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Proc. nº 79/01 TC – 1ª Secção Relator: Consº. Artur Maurício
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 – Nos autos do recurso interposto por M..., identificado nos autos, foi proferida a seguinte decisão sumária:
'1 – M..., identificado nos autos, foi condenado no 1ª Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Valongo, pela prática de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, com dolo eventual,, p. e p. pelos artigos 14º nº
3, 22º, 23º nº 2, 73º nº 1, 131º e 132º nºs 1 e 2 alínea c) (d) actualmente) do Código Penal, na pena de quatro anos de prisão.
Inconformado, recorreu para o Tribunal da Relação do Porto que, por acórdão de fls. 353 e segs, negou provimento ao recurso.
De novo inconformado, recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça que, por acórdão de fls. 402 e segs, manteve o decidido, negando provimento ao recurso.
É deste acórdão que vem interposto o presente recurso de constitucionalidade, ao abrigo do artigo 70º nº 1 alínea b) da Lei nº 28/82. Sobre a questão de constitucionalidade que pretende ver apreciada por este Tribunal, diz o recorrente no requerimento de interposição do recurso:
'A questão da inconstitucionalidade da aplicação ao caso sub judice das normas previstas nos artigos 131º e 132º nºs 1 e 2 d) do Código Penal, ainda que aplicadas sob a modalidade de tentativa, foi levantada nas alegações de motivação de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça – cfr., desde logo, se poderá atestar pela conclusão XI das referidas alegações. Com efeito, inexistindo no recorrente a intenção de matar, cfr. consta da matéria fáctica considerada pelo douto acórdão recorrido, excluído o dolo de homicídio, a aplicação das normas supra referidas ao caso concreto, e não a prevista no artigo 143º do Código Penal, consubstancia uma inconstitucionalidade, porquanto resulta violado o princípio da legalidade previsto no artigo 29º da Constituição da República Portuguesa'.
Cumpre decidir.
2 - Como reiteradamente o Tribunal Constitucional tem decidido, o recurso de constitucionalidade previsto no nosso ordenamento jurídico é um recurso de constitucionalidade normativa – ele tem por objecto uma norma (ou uma sua interpretação) e não a própria decisão judicial que a aplica.
Ora, sobre questões idênticas à dos presentes autos tem o Tribunal Constitucional (desde logo pelas suas 1ª e 3ª Secções) entendido que elas não constituem, em bom rigor, questões de constitucionalidade normativa, mas da própria decisão judicial recorrida. Assim, aconteceu – estando em causa um pretenso erro na qualificação jurídico-penal dos factos - no Acórdão nº 79/00 (inédito) que confirmou parecer do Relator que se expressara nos seguintes termos:
'Tal significa, nas circunstâncias do caso, que o ora reclamante impugna a aplicação ao caso da norma do artigo 20º, nº 1, da Lei nº 34/87, de 16 de Julho, que define os elementos do tipo do crime de peculato e estabelece a respectiva punição. O que o ora reclamante verdadeiramente questiona é o processo interpretativo que permitiu ao tribunal recorrido abranger no conceito de apropriação ilícita os actos que são atribuídos ao arguido. Tal processo interpretativo efectuado pelo tribunal a quo, por não ter respeitado – segundo a concepção do reclamante – os limites da interpretação da lei penal decorrentes do princípio da legalidade, implicaria a inconstitucionalidade da própria norma penal incriminatória, quando objecto de tal interpretação, por ofensa do referido princípio constitucional. Considerando ter havido um erro de julgamento, o ora reclamante invocou afinal a inconstitucionalidade da decisão judicial que considerou subsumível a conduta do arguido ao tipo de crime previsto e punido por determinada norma jurídica, e não a inconstitucionalidade da norma jurídica em que tal decisão se fundamentou. Por outras palavras, o que vem impugnado pelo ora reclamante não é a norma, em si mesma considerada, mas antes a decisão judicial que a aplicou, por via de um processo interpretativo que ele considera constitucionalmente proibido. Ora, o Tribunal Constitucional tem entendido, embora nem sempre por unanimidade, que, nas hipóteses como a dos autos, em que se questionam certas interpretações normativas por ofensa do princípio da tipicidade ou da legalidade penal, não estão em causa verdadeiras questões de inconstitucionalidade normativa mas antes questões de inconstitucionalidade da própria decisão recorrida ou do acto de julgamento (neste sentido, cfr.: acórdão nº 353/86, Acórdãos do Tribunal Constitucional, 8º vol., p. 571 ss; acórdão nº 634/94, Acórdãos ..., 29º vol., p. 243 ss; acórdão nº 221/95, Diário da República, II Série, de 27 de Junho de
1995, p. 7088 ss; acórdão nº 756/95, Acórdãos ..., 32º vol., p. 775 ss; acórdão nº 682/95, inédito; acórdão nº 154/98, inédito; e, mais recentemente, acórdão nº
674/99, inédito, onde pode encontrar-se uma análise da jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre esta matéria).
