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Processo nº 782/2003
3ª Secção Relatora: Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. Por sentença do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, A. foi condenado pela prática, em autoria material e em concurso real, de um crime de burla qualificada e de dez crimes de falsificação de estado civil, na pena única de 3 anos de prisão e de 300 dias de multa, suspensa em determinadas condições, e no pagamento de uma indemnização de € 47.804,07 ao Estado, acrescida dos devidos juros. Inconformado, o arguido recorreu para o Tribunal da Relação de Guimarães, Tribunal para o qual já tinha anteriormente interposto recurso de três decisões interlocutórias. O Tribunal da Relação de Guimarães não conheceu dos recursos interpostos destas decisões, porque o recorrente não tinha cumprido o ónus de indicar, nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 412º do Código de Processo Penal, que mantinha interesse no respectivo conhecimento, e negou provimento ao recurso interposto da decisão final. Recorreu, então, para o Supremo Tribunal de Justiça. Por acórdão de 8 de Julho de 2003, de fls. 55, o recurso foi rejeitado, “nos termos dos artigos 420º, n.º
1, com referência ao art. 414º, n.º 2, 417º, n.º 2/c e 419º n.º 4/a, todos do CPP'. Deste acórdão, A. reclamou para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça
(cfr. fls. 64). Pelo despacho de fls. 100, de 25 de Setembro de 2003, o Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça decidiu não conhecer da reclamação, por não ter qualquer base legal, nos seguintes termos: “Como resulta dos artºs 405º do CPP,
688º e 689º do CPC, a reclamação só pode incidir sobre um despacho do tribunal a quo, que não admitir ou retiver o recurso, e é dirigida ao presidente do tribunal superior. No caso em apreço estamos perante um acórdão que rejeitou os recursos interpostos pelos ora reclamantes, e não sobre qualquer despacho que não admita ou retenha o recurso. (...) A presente reclamação não se enquadra minimamente na previsão das disposições supra referidas”.
2. A 9 de Outubro seguinte, A. recorreu para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Julho. O recurso não foi admitido, por ter sido interposto depois de decorrido o prazo de 10 dias fixado pelo n.º 1 do artigo 75º da mesma Lei nº 28/82, uma vez que “a reclamação da decisão que o requerente deduziu para o Presidente deste STJ não interrompeu aquele mencionado prazo”.
3. Finalmente, A. veio reclamar para o Tribunal Constitucional da não admissão do recurso. Em síntese, o ora reclamante considera que o recurso foi tempestivamente interposto, em virtude do disposto no nos n.ºs 1 e 2 do artigo
75º da Lei nº 28/82, dos quais resultaria que “só a partir da data da decisão do Presidente do S.T.J. sobre a reclamação apresentada – se pode entender como esgotados os recursos ordinários que no caso cabiam, pelo que só então também se iniciaria o prazo de recurso para o Tribunal Constitucional”.
4. Notificado, o Ministério Público veio pronunciar-se no sentido do indeferimento da reclamação:
“Tal recurso é efectivamente intempestivo, por não poder aproveitar ao recorrente – que lançou mão de um meio procedimental inexistente no ordenamento adjectivo – o regime estabelecido no art. 75º, n.º 2, da Lei n.º 28/82: o diferimento do prazo para recorrer para este Tribunal, aí previsto, pressupõe que o recorrente haja utilizado um meio impugnatório susceptível de obstar ao trânsito em julgado do acórdão recorrido, o que implica, no mínimo, que se trate de instituto previsto, em abstracto, na lei de processo, o que não é obviamente o caso da reclamação de um acórdão, proferido por um Supremo Tribunal.”
5. A reclamação é, com efeito, manifestamente improcedente. Para chegar a esta conclusão, basta verificar que a reclamação apresentada perante o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça não tem a virtualidade de impedir o trânsito em julgado do acórdão de 8 de Julho de 2003, pela simples razão de que não é um meio legalmente admissível de reacção contra um acórdão do mesmo Tribunal.
Assim sendo, quando foi interposto o recurso para o Tribunal Constitucional, já tinha transitado em julgado “a decisão que não admite o recurso” prevista no citado n.º 2 do artigo 75º há mais de 10 dias. Logo, da conjugação entre o disposto no n.º 1 e neste n.º 2 do artigo 75º decorre, sem qualquer dúvida, que o recurso foi interposto depois de esgotado o prazo legalmente previsto para o efeito.
Nestes termos, indefere-se a reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 10 ucs.
Lisboa, 9 de Dezembro de 2003
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Vítor Gomes
Luís Nunes de Almeida