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Proc. n.º 136/03
2.ª Secção Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam em Plenário do Tribunal Constitucional:
A – O relatório
1. O Ministério Público recorre para este Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto nos art.os 280º, n.º 1, alínea a), da Constituição da República Portuguesa (doravante designada por CRP), 70º, n.º 1, alínea a), e
72º, n.os 1, alínea a), e 3, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão, da sentença do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa (3.º Juízo), de 12 de Dezembro de 2002, que decidiu “recusar por inconstitucionalidade, decorrente da violação do art.º 103º, n.º 2, da CRP, a aplicação do n.º 3 do art.º 72º da Lei n.º 3-B/2000, de 4 de Abril, na parte em que determina que a taxa sobre comercialização de produtos de saúde se quantifica tendo por referência o respectivo preço de venda ao público” e, em consequência de uma tal interpretação, julgar procedente a impugnação deduzida por A., anulando a liquidação do tributo, do montante de 9 468 727$00.
2. O recorrente alegou refutando o juízo de inconstitucionalidade proferido, resumindo as suas razões nas seguintes proposições conclusivas:
«1 – O princípio da reserva de lei fiscal, constante do artigo 103º, n.º 2 – conjugado com o artigo 165º, n.º 1, alínea i), da Constituição da República Portuguesa – apenas implica que a lei – editada ou credenciada pelo parlamento – que cria determinado imposto deve determinar (para além dos benefícios fiscais e das garantias dos contribuintes) a respectiva incidência e a taxa.
2 – A norma constante do n.º 3 do artigo 72º da Lei n.º 3-B/2000, desaplicada na decisão recorrida, ao determinar que a “taxa sobre comercialização de produtos de saúde”, ali prevista, incide sobre o volume de vendas de cada produto e tem por referência o respectivo preço de venda ao consumidor final, define, em termos bastantes, a matéria colectável sobre que vão incidir as taxas previstas no n.º 2 do mesmo preceito.
3 – Não viola o princípio da tipicidade ou da legalidade fiscal a circunstância de, vigorando um regime de autoliquidação de tal tributo, o obrigado tributário poder estar em situação de dúvida subjectiva acerca do efectivo preço de venda ao público, praticado no período em causa, carecendo, consequentemente, a referida autoliquidação de assentar num valor presumível ou hipotético.
4 – Tais dificuldades práticas, associadas exclusivamente ao regime de liquidação do tributo, são absolutamente estranhas aos princípios da tipicidade e da legalidade fiscal, não podendo naturalmente nelas fundar-se violação da norma constitucional do artigo 103º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, pelo que deverá proceder o presente recurso.».
3. Por seu lado, a recorrida contra-alegou defendendo o julgado e concluindo pelo seguinte modo:
«A – A denominada “taxa sobre comercialização de produtos de saúde” deve ser materialmente qualificada como um verdadeiro e próprio imposto.
B – A definição da base de incidência objectiva do imposto, por um lado, e a respectiva liquidação e cobrança, por outro, não podem ser consideradas separadamente, para efeitos de aplicação do princípio da legalidade, sempre que a determinabilidade da primeira seja posta em causa pelo regime legalmente estabelecido para estas últimas.
C – O número 3 do artigo 72º da Lei n.º 3-B/2000, ao estabelecer que o imposto criado seja autoliquidado no momento da introdução dos produtos de saúde no mercado, implica que a referida liquidação seja efectuada pelos respectivos sujeitos passivos sem que estes conheçam o “preço de venda ao consumidor final”, ou seja, sem que a base de incidência objectiva do imposto seja determinável por tais sujeitos passivos.
D – Uma vez que o regime estabelecido no artigo 72º da Lei n.º 3-B/2000 não permite superar a indeterminabilidade da base de incidência do imposto resultante do sistema de autoliquidação legalmente criado, o número 3 daquele artigo é inconstitucional, por violação do disposto no número 2 do artigo 103º da Constituição da República Portuguesa.
E – Na medida em que o imposto criado pelo artigo 72º da Lei n.º 3-B/2000 implica uma tributação sobre o rendimento de pessoas colectivas, e o número 3 do mesmo artigo sujeita os respectivos sujeitos passivos ao pagamento de um valor calculado por referência a um preço estabelecido e recebido por outras entidades que não aqueles sujeitos passivos, este último preceito é inconstitucional, por violação do imperativo resultante do número 2 do artigo 104º da Constituição da República Portuguesa, que exige que a tributação das empresas incida fundamentalmente sobre o seu rendimento real.».
Cumpre decidir.