É que tal questão – por não respeitar a uma inconstitucionalidade normativa, mas antes a uma inconstitucionalidade da própria decisão judicial – excede os poderes de cognição do Tribunal Constitucional, tendo em conta que o nosso sistema não admite o denominado recurso de amparo, maxime na modalidade de amparo em relação a decisões jurisdicionais directamente violadoras da Constituição. De todo o modo, mesmo que se entendesse que este Tribunal ainda seria competente para conhecer das questões de inconstitucionalidade resultantes da circunstância de ter sido utilizado um processo de interpretação constitucionalmente proibido
(por via da integração analógica ou de uma operação equivalente), sempre se deverá considerar excluída da competência do Tribunal Constitucional a apreciação de interpretações tidas por erróneas, efectuadas pelos tribunais comuns, com fundamento em violação do princípio da legalidade. Como o Tribunal Constitucional tem afirmado repetidamente, o controlo de constitucionalidade atribuído a este Tribunal só pode ter por objecto normas jurídicas e não também actos jurídicos de outra natureza, como as decisões judiciais. Disse este Tribunal, por exemplo, no citado acórdão nº 353/86:
«Ao sistema de fiscalização da constitucionalidade instituído pela nossa lei fundamental estão, assim, apenas sujeitos os actos do poder normativo (lato sensu), ou seja, aqueles que contêm uma «regra de conduta» ou um «critério de decisão» para os particulares, para a Administração e para os tribunais. Escapam a esse controle de constitucionalidade, por isso, as decisões judiciais, os actos da Administração sem carácter normativo (actos administrativos propriamente ditos) e os «actos de governo» em sentido estrito ou «actos políticos». Em boa verdade, aí já não se estará perante «actos normativos», sim em presença de actos de aplicação, execução ou simples utilização de normas – seja de normas infraconstitucionais, seja mesmo de normas constitucionais [...]. Assim, pois, sendo a competência deste Tribunal restrita ao julgamento de questões de inconstitucionalidade de normas jurídicas (cf. art. 280º, nº 6, da Constituição), não pode ele censurar uma decisão judicial que, por eventual erro de julgamento, haja violado directamente uma norma ou princípio constitucional.'
No caso dos autos, em que nem sequer vem invocado qualquer processo de integração analógica ou operação equivalente, mas uma mera interpretação considerada «errada» pelo ora reclamante, tem necessariamente de se concluir pela inexistência de uma questão de inconstitucionalidade normativa de que o Tribunal deva conhecer.' Também no Acórdão nº 674/99, in DR II Série de 25/2/2000 se decidiu sobre questão semelhante – a violação do princípio da legalidade ou da tipicidade pelo enquadramento jurídico-penal dos factos no crime de burla – o seguinte:
'49. No tocante à primeira questão suscitada, o recorrente J.......... começa por assinalar que a actual incriminação da burla (constante do artigo 313º do Código Penal de 1982 e hoje consignada no artigo 217º do Código Penal de 1995) possui como seu elemento típico essencial o conceito de
«astúcia». E que, sendo este um conceito indeterminado, sem definição legal, carece, no seu entender, de um esforço de interpretação jurídica para a definição dos respectivos contornos.
Neste contexto, o recorrente entende que a interpretação jurídica a efectuar, no tocante a conceitos integrantes de elementos típicos de normas incriminatórias não é livre, antes estando forçosamente contida nos limites da tipicidade decorrente do artigo 29º, nº 1, da Constituição. Prosseguindo no enunciado dos limites colocados ao intérprete pelo princípio da legalidade incriminatória, considera o recorrente que aí se inclui «a proibição de uma interpretação que ultrapasse o campo semântico natural dos conceitos jurídicos empregues pelo legislador na conformação dos seus tipos penais»; e conclui, consequentemente, que uma interpretação que extravase tais limites tornará a norma assim interpretada materialmente inconstitucional.
Nesta conformidade, o que o recorrente verdadeiramente questiona é o processo interpretativo que permitiu ao tribunal recorrido abranger a reserva mental de incumprimento no conceito de astúcia. Tal processo interpretativo efectuado pelo tribunal a quo, por não ter respeitado os limites de interpretação da lei penal decorrentes do princípio da legalidade incriminatória, consignado no artigo 29º, nº 1, da Lei Fundamental, designadamente a proibição da analogia e da interpretação extensiva «que ultrapasse o campo semântico natural dos conceitos jurídicos», consequenciaria a inconstitucionalidade da própria norma penal incriminatória, quando objecto de uma tal interpretação, por violação do referido princípio constitucional.
Resta, porém, saber se essa questão se reconduz a uma verdadeira questão de inconstitucionalidade normativa, isto é, a uma questão que caiba ao Tribunal Constitucional conhecer, no âmbito do recurso de constitucionalidade.
