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Processo nº 90/2001 Conselheiro Messias Bento
Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
Recorrente(s): A... Recorrido(s): Director do Departamento da Educação Básica
I. Relatório:
1. O presente recurso foi interposto do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 6 de Dezembro de 2000, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, 'visando a apreciação da inconstitucionalidade do artigo 2º do Decreto-Lei nº 519-E/79, de 28 de Dezembro, na interpretação que dele foi feita pelo douto acórdão recorrido, no sentido de que, por um lado, permitiria a resolução por via regulamentar de matéria sujeita a definição de acto legislativo, dessa forma ofendendo a regra do artigo 115º da Constituição, e de que, por outro lado, sustentaria as previsões dos pontos 3.2. e 3.3. do Despacho Conjunto nº 15/A/SERE/SEEBS/93
(Diário da República, II série, de 27 de Fevereiro de 1993), dessa forma ofendendo o princípio constitucional da igualdade'. O recorrente, em resposta ao convite que lhe foi feito nesse sentido, disse que suscitou a inconstitucionalidade nos artigos 8º e seguintes da alegação apresentada no Supremo Tribunal Administrativo e nas respectivas conclusões b) e c). O relator, por entender não poder conhecer-se do recurso interposto, por falta de verificação dos respectivos pressupostos - que são entre outros, ter o recorrente suscitado, durante o processo, de forma processualmente adequada, a inconstitucionalidade de determinada norma jurídica ou de uma sua interpretação
[cf. artigos 70º, nº 1, alínea b), e 72º, nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional] e haver tal norma ou interpretação sido aplicada como ratio decidendi pela decisão recorrida -, proferiu decisão sumária nesse sentido.
2. Reclama, agora, o recorrente para a conferência, dizendo, em síntese, ter suscitado uma questão de inconstitucionalidade; e tê-lo feito de modo processualmente adequado: 'de facto – diz -, foram por duas vezes suscitadas as questões de inconstitucionalidade, pois ab initio era visível essa dimensão do problema, quer nas alegações apresentadas no recurso contencioso, quer, mais desenvolvidamente ainda, nas alegações do subsequente recurso jurisdicional, nos seus artigos 8º a 17º, e levando expressamente às conclusões tal matéria'.
O RECORRIDO não respondeu.
3. Cumpre decidir.
II. Fundamentos:
4. O recorrente pretende que este Tribunal aprecie a constitucionalidade do que diz ser uma interpretação do artigo 2º do Decreto-Lei nº 519-E/79, de 28 de Dezembro. Pois bem: na decisão sumária reclamada escreveu-se o seguinte: Claro é que só pode falar-se numa interpretação de determinado normativo legal, quando se esteja perante um sentido susceptível de ser referido a esse normativo, pois toda a interpretação tem que ter 'um mínimo de correspondência verbal' na letra da lei (cf. artigo 9º, nº 2, do Código Civil). Para abrir a via do recurso de constitucionalidade, não chega, pois, falar em interpretação e apresentar como tal um qualquer enunciado, dizendo-o extraído de determinado preceito legal. Preciso é que esse enunciado seja, de facto, uma dimensão normativa possível do dispositivo legal em causa. Ora, no caso dos autos, basta atentar nos dizeres do artigo 2º do Decreto-Lei nº
519-E/79, de 28 de Dezembro, e no teor dos pontos 3.2. e 3.3. do Despacho Conjunto nº 15/A/SERE/SEEBS/93 (publicado no Diário da República, II série, de
27 de Fevereiro de 1993), para se concluir que o enunciado, que o recorrente apresenta como sendo o sentido que o acórdão recorrido extraiu daquela artigo 2º por via interpretativa, e que, por isso, pretende submeter ao julgamento deste Tribunal, não é uma interpretação de tal normativo. Esse enunciado mais não é do que, conforme a opinião do recorrente, o resultado da aplicação do dito artigo
