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Proc. n.º 862/03
2ª Secção Relator – Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam em conferência no Tribunal Constitucional:
A – Relatório
1 - A., identificado nos autos, instaurou no Tribunal Judicial da Comarca da Covilhã acção declarativa de condenação, sob a forma de processo sumário, contra B., pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de 2 100
000$00, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, provocados, em síntese, por uma “denúncia caluniosa” feita pela Ré contra o Autor.
A acção foi julgada totalmente improcedente. Interposto recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Coimbra, veio este Tribunal a negar-lhe provimento, pelo seu acórdão de 5/3/2002, confirmando a decisão de 1ª instância.
2 - O Autor interpôs, então, recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça.
Mas esse recurso não foi admitido pelo despacho, de 9/4/2002, do Senhor Desembargador-Relator, por a decisão recorrida caber na alçada do Tribunal (fls. 95).
Desta decisão, o Autor reclamou para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do disposto no art. 688º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC).
Tal reclamação foi indeferida por despacho desta entidade, de 4 de Julho de 2002 – fls. 148/149.
Este despacho foi notificado ao reclamante por carta registada, de 4 de Julho de 2002 - fls. 150.
Veio então o reclamante requerer ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça que sobre a sua decisão recaísse acórdão. Este pedido foi indeferido por despacho da mesma entidade, de 4 de Outubro de 2002, pela sua inadmissibilidade legal (fls. 157).
3 - Por requerimento apresentado em 15 de Outubro de 2002, o Autor interpôs recurso para o Tribunal Constitucional do referido despacho do Senhor Desembargador-Relator que não admitiu o recurso de revista acima referido. Por despacho do mesmo Senhor Desembargador-Relator, de 22 de Outubro de 2002, não foi, porém, aquele recurso admitido, por ser intempestivo (fls. 100).
Notificado desta decisão, veio o Autor requerer que sobre ela recaísse acórdão. A decisão foi mantida na conferência de juízes ( de 4/2/2003)
– fls.165.
Notificado desta decisão da conferência, o Autor interpôs recurso dela para este Tribunal Constitucional (fls. 169).
Este recurso não lhe foi admitido por despacho do Senhor Desembargador-Relator, de 11 de Março de 2003, por “não ser admissível recurso do despacho que o não admitiu” (fls. 170).
Novamente veio o Autor requerer que sobre este despacho recaísse acórdão da conferência (fls. 173). E tendo sido esclarecido, na sequência de despacho judicial, de que do despacho que não admitiu o recurso apenas caberia recurso para o Tribunal Constitucional ou reclamação para o presidente do tribunal superior, e convidado a vir dizer se o sentido do seu requerimento não seria recorrer antes para o Tribunal Constitucional, o Autor veio dizer que mantinha o requerimento de intervenção da conferência, porquanto só da decisão desta poderia recorrer para o Tribunal Constitucional. Tal requerimento foi indeferido por despacho do Senhor Desembargador-Relator, de 18 de Setembro de
2003.
Por requerimento de 30 de Setembro de 2003, veio então o mesmo Autor pedir a remessa dos autos ao Tribunal Constitucional “considerando que foram indeferidos, tanto a interposição do recurso para o Tribunal Constitucional, como as reclamações para a conferência”.
4 - O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal pronunciou-se no sentido do indeferimento da reclamação, quer por não ter sido suscitada qualquer questão de inconstitucionalidade normativa susceptível de integrar o objecto idóneo de um recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade, quer por o recurso ser intempestivo, não podendo ser relevada para este efeito a circunstância do recorrente ter formulado um pedido de reclamação para a conferência da decisão do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (de
4/7/2002) que indeferira a reclamação do despacho do Senhor Desembargador-Relator que não havia admitido o recurso de revista (de 9/4/2002).
B – Fundamentação
5 - Dispõe o art. 75º, n.º 1 da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), que “o prazo de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional é de 10 dias e interrompe os prazos para a interposição de outros que porventura caibam da decisão, os quais só podem ser interpostos depois de cessada a interrupção”.
Resulta dos autos que o recorrente foi notificado por carta registada, de 4 de Julho de 2002, da decisão do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça que lhe indeferiu a reclamação deduzida contra o referido despacho do Senhor Desembargador-Relator que não lhe admitira a interposição do recurso de revista para o STJ do acórdão da Relação de Coimbra que negou provimento à apelação interposta da sentença da 1ª instância.