50. O Tribunal Constitucional, pela sua 2ª Secção, começou por considerar que, em tais casos, se estaria perante «a inconstitucionalidade do acto de julgamento, e não a inconstitucionalidade de uma norma jurídica», pelo que se lhes não aplicaria o sistema de fiscalização da constitucionalidade, ao qual estão «apenas sujeitos os actos do poder normativo» (cfr. Acórdão nº
353/86, Acórdãos do Tribunal Constitucional, 8º vol., págs. 571 e segs.).
Contudo, mais tarde, no Acórdão nº 141/92 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 21º vol., págs. 599 e segs.), o Tribunal Constitucional, pela sua 1ª Secção, embora com o voto de vencido do Exmº Presidente, Consº Cardoso da Costa, deu resposta afirmativa ao problema. Afirmou-se então: De facto, poderia sustentar-se que o Tribunal Constitucional carecia de competência para conhecer do objecto deste recurso, porquanto não estaria em causa propriamente matéria normativa (norma inconstitucional, numa certa interpretação da mesma), mas matéria decisória (o Supremo Tribunal de Justiça, ao confirmar a decisão condenatória da primeira instância, teria aplicado analogicamente uma norma incriminatória, em contravenção imediata ao disposto no artigo 1º, nº 3, do Código Penal, só mediatamente se podendo considerar que esta decisão judicial teria violado os nºs. 1 e 3 do artigo 29º da Constituição
[...].
Não obstante o carácter sugestivo deste raciocínio, crê-se que o mesmo não procede. De facto, o recorrente suscitou no recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a questão de inconstitucionalidade da norma [...]. Sustentou aí que o tribunal havia interpretado extensivamente ou aplicado analogicamente certa norma incriminatória, sendo tal interpretação ou aplicação analógica através da criação de uma norma análoga aplicável a um caso omisso, contrárias à Constituição (no caso de se estar perante uma interpretação extensiva, seria também esta inconstitucional tal como o seria, por idêntica razão, o nº 3 do artigo 1º do Código Penal).
Ora, num plano perfunctório de análise de verificação dos pressupostos do recurso de constitucionalidade, ou seja, numa avaliação prima facie de tais pressupostos, entende-se que os mesmos se verificam no caso concreto. Saber se a interpretação perfilhada foi ou não inconstitucional faz parte já do conhecimento da questão de fundo ou de mérito. [...]
51. Esta última jurisprudência, porém, não se sedimentou. Com efeito, posteriormente, o Tribunal Constitucional veio a entender, nomeadamente no Acórdão nº 634/94 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 29º vol., págs. 243 e segs.), no Acórdão nº 221/95, (Diário da República, II Série, de 27 de Junho de
1995), no Acórdão nº 756/95, (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 32º vol., págs. 775 e segs.), no Acórdão nº 682/95, (inédito) ou, mais recentemente, no Acórdão nº 154/98 (inédito), que hipóteses em que se questionem certas interpretações normativas por ofensa do princípio da legalidade penal - ou hipóteses idênticas, no âmbito do respeito pelo princípio da legalidade fiscal - não traduzem verdadeiras questões de inconstitucionalidade normativa, mas reflectem antes questões de inconstitucionalidade da própria decisão recorrida ou do acto de julgamento.
Assim, pode ler-se no citado Acórdão nº 221/95: Portanto, o que a recorrente questiona, no essencial, no recurso interposto no tribunal a quo, não é a norma [...] interpretada em desarmonia com a Constituição, mas, antes, a decisão judicial [...] que, inconstitucionalmente, e na sua tese, tê-la-ia prejudicado, ao aplicar certa norma ao seu caso, através de um método de interpretação colidente com as regras gerais de interpretação das leis fiscais e os princípios constitucionais na matéria [...].
E, por outro lado, escreveu-se no já mencionado Acórdão nº 154/98: Pretende o recorrente que o Tribunal recorrido interpretou a norma do artigo
292º do Código Penal de forma extensiva, aplicando-o analogicamente, desde logo violando o disposto no nº 1 do artigo 29º da Constituição
. No entanto, não é o controlo normativo - legitimante do recurso de constitucionalidade - que está em causa.
[...] Ora, esse objectivo não se compagina com aquele controlo normativo, abrindo via, quando muito, a um recurso de amparo que não está entre nós previsto.
E sublinhe-se também que no anteriormente referido Acórdão nº 682/95 se entendeu sugestivamente que, em tais hipóteses, «o que está em causa não é uma específica dimensão normativa do preceito», mas antes «a determinação do seu
âmbito de aplicação, de acordo com a sua ratio», tarefa que «corresponde apenas
à subsunção jurídica do caso, não havendo nenhum sentido específico da norma confrontável com a Constituição». Por isso, aí mesmo se concluiu que não estaria em causa «qualquer específica questão de constitucionalidade, mas apenas um problema de averiguação da intenção normativa, objectivamente considerada, e de subsunção».