B – A fundamentação
4. A questão decidenda
É a de saber se o n.º 3 do art.º 72º da Lei n.º 3-B/2000, de 4 de Abril (Orçamento do Estado para 2000), é inconstitucional, designadamente, por violação dos art.os 103º, n.º 2 (princípio da legalidade tributária), e 104º, n.º 2, da CRP (princípio da tributação do rendimento real).
5. A sentença recorrida
A sentença recorrida - após haver assentado estar o tributo em causa sujeito ao princípio da legalidade tributária e ser indiferente, perante este, a sua natureza de taxa ou de imposto - concluiu que o n.º 3 do art.º 72º da Lei n.º
3-B/2000, de 4 de Abril, violava a dimensão material daquele princípio da legalidade tributária. E fundamentou este seu juízo na consideração de que «o princípio da legalidade tributária [se] materializa, para além da reserva de lei, também na tipicidade e determinação», mas «o que resulta do art.º 72.º da Lei n.º 3-B/2000 é uma indeterminação da base de incidência do tributo, pois que se determina que devendo o mesmo ser pago pelo responsável pela introdução do produto no mercado, no momento dessa introdução, através de autoliquidação, a quantificação do tributo se faça por referência ao preço de venda ao consumidor final que é um valor no momento desconhecido e que o sujeito passivo (e que tem de autoliquidar) desconhece e não domina em absoluto», sendo certo que «tal referência valorativa só teria cabimento num sistema de preços fixos em que o introdutor no mercado sabe de antemão qual irá ser o valor do preço de venda ao consumidor final (...)».
6. Do mérito do recurso de inconstitucionalidade
6.1. A primeira questão que poderá colocar-se é a de saber se este Tribunal poderá conhecer do recurso. Ora, está fora de dúvida que na decisão recorrida se verificou uma recusa de aplicação da norma em causa no presente recurso com fundamento na sua inconstitucionalidade, constituindo tal recusa de aplicação a ratio decidendi para o tribunal a quo. Estão, pois, preenchidos os requisitos específicos do tipo de recurso interposto. A propósito da apreciação do respeito pelo parâmetro em questão – o princípio da legalidade tributária –, importa notar, aliás, que, no presente recurso, o problema não é o de saber se o tribunal a quo respeitou os limites de interpretação da lei fiscal decorrentes do princípio da tipicidade, mas antes o de averiguar se o sentido desta lei (isto é, da norma desaplicada), tal qual foi determinado pela sentença recorrida, não ofende este princípio, na sua dimensão de determinabilidade, sendo certo que o obrigado tributário poderá vir a estar em situação de dúvida subjectiva acerca do efectivo preço de venda ao público dos bens sobre o qual deve autoliquidar o imposto. Trata-se, pois, de confrontar um certo sentido normativo com o princípio da legalidade, na sua dimensão de determinabilidade.
6.2. A norma, cuja conformidade à lei fundamental se questiona neste recurso, tem a seguinte redacção [transcrevendo-se todo o artigo para melhor apreensão do tipo tributário em causa]:
«Artigo 72º
Taxa sobre comercialização de produtos de saúde
1 – Os produtores e importadores, ou seus representantes, de produtos de saúde colocados no mercado ficam sujeitos ao pagamento de uma taxa de comercialização destinada ao sistema de garantia da qualidade e segurança de utilização daqueles produtos, à realização de estudos de impacte social e acções de formação para os agentes de saúde e consumidores, a realizar pelo INFARMED - Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento.
2 – A taxa a que se refere o número anterior é de: a) Produtos farmacêuticos homeopáticos, dispositivos médicos não activos e dispositivos médicos para diagnóstico in vitro - 0,4%; b) Cosméticos e produtos de higiene corporal - 2%.
3 – A taxa incide sobre o volume de vendas de cada produto, tendo por referência o respectivo preço de venda ao consumidor final, constituindo receita própria daquele Instituto, e sendo o seu valor pago, mensalmente, com base nas declarações de vendas mensais, nos termos e com os elementos a definir pelo mesmo Instituto.
4 – A não apresentação da declaração exigida no número anterior constitui contra-ordenação, nos termos do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 94/95, de 9 de Maio, do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 273/95, de 23 de Outubro, do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 306/97, de 11 de Novembro, e do artigo 44.º do Decreto-Lei n.º 296/98, de 25 de Setembro».
Lembra-se que está em causa alegada violação, pelo n.º 3 deste artigo, dos princípios da legalidade tributária e da tributação do rendimento real (artigos 103º, n.º 2, e 104º, n.º 2, da Constituição).
