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Proc. nº 575/2002
2ª Secção Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam em Conferência no Tribunal Constitucional
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que figura como recorrente A e como recorrida B, a Relatora proferiu Decisão Sumária no sentido do não conhecimento do objecto do recurso (cf. fls. 502 e ss.). O recorrente vem agora reclamar para a Conferência, ao abrigo do artigo 78º-A, nº 3, nos seguintes termos:
1. Uma precisão prévia, a presente reclamação restringe-se ao nº 4 do douto despacho, que se refere à apreciação da inconstitucionalidade de várias normas constantes de cláusulas de um ACT.
2. Decidiu-se não conhecer de tal matéria invocando a existência de vários acórdãos do Tribunal Constitucional que, embora com votos de vencido, têm entendido que as normas constantes do acordo colectivo não integram o conceito de norma para efeito de recurso de constitucionalidade.
3. Citam-se na douta decisão 3 acórdãos nesse sentido, dos quais apenas um se encontra publicado.
4. E embora a Exmª. Senhora Juíza Relatora diga discordar de tal entendimento, considera que 'em face de jurisprudência reiterada do Tribunal Constitucional aplica-se aos presentes autos tal jurisprudência', pelo que conclui pelo não conhecimento do objecto do recurso.
5. Vejamos o que diz a Lei.
6. O n°. 1 do art. 78A da LTC permite ao relator não conhecer do objecto do recurso no caso de o mesmo já ter sido objecto de decisão anterior do Tribunal ou por ser manifestamente infundada, mediante simples remissão para anterior jurisprudência do Tribunal.
7. A Exmª. Senhora Juíza Conselheira Relatora invoca os Acórdãos nºs 172/93,
637/98 e 235/01 que com votos de vencido consideraram que 'as normas constantes do acordo colectivo não integram o conceito de norma para efeito de recurso de constitucionalidade'.
8. Embora a Exmª. Senhora Juíza Relatora saliente, que 'discorda de tal entendimento', conforme voto de vencida aposto no Acórdão 697/98 no qual se remete para o Acórdão no. 368/97.
9. E lendo este último Acórdão em que foi Relatora a mesma Exmª. Senhora Juíza Conselheira, verificamos que aí se entendeu que 'as normas das convenções colectivas de trabalho não só são normas jurídicas, por determinação da lei, como se adequam a um conceito funcional de norma jurídica, para efeitos do controle da constitucionalidade'.
10. Pelo que se concluiu que 'as normas constantes de convenções colectivas de trabalho se devem ter como normas para efeitos do controlo da constitucionalidade' cometido ao Tribunal Constitucional.
11. E invoca-se no mesmo sentido o Acórdão nº 214/94 da 1ª Secção, reconhecendo embora que existe jurisprudência em sentido contrário da 2ª Secção.
12. E o mesmo Acórdão, de que foi relatora a Exmª. Senhora Juíza Conselheira Maria Fernanda Palma, veio até na al. d) de decisão, a julgar inconstitucionais várias normas de um acordo colectivo de trabalho e de um acordo de empresa.
13. O Acórdão teve voto de conformidade de 4 Juízes Conselheiros contra 2 votos de vencidos.
14. Parece-nos assim que não pode falar-se como na douta decisão aqui reclamada, em 'jurisprudência reiterada do Tribunal Constitucional'.
15. Não só não é reiterada, como é mesmo claramente discrepante.
16. E havendo discrepâncias, cremos que não faz qualquer sentido decidir não conhecer do objecto do recurso de constitucionalidade com invocação do nº 1 do art. 78-A da LTC.
17. E menos sentido faz, cremos, que a Exmª. Senhora Juíza Conselheira Relatora que sufraga o entendimento que as normas constantes de acordo colectivo se devem ter como normas para efeitos do controlo de constitucionalidade, opinião que parece mantém decida aqui em sentido contrário, não conhecer liminarmente do recurso.
18. É, salvo o devido respeito, um contrasenso dramático.
19. Razão tem, por isso, o Juiz Conse1heiro Guilherme da Fonseca quando no seu Breviário, a p.67, escreve que questão simples a decidir 'é sem dúvida aquela em que a norma cuja inconstitucionalidade é objecto do recurso, já foi declarada inconstitucional com força obrigatória geral'.
20. 'Ou aquela' acrescenta com verdadeira pertinência a este caso 'em que há jurisprudência anterior sobre a mesma matéria, da qual não diverge o relator'
(sublinhado nosso).
Cumpre apreciar e decidir.
2. De acordo com a jurisprudência da 2ª Secção do Tribunal Constitucional, as normas das convenções colectivas não correspondem ao conceito de norma para efeito de recurso de constitucionalidade (cfr. Acórdão nº 352/2001 – inédito). Na verdade, a jurisprudência actual do Tribunal Constitucional (de todas as suas Secções) acolhe, hoje, esse entendimento (cfr., exemplificativamente, Acórdãos nºs 352/2001, 492/2000, 697/98 – inéditos). Em face da jurisprudência reiterada do Tribunal Constitucional, neste momento, a que acaba de se fazer referência (e mencionada na Decisão Sumária), não existe qualquer ilogicidade ou desrazoabilidade (ou como o reclamante afirma contra-senso) na circunstância de a Decisão Sumária reclamada ter sido subscrita por uma Juíza que discorda dessa jurisprudência. Com efeito, não se verificando a possibilidade de alterar tal entendimento, na actual configuração do Tribunal, o prosseguimento dos autos para alegações apenas iria prolongar desnecessariamente o processo, o que, agora sim, consubstanciaria uma utilização do processo contra a razão e com custos evitáveis para o recorrente. De resto, a citação que o reclamante faz do Breviário da autoria do Excelentíssimo Conselheiro Guilherme da Fonseca está incompleta, pois nesse texto são referidos, exemplificativamente, outros casos que se enquadram na noção de questão simples, sendo, aliás, o citado exemplo também configurável como uma aplicação de uma declaração de inconstitucionalidade. De qualquer modo, o entendimento utilizado pela Relatora do que seja questão simples, em casos como este, é comum na jurisprudência do Tribunal Constitucional, não constituindo sequer qualquer inovação. O presente caso constitui, claramente, uma questão simples. Será, assim, seguido o entendimento que o Tribunal tem acolhido em casos deste tipo, pelo que se remete para os fundamentos do Acórdão nº 352/2001 (do qual se junta cópia).
3. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação, confirmando consequentemente a Decisão Sumária reclamada.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 UCs. Lisboa, 15 de Janeiro de 2003- Maria Fernanda Palma Bravo Serra José Manuel Cardoso da Costa