52. Mais recentemente, porém, esta posição do Tribunal - que já não era totalmente unânime (cfr. declarações de voto do Exmo. Conselheiro José de Sousa Brito apostas ao Acórdão nº 634/94 e ao Acórdão nº 756/95) - parece ter-se inflectido através do Acórdão nº 205/99 (Diário da República, II Série, de 5 de Novembro de 1999) e do Acórdão nº 285/99 (Diário da República, II Série, de 21 de Outubro de 1999).
Com efeito, entendeu-se no citado Acórdão nº 205/99:
É objecto do presente recurso de constitucionalidade o confronto de uma interpretação do artigo 120º, nº 1, alínea a), do Código Penal de 1982 com os artigos 29º, nºs 1 e 2 e 32º, nºs 1 e 4, da Constituição
. Consubstancia um tal confronto uma verdadeira questão de constitucionalidade normativa para cujo conhecimento o Tribunal Constitucional tem competência ou estar-se-á, apenas, perante o pedido de apreciação de uma eventual contradição da decisão recorrida, na sua substância meramente decisória, com a Constituição? Impõe-se o entendimento segundo o qual o Tribunal Constitucional se confronta, neste caso, com uma verdadeira questão de constitucionalidade normativa, apesar de tal questão resultar de o tribunal recorrido ter atingido um resultado interpretativo eventualmente proibido, em face das restrições interpretativas impostas pelo princípio da legalidade em direito penal. Com efeito, várias razões intercedem a favor de que a questão colocada não pretende suscitar o mero controlo pelo Tribunal Constitucional da decisão recorrida. Assim, desde logo, o recorrente não submete à apreciação do Tribunal Constitucional um processo interpretativo utilizado pontualmente na decisão recorrida, isto é, a inserção do caso concreto num âmbito normativo pré-determinado pelo julgador. Não é um tal momento de sotoposição do caso no quadro lógico decorrente da interpretação da norma o que verdadeiramente se questiona, mas antes um certo conteúdo interpretativo atribuído ao artigo 120º, nº 1, alínea a), o qual é identificado. Questiona-se, sem dúvida, se a fixação de sentido da norma, segundo a qual esta abrangerá, em geral, na interrupção da prescrição, a notificação ao arguido do despacho do Ministério Público para interrogatório no inquérito e a realização deste' é uma interpretação normativa compatível com a Constituição, em face dos artigos 29º, nºs 1 e 3 e 32º, nºs 1 e
4. É, assim, o conteúdo final da interpretação, ou dito de outro modo, o resultado interpretativo pelo qual se atinge a norma que decide o caso, norma que eventualmente não tem competência constitucional para o decidir, que é submetido ao controlo de constitucionalidade. A isto acresce que o referido conteúdo interpretativo não é apenas determinado pelo caso concreto, mas é referido com elevada abstracção, na base de uma linha jurisprudencial anterior que utilizou a mesma perspectiva interpretativa para casos idênticos. Emerge, assim, claramente, de um momento interpretativo a questão de constitucionalidade. Não se trata de um momento meramente aplicativo da norma ao caso concreto, isto é, de uma situação em que o recorrente suscite apenas a correcção lógico-jurídica da inclusão do caso na norma. Trata-se, antes, da indicação, com suficiente autonomia, dos critérios jurídicos genérica e abstractamente referidos pelo julgador ao texto legal para decidir casos semelhantes. Neste caso, foi enunciada pelo julgador uma dimensão normativa que, segundo o recorrente, não corresponde fielmente às palavras do legislador, violando, por isso, o princípio da legalidade, sendo essa dimensão normativa que o recorrente pretende ver apreciada. Ora, o Tribunal Constitucional não pode deixar de controlar dimensões normativas referidas pelo julgador a uma norma legal ainda que resultantes de uma aplicação analógica, em casos em que estejam constitucionalmente vedados certos modos de interpretação ou a analogia. O resultado do processo de interpretação ou criação normativa (tanto de meras dimensões normativas como de normas autónomas), ínsito na actividade interpretativa dos tribunais, não pode deixar de ser matéria de controlo de constitucionalidade pelos tribunais comuns e pelo Tribunal Constitucional, quando a própria Constituição exigir limites muito precisos a tais processos de interpretação ou criação normativa, não reconhecendo qualquer amplitude criativa ao julgador.
Questão afim da anterior é a de saber se o objecto do recurso é efectivamente o artigo 120º, nº 1, alínea a), do Código Penal ou antes uma norma construída pelo julgador através de um processo de integração de lacuna por analogia, nos termos do artigo 10º, nºs 1 e 2, do Código Civil. Note-se, porém, que em ambos os casos estaremos confrontados com uma norma cuja conformidade à Constituição é sindicável perante o Tribunal Constitucional. Na primeira hipótese, concluir-se-á que a aplicação analógica ainda constitui uma actividade interpretativa, em sentido amplo, dando como resultado uma certa dimensão normativa que pode contrariar normas ou princípios constitucionais. Na segunda hipótese, estará em causa uma norma não escrita igualmente susceptível de afrontar a Constituição quer quanto ao seu conteúdo quer quanto à sua génese (a circunstância de ser obtida mediante uma aplicação analógica vedada pelo artigo
29º, nºs 1 e 3, da Constituição feri-la-á de inconstitucionalidade material).