6.3. O princípio da legalidade tributária, que a Constituição de
1976 vem afirmando em todas as suas versões, consta hoje do seu art.º 103º, n.º
2. Segundo este, «os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes». O princípio tem duas dimensões jurídicas, ambas enfeudadas à sua matriz histórica de não tributação sem a autorização do Parlamento, enquanto representante do povo
(princípio da auto-tributação): uma traduzida na regra constitucional de reserva de lei da Assembleia da República ou de decreto-lei do Governo emitido a coberto de autorização do Parlamento a que tem de obedecer a criação dos impostos, constante actualmente do art.º 165º, n.º 1, alínea i), da CRP; outra, consubstanciada na exigência de conformação, por parte da lei, dos elementos modeladores do tipo tributário, abrangendo, assim, a incidência objectiva e subjectiva, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes.
É esta segunda dimensão que densifica os fundamentos axiológicos da nossa Constituição Fiscal e que se materializa nos princípios da universalidade, da igualdade tributária e da capacidade contributiva. Ora, a prossecução de um tal desiderato ético-político demanda que a função de definição dos elementos de cuja operacionalidade jurídica emerge a obrigação tributária esteja reservada à lei. Deste modo, o princípio da legalidade tributária, na sua acepção material ou substancial, postula a sujeição ao sub-princípio da tipicidade legal dos elementos de cujo concurso resulte a modelação dos tipos tributários ou dos impostos ou, dito de outro modo, dos elementos essenciais dos impostos, e que são, segundo os próprios termos adquiridos da ciência fiscal pela nossa Lei Fundamental, a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes. Cingindo-nos ao plano da incidência dos impostos - já que a questão de inconstitucionalidade se centra nesse domínio - importa notar que caberá ao legislador (a Assembleia da República ou o Governo, agindo com autorização daquela) a tarefa de eleger, dentro dos factos que revelem a existência de capacidade contributiva, aqueles que devem ser erigidos à categoria de factos tributários ou de factos jurígenos da obrigação de imposto (incidência objectiva). Mas, porque se trata de factos jurídicos, com necessário relevo económico/financeiro, e porque a capacidade contributiva que se pretende afectar
é susceptível de diversas gradações, compete também ao legislador definir os critérios quantitativos de afectação ao imposto do valor desses factos. Fala-se, então, na dimensão quantitativa do facto tributário denominada por matéria colectável. Por outro lado, cabe igualmente à lei a função de definir os termos ou elementos que permitem o estabelecimento do vínculo jurídico de conexão ou de adstrição dos factos tributários objectivos a certo sujeito, convertendo-o em sujeito da obrigação de imposto. Por natureza, atenta a sua função constitucionalmente definida, o legislador tributário goza, em princípio, de discricionariedade normativo-constitutiva quanto à eleição dos factos reveladores de capacidade contributiva que podem ser elevados à categoria de factos tributários, bem como à definição dos elementos que concorrem para se definir a matéria colectável. Mas, como não poderá deixar de ser, com obediência aos parâmetros constitucionais, já acima apontados.
Um destes parâmetros, que é postulado pelos princípios do Estado de Direito e da segurança jurídica que lhe é inerente, é o princípio da determinabilidade. Ao hipotisar os pressupostos de facto/jurídicos da tributação
–ao desenhar o tipo ou o Tatbestand tributário - depara-se, na verdade, o legislador com o problema da previsibilidade dos efeitos jurídicos amputadores da riqueza ou do rendimento dos contribuintes. É neste terreno que se põe, então, a questão da amplitude constitucionalmente admissível dos conceitos usados na definição dos elementos essenciais dos impostos, confrontando-se aqui duas pretensões de sentido oposto. De um lado, a exigência de que a previsão dos factos tributários seja feita de forma «suficientemente pormenorizada», de modo que os contribuintes possam ter algumas certezas quanto à extensão da sua riqueza ou rendimento que sairá afectada pela tributação (cfr. J. M. Cardoso da Costa, Curso de Direito Fiscal,
2ª edição, Coimbra, 1972, pp. 309 e segs.) ou que a lei «leve a disciplina dos referidos elementos essenciais, ou seja, a disciplina essencial de cada imposto, tão longe quanto lhe seja possível» (cfr. José Casalta Nabais, Direito Fiscal,
