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Proc. nº 761/2002
2ª Secção Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam em Conferência no Tribunal Constitucional
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, em que figuram como recorrentes A e outros, e como recorridos o Ministério Público e o Centro Regional de Segurança Social do Norte, foram submetidas à apreciação do Tribunal Constitucional as seguintes normas:
– Os arts. 432º, c) e d), 410º, nºs 1, 2 e 3, e 427º a 431º inclusive, todos do CPP, quando conjugadamente interpretados no sentido de não permitir o recurso para os tribunais da relação no que respeita à matéria de facto, quando a decisão de 1ª instância tenha sido proferida por um colectivo, ou seja, quando a decisão condenatória revista a forma de acórdão (e não de sentença), inconstitucionalidade invocada nos autos aquando da interposição de recurso, não admitido, para o Supremo Tribunal de Justiça (só então o recorrente se encontrou em condições e oportunidade, vg. processuais, de suscitar a inconstitucionalidade das referidas normas na interpretação que aparentemente lhe é dada pelo douto acórdão recorrido – cfr., com interesse, acórdãos do TC
40/84 in BMJ 346, pág. 179; 8/87 in BMJ 363, pág. 163; 249/90 in DR II série nº
65, de 19/3/91; 94/88 in BMJ 372, pág. 285; 391/89 in DR II série nº 243 de
4/9/89; 51/90 in DR II série, de 12/7/90), bem como
– Os arts. 43º e 44º RJIFNA. A Relatora proferiu Decisão Sumária no sentido do não conhecimento do objecto do recurso (fls. 1348 e ss.). Quanto à primeira questão suscitada, por a mesma não ter sido invocada antes da prolação da decisão recorrida. Quanto à segunda questão, por a norma impugnada não ter sido aplicada pela decisão recorrida.
2. Os recorrentes vêm agora reclamar, ao abrigo do artigo 78º-A, nº 3, da Lei do Tribunal Constitucional, sustentando que o acórdão recorrido constituiu decisão inesperada e que a interpretação feita dos preceitos impugnados do Regime Geral das Infracções Fiscais não Aduaneiras é inconstitucional. O Ministério Público pronunciou-se, concordando com a Decisão Sumária no ponto em que não tomou conhecimento do objecto do recurso referente aos preceitos do Regime Geral das Infracções Fiscais não Aduaneiras e manifestando 'fundadas dúvidas' quanto ao não conhecimento do objecto do recurso relativo às normas do Código de Processo Penal, concluindo pelo provimento parcial da reclamação. Cumpre apreciar e decidir.
3. Os reclamantes afirmam que 'no que respeita à inconstitucionalidade dos artigos 43º, 44º e 45º RGIFNA não pode(m) a(s) requerente(s) discordar do afirmado na douta Decisão Sumária'. Seguidamente, afirmam que 'a interpretação dada pelo tribunal de primeira instância e vertida na fundamentação do respectivo acórdão desemboca claramente em inconstitucionalidade'. Ora, tais asserções em nada colidem com a fundamentação da Decisão Sumária reclamada. Aliás, a primeira afirmação expressa até o acordo das reclamantes em relação a tal decisão. Assim, a presente reclamação improcede quanto a esta parte.
4. Os reclamantes afirmam que a decisão do Tribunal da Relação do Porto constituiu decisão inesperada, na parte em que considerou irrecorrível o acórdão proferido pelo colectivo em primeira instância quanto à matéria de facto com transcrição da prova produzida em audiência realizada pelo recorrente. Não está em causa, naturalmente, apreciar a conformidade à Constituição de tal interpretação (como se sublinhou na Decisão Sumária reclamada), nem saber se cabe apenas ao tribunal realizar a transcrição dos registos fonográficos da prova produzida em audiência de julgamento, como concluiu o Supremo Tribunal de Justiça no 'Assento' nº 2/2003 (D.R., I Série-A, de 30 de Janeiro de 2003), ou se, diversamente, tal transcrição pode ser feita pelo próprio recorrente. Com efeito, apenas importa averiguar se os reclamantes dispunham ou não de condições objectivas para lhes ser exigível suscitar, previamente, a inconstitucionalidade da dimensão normativa agora impugnada. Ora, desde logo a natureza controversa (pelo menos em termos jurisprudenciais) da questão em causa aponta no sentido da existência dessas condições. Não obstante, o certo é que a questão da inadmissibilidade do recurso em matéria de facto foi expressamente suscitada pelo Ministério Público no parecer de fls.
1182 e ss. (cf. fls 1219 e 1224), ao qual os reclamantes tiveram oportunidade de responder, nos termos do artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, não o tendo feito.
É pois indiscutivelmente manifesto, contrariamente ao sustentado pelos reclamantes e pelo Ministério Público junto do Tribunal Constitucional, que os reclamantes tiveram oportunidade processual para suscitar a questão de constitucionalidade normativa relativa à inadmissibilidade do recurso em matéria de facto das sentenças proferidas pelo tribunal colectivo, justificando-se, por isso, a exigibilidade da suscitação durante o processo da questão de constitucionalidade. Improcede, portanto, a presente reclamação, também quanto a este ponto.
5. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação, confirmando consequentemente a Decisão Sumária reclamada.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 15 UCs. cada. Lisboa, 19 de Março de 2003 Maria Fernanda Palma Benjamim Rodrigues Luís Nunes de Almeida