Todavia, esta questão acaba por ser de cunho puramente teorético na medida em que estará sempre em causa a questão de saber se é compatível com a Constituição a norma que determina a interrupção da prescrição obtida a partir do artigo 120º, nº 1, alínea a) do Código Penal. E, independentemente de estar em causa uma interpretação extensiva ou aplicação analógica desta norma legal, o que se pergunta é se a norma, dimensão, sentido ou interpretação obtidos contrariam ou não, na sua génese, o princípio da legalidade e, em concreto, a exigência de lex certa que lhe é ínsita.
Também este aresto não obteve unanimidade.
Com efeito, o Exmo. Conselheiro-Presidente manifestou opinião contrária à doutrina que obteve vencimento - em voto de vencido que juntou a este mesmo Acórdão nº 205/99 - tendo então considerado que se não deveria conhecer do recurso, «por entender que o seu objecto extravasa o âmbito da competência e do poder de cognição do Tribunal», e que a argumentação desenvolvida em contrário no acórdão não punha em crise a conclusão «de que, ao cabo e ao resto, já não está em causa, na situação, uma questão de inconstitucionalidade 'normativa' – tal como o não estava nos casos versados nos Acórdãos nº 682/95 e 221/95, os quais [...] não são 'estruturalmente' diferentes do ora em apreço».
Posição idêntica de afastamento relativamente a esta nova corrente jurisprudencial viria também posteriormente a ser manifestada pelo ora relator, através de declaração de voto aposta, por sua vez, ao mencionado Acórdão nº
285/99.
53. Acerca da questão em apreço, designadamente da eventual extensão do sistema de controlo da constitucionalidade às normas que se extraem da integração de lacunas, afirma Rui Medeiros (A Decisão de Inconstitucionalidade - Os autores, o conteúdo e os efeitos da decisão de inconstitucionalidade da lei, Universidade Católica Editora, Lisboa, 1999, págs. 340 a 342):
A conclusão adoptada não significa, porém, que o Tribunal Constitucional possa fiscalizar a constitucionalidade, não já da norma determinada através do processo de integração de lacunas, mas antes do próprio processo de obtenção da regra aplicável. A questão ganha particular relevância nos domínios em que existe uma proibição constitucional de recurso à analogia. É o que sucede, concretamente, com o princípio constitucional da legalidade em matéria penal.
Há quem entenda que cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que, aplicando analogicamente uma norma incriminadora, violam o princípio constitucional da legalidade em matéria penal. Não duvidamos que essa é a solução mais consentânea com a lógica do recurso de amparo ou da queixa constitucional. Mas, já o sabemos, o legislador constitucional português não quis introduzir um sistema semelhante ao da acção constitucional de defesa de direitos fundamentais. Ora, independente da questão de saber se a violação do nullum crimen sine lege stricta envolve ou não uma inconstitucionalidade directa, a verdade é que, quando invoca a proibição da analogia, o que o recorrente suscita é «a inconstitucionalidade do acto de julgamento e não a inconstitucionalidade de uma norma jurídica». Sem dúvida que, nos casos em que um tribunal interpreta uma lei em desconformidade com a Constituição, a inconstitucionalidade não pode apenas ser imputada ao legislador, pois, sendo possível atribuir à lei um sentido conforme com a Constituição, a disposição legal em si é válida. Mas, na hipótese aqui em apreciação, a inconstitucionalidade, ainda que se convole numa inconstitucionalidade material, reporta-se unicamente ao processo de integração de lacunas adoptado pelo tribunal. Ora, uma coisa é dizer que a norma que um tribunal extrai, ainda que por analogia, de um acto normativo pode ser fiscalizada pelo Tribunal Constitucional, outra, bem diferente, á afirmar que a própria decisão jurisdicional constitui um acto normativo sindicável pelo Tribunal Constitucional. De resto, se assim não fosse, «todas as decisões judiciais, enquanto tais, susceptíveis de fiscalização da constitucionalidade
(...). E assim se defraudaria a Constituição, que expressamente pretendeu que o controlo da constitucionalidade fosse um controlo eminente normativo.
Tudo somado, é possível concluir que, nos casos em que o próprio legislador pode (sem ofender a Constituição) estabelecer por via legislativa solução idêntica àquela que resultava da interpretação ou integração inconstitucional da lei realizada pelo tribunal a quo, o Tribunal Constitucional não pode conhecer do recurso.