Atento o disposto no art. 254º, n.os 1 e 2, do CPC, aplicável ao processo constitucional por mor do preceituado no art. 69º da LTC, tem de presumir-se que o recorrente foi notificado da decisão de indeferimento da reclamação em 8 de Julho de 2002, dado o dia 7 ter sido domingo.
E é a partir de tal data que se conta o prazo para interpor recurso para este Tribunal Constitucional do despacho do Senhor Desembargador-Relator que não admitiu o recurso de revista interposto pelo recorrente do acórdão que negou provimento à apelação.
Ora, sendo assim esse prazo esgotou-se em 17 de Setembro de 2002. E esgotou-se nesta data porque, sendo embora de 10 dias, o mesmo prazo se suspendeu durante as férias judiciais do Verão, de 16 de Julho a 14 de Setembro, nos termos do art. 12º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais (Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro), de acordo com o disposto no art.
144º, n.º 1 do CPC, aplicável ao processo constitucional por força do referido art. 69º da LTC.
O recorrente só veio, todavia, fazê-lo em 15 de Outubro de 2002, quando, portanto, há muito tempo se havia esgotado o referido prazo.
É certo que o recorrente formulou um pedido no sentido de, sobre a decisão do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça que havia indeferido a sua reclamação contra o despacho de não admissão do recurso de revista, recair acórdão ou seja, de reclamação para uma conferência de juízes. Mas a tal acto não podem ser atribuídos quaisquer efeitos jurídicos no sentido de diferir, para um outro momento posterior, o dies a quo do prazo de interposição do recurso para este Tribunal Constitucional do despacho que não admitiu o recurso de revista, como se ele desse satisfação ao requisito da exigência do esgotamento de todos os recursos ordinários para se poder interpor recurso de constitucionalidade, a que aludem os n.os 2, 3 e 4 do art. 70º da LTC. E não pode, porque esse meio não está previsto na lei processual como meio idóneo para se atacar a decisão da reclamação proferida nos termos dos arts. 688º e 689º do CPC. Na verdade, independentemente do órgão “presidente do tribunal superior”, que aprecia as reclamações previstas no art. 688º do CPC, estar previsto apenas como órgão unipessoal e a reclamação para a conferência, prevista no art. 700º, n.º 3 do CPC, pressupor a existência de um órgão colegial, como se acentua no referido despacho que indeferiu esse pedido, acontece que o n.º 2 do art. 689º do CPC diz expressamente que “a decisão do presidente não pode ser impugnada”, salvo evidentemente em recurso de constitucionalidade cuja previsão não consta do CPC.
Temos, pois, de concluir que a conferência, no tribunal a quo, julgou segundo o direito aplicável a questão da extemporaneidade do recurso: o direito de praticar o acto já se havia extinguido (art. 145º, n.º 3 do CPC).
Como é evidente, tendo o recurso interposto pelo recorrente, para este Tribunal Constitucional, do despacho do Senhor Desembargador-Relator (de
11/3/2003 - fls. 170) [que não admitiu o recurso por ele igualmente interposto do acórdão da conferência, que, por seu lado, não havia admitido (por extemporaneidade), o recurso anteriormente interposto para este mesmo Tribunal], o mesmo objecto - isto é, o despacho do Senhor Desembargador-Relator que não admitiu o recurso de revista para o STJ que a conferência confirmou - não há que lhe conferir autonomia processual. O objecto do recurso continua a ser sempre o mesmo. Assim, estando impugnado para o Tribunal Constitucional o despacho que não admitiu o recurso, não poderá vir novamente a impugnar-se a decisão da conferência que confirmou esse despacho. A sorte de tal recurso é, por isso, a mesma do anteriormente interposto.
Sendo extemporâneo, mostra-se prejudicado o conhecimento de outros pressupostos do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade que eventualmente possam ocorrer (art. 660º, n.º 2 do CPC).
C – Decisão
6 - Destarte, atento tudo o exposto, este Tribunal Constitucional decide indeferir a reclamação.
Custas pelo reclamante, com taxa de justiça que se fixa em 6 UC, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário que lhe foi concedido.
Lisboa, 17 de Dezembro de 2003
Benjamim Rodrigues Maria Fernanda Palma Rui Manuel Moura Ramos