2ª ed., Coimbra, 2003, pp. 138), de modo que a obrigação de imposto seja o mais certa possível por parte dos contribuintes. É a solução que é reclamada pelo princípio da segurança jurídica dos contribuintes. Segundo esta perspectiva, a incidência (como os demais elementos essenciais) deve ser definida por conceitos cujo sentido seja o mais unívoco possível. Mas, do outro lado, o princípio da igualdade tributária reclama que os conceitos tenham a abertura ou plasticidade semântica suficiente para poder abarcar as realidades que expressam a capacidade tributária elegida, os níveis de riqueza ou de rendimento tributando, e que esse objectivo possa ser realizado não só no plano abstracto da previsão dos tipos tributários, mas também no plano da sua aplicação concreta, em que se situam o combate à evasão fiscal e a praticabilidade do sistema. Na verdade, sem uma estruturação conceitual apta a colher todas as virtualidades que o facto tributário é susceptível de assumir; sem uma eleição de conceitos que permitam surpreender a existência da riqueza e dos rendimentos e, por fim, sem a construção de um sistema exequível sob o ponto de vista da praticabilidade, não pode haver um efectivo cumprimento do princípio da igualdade tributária. São estes, essencialmente, os aspectos que, segundo a doutrina, justificam o uso dos conceitos jurídicos indeterminados, de “certas cláusulas gerais”, de “conceitos tipológicos” (Typusbegriffe), de “tipos discricionários” (Ermessentatbestände) e de certos conceitos que atribuem à administração uma margem de valoração, os designados “preceitos de poder”
(Kann-Vorschrift) (cfr. J. L. Saldanha Sanches, “A segurança jurídica no Estado social de direito”, in Ciência e Técnica Fiscal, n.os 310/312, pp. 299 e segs.; J. Casalta Nabais, O dever fundamental de pagar impostos, Coimbra, 1998, pp. 373 e segs.). Mediante o uso de tais figuras o sistema ganha operacionalidade e aptidão, quer para dar resposta às circunstâncias que o legislador hipotisou, quer para abarcar as novas realidades reveladoras de idêntica capacidade contributiva. Mas, como é evidente, não pode deixar de existir um limite ao uso de tais modos de expressão dos elementos do imposto, sob pena de sair frustrado o objectivo constitucional de cometer aos representantes do povo a definição dos tipos tributários. Se não será sempre indispensável que a norma legal fiscal forneça ao contribuinte a possibilidade de cálculo exacto, sem margem para quaisquer dúvidas ou flutuações, do seu encargo fiscal, é, porém, de exigir que “a norma que constitui a base do dever de imposto seja suficientemente determinada no seu conteúdo, objecto, sentido e extensão de modo que o encargo fiscal seja medível e, em certa medida, previsível e calculável para o cidadão” (cfr. J. Casalta Nabais, O dever fundamental…, cit., p. 356, citando esta fórmula do Tribunal Constitucional Federal alemão, embora criticando ainda a sua insuficiência, e salientando que o princípio da determinabilidade deve “ser entendido com alguma moderação e realismo de modo a compatibilizá-lo com o princípio da praticabilidade”). Relativamente ao princípio da legalidade tributária de reserva de lei formal cabe dizer, também, que ele não abarca os aspectos que contendam com o lançamento, a liquidação e a cobrança dos impostos. É uma solução que decorre directamente do disposto no art.º 103º, n.º 3, segundo o qual “ninguém pode ser obrigado a pagar impostos... cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei”. Atenta a ratio do princípio da legalidade tributária, apenas poderão dizer-se sujeitas às suas exigências formais e materiais aquelas normas que, conquanto possam aparecer inseridas no procedimento de determinação do imposto, assumam um carácter «material ou substantivo» ou cujo conteúdo tenha que ver, ainda, com a modelação normativa dos elementos constitutivos do tipo tributário de cuja concretização factual deriva a obrigação de imposto e o seu montante, extravasando da esfera procedimental ou processual.
É o caso das normas que identificam, ainda, a realidade económica sujeita ao imposto, através da caracterização ou consideração de factores, índices ou expoentes de que o facto tributário se pode revestir. É claro, na verdade, que o legislador, na conformação dos elementos essenciais do tipo tributário, não está inibido, sem qualquer ofensa dos princípios da legalidade tributária e da tipicidade, de lançar mão, para além dos referidos conceitos, de remissões para elementos aos quais atribua a função de determinação dos seus aspectos ou dimensões técnicas (por exemplo, com remissão para um determinado preço que se venha a estabelecer no mercado). Se estas dimensões forem certas ou quase certas, ou, pelo menos, previsíveis, é evidente que a remissão para a sua fixação em nada afronta o princípio da tipicidade e da segurança jurídica que lhe anda associado. Tais normas remissivas têm, ainda, uma função identificadora dos rendimentos ou da riqueza a tributar, bem diferente daquele outro tipo de normas que apenas têm por escopo indicar os métodos ou caminhos a percorrer com vista à determinação da matéria colectável e/ou do imposto, e estão sujeitas ao princípio da legalidade.