É para a transcrita fundamentação lógica - válida necessariamente, tanto para as formas não admissíveis de interpretação extensiva, como para a interpretação analógica - que ora se remete, assim se confirmando a jurisprudência deste Tribunal seguida entre 1994 e 1998 e vertida nos arestos anteriormente citados.
Com efeito, o recorrente não questiona que o conteúdo da norma, com a interpretação adoptada, seja compatível com o texto constitucional – nomeadamente, não questiona que a norma em causa pudesse proceder, por opção expressa do legislador, à referida incriminação quando ocorresse apenas reserva mental de incumprimento. O que vem questionado pelo recorrente nos presentes autos é tão-só que o julgador possa alcançar esse mesmo conteúdo normativo através de um processo interpretativo, já que, ao fazê-lo através de uma forma desrespeitadora dos limites fixados à interpretação da lei criminal, viola necessariamente o princípio da legalidade penal. Ou seja, não se questiona que o comportamento do recorrente possa ser objecto de uma incriminação, apenas se questiona se ele preenche efectivamente o tipo legal do crime de burla.
Conclui-se, assim, inequivocamente, que o que vem impugnado pelo recorrente não é a norma, em si mesma considerada, mas antes, a decisão judicial que a aplicou, por via de um processo interpretativo constitucionalmente proibido.
Ora, tal questão – por não respeitar a uma inconstitucionalidade normativa, mas antes a uma inconstitucionalidade da própria decisão judicial - excede os poderes de cognição do Tribunal Constitucional, uma vez que, entre nós, não se encontra consagrado o denominado recurso de amparo, designadamente na modalidade do amparo contra decisões jurisdicionais directamente violadoras da Constituição.
De todo o modo, mesmo que se entendesse que este Tribunal ainda era competente para conhecer das questões de inconstitucionalidade resultantes do facto de se ter procedido a uma constitucionalmente vedada integração analógica ou a uma «operação equivalente», designadamente a uma interpretação «baseada em raciocínios analógicos» (cfr. declaração de voto do Consº Sousa e Brito ao citado Acórdão nº 634/94, bem como o já mencionado Acórdão nº 205/99), o que sempre se terá por excluído é que o Tribunal Constitucional possa sindicar eventuais interpretações tidas por erróneas, efectuadas pelos tribunais comuns, com fundamento em violação do princípio da legalidade.
Aliás, se assim não fosse, o Tribunal Constitucional passaria a controlar, em todos os casos, a interpretação judicial das normas penais (ou fiscais), já que a todas as interpretações consideradas erróneas pelos recorrentes poderia ser assacada a violação do princípio da legalidade em matéria penal (ou fiscal). E, em boa verdade, por identidade lógica de raciocínio, o Tribunal Constitucional, por um ínvio caminho, teria que se confrontar com a necessidade de sindicar toda a actividade interpretativa das leis a que necessariamente se dedicam os tribunais – designadamente os tribunais supremos de cada uma das respectivas ordens -, uma vez que seria sempre possível atacar uma norma legislativa, quando interpretada de forma a exceder o seu
«sentido natural» (e qual é ele, em cada caso concreto?), com base em violação do princípio da separação de poderes, porque mero produto de criação judicial, em contradição com a vontade real do legislador; e, outrossim, sempre que uma tal interpretação atingisse norma sobre matéria da competência legislativa reservada da Assembleia da República, ainda se poderia detectar cumulativamente, nessa mesma ordem de ideias, a existência de uma inconstitucionalidade orgânica.
Ora, um tal entendimento - alargando de tal forma o âmbito de competência do Tribunal Constitucional - deve ser repudiado, porque conflituaria com o sistema de fiscalização da constitucionalidade, tal como se encontra desenhado na Lei Fundamental, dado que esvaziaria praticamente de conteúdo a restrição dos recursos de constitucionalidade ao conhecimento das questões de inconstitucionalidade normativa. Assim, por exemplo, e no caso dos autos, para decidir a questão de inconstitucionalidade, o Tribunal Constitucional seria, em primeira linha, chamado a resolver as controvérsias doutrinais respeitantes à factualidade típica do crime de burla (cfr., verbi gratia, José de Sousa e Brito, A burla do artigo 451º do Código Penal – Tentativa de sistematização, Scientia Ivridica, Tomo XXXII, 1983, págs. 131 e segs.; e Maria Fernanda Palma e Rui Pereira, O Crime de Burla no Código Penal de 1982-95, Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, vol. XXXV, 1994, págs. 321 e segs.).
Ora, assim sendo, no caso vertente, em que nem sequer ocorreu uma integração analógica ou «operação equivalente», mas uma mera interpretação da lei que vem contestada pelo recorrente, tem necessariamente de se concluir pela inexistência de uma questão de inconstitucionalidade normativa de que o Tribunal deva conhecer.'
É esta jurisprudência que aqui cabe reiterar por ter inteira aplicação ao caso dos autos.
