sido aplicada como ratio decidendi pela decisão recorrida -, proferiu decisão sumária nesse sentido.
O recorrente reclama, agora, para a conferência da decisão sumária de não conhecimento do recurso, dizendo, em síntese, que o entendimento do artigo 72º, nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional, no sentido de que a questão de constitucionalidade não foi suscitada de modo processualmente adequado, é injustificadamente rigorista.
O RECORRIDO não respondeu.
2. Cumpre decidir.
II. Fundamentos:
3. O recorrente pretende que este Tribunal aprecie a constitucionalidade de determinada interpretação do artigo 7º-A do Decreto-Lei nº 110-A/81, de 14 de Maio, e do nº 4 da Portaria nº 54/91, de 19 de Janeiro.
Na decisão sumária reclamada, escreveu-se o seguinte: Claro é que só pode falar-se numa interpretação de determinado normativo legal, quando se esteja perante um sentido susceptível de ser referido a esse normativo, pois toda a interpretação tem que ter 'um mínimo de correspondência verbal' na letra da lei (cf. artigo 9º, nº 2, do Código Civil). Para abrir a via do recurso de constitucionalidade, não chega, pois, falar em interpretação e apresentar como tal um qualquer enunciado, dizendo-o extraído de determinado preceito legal. Preciso é que esse enunciado seja, de facto, uma dimensão normativa possível do dispositivo legal em causa. Pois bem: o que o recorrente enuncia como sendo o sentido que o acórdão recorrido extraiu, por via interpretativa, do artigo 7º-A do Decreto-Lei nº
110-A/81, de 14 de Maio (aditado pelo Decreto-Lei nº 245/81, de 24 de Agosto) e do nº 4 da Portaria nº 54/91, de 19 de Janeiro – sentido que, por isso, ele quer submeter ao julgamento deste Tribunal – não é uma interpretação de tais normativos. O dito enunciado corresponde, quando muito (e, ainda assim, na visão do recorrente) ao modo como o acórdão terá aplicado os referidos normativos no julgamento do caso ou, talvez melhor, ao resultado dessa aplicação. Basta atentar no teor dos mencionados preceitos para se ver que assim é. De facto, o dito artigo 7º-A, no seu nº 1, alínea a), dispõe que as pensões de aposentação, de reforma e de invalidez são 'determinadas, com efeitos a partir de 1 de Setembro de 1981, por forma a que: a). os vencimentos a ter em conta no cálculo das pensões [...] sejam de montante igual a 76,5% dos vencimentos das categorias correspondentes do activo fixados nos termos do presente diploma'; e, no nº 2, acrescenta que 'o processo de cálculo estabelecido no número anterior será aplicado às pensões aumentadas nos termos do artigo 7º, não podendo, em qualquer caso, resultar dessa aplicação redução dos montantes percebidos'. De sua parte, o nº 4 da Portaria nº 54/91 aumentou para 92% 'a percentagem de actualização das pensões que foram abrangidas pela alínea a) do nº 1 do artigo
7º-A do Decreto-Lei nº 110-A/81, de 14 de Maio, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 245/81, de 24 de Agosto, com referência aos vencimentos em vigor naquela data'. Mas, se acaso, no enunciado que o recorrente apresenta como sendo o sentido que o acórdão recorrido extraiu dos referidos normativos, ainda se pudesse ver uma interpretação dos mesmos, a verdade é que, nessa dimensão, a sua constitucionalidade não foi por ele questionada perante o tribunal recorrido. Não o foi, ao menos de modo processualmente adequado, como exige o artigo 72º, nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional. Na verdade, na alegação então apresentada, o recorrente – depois de, no artigo
32º, dizer que julgava 'inadmissível o resultado interpretativo a que se chegou na sentença em apreço, nomeadamente na sua aferição com os princípios constitucionais a que está vinculada'(os princípios da igualdade de tratamento e da justiça), mas sem enunciar esse resultado interpretativo e sem o imputar ao artigo 7º-A, nem ao nº 4; e depois também de apontar o modo como, em seu entender, deviam ser interpretados os referidos artigos 7º-A e nº 4 [cf. as conclusões a) a g)] – disse:
'Decidindo em sentido diverso, a douta sentença recorrida incorreu em errada interpretação desses preceitos legais, com o consequente vício de violação de lei, interpretação essa que ademais ofende os princípios constitucionais da igualdade de tratamento e da justiça' [cf. a conclusão h)]. Significa isto que, no tocante à questão de inconstitucionalidade, o recorrente, falando numa interpretação que nem sequer enunciou, utilizou uma fórmula passe-partout, que é processualmente inadequada para servir como suscitação da inconstitucionalidade de determinada dimensão normativa dos preceitos que estavam em causa.
4. A decisão sumária reclamada não merece censura, pois os fundamentos por que nela se chegou ao não conhecimento do recurso em nada foram abalados pelo discurso argumentativo da reclamação apresentada.
Pode, pois, dizer-se, desde logo, que o sentido, que o recorrente apresenta como tendo sido extraído, por via interpretativa, do artigo 7º-A do Decreto-Lei nº
110-A/81, de 14 de Maio, e do nº 4 da Portaria nº 54/91, de 19 de Janeiro, não é um sentido susceptível de ser referido a tais normativos. E que, se, acaso, nesse sentido ainda puder ver-se uma interpretação desses normativos, o recorrente não suscitou a inconstitucionalidade deles, nessa dimensão, perante o tribunal recorrido; ao menos, não o fez de modo processualmente adequado.
III. Decisão: Pelos fundamentos expostos, decide-se:
(a). indeferir a reclamação apresentada; e, em consequência, confirmar a decisão de não conhecimento do recurso;
(b). condenar o reclamante nas custas, com quinze unidades de conta de taxa de justiça.
Lisboa, 23 de Maio de 2001 Messias Bento José de Sousa e Brito Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Alberto Tavares da Costa Luís Nunes de Almeida (vencido, por entender que o recorrente suscitou, perante o Tribunal Recorrido, a inconstitucionalidade de uma norma, com certa interpretação – cfr. Conclusão h) do artº 32º das alegações ali apresentadas).