6.4. Passemos, agora, à análise da conformidade da concreta norma em questão com a dimensão material do princípio da legalidade tributária, tal como este foi acima recortado. Mas antes de mais importa referir que as considerações subsequentes têm como pressuposto a aceitação da qualificação (em cuja discussão aprofundada não se torna, pois, indispensável entrar), efectuada pela sentença recorrida, do tributo em questão como verdadeiro imposto (pese embora a designação como “taxa sobre comercialização de produtos de saúde”), na medida em que não se divisa qualquer contrapartida com a qual o tributo se encontre em relação sinalagmática, não tendo de saber-se, aqui, se tal resultado interpretativo é o que deverá inferir-se da lei ordinária, à face dos respectivos cânones hermenêuticos. Trata-se de um imposto que visa tributar o consumo de certos
“produtos de saúde” (imposto indirecto sobre o consumo), cujos sujeitos passivos são os “produtores e importadores, ou seus representantes, de produtos de saúde colocados no mercado” (que naturalmente o repercutirão no consumidor final, pelo que este é assim o seu sujeito económico). Por outro lado, cumpre notar que o imposto foi autoliquidado pelo sujeito passivo de acordo com as regras de determinação da matéria colectável que foram definidas pelo INFARMED - Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento que a decisão recorrida considerou, porém, ilegais, porquanto este Instituto
“veio a consagrar uma regra (…) diferente da legalmente estabelecida, pois que manda aplicar a taxa ao volume de vendas do sujeito passivo (que reconhece só muito raramente ser a entidade que vende ao consumidor/utilizador final), quando a lei determina que esse volume de vendas tem por referência o respectivo preço de venda ao consumidor final. Uma coisa é o volume de vendas do sujeito passivo, e outra, bem diferente, é esse volume de vendas por referência ao preço de venda ao consumidor final.”
É claro que o que está aqui em causa não é a regra legal que foi aplicada pelo sujeito passivo na autoliquidação do imposto por si efectuada, correspondente à decorrente da interpretação feita pelo INFARMED, mas antes a norma jurídica tal qual foi determinada pela decisão recorrida, já que foi com base na sua aplicação que esta decretou a anulação da autoliquidação.
O tipo tributário em causa mostra-se caracterizado na sentença recorrida do seguinte modo: a incidência objectiva do tributo é revelada, segundo a expressão legal (art.º 72º, n.º 1, da referida Lei do Orçamento), pela introdução no mercado dos produtos a que aludem as alíneas a) e b) do n.º 2 do mesmo art.º 72º (produtos farmacêuticos homeopáticos, dispositivos médicos não activos e dispositivos médicos para diagnóstico in vitro e cosméticos e produtos de higiene corporal); os sujeitos passivos do imposto (incidência subjectiva) são os produtores e importadores, ou os seus representantes; a dimensão quantitativa do facto tributário em que se expressa a matéria colectável – dimensão ainda da incidência objectiva, segundo os princípios acima expostos - é definida pelo volume de vendas de cada produto daquelas espécies, tendo aquele por referência o respectivo preço de venda ao consumidor final, sobre ele se aplicando as taxas estabelecidas.
Ora o recorte de todos estes conceitos legais permite o conhecimento objectivo, e com segurança jurídica, de qual foi a “entidade” económica que foi seleccionada pelo legislador como facto tributário: a introdução no mercado das espécies identificadas dos referidos produtos. Permite, ainda, conhecer, com previsibilidade e segurança jurídicas, os termos quantitativos do facto tributário que foram legalmente relevados para o apuramento do imposto ou seja, qual a definição da sua matéria colectável: o volume de vendas de cada produto, com referência ao seu preço de venda ao consumidor final e bem ainda os obrigados ao seu pagamento ou os seus sujeitos passivos: os produtores e importadores dos referidos produtos, ou os seus representantes.
É certo que, no momento da produção, da importação ou do lançamento no mercado, não sendo, em regra, os produtores e importadores, ou seus representantes, de produtos de saúde, a vender directamente ao consumidor final, o preço de venda ao consumidor final pode ainda não estar estabelecido (deixando, pois, de parte, a hipótese de eventuais preços fixos, com todas as suas implicações), e que, portanto, pode ainda variar. Não pode, ainda assim, afirmar-se que, com a remissão para tal preço de venda ao consumidor final para o cálculo do imposto – preço, esse, que só vem a fixar-se com exactidão posteriormente –, o encargo fiscal se torne impossível de medir, e deixe de ser, na medida constitucionalmente exigível à luz do princípio da legalidade fiscal, previsível e calculável. Na verdade, o preço de venda ao consumidor final, que a norma em apreço define como a “referência” para o cálculo do imposto (este “incide sobre o volume de vendas de cada produto, tendo por referência o respectivo preço de venda ao consumidor final”), podendo embora variar, de forma a não ser exactamente quantificável no momento das vendas, realizadas por produtores e importadores, ou seus representantes, de produtos de saúde colocados no mercado, não deixa de ser em regra previsível, segundo as condições normais prevalecentes no mercado. E mais: tal preço não só é normalmente previsível como é mesmo - ou deve ser, segundo as leges artis da actividade comercial e industrial - geralmente, previsto, tal como as quantidades que provavelmente serão vendidas ao consumidor final, quer pelos vendedores finais, quer pelos próprios produtores, importadores ou seus representantes, dado que estes, naturalmente, têm de basear nessas previsões os cálculos indispensáveis para o exercício da respectiva actividade económica e empresarial. Não se afigura, assim, que a circunstância de se tomar tal antecipação do que virá a ser o preço de venda ao consumidor final (nos casos em que não se pode saber com certeza qual virá a ser) como base para o cálculo do imposto torne este indeterminável.