Na verdade, o que o recorrente impugna é a decisão judicial que enquadrou no tipo legal de crime de homicídio qualificado, na forma tentada, com dolo eventual, os factos dados como provados, entendendo ele, no essencial, que tal tipo de crime se não pode configurar quando se não dá como provada – como foi o caso - a intenção de matar.
A situação é, deste modo, muito semelhante às que foram versadas no acórdãos supra transcritos, pelo que, com o mesmo fundamento, não pode o Tribunal conhecer do objecto do recurso.
3 – Decisão:
Pelo exposto e em conclusão decide-se não conhecer do objecto do recurso.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 6 Ucs.'
Desta decisão sumária, vem agora o recorrente, reclamar para a conferência, nos termos que a seguir se transcrevem:
'M..., recorrente nos autos à margem identificados, em que são recorridos o Ministério Público e S, tendo sido notificado da douta decisão sumária proferida pelo Venerando Conselheiro deste Tribunal Superior, vem nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 78º-A, nº. 3 da Lei nº. 28/82 de
15 de Novembro, na redacção conferida pela Lei nº. 13-A/98, de 26 de Fevereiro, apresentar a V. Exas. reclamação para a conferência, nos termos e fundamentos seguintes:
1º - Considerou o Venerando Conselheiro relator que não deveria conhecer do objecto do recurso, porquanto '...o que o recorrente impugna é a decisão judicial que enquadrou no tipo legal de crime de homicídio qualificado, na forma tentada, com dolo eventual, os factos dados como provados, entendendo ele, no essencial, que tal tipo de crime se não pode configurar quando se não dá como provada – como foi o caso – a intenção de matar'.
2º - Salvo o devido respeito, que é muito, não parece ter sido a mais correcta, a decisão sumária proferida.
Senão vejamos,
3º - Na verdade, no seu requerimento de interposição de recurso, o reclamante faz alusão expressa à decisão proferida e ao sentido da interpretação das normas que nela se verte, e que considera ser inconstitucional.
4º - No entanto, nunca tal exposição poderá ser entendida como uma impugnação da douta decisão proferida, mas apenas como um modo de apresentação da questão aos Venerandos Conselheiros do Tribunal Constitucional.
5º - Conforme dispõe o artigo 75º-A da Lei nº. 28/82 de 15 de Novembro, o então recorrente limitou-se a indicar a alínea do artigo 70º nº. 1 ao abrigo da qual interpôs o recurso, a norma cuja inconstitucionalidade pretendia que o presente Tribunal apreciasse, a indicação da norma e princípio constitucional que considerou violado e a peça processual em que suscitou a questão da inconstitucionalidade.
6º - Por assim ter sido, não foi o recorrente então convidado a corrigir o seu requerimento, porquanto resulta do supra mencionado preceito que, inevitavelmente, sempre terá o requerente de fazer menção expressa ao caso em concreto.
7º - Assim, não se pode retirar dessa menção a conclusão que o recurso interposto para o Tribunal Constitucional tem por objecto a própria decisão recorrida, e não as normas jurídicas em si, tal e qual foram aplicadas.
8º - Ao expor a decisão em concreto, impugnando a interpretação que nela se verte acerca do sentido a dar aos preceitos aplicados, sempre teve o reclamante como pano de fundo uma questão puramente normativa, que é a da inconstitucionalidade que, em abstracto, resulta da interpretação legal que fundamenta a decisão.
9º - Tal questão de fundo não se liga já à decisão recorrida, mas sim
à aplicação que será ou não legítimo fazer de dados preceitos legais, tendo em atenção as disposições constitucionais.
10º - Assim, o objecto do recurso não será a decisão judicial, mas sim o conteúdo interpretativo atribuído aos artigos 131º e 132º nº. 1 alínea d) do Código Penal, apreciando de forma geral e abstracta a eventual inconstitucionalidade de tal entendimento, independentemente da situação em concreto.
11º - Tal questão, abstractamente considerada, está já no âmbito de cognição do Tribunal Constitucional, nos moldes em que o define a Constituição da República Portuguesa e a Lei Orgânica deste mesmo Tribunal, pelo que, salvo melhor entendimento, foi incorrecta a decisão da qual ora se reclama, na medida em que considerou que o objecto do recurso interposto não deveria ser conhecido.
12º - O recurso interposto funda-se efectivamente na inconstitucionalidade da aplicação das normas previstas nos artigos 131º e 132º, nºs. 1 e 2 al. d) do Código Penal, ainda que aplicadas sob a modalidade de tentativa, quando não se prove a intenção de matar.
13º - Tal consideração resulta da não aplicação do artigo 143º do Código Penal, resultando violado o princípio constitucional da legalidade, previsto no artigo 29º nº. 1 da Constituição da República Portuguesa.