2º, tal como no caso foi feita pelo acórdão recorrido. De facto, tendo em conta que 'o preenchimento dos lugares docentes para o magistério em cursos de ensino básico e secundário no estrangeiro será feito mediante concurso documental a realizar bienalmente' (artigo 1º), o referido artigo 2º dispõe que esse concurso 'realizar-se-á separadamente para cada grau de ensino e compreenderá duas fases, sendo a primeira de recondução e a segunda de colocação' (nº 1); e acrescenta que 'o concurso será aberto por aviso a publicar no Diário da República até ao dia 28 de Fevereiro anterior ao início do ano lectivo a que o concurso respeita' (nº 2). De sua parte, o referido Despacho Conjunto, no que concerne à fase de recondução, dispõe que se podem candidatar os 'professores que se tenham sujeitado à acção de formação certificada regulada pelo Despacho 60/SERE/89 e nela tenham obtido o resultado final de satisfaz'
(Ponto 3.2. do despacho Conjunto 15-A/SERE/SEEBS/93, publicado no Diário da República, II série, de 27 de Fevereiro de 1993) e, bem assim, os 'professores que se encontram ao abrigo dos acordos bilaterais com o governo alemão cuja formação contínua tenha sido assegurada pelos respectivos Estados em cooperação com o Ministério da Educação' (Ponto 3.3. do mesmo Despacho Conjunto). Simplesmente, as decisões judiciais, em si mesmas, não podem ser objecto de controle de constitucionalidade por parte deste Tribunal. Acresce que, suposto que nesse enunciado se pudesse ainda ver uma interpretação do artigo 2º do Decreto-Lei nº 519-E/79, de 28 de Dezembro, esse normativo não foi, nessa dimensão, questionado sub specie constitutionis perante o tribunal recorrido. Não o foi, ao menos de modo processualmente adequado, como exige o nº
2 do artigo 72º da Lei do Tribunal Constitucional. Na verdade, a esse propósito, o recorrente – depois de, no artigo 8º da alegação, falar em 'violação do artigo 2º/1 do Decreto-Lei nº 519-E/79, conjugado com o artigo 115º da Constituição – o que disse foi o seguinte:
(a). 'Sobre a invocada violação do artigo 2º/1 do Decreto-Lei nº 519-E/79, conjugado com o artigo 115º da Constituição, o que se deve liminarmente observar
é que a pronúncia havida foi insuficiente [...]' (ponto 8º da alegação);
(b). 'Devia a decisão recorrida ter considerado provada a invocada extemporaneidade da publicação do aviso do concurso em causa e, assim, a violação do artigo 2º/2 do Decreto-Lei nº 519-E/79 [conclusão a), da alegação];
(c). 'Omitiu a decisão recorrida pronúncia sobre a violação do artigo 115º da Constituição – decorrente de nesse aviso se disciplinarem matérias carecidas de definição legal' [conclusão b), da alegação]. Como se vê, o recorrente aponta o próprio artigo 2º como norma violada, e não como norma violadora da Constituição.
5. Na reclamação ora apresentada, o recorrente não diz nada susceptível de pôr em causa o que se escreveu na decisão sumária para fundamentar o não conhecimento do recurso. Há, assim, que concluir que o recorrente não suscitou perante o tribunal recorrido a inconstitucionalidade de uma determinada interpretação do artigo 2º do Decreto-Lei nº 519-E/79, de 28 de Dezembro, mas antes a omissão de pronúncia sobre essa questão por parte do Tribunal Administrativo de Círculo. Por isso, a decisão sumária reclamada não merece censura.
III. Decisão: Pelos fundamentos expostos, decide-se:
(a). indeferir a reclamação apresentada; e, em consequência, confirmar a decisão de não conhecimento do recurso;
(b). condenar o reclamante nas custas, com quinze unidades de conta de taxa de justiça. Lisboa, 23 de Maio de 2001 Messias Bento José de Sousa e Brito Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Alberto Tavares da Costa Luís Nunes de Almeida