É certo que poderá ocorrer uma flutuação do preço de venda ao consumidor final, até à venda a este, em relação ao preço antes previsto, e que esta tanto pode vir a dar-se no sentido negativo (caso em que se poderá ter liquidado imposto com base num preço superior, e, portanto, eventualmente, um encargo fiscal maior do que o que resultaria da consideração do preço realmente verificado) como no sentido positivo (tendo-se liquidado um montante de imposto inferior ao correspondente ao preço real), sendo, até, este último o caso normalmente propiciado por conjunturas de inflação. Nesta senda poder-se-ia dizer que o preço tomado por base da autoliquidação seria um preço presumido. Todavia, a circunstância de, eventualmente, o sujeito passivo ter de, ao autoliquidar o imposto, partir de um preço presumido ao consumidor final não quer dizer que o legislador não tenha definido a incidência em torno do preço de venda ao consumidor final. Donde se poderá concluir que o estado de dúvida subjectiva sobre o preço a tomar como base de autoliquidação do imposto se deve exclusivamente ao regime de liquidação do tributo, numa dimensão procedimental estranha ao princípio da tipicidade ou da legalidade fiscal – e, de todo o modo, que se trata de um problema de calculabilidade do imposto com exactidão, que, como resulta do que se disse, não poderia fundar nunca uma conclusão pela indeterminabilidade da obrigação tributária, e consequente violação do princípio da legalidade fiscal, consagrado no artigo 103º, n.º 2, da Constituição da República: a opção do legislador por um regime de autoliquidação do tributo, como acontece neste tipo tributário, em vez de por um regime de apuramento ou de liquidação administrativas é irrelevante para a definição do grau de certeza objectiva da incidência que é exigível pelo princípio constitucional referido. Conclui-se, pois, no sentido de que o n.º 3 do artigo 72º da referida Lei n.º
3-B/2000, de 4 de Abril (Lei do Orçamento do Estado para 2000), não viola a dimensão material do princípio da legalidade tributária.
6.5. A impugnante, ora recorrida, sustenta, ainda, que o tributo, assim modelado nos termos do art.º 72,º n.os 1 e 3, da Lei n.º 3-B/2000, é inconstitucional por violação do disposto no art.º 104º, n.º 2, da CRP (princípio da tributação do rendimento real). Mas não tem razão, como se verá de seguida. A nossa Constituição concebeu a realidade dos impostos enquanto um sistema que, no seu todo, deve “visa[r] a satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas e uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza”. E deixando, embora, ao legislador ordinário um vasto campo de eleição quanto à conformação dos tipos tributários a criar ou a manter, não deixou, desde logo, de lhe apontar os princípios rectores aos quais os diversos tipos de impostos deverão obedecer, consoante os factos económicos que atinjam - o rendimento pessoal, o rendimento das empresas, o património e o consumo -, prevendo uma tributação sobre o rendimento pessoal, sobre o rendimento das empresas, do património e do consumo.
No que concerne à tributação das empresas, que é o domínio em que se insere a concreta questão de inconstitucionalidade posta pela recorrida, o diploma básico estabelece que ela “incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real”. A tributação segundo o rendimento real é, numa certa dimensão, uma decorrência necessária do princípio da capacidade contributiva. É ele que justifica que a Constituição estabeleça que o sistema fiscal não pode deixar de assegurar “uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza” (art.º 103º, n.º 1) e que especifique, posteriormente, que os impostos devem ter em conta as “necessidades e os rendimentos [concretos] do [de cada] agregado familiar” e, finalmente, que a “tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real”.