14º - Nestes termos, é forçoso considerar que o Tribunal Constitucional confronta-se com uma verdadeira questão de constitucionalidade, ainda que tal resulte do facto do Tribunal recorrido ter atingido um resultado interpretativo meramente proibido, em face das restrições impostas pelo princípio constitucional da legalidade em Direito Penal.
15º - Ora, o que verdadeiramente se questiona é o conteúdo da interpretação, o resultado interpretativo pelo qual se atinge a norma que decide o caso, norma esta que eventualmente não tem competência, validade e eficácia constitucional para o decidir, cuja aplicação é submetida ao controlo de constitucionalidade.
16º - Neste caso, foi enunciada pelo julgador uma dimensão normativa que, segundo o recorrente/reclamante, não corresponde fielmente às palavras do legislador, violando, por isso, o princípio constitucional da legalidade, sendo essa dimensão normativa que o recorrente pretende ver apreciada, e não a decisão judicial em si.
17º - Conforme vertido no douto Acórdão nº. 205/99 do Tribunal Constitucional, in DR – II Série, nº. 258, de 5 de Novembro de 1999, págs. 16641 e ss. 'O resultado do processo de interpretação ou criação normativa (tanto de meras dimensões normativas como de normas autónomas), ínsito na actividade interpretativa dos tribunais, não pode deixar de ser matéria de controlo de constitucionalidade dos tribunais comuns e pelo Tribunal Constitucional, quando a própria Constituição exigir limites muito precisos a tais processos de interpretação ou criação normativa, não reconhecendo qualquer amplitude criativa ao julgador'.
18º - Opinião que já por diversas vezes foi defendida no Tribunal Constitucional, nomeadamente nos Acórdãos nºs. 141/92, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, XXI Volume, págs. 599 e ss., e 285/99, in DR – II Série, de 21 de Outubro de 1999, e nas declarações de voto do Exmo. Juiz Conselheiro José de Sousa e Brito apostas aos Acórdãos 634/94 e 765/95, não publicados.
19º - Aliás, a sustentação da tese contrária, na qual se suporta a douta decisão sumária, objecto da actual reclamação, será negar a protecção da justiça constitucional à generalidade dos casos de violação das garantias do artigo 29º nºs. 1 e 3 da Constituição da República Portuguesa.'
Cumpre apreciar e decidir.
2 – Reafirma-se que o recurso de constitucionalidade visa a apreciação de uma norma ou uma sua interpretação, não podendo ter, consequentemente, por objecto, a decisão judicial que a aplica; foi este o fundamento do não conhecimento do recurso na decisão reclamada, onde se fez apelo a diversos acórdãos deste Tribunal que, em questões idênticas à dos presentes autos – violação do princípio da legalidade ou da tipicidade com a integração dos factos em determinado tipo legal de crime – se pronunciaram no mesmo sentido
O reclamante acentua agora determinados aspectos formais do seu requerimento de interposição do recurso para demonstrar que o recurso não tem por objecto a decisão judicial impugnada mas uma interpretação normativa.
A verdade é que, na decisão reclamada, o entendimento adoptado não assentou nos termos utilizados pelo reclamante, mas no que substancialmente estava em causa.
Do que o reclamante discorda é do facto de o tribunal 'a quo' ter integrado os factos no tipo legal de crime de homicídio qualificado, na forma tentada, com dolo eventual, a tal não obstando a circunstância de se não ter provado a intenção de matar (dolo directo), o que a decisão recorrida faz através de determinado processo interpretativo, bastando-se com a prova do dolo eventual.
É precisamente esse o conteúdo da decisão judicial recorrida e a imputação de inconstitucionalidade feita pelo reclamante reporta-se substancialmente não às normas mas ao que o tribunal 'a quo' decidiu através do processo interpretativo utilizado, cuja correcção não é sindicável pelo Tribunal.
E mesmo a ter sido utilizado um processo de interpretação constitucionalmente proibido no acórdão recorrido, não compete ao Tribunal Constitucional julgar interpretações 'tidas por erróneas, efectuadas pelos tribunais comuns, com fundamento em violação do princípio da legalidade'
(Acórdão nº 79/00).
Diz ainda o reclamante que o Tribunal Constitucional já se tem pronunciado no sentido por ele defendido.
Mas tal não foi ocultado na decisão reclamada, onde se transcrevem, inclusivé, passos de alguns dos acórdão em que o reclamante se apoia.
Simplesmente e não os deixando de ter em conta, é o entendimento oposto que aqui se acolhe - nos casos 'em que se questionam certas interpretações normativas por ofensa do princípio da tipicidade ou da legalidade penal, não estão em causa verdadeiras questões de inconstitucionalidade normativa, mas antes questões de inconstitucionalidade da própria decisão recorrida ou do acto de julgamento (...)' – sendo certo que o reclamante não aduz em favor da sua tese nenhuma argumentação inovadora.
3 – Decisão:
Pelo exposto e em conclusão, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 Ucs. Lisboa, 8 de Maio de 2001 Artur Maurício Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa