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Processo n.º 595/03 Plenário Relator: Cons. Gil Galvão
Acordam no Plenário do Tribunal Constitucional:
I - Relatório
1. M., na qualidade de “mandatário da Lista de Cidadãos denominada B.!”, impugnou a elegibilidade de C., candidato indicado em n.º 1, pelo Partido Socialista, para a Assembleia de Freguesia de Samora Correia. Por decisão de 18 de Agosto de 2003, do Tribunal de 1ª Instância da comarca de Samora Correia, foi considerado elegível o referido candidato. É o seguinte o teor da decisão em causa:
“A Mandatária do grupo de cidadãos eleitores 'B.' veio impugnar a candidatura de C., indicada pelo 'PS' como candidato n° 1 para a Assembleia de Freguesia de Samora Correia. Alegou, para tanto e em síntese, que o mesmo cidadão preencheu e assinou a declaração de propositura da Lista de Cidadãos 'B.', violando o disposto no art.
16°, nos 3 e 6, da Lei Eleitoral.
* Notificada para o efeito, a Mandatária do 'PS' pronunciou-se no sentido do indeferimento do requerido, sustentando, em suma, que o candidato apresentado não consta da Lista de Candidatos do 'B.' e que o facto de o mesmo cidadão, individualmente considerado, possibilitar como proponente a apresentação de uma lista de cidadãos à eleição de um órgão autárquico não o impede de ser candidato por uma outra lista proposta por um partido político.
* Resulta dos autos que:
- C. assinou uma declaração de propositura da lista de candidatos 'B.' à eleição intercalar para a Assembleia de Freguesia de Samora Correia;
- C. foi apresentado pelo 'PS' como candidato à Assembleia de Freguesia de Samora Correia;
- C. não foi apresentado como candidato pelo 'B.'.
* Nos termos do art. 16°, n.ºs 3 e 6, da Lei Eleitoral, 'Nenhum cidadão eleitor pode ser proponente de mais de uma lista de candidatos para a eleição de cada
órgão' e 'Ninguém pode ser candidato simultaneamente em listas apresentadas por diferentes partidos, coligações ou grupos de cidadãos'. O princípio defendido neste preceito geral, como adaptação do princípio constitucional contido no n.º 2 do art.º 51º da CRP, é o de que nenhum eleitor pode propor programas políticos diferentes para uma mesma eleição.
É naturalmente também uma forma de evitar a proliferação de candidaturas de grupos de cidadãos. Se é certo que o n° 6 do citado normativo não se mostra violado, porquanto o cidadão em causa apenas é candidato pela lista do 'PS', a questão está, pois, em saber se quando se fala em 'lista de candidatos' (nº 3) se pretende apenas abranger os grupos de cidadãos eleitores ou também os partidos políticos. Ora, quando estão em causa listas apresentadas por grupos de cidadãos é que a questão dos proponentes se coloca, já que no que respeita aos partidos políticos os mesmos estão já registados, devendo juntar ao processo a respectiva certidão do Tribunal Constitucional. Ou seja, não se vê que tenha sido violado o n° 3 do preceito legal em análise. Pelo exposto, indefere-se a impugnação suscitada pelo grupo de cidadãos 'B.', concluindo-se pela elegibilidade do candidato C.. Notifique.”
2. Em 19 de Agosto de 2003, a referida mandatária da Lista de Cidadãos denominada “B.”, veio, nos termos dos artigos 31º e seguintes da Lei Eleitoral
(Lei Orgânica n.º1/2001, de 14 de Agosto), interpor recurso para o Tribunal Constitucional daquela decisão.
Em requerimento dirigido aos juizes do Tribunal Constitucional, motivou assim a recorrente o seu recurso:
“[...] Considerandos:
1. O cidadão C. preencheu e assinou a declaração de propositura da Lista de Cidadãos denominada 'B.', ( cf. por favor, fotocópia autenticada em anexo ).
2. O supracitado cidadão aparece, agora, como 1° candidato pela Lista apresentada pelo Partido Socialista às eleições intercalares para a Assembleia de Freguesia de Samora Correia, marcadas para o dia 21 de Setembro de 2003.
3. Os pontos 3 e 6, do Artigo 16°, da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais mencionam, explicitamente, a impossibilidade de qualquer cidadão poder ser proponente de mais de uma lista de candidatos (ponto 3) ou de ser candidato simultaneamente em listas apresentadas por diferentes partidos, coligações ou grupos de cidadãos (ponto 6).
4. Da conjugação do ponto 3 e do ponto 6 do Artigo 16° da Lei Eleitoral supracitada resulta, numa análise fundamentada na cientificidade da lógica matemática o seguinte: se o cidadão A não pode ser proponente de mais de uma lista e se o mesmo cidadão A não pode ser candidato em simultâneo por mais do que uma lista de candidatos, logo, o cidadão A não pode ser proponente e candidato por listas diferentes, propondo programas políticos também diferentes, que concorrem, simultaneamente. ao mesmo acto eleitoral. Conclusão: Em face do que atrás fica exposto, conclui-se que a candidatura, do senhor C., apresentada pelo Partido Socialista, viola, de forma expressa e grosseira, o disposto na Lei Eleitoral sobre esta matéria, como adaptação do princípio constitucional contido no n.º 2 do artigo 51º da Constituição da República Portuguesa, pelo que se requer a V. Exas. a imediata notificação do Mandatário da Lista de Candidatura do Partido Socialista, no sentido de proceder à substituição do referido candidato.”
Tudo visto cumpre decidir. II - Fundamentação
3. Ora, acontece que, desde logo, se tem de concluir, no caso concreto, que não se pode tomar conhecimento do presente recurso por não ter sido apresentada previamente pela recorrente, como se impunha, a reclamação prevista no artigo
29º da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto, que estatui o seguinte: “Das decisões relativas à apresentação de candidaturas podem reclamar os candidatos, os seus mandatários, os partidos políticos, as coligações ou os primeiros proponentes de grupos de cidadãos eleitores concorrentes à eleição para o órgão da autarquia, até quarenta e oito horas após a notificação da decisão, para o juiz que tenha proferido a decisão”.
De facto, o recurso previsto no artigo 31º n.º 1 da mesma Lei (“Das decisões finais relativas à apresentação de candidaturas cabe recurso para o Tribunal Constitucional...) só pode ser interposto depois de decidida aquela reclamação, como é jurisprudência reiterada deste Tribunal Constitucional (cfr., por exemplo, os Acórdãos n.º 498/01, 500/01 e 287/02, todos disponíveis na página Internet do Tribunal Constitucional, em
www.tribunalconstitucional.pt/jurisprudencia.htm.
III - Decisão
Nestes termos, decide-se não tomar conhecimento do recurso.
Lisboa, 2 de Setembro de 2003 Gil Galvão Carlos Pamplona de Oliveira Benjamim Rodrigues Artur Maurício Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Bravo Serra Rui Manuel Moura Ramos