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Proc. n.º 882/03
3ª Secção Relator: Cons. Gil Galvão
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório.
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Judicial da Comarca de Albufeira, foi proferida, em 23 de Junho de 2003, decisão que declarou extinto um determinado procedimento criminal, pelo decurso do prazo de prescrição, por o juiz ter entendido não perfilhar “o entendimento expresso no Acórdão do Plenário das Secções Criminais do STJ, n.º 10/2000, que fixou jurisprudência no sentido de que «no domínio da vigência do Código Penal de 1982 e do Código de Processo Penal de 1987, a declaração de contumácia constituía causa de suspensão da prescrição do procedimento criminal»”, e, simultaneamente, ter julgado “o artigo
336º, n.º 1, do Código de Processo Penal (ou 335º, n.º3, na redacção dada pela Lei 59/98, de 25 de Agosto) orgânica e materialmente inconstitucional no entendimento de que permite entender a declaração de contumácia como causa de suspensão do procedimento criminal à luz do artigo 119º, n.º 1, do Código Penal de 1982”, por violar o disposto nos artigos 2º, 20º, n.º 4, parte final, 27º, n.º 1, 29º, n.º 1, 30º, n.º 1, 32º, n.º 1 e 2 da Constituição.
2. Desta decisão foi interposto pelo representante do Ministério Público naquela comarca, ao abrigo dos artigos 70º, n.º 1, al. a) e 72º, n.º 1, al. a) da LTC, recurso obrigatório de constitucionalidade. O recurso não foi, porém, admitido, por decisão de 3 de Outubro de 2003, que se fundou, para tanto, na seguinte fundamentação:
“Dispõe o artigo 70º, n.º 5, da Lei do Tribunal Constitucional que não é admissível “recurso para o Tribunal Constitucional de decisões sujeitas a recurso ordinário obrigatório, nos termos da lei processual.” Ora, no presente caso, a verdade é que, nos termos do artigo 446º, do Código de Processo Penal, caberá ao Ministério Público recorrer obrigatoriamente da decisão proferida nos autos, por ter sido proferida contra o Acórdão do STJ n.º
10/2000. Apesar de o artigo 446º do Código de Processo Penal estar inserido no título II do livro IX do Código de Processo Penal (referente aos recursos extraordinários), a verdade é que, como tem vindo a ser entendido pela Jurisprudência Constitucional (v.g. Acórdãos 233/01, de 4/07/2001, da 1ª Secção do Tribunal Constitucional; Ac. 93/02, de 26/02/2002, da 2ª Secção do Tribunal Constitucional; e 281/01, de 26/06/2001 e 282/01, de 26/06/2001 da 3ª Secção do Tribunal Constitucional), haverá que, previamente, recorrer dentro da ordem dos Tribunais Judiciais, nos termos do citado artigo 446º. Assim, pelo exposto, não se admite o recurso interposto a fls. 108.”
3. Inconformado com esta decisão que não lhe admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional, apresentou o ora reclamante a presente reclamação, em que, todavia, nada acrescenta de relevante quanto à não admissão do recurso.
4. Já neste Tribunal foram os autos com vista ao Ministério Público, que se pronunciou no sentido da improcedência da reclamação, posição que fundamentou nos seguintes termos:
“Como refere a decisão reclamada, a jurisprudência constitucional vem entendendo, de modo uniforme e reiterado, que o “recurso ordinário obrigatório”, previsto no art. 446º do CPP, tem precedência sobre o recurso de fiscalização concreta, fundado na recusa de aplicação da interpretação normativa realizada pelo acórdão de uniformização de jurisprudência emitido pelo STJ. Nestes termos, nenhuma censura merece a decisão reclamada.”
Dispensados os vistos legais, cumpre decidir.
II – Fundamentação.
A exacta questão dos autos foi, muito recentemente, objecto de decisão deste Tribunal, nos Acórdãos n.º 470/03 e 559/03 (disponíveis na página Internet do Tribunal Constitucional em http://www.tribunalconstitucional.pt/jurisprudencia.htm), tirados em processos igualmente vindos do Tribunal Judicial da Comarca de Albufeira e em que foram proferidas idênticas decisões. Naquele primeiro acórdão se afirmou:
“Como refere o representante do Ministério Público junto deste Tribunal Constitucional, “a decisão recorrida afasta, de forma directa e categórica, a aplicação do acórdão de uniformização de jurisprudência do Plenário das Secções Criminais do STJ, n.º 10/2000 – sendo, pois, proferida contra jurisprudência fixada pelo Supremo.” Ora, é jurisprudência constante e reiterada deste Tribunal (cfr., por exemplo, os Acórdãos nºs 281/01, 282/01, 323/01, 334/01, 335/01 e 93/02, disponíveis na página Internet do Tribunal em, em http://www.tribunalconstitucional.pt/jurisprudencia.htm) que, em situações idênticas às dos presentes autos, não se pode conhecer do objecto do recurso,
“por não ter sido previamente interposto o recurso obrigatório previsto no artigo 446º do Código de Processo Penal”. É esta jurisprudência que, por manter inteira validade, agora mais uma vez há que reiterar, uma vez que tem precedência sobre o recurso de constitucionalidade o recurso a interpor obrigatoriamente para o Supremo Tribunal de Justiça, com fundamento específico no artigo 446º do Código de Processo Penal.”
Nada mais há agora a acrescentar.
III. Decisão
Nestes termos, decide-se indeferir a presente reclamação. Sem custas, por não serem devidas.
Lisboa, 18 de Dezembro de 2003
Gil Galvão
Bravo Serra Luís Nunes de Almeida