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Processo nº 333/03
3ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. - Nos presentes autos de recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade instaurados ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, vindos do Tribunal Central Administrativo, em que são recorrente A., neles identificado, e recorrido o Presidente da Câmara Municipal de B., foi proferida, em 2 de Junho último, decisão sumária, nos termos do nº 1 do artigo 78º-A daquele diploma legal, onde não se tomou conhecimento do recurso, cujo teor se transcreve:
“1. -A., com os sinais dos autos, notificado do acórdão do Tribunal Central Administrativo de 13 de Março de 2003, que negou provimento ao recurso jurisdicional e declarou executado o julgado anulatório, veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional, com fundamento na alínea a) do nº1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, pois, em seu entender, «o citado acórdão, ao declarar executado o acto anulatório, o Despacho de 11/7/96 do Snr. Presidente da Câmara Municipal de B., violou os artºs 202º, nº1, da C.R.P., que determina incumbir aos Tribunais assegurar a defesa de direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos e reprimir a violação da legalidade democrática, no caso o direito do ora agravante à integral aplicação do D.L.
81-A/96, de 21/6, e legislação complementar e, pelo mesmo motivo, o artº 205º, nº2, da C.R.P., e, ainda, os artºs 13º e 266º desta, por que a este não foi, com violação dos princípios da igualdade, da proporcionalidade e da justiça, aplicada a referida legislação (D.L. 81-A/96, de 21/6, Lei 76/87, de 24/7, D.L.
195/97, de 31/7, e D.L. 256/98, de 14/8) emitida, entre outros objectivos, com os de “repor a legalidade num Estado de direito democrático e de tornar mais saudável a política de pessoal na função pública” e “dar cumprimento ao acordo salarial para 1996 e compromissos de médio e longo prazos celebrados com as associações sindicais em 10 de Janeiro passado” (do preâmbulo do D.L. 81-A/96)».
2. - O acórdão do Tribunal Central Administrativo ora impugnado, decidiu negar provimento ao recurso e declarar executado o acto anulatório, com os seguintes fundamentos:
“O Acórdão deste TCA, proferido no processo principal, em 7/11/01, limitou-se a confirmar a anulação do despacho de 11/7/96 do Presidente da CM de B., que considerou que o recorrente não satisfazia necessidades permanentes dos serviços, porque o seu contrato a termo certo se destinara a suprir necessidades ocasionais e temporais inerentes às tarefas de limpeza urbana, por falta de fundamentação de facto, uma vez que tal despacho se havia limitado 'a enunciar uma conclusão, através da reprodução da fórmula constante do texto do artº 6° do DL n° 81-A/96, sem explicitar os factos que motivaram concretamente a decisão'
(Cfr., cópia junta a fls. 5 e segs. destes autos). Assim sendo, resulta inequívoco que as considerações levadas aos artºs. 17° a
22° das alegações jurisdicionais e que constituem o cerne da argumentação do recorrente, não têm qualquer correspondência com o efectivamente decidido no processo principal, não sendo possível pretender que aquele Acórdão tenha
'declarado' que as funções desempenhadas pelo recorrente visavam a satisfação de necessidades permanentes dos serviços e que, consequentemente, ser-lhe-ia aplicável o disposto no artº 3°/1 do DL n° 81A/96, de 21/6 e na posterior legislação complementar, em ordem à sua integração nos quadros da CM de B.. Ou seja, a argumentação do recorrente assenta num equívoco, sendo certo que a decisão de saber se tais funç(ões) visavam, ou não, a satisfação de
'necessidades permanentes dos serviços' apenas poderia ser tomada pelos competentes órgãos municipais, não pelos tribunais que não exercem a
'administração activa', e que no momento em que foi prolatado o acto anulado apenas se encontrava em vigor o referido DL n° 81-A/96, cujo art. 3° permitia, em tais casos, a prorrogação dos contratos a termo certo até 30/4/97. Ou seja, tendo o acto contenciosamente sindicado sido anulado por mera falta de fundamentação e tendo a autoridade recorrida em cumprimento do Acórdão proferido pelo STA, no âmbito do pedido de suspensão de eficácia, procedido à prorrogação do contrato do recorrente até ao dia 30/4/97, com o pagamento das respectivas remunerações, mostra-se executado o julgado anulatório, não sendo caso de declarar a existência de causa legítima de inexecução, pois que não se verifica qualquer inexecução do decido no processo principal. Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso jurisdicional e em declarar executado o julgado anulatório.”