Mas o rendimento real fiscalmente relevante não é, em si próprio, uma realidade de valor fisicamente apreensível, mas antes um conceito normativamente modelado e contabilisticamente mensurável, sendo constituído, simpliciter, “pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas [previstas na lei e] verificadas no mesmo período” (cfr. art.º 17º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas) - o saldo entre os proveitos ou ganhos provenientes das mais diversas fontes, como vendas, bónus, comissões, rendimentos de imóveis, rendimentos de carácter financeiro, prestações de serviços, mais-valias realizadas, subsídios, etc., menos os custos ou perdas, como os encargos relativos à produção, distribuição e venda, encargos de natureza financeira e de natureza administrativa, encargos fiscais e parafiscais, reintegrações e amortizações, etc., acrescido das variações patrimoniais positivas ou diminuído das variações patrimoniais negativas, previstas na lei. Por outro lado, a injunção constitucional da tributação segundo o rendimento real não pode deixar de atender, necessariamente, aos princípios da praticabilidade e de operacionalidade do sistema, pelo que não pode deixar de se lhes reconhecer natureza constitucional, sob pena dos arquétipos legalmente construídos não conseguirem realizar, com a aproximação possível, o princípio da universalidade e da igualdade no pagamento de os impostos.
Um sistema inexequível ou um sistema que não permita o controlo dos rendimentos e da evasão fiscal, na medida aproximada à realidade existente, conduz em linha recta à distorção, na prática, do princípio da capacidade contributiva e da tributação segundo o rendimento real. São estas as dificuldades que explicam que a Constituição se tenha limitado a prever que a imposição fiscal deve incidir fundamentalmente sobre o rendimento real, não «excluindo com tal disposição o recurso a outras formas fiscais estranhas ao mito do apuramento declarativo-contabilístico do rendimento real»
- José Guilherme Xavier de Basto (O princípio da tributação do rendimento real e a Lei Geral Tributária, in Fiscalidade, n.º 5), (cfr. também, João Pedro Alves Ventura Silva Rodrigues, Algumas reflexões em torno da efectiva concretização do princípio da capacidade contributiva, in Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, 2003, pp. 906 e ss.).
No dizer de Casalta Nabais, «a CRP, ao exigir que a tributação das empresas se norteie pelo rendimento real, está apenas a “recortar” o quadro típico ou caracterizador do sistema fiscal (...) e não [a] “estabelecer” ou “desenhar a cheio” esse mesmo quadro» (cfr. “Alguns Aspectos do quadro constitucional das empresas”, in Fisco, n.os 103/104, pp. 19).
Ora, mesmo desprezando a admitida circunstância de a Constituição poder admitir uma tributação das empresas não subordinada estritamente ao seu rendimento real, verifica-se que o tributo acima normativamente recortado não tem a natureza de um tributo sobre o rendimento real, na medida em que ele não incide sobre a “soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas [previstas na lei e] verificadas no mesmo período”, auferido pelos seus sujeitos passivos. Ele é, antes, basicamente, uma imposição tributária que se enquadra no tipo daqueles tributos que procuram atingir o consumo dos específicos bens a que respeita.
Nesta perspectiva, os factos geradores da obrigação tributária ou a sua causa legal não são a obtenção de certo rendimento pelo obrigado tributário, expresso nos referidos termos, mas o consumo evidenciado pela venda de tais produtos.
Não se pode verificar, pois, qualquer violação do princípio do rendimento real estabelecido no art.º 104º, n.º 2, da CRP.
C – A decisão
7. Destarte, atento tudo o exposto, decide este Tribunal Constitucional:
a) não julgar inconstitucional a norma do n.º 3 do art.º 72º da Lei n.º 3-B/2000
(Orçamento do Estado para 2000), de 4 de Abril; b) conceder provimento ao recurso; c) ordenar a reforma da decisão recorrida em função do aqui decidido.
Lisboa, 3 de Março de 2004
Benjamim Rodrigues Paulo Mota Pinto Rui Manuel Moura Ramos Gil Galvão Carlos Pamplona de Oliveira Bravo Serra Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Maria Helena Brito Artur Maurício Vítor Gomes Maria Fernanda Palma (vencida nos termos e pelo essencial das razões da declaração de voto do Conselheiro Mário Torres)
Mário José de Araújo Torres (vencido, nos termos da declaração de voto junta)
Luís Nunes de Almeida
DECLARAÇÃO DE VOTO
Votei vencido, pois confirmaria o juízo de inconstitucionalidade contido na decisão recorrida.
Assente que a matéria colectável do tributo em causa é representada pelo “volume de vendas de cada produto, tendo por referência o respectivo preço de venda ao consumidor final” e sendo este preço, em regra, desconhecido na data em que o contribuinte tem de proceder à liquidação do imposto, afigura-se-me inegável a violação do princípio da determinabilidade, que constitui um elemento essencial do princípio da legalidade tributária. Não vejo, na verdade, como se pode defender, como o faz o precedente acórdão, que o regime instituído pela norma questionada “permite (...) conhecer, com previsibilidade e segurança jurídicas, os termos quantitativos do facto tributário que foram legalmente relevados para o apuramento do imposto”
(sublinhado acrescentado).
