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Processo nº 781/02
3ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. - A, nos autos de recurso jurisdicional de impugnação da liquidação de taxa urbanística que move contra o Município de Lisboa, pendentes no Tribunal Central Administrativo, interpôs recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão neles proferido, recurso que não foi admitido por caber recurso ordinário (a petição de impugnação deu entrada em 16 de Setembro de 1996, na Câmara Municipal de Lisboa).
Inconformado com o despacho que indeferiu o seu requerimento, reagiu o interessado mediante reclamação, sob invocação do disposto nos artigos 688º, nºs. 1 e 2, e 690º, nº 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi dos artigos 1º e 102º da LPTA (Lei de Processo nos Tribunais Administrativos – Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho), o que fez dirigindo-se ao Presidente do Supremo Tribunal Administrativo.
Observa, nesse requerimento, entender ser aplicável ao caso vertente a doutrina de anterior despacho desse Magistrado – de 5 de Março de 2002, proferido no proc. nº 7/02 – em sentido oposto ao da decisão reclamanda, pelo que a confirmação desta violaria o disposto no nº 3 do artigo
687º do Código de Processo Civil (estaria em causa erro na espécie de recurso, devendo-se seguir os termos do recurso julgado apropriado).
Concluiu, designadamente:
'1º O despacho sub judice indeferiu o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, apresentado pelo ora reclamante, com fundamento em que do acórdão do Tribunal Central Administrativo, de 2002.05.07, ainda cabia recurso ordinário para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo (v. arts. 32º/1/a) e 41º do ETAF, na redacção inicial; cfr. artº
120º do ETAF) – cfr. texto nº 1;
2º Tendo sido interposto pelo ora reclamante recurso diferente do que competia, tal facto nunca poderia fundamentar o seu indeferimento, devendo este prosseguir os termos do recurso considerado adequado pelo douto tribunal a quo (v. artº
687º/3 do CPC, aplicável ex vi do artº 1º da LPTA) – cfr. texto nºs. 2 e 3;
3º O aliás douto despacho reclamado enferma assim de manifestos erros de julgamento, tendo violado frontalmente o disposto nos artºs. 687º/3 do CPC e no artº 120º do ETAF – cfr. texto nºs. 1 a 4.'
2. - O requerimento foi objecto de despacho judicial, de 5 de Novembro último, com o seguinte teor, no que ora releva:
'Entendendo-se como mero lapso a referência ao requerimento de fls. 2 a designação de Venerando Presidente do Supremo Tribunal Administrativo, já que se encontra em causa no despacho reclamado o indeferimento de recurso para o Tribunal Constitucional, sendo este o competente para apreciar tal reclamação, admite-se a reclamação nestes termos. Nos termos do disposto no artº 688º, nº 3 do Código de Processo Civil, ex vi do artº 69 e segs., da Lei 28/82, de 15 de Novembro, mantemos o despacho reclamado nos seus precisos termos, convencidos da sua bondade, não enfermando dos apontados erros, e muito menos, que tais erros sejam manifestados, como invoca o reclamante na sua reclamação [...].'
3. - Neste Tribunal Constitucional foram os autos com vista ao Ministério Público, nos termos do nº 2 do artigo 77º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, que emitiu parecer no sentido de não se tomar conhecimento do peticionado dado não surpreender na respectiva peça processual 'qualquer manifestação de vontade da parte de lançar mão do procedimento previsto nos artigos 76º, nº 4 e 77º da Lei nº 28/82'.
4. - Entende Ministério Público que a linha argumentativa utilizada pelo reclamante não revela erro no lapso de escrita, sendo mera decorrência de uma dada estratégia processual, não competindo, naturalmente, a este Tribunal, suprir ou corrigir oficiosamente uma atitude processual que não denuncia, expressa ou implicitamente, qualquer vontade em deduzir reclamação para o Tribunal Constitucional. Na verdade, compulsados os autos, verifica-se que o interessado, confrontado com a não admissão do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade por si interposto por não se encontrarem exauridos os meios de recurso ordinário, dirigiu-se ao Presidente do Supremo Tribunal Administrativo sustentando que o recurso interposto para o Tribunal Constitucional devia ser 'convolado' para recurso ordinário a apreciar por esse Supremo Tribunal.
Como quer que seja, o autor do requerimento inicial, ao dirigir-se directamente ao Presidente do Supremo Tribunal Administrativo, invocando expressamente um despacho proferido por esse Magistrado noutro processo, cuja aplicação ao caso dos autos vem requerer, de modo a, logicamente, se revogar o anteriormente decidido nestes autos, por alegada violação 'frontal' do nº 3 do artigo 687º do Código de Processo Civil e do artigo 120º do ETAF
(Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais – Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril), coloca-se no plano de reapreciação do anterior requerimento, colocando uma questão de vício de violação de lei – o que, podendo caracterizar-se como erro in procedendo ou, inclusivamente, in judicando, seguramente não se equaciona em matriz de constitucionalidade – que, no concreto caso, não foi convocada (não obstante tudo indicar no sentido da falta de exaustão de recursos ordinários).
É que a reclamação para o Tribunal Constitucional, inspirada no regime previsto nos artigos 688º e 689º do Código de Processo Civil, na sequência do antigo recurso de queixa, recorta-se como um meio impugnatório de decisões que não admitem o recurso de constitucionalidade com fundamento na inverificação dos pressupostos de admissibilidade do recurso de constitucionalidade: funcional e teleologicamente equiparáveis aos recursos, enforma-as uma lógica incompatível com vícios de outra proveniência como aquele que é imputado no requerimento dito de reclamação.
Acresce que a anterior decisão que admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional não o vincula (nº 3 do artigo 76º da Lei nº
28/82).
5. - Em face do exposto, não se conhece a reclamação apresentada. Lisboa, 21 de Fevereiro de 2003 Alberto Tavares da Costa Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Luís Nunes de Almeida