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Proc. n.º 788/02
3ª Secção Relator: Cons. Gil Galvão
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - Relatório
1. Por decisão do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa, de 24 de Maio de 1999, foi julgada improcedente, por não provada, a acção que A (ora recorrente) intentou contra o Estado Português, nos termos do art. 165º do Código de Processo Tributário, para reconhecimento de direito ou interesse legítimo em matéria tributária.
2. Inconformada com essa decisão a A recorreu para o Tribunal Central Administrativo, que, por acórdão de 27 de Março de 2001 (fls. 129 a 138), julgou o recurso totalmente improcedente.
3. Novamente inconformada a A recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo tendo, a concluir a sua alegação, formulado, designadamente, as seguintes conclusões:
'(...)
6ª - Ora, o douto acórdão recorrido, ao determinar que não deverá reconhecer-se ao ora recorrente o direito de receber juros indemnizatórios, quando se encontra provado que houve erro praticado pela Administração Fiscal que conduziu a uma liquidação indevida do imposto e a uma arrecadação ilegal do mesmo, e se constata existirem normas que impõem ao contribuinte a obrigação de pagar juros indemnizatórios quando este pratique erro de direito, coloca a ora recorrente numa posição de desigualdade perante o sujeito activo da relação jurídica tributária.
7ª - Assim decidindo, o douto aresto recorrido violou a garantia da recorrente ao direito de ser tratada com igualdade, princípio definido na Constituição da República Portuguesa, devendo rejeitar-se a interpretação constante do § 1 do art. 140º que restringe o pagamento de juros indemnizatórios aos contribuintes quando somente ocorre erro de facto imputável à Administração Fiscal, mas já não assim se se estiver perante um erro de direito.
8ª - Foi assim violada a disposição contida no art. 13º da Constituição da República Portuguesa e deverá rejeitar-se a interpretação que restringe a restituição de juros indemnizatórios ao erro de facto imputável aos serviços'.
4. O Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 17 de Abril de 2002 (fls.
157 a 161), decidiu anular todo o processo, com fundamento em erro na forma do processo. Para tanto, escudou-se na seguinte fundamentação:
'(...) A discordância do recorrente assenta, no essencial, em que é inconstitucional o
§ 1 daquele art. 140º, interpretado conforme o fez o Tribunal recorrido, por violação do princípio da igualdade, já que todo o erro do contribuinte, seja de facto seja de direito, o torna incurso na obrigação de prestar juros compensatórios. Esta a única questão colocada à nossa consideração. Antes, porém, e por dever de ofício, importa abordar a questão da propriedade do meio escolhido pela recorrente para fazer valer a sua pretensão em juízo. Como é hoje jurisprudência quase pacífica, a acção para reconhecimento de um direito, não sendo, como inicialmente se entendeu, um meio «residual», é, todavia, um meio processual complementar dos demais, de que há-de lançar mão quando não exista meio processual específico, expressamente previsto para a situação, que permita ao particular obter uma efectiva tutela judicial dos seus direitos.
É o que estabelece o art. 69º n.º 2 da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos (LPTA), em cujos termos «as acções só podem ser propostas quando os restantes meios contenciosos, incluindo os relativos à execução de sentença, não assegurem a efectiva tutela jurisdicional do direito ou interesse em causa». Ora, este Tribunal vem entendendo, de modo unívoco, que o pedido de juros indemnizatórios deve ser feito no processo de impugnação judicial do acto de liquidação, a tal não obstando tratar-se de um meio processual que se configura como um recurso contencioso de anulação. Deste jeito, a ora recorrente, ao não ter obtido, naquele processo, a declaração judicial de que lhe eram devidos juros indemnizatórios, perdeu a oportunidade de ver reconhecido o direito a eles. E, devendo o pedido de juros indemnizatórios ser formulado na impugnação judicial do acto de liquidação, a acção para o reconhecimento de direito não é meio adequado para obter aqueles juros, uma vez que a impugnação judicial confere plena tutela jurisdicional ao direito invocado pela recorrente. Configura-se, assim, um erro na forma do processo, por o adequado para obter a declaração do direito não ser o escolhido pela autora, erro esse que é do conhecimento oficioso, à luz do disposto no art. 98º, n.º 4 do Código de Procedimento e Processo Tributário, aqui aplicável por força do que estatui o artigo 12º da Lei n.º 15/2002, de 5 de Junho. Por outro lado, não há qualquer possibilidade de aproveitar a petição inicial no presente processo, como ampliação do pedido na impugnação judicial do acto de liquidação, posto que tal impugnação está definitivamente julgada. Noutra perspectiva, pode pretender-se que as sentenças dos tribunais administrativos e fiscais – e estamos, aqui, perante uma decisão judicial, proferida pelo Supremo Tribunal Administrativo, que anulou o acto tributário de liquidação -, são executáveis, nos termos do disposto nos artigos 95º e 96º da LPTA e 5º e 12º do Decreto-Lei n.º 256-A/77, de 17 de Junho. Visa esse processo a definição, pelos tribunais, dos actos e operações em que deve consistir a execução do julgado ou, verificando-se causa legítima da sua inexecução, a fixação da indemnização pelos prejuízos resultantes de tal inexecução. No nosso caso, e no critério da recorrente, a Administração Fiscal só parcialmente deu cumprimento à decisão judicial anulatória, porquanto, tendo, embora, restituído as quantias que, a título de imposto e juros compensatórios, o levara a pagar, indevidamente, não satisfez juros indemnizatórios, relativos ao período de tempo durante o qual se viu privado de tais quantias. Poderia, pois, parecer que a recorrente, da acção autora, tinha ao seu alcance, para alcançar o seu desiderato, o meio processual da execução da decisão judicial. Como assim, o constatado erro na forma do processo conduziria, apenas,
à convolação, seguindo-se, antes, os termos do processo de execução de julgados, aproveitando-se o processado na medida em que for aproveitável, e praticando-se, tão só, os actos próprios da forma adequada.
À luz do artigo 96º da LPTA, a petição, aproveitada como petição de execução de julgado, seria tempestiva, já que deu entrada em 9 de Março de 1995, datando a decisão judicial a executar de 12 de Janeiro de 1994. Mas duas razões há para que não possa ser assim: Por um lado, e como se disse já, o entendimento deste Tribunal é no sentido de que, antes do início da vigência da Lei Geral Tributária – 1 de Janeiro de 1999
-, o pedido de juros indemnizatórios devia ser formulado na impugnação judicial do acto de liquidação, sendo impróprio o meio da execução do julgado para o manifestar. Por outro lado, o interesse na execução do julgado deve, colocado face ao incumprimento, ou ao deficiente cumprimento, da Administração, formular o pedido perante ela, só depois, em caso de invocação de causa legítima de inexecução, ou de não execução integral, podendo recorrer aos tribunais. É o que resulta do estabelecido nos artigos 5º, n.º 1 e 7º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 256-A/77. Este procedimento não foi, no caso, seguindo pela recorrente, pelo que também como petição nos termos do n.º 2 do art. 7º referido não pode a sua petição ser aproveitada.
É, pois, inviável a convolação, o que vale por dizer que é insanável o erro na forma do processo, que, consequentemente, é nulo, nulidade que aqui se declara – cfr. os artigos 98º do CPPT e 206º, n.º 2 do Código de Processo Civil'.
5. Na sequência veio a ora reclamante, ao abrigo o disposto nos artigos 125º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 668º do Código de Processo Civil, arguir a nulidade daquele aresto.
6. O Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 16 de Outubro de 2002 (fls.
176 a 179), desatendeu as arguidas nulidades, decisão que fundamentou, designadamente, nos seguintes termos:
'(...) A primeira causa de nulidade do acórdão de 17 de Abril p.p. apontada pela recorrente é a omissão de pronúncia, por não ter apreciado a questão da inconstitucionalidade atribuída ao § 1 do artigo 140º do Código da Contribuição Industrial, interpretado como fora pelo TCA. Mas, como logo adianta a própria recorrente, da obrigação que impende sobre os tribunais de apreciarem as questões que lhe sejam submetidas exceptuam-se aquelas cujo conhecimento fique prejudicado pela solução dada a outras.
(...) Ora este Tribunal entendeu (se o fez mal, ou sem o poder fazer, é outro tema) que a forma processual eleita pela recorrente para fazer valer a sua pretensão não era a ajustada, e que esse erro implicava a anulação de todo o processo. Está bom de ver que, perante esta pronúncia, outra nenhuma caiba. Ou seja, tudo o mais, maxime, a questão do mérito da acção, estava prejudicada face à anulação do processo, julga impróprio para chegar ao resultado visado pela recorrente. Tanto basta para que não ocorra a nulidade por omissão de pronúncia.
2.3. Por outro lado, pretende a recorrente que há, no acórdão censurado, excesso de pronúncia, por a questão do erro na forma do processo, que apreciou, não estar suscitada nem ser do conhecimento oficioso.
(...) Ora, ao protestar que a questão de erro na forma do processo não era de conhecimento oficioso, a recorrente contraria, deste modo frontal, a límpida afirmação que se fez no acórdão, aonde se escreveu que tal erro «é de conhecimento oficioso, à luz do disposto no art. 98º, n.º 4 do Código de Procedimento e Processo Tributário, aqui aplicável por força do que estatui o artigo 12º da Lei n.º 15/2002, de 5 de Junho». Como assim, e tendo julgado o Tribunal, expressa e fundamentadamente, que podia conhecer da questão, o caso não é de excesso de pronúncia, mas, eventualmente, de erro de julgamento, se acaso estiver errado o entendimento adoptado, e a questão não for, como entende a recorrente, de conhecimento oficioso. Daí que também não ocorra a nulidade por excesso de pronúncia.
2.4. Acusa a recorrente o acórdão deste Tribunal de integrar uma decisão surpresa, nos termos do art. 3º, n.º 3, do Código de Processo Civil, por não lhe ter sido dada oportunidade para se pronunciar sobre a questão de erro na forma de processo. Mas não é assim. Conforme se apontou no acórdão de 17 de Abril, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto do TCA levantou a questão no seu parecer que antecedeu o acórdão que aquele Tribunal veio a proferir, acórdão que acolheu esse parecer (em que fora apontada a existência na forma de processo); porém, sem daí retirar a conclusão que se impunha. Lê-se naquele aresto, que transcreve o falado parecer «a recorrente usou meio processual inadequado à tutela do direito invocado», pois,
« o pedido deveria ter sido formulado na impugnação judicial contra a liquidação», entendimento este que «não é afectado pela circunstância de se perfilhar a teoria do alcance médio da acção».
(...) Numa palavra, o erro na forma de processo já fora afirmado pelo TCA, na esteira do anterior parecer do Ministério Público. Portanto, a recorrente não foi colhida de surpresa por uma questão que nunca fora colocada no processo, nem era previsível que nele fosse tratada. E, ao recorrer do acórdão desse Tribunal, podia abordar a questão, nas suas alegações de recurso. Não é, pois, exacto afirmar que a decisão deste STA a tomou de surpresa, antes que tivesse tido oportunidade de se pronunciar sobre a matéria.
2.5 Por fim, a recorrente acusa o acórdão sob exame de ter ofendido o caso julgado, porquanto o TCA já se teria pronunciado sobre o problema da impropriedade do meio, não podendo este STA voltar a pronunciar-se sobre a mesma questão.
(...) Ora, como já se viu, o TCA, se bem que tenha abordado o tema da propriedade do meio, afirmando a existência de erro na forma do processo, não sentenciou em conformidade, isto é, não retirou daí qualquer efeito jurídico. Ou seja: por um lado, a questão não fora objecto de decisão final nenhuma, susceptível ou insusceptível de recurso ordinário; por outro lado, ainda que não abordada pela recorrente nas suas alegações e respectivas conclusões, a mesma questão foi entendida como de conhecimento oficioso, o que legitimava o Tribunal a apreciá-la e a decidi-la. Não há, portanto, ofensa do caso julgado.
2.6 Uma última palavra para abordar o tema da violação do direito de acesso ao direito e aos tribunais atribuído pela Constituição, abordado pela recorrente no requerimento em que argui nulidades do acórdão. Se bem entendemos o que a este respeito diz a recorrente, o Tribunal, ao interpretar o art. 98º, n.º 4, do CPPT no sentido de admitir a anulação de todo o processo, em caso de se verificar erro na sua forma, teria feito do preceito uma interpretação inconstitucional, por impeditiva do prosseguimento do processo e, por via disso, do direito de acesso ao direito e aos tribunais. Ainda aqui podemos estar perante um erro de julgamento, a apreciar em outra sede que não esta, que é a da apreciação, pelo próprio Tribunal que o proferiu, das nulidades assacadas ao acórdão.
(...)'.
7. Desta decisão, bem como daquela outra de 17 de Abril de 2002, foi interposto, ao abrigo das alíneas b), f) e g) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, recurso para o Tribunal Constitucional, através do requerimento de fls. 182 a 184.
8. Já neste Tribunal foi a ora reclamante convidada, por despacho do relator do processo emitido ao abrigo do artigo 75º-A, n.º 6, da LTC, para que desse 'cabal cumprimento ao disposto no artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional, indicando quais as normas que pretende ver apreciadas ao abrigo de cada uma das alíneas do n.º 1 do artigo 70º da mesma Lei por si invocadas, bem como qual a peça processual em que suscitou a questão de inconstitucionalidade ou ilegalidade'.
9. Em resposta a esta solicitação apresentou a ora reclamante o requerimento de fls. 188 a 190, que de seguida se transcreve:
'(...) a) O presente recurso de fiscalização concreta da inconstitucionalidade é interposto ao abrigo da alínea g) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, requerendo-se como seu objecto que seja apreciada a inconstitucionalidade do consagrado sob o § 1 do artigo 140º do Código da Contribuição Industrial, atento o já anteriormente sentenciado pelo Acórdão com o n.º 647/99, da 2ª Secção desse Tribunal, o qual foi proferido no processo com o n.º 39/99, na data de 24 de Novembro do ano de 1999 (publicado na II Série do Diário da República, n.º 45, de 23 de Fevereiro de 2000, págs. 3681 e 3682). b) Este recurso alicerça-se ainda no estatuído sob a al. b) do n.º 1 do art. 70º da Lei do Tribunal Constitucional, porquanto a inconstitucionalidade a apreciar do § 1 do artigo 140º do Código da Contribuição Industrial, foi expressamente suscitada (conclusões 7ª e 8ª) pela aqui recorrente nas suas alegações, introduzidas em juízo no dia 6 de Novembro de 2001 (a fls. 149) dirigidas ao Supremo Tribunal Administrativo (processo n.º 26270 da 2ª Secção), sequencialmente ao conteúdo do acórdão emanado do Tribunal Central Administrativo, com data do dia 27 de Março de 2001 (processo de recurso jurisdicional n.º 4078/00). c) Doutro passo, o recurso de fiscalização concreta da inconstitucionalidade é ainda interposto ao abrigo da al. b) do n.º 1 do art. 70º da Lei do Tribunal Constitucional a fim de ser apreciada a inconstitucionalidade do consagrado no n.º 3 do art. 3º do Código de Processo Civil e no art. 98º, n.º 4 do Código de Procedimento e do Processo Tributário se interpretados no sentido de admitirem que o tribunal de recurso não tem de convidar as partes a pronunciarem-se sobre uma questão de que se propõe conhecer oficiosamente quando a mesma não integra o objecto do recurso. A inconstitucionalidade dos aludidos comandos normativos foi expressamente suscitada pelo aqui recorrente no requerimento de arguição de nulidades (fls. 164 e segs.) do douto acórdão do STA de 17 de Abril de 2002
(fls. 157 e ss.) que, sem que tal fosse suscitada no recurso, veio aplicar os indicados preceitos dando-lhe a interpretação referida e, por isso e nessa medida, são inconstitucionais; tal decisão foi mantida no acórdão de 16 de Outubro de 2002 que «desatendeu a arguição de nulidades» (fls. 176 e segs.). d) O presente recurso de fiscalização concreta da inconstitucionalidade é também interposto ao abrigo da al. b) do n.º 1 do art. 70º da Lei do Tribunal Constitucional, requerendo-se como seu objecto que seja apreciada a inconstitucionalidade do consagrado nos artigos 206º, 668º, n.º 1, al. d) e
660º, n.º 2, quando interpretados no sentido em que o foram pelos dois acórdãos do STA (fls. 157 e segs. E fls. 176 e segs.) ou seja:
1 – que pode em sede de recurso deixar de conhecer de mérito ao decidir uma questão processual que não lhe foi colocada por qualquer das partes;
2 – que pode conhecer de um eventual erro na forma de processo após a sentença proferida em 1ª instância e mesmo o acórdão proferido em 2ª instância quando tal questão não foi objecto do recurso. A inconstitucionalidade dos aludidos comandos normativos foi expressamente suscitada pela aqui recorrente no requerimento de arguição de nulidades (fls.
164 e segs.) do douto acórdão do STA de 17 de Abril de 2002 (fls. 157 e ss.) que, sem que tal questão fosse suscitada no recurso, veio aplicar os indicados preceitos na interpretação referida e, por isso e nessa medida, são inconstitucionais; tal decisão foi mantida no acórdão de 16 de Outubro de 2002 que «desatendeu a arguição de nulidades» (fls. 176 e segs.). e) O presente recurso de fiscalização concreta da inconstitucionalidade é ainda, e por último, interposto ao abrigo da al. b) do n.º 1 do art. 70º da Lei do Tribunal Constitucional, requerendo-se como seu objecto que seja apreciada a inconstitucionalidade do consagrado no art. 12º da Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, quando interpretado, como o faz o acórdão de 17 de Abril de 2002 ora em crise, que determinou a aplicação do art. 98º, n.º 4 do CPPT a processos anteriores à sua entrada em vigor, designadamente ao presente processo instaurado em 9 de Março de 1995 e que, assim, à «sua luz» o erro na forma de processo «é de conhecimento oficioso». A inconstitucionalidade dos aludidos comandos normativos foi expressamente suscitada pela aqui recorrente no requerimento de arguição de nulidades (fls. 164 e segs.) do douto acórdão do STA de 17 de Abril de 2002 (fls. 157 e ss.) que, sem que tal questão fosse suscitada no recurso, veio aplicar os indicados preceitos na interpretação referida e, por isso e nessa medida, são inconstitucionais; tal decisão foi mantida no acórdão de 16 de Outubro de 2002 que «desatendeu a arguição de nulidades» (fls. 176 e segs.)(...)'.
10. Na sequência, foi proferida pelo Relator do processo neste Tribunal, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decisão sumária no sentido do não conhecimento do recurso (fls. 192 a 206). É o seguinte, na parte decisória, o seu teor:
' (...) 10.1. O recurso interposto ao abrigo das alíneas b) e g) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, para apreciação da constitucionalidade do § 1 do artigo 140º do Código da Contribuição Industrial [alíneas a) e b) do requerimento/resposta de fls. 188 a 190]. O recurso previsto nas alíneas b) e g) do n.º 1, do artigo 70º, da Lei do Tribunal Constitucional, pressupõe, designadamente, que a decisão recorrida tenha efectivamente aplicado no julgamento do caso, como ratio decidendi, a norma cuja inconstitucionalidade o recorrente pretende ver apreciada. Ora, como resulta evidente do teor das decisões recorridas – os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 17 de Abril (fls. 157 a 161) e de 16 de Outubro de 2002 (fls. 176 a 179) –, que supra já transcrevemos na sua parte decisória, é manifesto que as mesmas não aplicaram o § 1 do artigo 140º do Código da Contribuição Industrial. A primeira porque considerou, com base em outros preceitos, que expressamente cita, que o erro na forma de processo conduz
à nulidade do mesmo, ficando dessa forma prejudicado o conhecimento da questão de fundo (para cuja decisão seria efectivamente de convocar o § 1 do artigo 140º do Código da Contribuição Industrial). A segunda porque se limitou a apreciar, igualmente com base em outros preceitos, que também cita, da alegada nulidade daquela. Dessa forma, não tendo nenhuma das decisões efectivamente aplicado, como ratio decidendi, o § 1 do artigo 140º do Código da Contribuição Industrial, torna-se evidente que não pode, nesta parte, conhecer-se do objecto do recurso de constitucionalidade que a recorrente pretendeu interpor, por não estar preenchido um dos seus pressupostos legais de admissibilidade.
10.2. O recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, para apreciação da constitucionalidade do artigo 3º, n.º 3 do Código de Processo Civil e do artigo 98º, n.º 4 do Código de Procedimento e de Processo Tributário
[alínea c) do requerimento/resposta de fls. 188 a 190]. Pretende também a recorrente ver apreciada 'a inconstitucionalidade do consagrado no n.º 3 do art. 3º do Código de Processo Civil e no art. 98º, n.º 4 do Código de Procedimento e do Processo Tributário, se interpretados no sentido de admitirem que o tribunal de recurso não tem de convidar as partes a pronunciarem-se sobre uma questão de que se propõe conhecer oficiosamente quando a mesma não integra o objecto do recurso'. Também nesta parte, como se verá, não pode conhecer-se do objecto do recurso. De facto, como expressamente refere o artigo 72º, n.º 2, da LTC e tem sido repetidamente afirmado pelo Tribunal Constitucional, é pressuposto de admissibilidade do recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, que o recorrente tenha suscitado, durante o processo e de forma processualmente adequada, a questão de constitucionalidade que pretende ver apreciada, constituindo desde há muito jurisprudência assente neste Tribunal (veja-se, entre muitos nesse sentido, os acórdãos n.ºs 62/85, 90/85 e 450/87, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 5º vol., p. 497 e 663 e 10º vol., pp. 573, respectivamente) que a inconstitucionalidade de uma norma jurídica só se suscita durante o processo quando tal se faz em tempo de o tribunal recorrido a poder decidir e em termos de ficar a saber que tem essa questão para resolver - o que exige que a questão seja suscitada antes de esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a matéria a que a mesma inconstitucionalidade respeita (ou seja: em regra, antes da prolação da decisão recorrida). No caso dos autos, notificada a recorrente, já no Tribunal Constitucional, para indicar a peça processual em que teria suscitado as questões de constitucionalidade que pretende ver apreciadas, a mesma veio esclarecer que o teria feito 'no requerimento de arguição de nulidades (fls. 164 e segs.) do douto acórdão do STA de 17 de Abril de 2002 (fls. 157 e segs.)'. A verdade, porém, é que, ao contrário do que refere, não o fez. Como se verá, sumariamente, já de seguida, a recorrente não suscita, naquela peça processual, a questão da inconstitucionalidade normativa dos artigos 3º, n.º 3, do Código de Processo Civil e 98º, n.º 4 do Código de Procedimento e do Processo Tributário, se interpretados no sentido de admitirem que o tribunal de recurso não tem de convidar as partes a pronunciarem-se sobre uma questão de que se propõe conhecer oficiosamente quando a mesma não integra o objecto do recurso. Desde logo nunca imputa qualquer questão de inconstitucionalidade a uma interpretação normativa (fosse ela qual fosse) do artigo 3º, n.º 3, do Código de Processo Civil. Para o demonstrar bastará reproduzir, aqui, na íntegra, a única parte daquela peça processual em que a recorrente se refere a este preceito:
'III – DA DECISÃO SURPRESA Nos termos do artigo 3º, n.º 3 do CPC, o «juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem». Sucede que, o douto acórdão conheceu da questão do erro na forma do processo e, designadamente, que a mesma constituía nulidade insuprível, sem que fosse dada
às partes, designadamente à contribuinte aqui reclamante, a possibilidade de se pronunciar sobre tais questões, o que constitui nulidade que aqui se invoca e determina a nulidade da decisão. Também não se invoque que tal questão foi objecto de referência no acórdão da 2ª instância, pois este não conheceu da mesma e, assim sendo, nem o TCA tinha de observar o princípio do contraditório por manifesta desnecessidade e, face à solução dada ao pleito no TCA, não deveria, nem incumbiria à aqui reclamante pronunciar-se sobre tal questão uma vez que nela não ficou vencida nem a mesma foi objecto de recurso'. Mas também nunca suscita naquela peça processual a questão de inconstitucionalidade do artigo 98º, n.º 4 do Código de Procedimento e do Processo Tributário, se interpretado no sentido de admitir que o tribunal de recurso não tem de convidar as partes a pronunciarem-se sobre uma questão de que se propõe conhecer oficiosamente quando a mesma não integra o objecto do recurso. Para o demonstrar, igualmente se transcreve, de seguida, a (única) parte daquela peça processual em que a recorrente liga o disposto no artigo 98º, n.º 4 do Código de Procedimento e do Processo Tributário a um preceito constitucional:
'Ora, apesar de ser nosso entendimento que o erro na forma de processo a que se alude no n.º 4 do art. 98º do CPPT não integra o elenco das nulidades insupríveis taxativamente enumeradas no n.º 1 do mesmo preceito, tal questão sempre assim teria de ser dirimida uma vez que, no elenco das nulidades insanáveis taxativamente previstas no artigo 119º do Código de Processo Tributário, não consta o erro na forma de processo e nem esse nem qualquer outro preceito aludem ao erro na forma do processo ou por qualquer modo a qualificam como nulidade insuprível, regendo, assim, nessa matéria o disposto nos artigos
199º e 206º, n.º 2 do CPC que, como adiante veremos, apenas permite o seu conhecimento oficioso até – no limite – à sentença proferida em 1ª instância. Aliás, outro entendimento seria susceptível de eternizar a resolução de conflitos cerceando assim o direito constitucional à tutela jurisdicional efectiva consagrado nos n.ºs 1 e 3 do já apontado preceito constitucional (art.
20º da CRP). Não tendo, pois, a recorrente suscitado, durante o processo e de forma processualmente adequada, perante o Supremo Tribunal Administrativo, a questão da inconstitucionalidade do n.º 3, do art. 3,º do Código de Processo Civil e do n.º 4, do art. 98º, do Código de Procedimento e do Processo Tributário, 'se interpretados no sentido de admitirem que o tribunal de recurso não tem de convidar as partes a pronunciarem-se sobre uma questão de que se propõe conhecer oficiosamente quando a mesma não integra o objecto do recurso', apenas resta concluir pela impossibilidade de, também nesta parte, conhecer do objecto do recurso.
10.3. O recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, para apreciação da constitucionalidade dos artigos 206º, 668º, n.º 1, al. d) e
660º, n.º 2, do CPC, e do artigo 12º da Lei n.º 15/2001, de 5 de Julho [alíneas d) e e) do requerimento/resposta de fls. 188 a 190]. Pretende ainda a recorrente ver apreciada a inconstitucionalidade 'do consagrado nos artigos 206º, 668º, n.º 1, al. d) e 660º, n.º 2, quando interpretados no sentido(...) [de]: 1 – que pode em sede de recurso deixar de conhecer[-se] de mérito ao decidir uma questão processual que não [...] foi colocada por qualquer das partes; 2 – que pode conhecer[-se] de um eventual erro na forma de processo após a sentença proferida em 1ª instância e mesmo do acórdão proferido em 2ª instância quando tal questão não foi objecto do recurso' [alínea d) do requerimento/resposta de fls. 188 a 190]; bem como do 'art. 12º da Lei n.º
15/2001, de 5 de Junho, quando interpretado, como o faz o acórdão de 17 de Abril de 2002 ora em crise, que determinou a aplicação do art. 98º, n.º 4 do CPPT a processos anteriores à sua entrada em vigor'. A verdade é que, como vai ver-se, também nenhuma destas questões foi adequadamente suscitada perante o Supremo Tribunal Administrativo. E, designadamente, não o foram – ao contrário do que alega a recorrente - no requerimento de arguição de nulidades (fls. 164 e segs.) do douto acórdão do STA de 17 de Abril de 2002 (fls. 157 e ss.) -. Que é assim resulta evidente da transcrição, que de seguida se fará, daquela peça processual na (única) parte em que a mesma se refere a uma questão de constitucionalidade (com excepção da já referida alegação de inconstitucionalidade do §1 do artigo 140º do Código da Contribuição Industrial):
'(...) Doutr´arte, apesar da lei adjectiva ser em regra de aplicação imediata, a eventual falta de verificação dos pressupostos processuais face à lei vigente ao tempo da decisão, também tem de ser aferida ao abrigo da lei em vigor à data da entrada em juízo da petição. Mais, ou existem normas transitórias que permitam a convolação forma de processo ou, sob pena de violação do direito constitucional do acesso ao direito e aos tribunais consagrado no art. 20º da Constituição da República Portuguesa, devem prosseguir os ulteriores termos até final as acções instauradas ao tempo da lei anterior. Ora, apesar de ser nosso entendimento que o erro na forma de processo a que se alude no n.º 4 do art. 98º do CPPT não integra o elenco das nulidades insupríveis taxativamente enumeradas no n.º 1 do mesmo preceito, tal questão sempre assim teria de ser dirimida uma vez que, no elenco das nulidades insanáveis taxativamente previstas no artigo 119º do Código de Processo Tributário, não consta o erro na forma de processo e nem esse nem qualquer outro preceito aludem ao erro na forma do processo ou por qualquer modo a qualificam como nulidade insuprível, regendo, assim, nessa matéria o disposto nos artigos 199º e 206º, n.º 2 do CPC que, como adiante veremos, apenas permite o seu conhecimento oficioso até – no limite – à sentença proferida em 1ª instância. Aliás, outro entendimento seria susceptível de eternizar a resolução de conflitos cerceando assim o direito constitucional à tutela jurisdicional efectiva consagrado nos n.ºs 1 e 3 do já apontado preceito constitucional (art.
20º da CRP). (...)'. Ora, como resulta evidente da transcrição supra feita, é manifesto que não foi aqui adequadamente suscitada qualquer das questões de constitucionalidade referidas nas alíneas d) e e) do requerimento/resposta de fls. 188 a 190, e supra já identificadas, termos em que, também não pode, nesta parte, conhecer-se do objecto do recurso. Nestes termos, decide-se, ao abrigo do disposto no art. 78º-A, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional, não conhecer do objecto do recurso.'
11. Inconformada com esta decisão a ora reclamante apresentou, ao abrigo do disposto no art. 78º-A, n.º 3 da LTC, a presente reclamação para a Conferência, o que fez nos seguintes termos:
' (...) 1. - A Recorrente decaiu em 1ª Instância na acção para reconhecimento de direito ou interesse legítimo em matéria tributária a que aludem os autos em apenso.
2. - Interposto recurso «per saltum» para o Supremo Tribunal Administrativo, veio este Supremo Tribunal entender que existia «controvérsia factual» e, consequentemente, a requerimento da aqui também recorrente o processo baixou à
2ª Instância.
3. - Em 2ª Instância foi negado provimento ao recurso porque, de acordo com o preceituado no artº 140° §1 ° do Código da Contribuição Industrial, «a responsabilidade da AF pelo pagamento de juros indemnizatórios decorria apenas da existência de erro de facto imputável aos serviços». Mais se entendeu que o erro cometido pela Administração Fiscal na liquidação em causa, «... a existir, seria apenas erro de direito, por errada interpretação e aplicação da lei ... pelo que improcedem as conclusões do recurso e, em consequência, o recurso».
4. - Do douto acórdão referido em 3., foi interposto recurso para o STA cujos fundamentos por este assim - e bem - foram resumidos:
«A discordância da recorrente assenta, no essencial, em que é inconstitucional o
§ 1 ° daquele artigo 140°, interpretado conforme o [ ] fez o Tribunal recorrido, por violação do princípio da igualdade, já que todo o erro do contribuinte, seja de facto, seja de direito, o torna incurso na obrigação de prestar juros compensatórios.» Acrescenta, de seguida, o douto aresto:
«Esta a única questão colocada à nossa consideração.» Entendeu, porém, o STA não conhecer da única questão que lhe foi colocada e decretar a nulidade de todo o processo por erro na sua forma, o que fez oficiosamente pois tal questão não foi objecto de qualquer recurso .
5. - A aqui Recorrente arguiu, então, a nulidade daquele douto aresto do STA, invocando, designadamente que: A questão da inconstitucionalidade do § 1° do artigo 140° do Código da Contribuição Industrial enformava as alegações da Recorrente e as conclusões nelas formuladas pelo que deveria ter sido objecto de apreciação e não o tendo sido, enferma a douta decisão de nulidade. Nem se replique que nos termos do n° 2 do artº 660° do Código de Processo Civil que se exceptuam «aquelas (questões) cuja solução esteja prejudicada pela solução dada a outras» pois nenhuma outra foi suscitada pelas partes no recurso; doutro passo, como adiante melhor referiremos, nem ao Tribunal lhe era imposto nem lhe era permitido o conhecimento oficioso da questão do entendido erro na forma do processo o que, em qualquer situação, nunca deveria impedir o Tribunal de conhecer também do mérito da questão suscitada. Como a este propósito escreve o Juiz-Conselheiro Jacinto Fernandes Rodrigues Bastos em anotação ao n ° 2 do art.º 660° do Código de Processo Civil «Temos, assim, que as questões sobre o mérito a que se refere este n° 2 serão as que suscitam a apreciação quer da causa de pedir apresentada, quer do pedido formulado» ('in' Notas ao Código de Processo Civil, vol. III, 3ª Ed., Almedina
2001, pág. 180). Ora, seguindo o entendimento do douto acórdão a única questão colocada à apreciação do Tribunal foi a da inconstitucionalidade do §1° do artigo 140° do Código da Contribuição Industrial, questão que não foi objecto de apreciação. Assim sendo, como inquestionavelmente nos parece ser, restará aquilatar da possibilidade de o acórdão ter conhecido de questões processuais que o impediam de conhecer da questão controvertida a que no domínio do processo civil alude o n° 1 do apontado artº 660° do C PC. Como a este propósito escreve o Juiz Conselheiro Jacinto Fernandes Rodrigues Bastos tais questões «Normalmente ... são conhecidas na audiência preliminar ... ou no despacho saneador ...; só excepcionalmente, portanto, serão apreciadas na sentença.» ('in' loc. e op. cit.). Mas em que sentença? Da sentença de 1ª instância ou em qualquer fase do processo enquanto as respectivas nulidades não devam considerar-se sanadas? Afigura-se-nos que o próprio acórdão nos dá essa resposta quando expressamente fundamenta a sua decisão de declarar o erro na forma do processo no art.º 206°, n° 2 do Código de Processo Civil. Ora, se assim fosse e sem o admitir (o erro), sempre já estaria vedado ao Tribunal de recurso pronunciar-se sobre tal questão pois a mesma apenas poderia ter sido conhecida em 1ª Instância. Mas mais, se não se conhecesse da questão da inconstitucionalidade do § 1° do artigo 140° do Código da Contribuição Industrial, permitir-se-ia que produzisse efeito uma norma inconstitucional, por um lado e cuja inconstitucionalidade inclusivamente foi decretada pelo Tribunal Constitucional, por outro. Assim e em conclusão, o mui douto acórdão proferido nos presentes autos enferma de nulidade dado que não se pronunciou sobre as questões que foram objecto das conclusões da Recorrente.
2. Doutr'arte, apesar de a lei adjectiva ser em regra de aplicação imediata, a eventual falta de verificação dos pressupostos processuais face à lei vigente ao tempo da decisão, também tem de ser aferida ao abrigo da lei em vigor à data da entrada em juízo da petição. Mais, ou existem normas transitórias que permitam a convolação noutra forma de processo ou, sob pena de violação do direito constitucional do acesso ao direito e aos tribunais consagrado no art° 20° da Constituição da República Portuguesa, devem prosseguir os ulteriores termos até final as acções instauradas ao tempo da lei anterior. Ora, apesar de ser nosso entendimento que o erro na forma do processo a que se alude no n° 4 do artº 98° do CPPT não integra o elenco das nulidades insupríveis taxativamente enumeradas no n° 1 do mesmo preceito, tal questão sempre assim teria de ser dirimida uma vez que, no elenco das nulidades insanáveis taxativamente previstas no art° 119° do Código do Processo Tributário, não consta o erro na forma do processo e nem esse nem qualquer outro preceito aludem ao erro na forma do processo ou por qualquer modo a qualificam como nulidade insuprível, regendo, assim, nessa matéria o disposto nos artigos 199° e 206°, n° 2 do CPC que, como adiante veremos, apenas permite o seu conhecimento oficioso até - no limite - à sentença proferida em 1ª instância. Aliás, outro entendimento seria susceptível de eternizar a resolução de conflitos cerceando assim o direito constitucional à tutela jurisdicional efectiva consagrado nos n.ºs 1 e 3 do já apontado preceito constitucional (art.º
20º CRP).
6. - Ora, com o devido e merecido respeito pela douta Decisão Sumária proferida nos presentes autos, a aqui Recorrente suscitou, como lhe incumbia, adequadamente todas as questões e os correspondentes preceitos legais adjectivos
(Processo Civil e Tributário) que no seu entendimento também enformavam as nulidades do acórdão do STA de 17/4/2002; foi o douto aresto do STA de
16/10/2002 que, ao apreciar e decidir o requerimento de arguição de nulidades, deu uma interpretação aos ali indicados preceitos legais que, a admitir-se, faria inquinar essas mesmas normas de inconstitucionalidade. Nesta parte, é certo que não foi anteriormente suscitada a inconstitucionalidade das normas controvertidas mas pela simples razão que nunca essas normas tinham sido interpretadas no sentido em que o foram no aresto do STA. Assim e nessa parte, estamos perante uma situação excepcional em que a recorrente não teve «qualquer oportunidade de suscitar a questão de constitucionalidade em momento anterior à decisão recorrida» (Ac. n° 219/92 de 16/6/92 BMJ 418-807). Ademais, é inconstitucional o artigo 70° da Lei do Tribunal Constitucional se interpretado no sentido de que não cabe recurso de um aresto do STA que em última instância decidiu oficiosamente não conhecer do objecto do recurso por erro na forma do processo, dando para tal uma interpretação inconstitucional a normas do processo civil e tributário, designadamente no artº 98° do Código de Procedimento e do processo Tributário, artigos 3°., n° 3, 206°, 668°, n° 1, al. d) e 660°, n° 2 do Código de Processo Civil e artº 12° da Lei n° 15/2001, de 5 de Junho.
7. - Doutro passo, entendeu-se no ponto 2.6 do último aresto do STA (16/10/2002) que a aqui Recorrente suscitou a inconstitucionalidade do artº 98°, n° 4 do CPPT
.
8. - Com efeito, lê-se no referido ponto 2.6 do último aresto do STA: Se bem entendemos o que a este respeito diz a recorrente, o Tribunal, ao interpretar o artº 98° n° 4 do CPPT no sentido de admitir a anulação de todo o processado, em caso de se verificar erro na sua forma, teria feito do preceito uma interpretação inconstitucional, por impeditiva do prosseguimento do processo e, por via disso, do direito de acesso ao direito e aos tribunais.» TERMOS EM QUE espera a revogação da douta Decisão Sumária e impetra que, por acórdão, se decida conhecer do objecto do recurso.
12. Por parte da Fazenda Pública, ora recorrida, foi apresentada a seguinte resposta:
'1º A requerente pretende, em última análise, obter pronúncia o Venerando Tribunal Constitucional sobre o artigo 140° do Código da Contribuição Industrial que não foi efectivamente aplicado pelos Acórdãos de fls. 157a 161 e 176 a 179, proferidos pelo Supremo Tribunal Administrativo.
2° Para tanto pretende que arguiu a inconstitucionalidade do n ° 4 do artigo 98° do CPT e, por essa via, obter decisão que recaia decisão do Tribunal sobre o pedido deduzido na acção para reconhecimento de um direito ou interesse legitimo em matéria tributária.
3º Mas a verdade é que a ora requerente não arguiu sequer que o entendimento que o Tribunal fez da norma violou preceito constitucional, limitando-se a pugnar por uma interpretação do n.º 4 do artigo 98º do CPT, socorrendo-se do argumento de que outro entendimento seria inconstitucional por cercear o direito à tutela jurisdicional efectiva.
4° E, assim, como bem julgou a douta decisão sumária, não se verificam os pressupostos para conhecer do objecto do recurso. Termos em que deve a presente reclamação para a conferência ser julgada improcedente e ser decidido não conhecer do objecto do recurso.' Dispensados os vistos legais, cumpre decidir.
II – Fundamentação
13. Com a presente reclamação a ora reclamante vem fundamentalmente contestar que, conforme se decidiu na decisão reclamada de fls. 192 a 206, não tenha suscitado adequadamente as questões de constitucionalidade normativa que pretende ver apreciadas, inclusive de normas que se entendeu na decisão sumária não terem sido aplicadas no acórdão recorrido. A verdade, porém, é que não lhe assiste razão. Como se demonstrou já, pormenorizadamente, na decisão reclamada, é manifesto que nem o § 1 do artigo 140º do Código da Contribuição Industrial foi efectivamente aplicado, como ratio decidendi, pelas decisões recorridas, nem a recorrente suscitou, durante o processo e em termos processualmente adequados, as questões de constitucionalidade - referidas aos artigos 3º, n.º 3, 206º, 668º, n.º 1, al. d) e 660º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil, ao artigo 98º, n.º 4 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, e ao artigo 12º da Lei n.º
15/2001, de 5 de Julho - que pretendia ver apreciadas. Agora apenas se acrescenta – por ser a única questão verdadeiramente nova colocada pela ora reclamante – que é manifestamente improcedente a alegação de que ' (...) é inconstitucional o artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional se interpretado no sentido de que não cabe recurso de um aresto do STA que em
última instância decidiu oficiosamente não conhecer do objecto do recurso por erro na forma do processo, dando para tal uma interpretação inconstitucional a normas do processo civil e tributário, designadamente no art. 98º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, artigos 3º, n.º 3, 206º, 668º, n.º 1, al. d) e 660º, n.º 2, do Código de Processo Civil e 12º da Lei n.º 15/2001, de 5 de Julho (...)'. Como resulta evidente de tudo quanto já se disse, este Tribunal não interpretou o artigo 70º da LTC no sentido apontado pela recorrente – i.e., no sentido de que não cabe recurso de um aresto do STA que em última instância decidiu oficiosamente não conhecer do objecto do recurso por erro na forma do processo – mas, diferentemente, no sentido de entender que esse recurso – que o artigo 70º, em abstracto, admite – não pode, contudo, ser admitido no caso concreto, precisamente por o recorrente não ter cumprido os pressupostos de que depende a sua admissibilidade. Assim sendo, apenas resta, reafirmando no mais os fundamentos constantes da decisão reclamada, que em nada são abalados pela presente reclamação, concluir pela impossibilidade de conhecer do objecto do recurso.
III – Decisão Nestes termos, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do objecto do recurso. Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 (quinze) unidades de conta. Lisboa, 17 de Março de 2003 Gil Galvão Bravo Serra Luís Nunes de Almeida