3. - O recurso foi admitido pelo Desembargador relator, o que, no entanto, não vincula este Tribunal Constitucional – n.º 3 do artigo 76º da citada Lei n.º
28/82.
Entende-se, com efeito, que o acórdão recorrido não recusou a aplicação do complexo normativo invocado pela recorrente com fundamento em vício de inconstitucionalidade, o que obsta ao conhecimento do objecto do recurso.
4. - Na verdade, o recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade interposto com fundamento na alínea a) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, tem por objecto as decisões dos tribunais que “recusam a aplicação de qualquer norma, com fundamento em inconstitucionalidade”.
Assim, a via de recurso para o Tribunal Constitucional só se abre se o tribunal a quo tiver rejeitado, com base em juízo de inconstitucionalidade, a aplicação ao caso concreto do conteúdo do regime constante de uma determinada norma jurídica (cfr., inter alia, o Acórdão n.º
350/92, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 23, págs. 459 e segs.).
A esta situação se equivalem, no entanto, os casos de simples recusa implícita da norma, de harmonia com o entendimento professado na jurisprudência constitucional de que é ao órgão jurisdicional competente para, por via de recurso e centralizadamente, fiscalizar em concreto a constitucionalidade das normas que cabe, em definitivo, a qualificação do vício motivador da desaplicação (assim, v.g., os Acórdãos n.ºs. 13/83, 27/84 e 429/89, publicados nos Acórdãos cits., vol. 1º, pág. 151, 27/84, vol. 2º, p. 445, e vol. 13º - tomo II, págs. 1237 e segs.).
De qualquer modo, mesmo que implícita, há-de retirar-se, do discurso da decisão recorrida, ao menos, a aparência de um juízo de inconstitucionalidade.
Ora, não é isso que, no caso concreto, se verifica.
5. - Com efeito, como se verifica do excerto da parte decisória da decisão recorrida acima transcrito, esta, ao negar provimento ao recurso, entendendo que já se mostrava executado o julgado anulatório, não aplicando ao caso o disposto no artigo 3º, nº1, do Decreto-Lei n.º 81-A/96, de 21 de Junho, e posterior legislação complementar, não o fez com fundamento em inconstitucionalidade das normas em apreço, mas sim porque não acolheu a argumentação do recorrente, que julgou assentar “num equívoco”, como ali se consignou.
6. - Ainda que se entendesse existir lapso do recorrente e que este pretendia fundamentar o recurso na alínea b) do nº1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, e não na alínea a) deste preceito, também não se poderia conhecer do recurso, porquanto, o recorrente, à semelhança do que fez nas conclusões da sua alegação do recurso para o Tribunal Central Administrativo (cfr. conclusão 6ª), não suscita no requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional uma questão de constitucionalidade normativa de que se deva conhecer, antes imputa o vício de inconstitucionalidade à própria decisão recorrida, em si mesma considerada, a qual não integra o âmbito do recurso de constitucionalidade em apreço, em conformidade com a jurisprudência uniforme e reiterada deste Tribunal..
7. - Nestes termos, decide-se, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei do Tribunal Constitucional, não tomar conhecimento do recurso. Custas a cargo do recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 6 unidades de conta.”
2. - Notificado, reclamou oportunamente o recorrente, para a conferência, nos termos do nº 3 do artigo 78º-A da aludida Lei nº 28/82, defendendo que se atenda à reclamação deduzida, com o prosseguimento normal da tramitação processual.
No respectivo articulado, o reclamante não logrou contrariar minimamente o sumariamente deduzido, nem tão pouco adiantou algo que tenha de ser objecto de ponderação.
Com efeito, reconhecendo que o recurso foi
“eventualmente mal enquadrado da alínea a) do nº 1 do artigo 70”, da Lei do Tribunal Constitucional, limitou-se o reclamante a reafirmar que “as sentenças dos Tribunais Administrativos, ao não imporem à Administração real e efectiva execução da sentença do TAC de Lisboa, de 31/5/99, incumpriram as referidas normas da CRP”.
Reafirma-se, por conseguinte, sem necessidade de maiores considerandos, a decisão reclamada, com a qual, na sua essencialidade, se concorda.
3. - Em face do exposto e nos termos do nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, indefere-se a reclamação, mantendo-se a decisão no sentido do não conhecimento do objecto do recurso.
Custas pelo reclamante, com taxa de justiça que se fixa em 15 unidades de conta. Lisboa, 15 de Julho de 2003 Alberto Tavares da Costa Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Luís Nunes de Almeida