Imprimir acórdão
Processo n.º 783/01
2ª Secção Relator – Cons. Paulo Mota Pinto
Acordam em conferência na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I. Relatório
1.Por decisão sumária de 13 de Março de 2002, foi decidido não tomar conhecimento do recurso apresentado ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, por A., e condená-lo em custas no montante de cinco unidades de conta.
Inconformado, o recorrente levou reclamação à conferência, que, pelo Acórdão n.º
300/2002, a indeferiu, confirmando aquela decisão sumária e condenando o reclamante em custas, com quinze unidades de conta de taxa de justiça.
2.Veio então o reclamante requerer a declaração de nulidade do acórdão por
“contradição entre as premissas e a conclusão do acórdão ora reclamado” porque nele se admite
“a hipótese da inconstitucionalidade ser discutida neste tribunal, sem que a mesma tivesse sido suscitada no tribunal comum, ou seja, durante o processo, para depois concluir que não tendo sido invocada anteriormente a questão de inconstitucionalidade, já esse problema não pode colocar-se nesta instância.” Considerou ainda que tal decisão
“não tomou em consideração o disposto no n.º 1 do artigo 32º do C. P. Penal, que seguramente se sobrepõe à interpretação que momentaneamente os tribunais possam fazer sobre o modo e o local onde a questão da inconstitucionalidade deva inicialmente ser suscitada.”
Por outro lado, considerou “manifestamente exagerado” o montante de custas aplicado ao requerente pedindo que o valor destas fosse alterado “para o mínimo de cinco unidades de conta”.
O Ministério Público veio pronunciar-se sobre tal requerimento, dizendo:
«1º É verdadeiramente ininteligível a arguição de nulidade deduzida pelo reclamante.
2º Na verdade, só uma leitura pouco cuidada dos termos da decisão reclamada – e o manifesto e indesculpável desconhecimento da reiterada jurisprudência constitucional acerca dos pressupostos de admissibilidade dos recursos de fiscalização concreta – podem explicar o teor da arguição de nulidade deduzida.
3º Revelando-se perfeitamente absurda a pretensão de “dar prioridade” à questão de mérito (atinente ao artigo 32º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa) sobre a “questão prévia” da verificação dos pressupostos do recurso interposto.
4º Carece, por outro lado, de qualquer fundamento o pedido de reforma da decisão proferida quanto a custas, já que a condenação proferida respeita integralmente a lei vigente e harmoniza-se, de modo perfeito, com a reiterada jurisprudência deste Tribunal acerca da graduação do montante de custas devidas nos recursos de fiscalização concreta.»
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentos
3.Começando pela arguição de nulidade, parece ela decorrer – apesar da difícil inteligibilidade (“ininteligível” na expressão do Ministério Público) – da falta de compreensão do que se afirmou na decisão ser a regra e a excepção. De facto, como se escreveu na decisão sumária – e como foi confirmado pela conferência, como é jurisprudência unânime deste Tribunal e é ponto assente na doutrina –, a regra é a de que a suscitação da questão de constitucionalidade nos recursos intentados ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional tem de ocorrer necessariamente durante o processo, ou seja, antes de esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a matéria a que a questão de constitucionalidade respeita. Porém, há situações em que se dispensa o cumprimento deste ónus de suscitação atempada de tal questão: “situações excepcionais, anómalas, nas quais o interessado não disponha da oportunidade processual para suscitar a questão de inconstitucionalidade antes de proferida a decisão final”, como se escreveu na decisão sumária reclamada e no seu acórdão confirmatório. Explicou-se, aliás, numa e noutra ocasião, porque é que o caso dos autos não se enquadrava numa destas excepções – o que confirma o sem sentido da arguição de nulidade, pois não se verifica qualquer contradição da decisão reclamada. Também alegou o requerente faltar qualquer norma para se poder sustentar este entendimento, descurando – o que, porém, também havia sido explicado nas duas anteriores decisões deste Tribunal –, além do mais (veja-se, designadamente, o artigo 72º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional), a própria natureza de recurso do mecanismo de que procurou lançar mão, a supor, necessariamente, um anterior juízo de conformidade ou desconformidade com a Constituição, juízo esse a submeter a reexame por este Tribunal.
4.Sobre a suposta desconformidade deste entendimento com o n.º 1 do artigo 32º do Código de Processo Penal – que, porém, trata do “conhecimento e dedução da incompetência”, podendo supor-se que o reclamante pretendia invocar o n.º 1 do artigo 32º, mas da Constituição –, tem razão o Ministério Público neste Tribunal, pois não pode deixar de considerar-se “absurda” a pretensão de dar prioridade à resolução da questão de mérito, ou de fundo, antes de resolvida a questão prévia da verificação dos pressupostos do recurso interposto – isto é, dos pressupostos para se poder apreciar aquela questão de mérito.
5.Finalmente, quanto à graduação das custas em que o reclamante foi condenado, verifica-se que, além de o montante anteriormente fixado se situar na franja mais baixa dos limites para a condenação em custas previstos no artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro (entre as 5 e as 50 unidades de conta), corresponde, como notou o Ministério Público, à normal graduação do montante de custas. Nada há, pois, a alterar na condenação em custas.
III. Decisão
Pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir o presente requerimento de arguição de nulidade e de reforma da anterior decisão quanto a custas.
Custas do incidente pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 (quinze) unidades de conta.
Lisboa, 3 de Dezembro de 2003
Paulo Mota Pinto Mário José de Araújo Torres Rui Manuel Moura Ramos