O erro básico cometido pelo legislador ao adoptar este regime foi determinado pelo facto de ter decalcado acriticamente o sistema instituído pelo Decreto-Lei n.º 282/95, de 16 de Outubro, que regulou a “taxa de comercialização dos medicamentos”, a que ficaram sujeitos os titulares de autorização de introdução no mercado de cada medicamento de uso humano e de uso veterinário, fixando a respectiva taxa em 0,4% do volume de vendas de cada medicamento, calculada sobre “um preço de venda ao público de referência”. Porém, nesse diploma logo se estabelecia que “o preço de venda ao público de referência é calculado mediante a aplicação das margens de comercialização máximas admitidas para os medicamentos comparticipáveis” (n.º 4 do artigo 1.º). Esta regra possibilitava aos sujeitos obrigados ao pagamento desse tributo o conhecimento preciso do valor exacto da matéria colectável sobre que incidia essa taxa, no momento da liquidação do imposto. A inexistência de norma similar relativamente ao tributo ora em causa, tornando desconhecido e indeterminável com o mínimo de precisão, na generalidade dos casos, esse elemento essencial da obrigação tributária, viola o princípio constitucional da legalidade tributária.
Em tal violação deixou de incorrer o legislador quando, nas leis orçamentais dos anos seguintes, passou a fazer incidir a taxa em causa
“sobre o montante de volume de vendas dos mesmos produtos das entidades responsáveis pela sua colocação no mercado” (artigo 58.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 30-C/2000, de 29 de Dezembro – Orçamento do Estado para 2001, e artigo
55.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro – Orçamento do Estado para 2002). Solução que veio a ser consagrada no novo regime legal desse tributo, que o faz incidir “sobre o montante do volume de vendas dos mesmos produtos, deduzido o imposto sobre o valor acrescentado, pelas entidades responsáveis pela sua colocação no mercado” (artigo 1.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 312/2002, de 20 de Dezembro). Desapareceu, assim, em todos esses diplomas, a determinação da liquidação com base no (genericamente desconhecido no momento em que o obrigado tributário tem de fazer essa operação) “preço de venda ao consumidor final”, e que, a meu ver, infringia o princípio da legalidade tributária.
Acresce que resulta dos artigos 45.º, n.º 1, 54.º, n.º
1, alínea c), e 78.º da Lei Geral Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei n.º
398/98, de 17 de Dezembro, que, enquanto não caducar o direito à liquidação, o INFARMED, com a cooperação da Administração Fiscal, tem o dever de, detectada desconformidade, por defeito, entre o valor que o sujeito obrigado ao pagamento do tributo indicou como sendo previsivelmente o preço de venda ao consumidor final, e com base no qual procedeu à autoliquidação, e o preço que efectivamente veio a ser fixado pelo mercado para a venda ao público do produto em causa, proceder a liquidação adicional, exigindo ao produtor ou importador
(ou seus representantes) o pagamento da diferença, num momento em que a estes já se tornou impossível proceder à repercussão desse acréscimo no elo seguinte da cadeia de comercialização. Daqui resulta, a meu ver, uma amputação do rendimento desses sujeitos, não bastando, para a tornar irrelevante, a mera possibilidade, absolutamente aleatória, da ocorrência de situações inversas e consequentes compensações.
Nem se diga que a relativização das exigências do princípio da determinabilidade se justifica, no caso, por razões de praticabilidade, já que bastaria ao legislador, por exemplo, ter escolhido como preço de referência o da venda efectuada pelo produtor ou importador, como, aliás, veio a fazer nas leis orçamentais subsequentes e no novo regime legal do tributo em causa, atrás referidos.
Foi isto que se propôs fazer o INFARMED, quando, certamente dando-se conta do erro cometido pelo legislador, emitiu as referidas instruções para o preenchimento dos modelos de declarações de venda por ele aprovadas, mas que a decisão recorrida julgou ilegais, por consagrarem regras de determinação da matéria tributável (volume de vendas do sujeito passivo, que só muito raramente será a entidade que vende ao consumidor final) diferentes da então legalmente estabelecida (volume de vendas tendo por referência o respectivo preço de venda ao consumidor final).
A conformidade constitucional de uma norma legal tem de ser aferida face à sua directa estatuição e não face a intervenções da Administração que possam ser entendidas como antecipada renúncia à integral execução da lei. Sendo inconstitucional o critério de determinação da matéria tributável estabelecido pela lei, não é a circunstância de o INFARMED se propor adoptar outro critério, menos desfavorável para o obrigado tributário e já respeitador dos princípios constitucionais relevantes, que pode afastar o juízo de inconstitucionalidade incidente sobra a norma legal em causa.
Mário José de Araújo Torres