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Proc nº. 385/99 TC – 1ª Secção Relator: Consº. Artur Maurício
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 – P... e mulher M..., com os sinais dos autos, reclamam do despacho de
17/12/98 proferido no Tribunal da Relação de Lisboa que não admitiu o recurso por eles interposto através do requerimento certificado a fls. 25.
Dizem na sua reclamação:
'1. O prazo de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional não é de 8 dias, mas sim de 10 dias (art. 75º nº. 1 da LTC)
2. O recurso é interposto dentro do prazo legal de 10 dias, após terem sido efectuadas, até à exaustão, todas as diligências que seriam possíveis.
3. A jurisprudência do TC, tem considerado que todos os meios impugnatórios de decisões judiciais, recursos e reclamações, devem ser esgotados, (cfr. A . Ribeiro Mendes, Recursos em Processo Civil, 2ª edição, Lisboa, 1994, pág. 332).
4. Ora, o recurso é interposto dentro do prazo legal de 10 dias, decorridos que foram 10 dias depois de terem sido efectuadas até à exaustão todas as diligências que seriam possíveis.
5. Temos que, os recorrentes foram notificados do acórdão de 10/11/98 de fls.
214 em 19/11/98.
6. Os 10 dias atrás referidos, acabaram em 30/11/98.
7. Como é de 10 dias o prazo de interposição do recurso para o TC, como já ficou dito no nº. 1 desta reclamação, o prazo só terminou em 10 de Dezembro de 1998.
8. Como a interposição do recurso para o TC teve lugar em 9/12/98, temos que, o recurso foi interposto dentro do prazo, tempestivamente. Assim, solicita-se que, o referido recurso seja admitido e sobre sua matéria recaia acórdão, nos termos do art. 700º, nº. 3 do CPC.'
O Exmo. Magistrado do Ministério Público neste Tribunal pronuncia-se no sentido do indeferimento da reclamação por duas ordens de razões, qualquer uma delas suficiente para não ser admitido o recurso: a primeira, por não se verificarem os pressupostos do recurso interposto ao abrigo do artigo 70º nº. 1 alínea c) da Lei nº. 28/82, a segunda, por intempestividade do recurso tal como se decidiu no despacho impugnado.
Cumpre decidir.
2 – Para correcta interpretação do decidido no despacho reclamado e dos termos da reclamação, importa alinhar a sequência processual que resulta dos autos:
Assim:
Por acórdão de 12/5/98, notificado aos recorrentes em 21/5/98, o Tribunal da
Relação de Lisboa negou provimento ao recurso interposto, pelos ora
reclamantes, de sentença que julgara improcedente acção de despejo pelos
mesmos intentada no Tribunal Judicial de Cascais.
Nesse recurso, os recorrentes haviam alegado, entre outros fundamentos, o
princípio da plenitude da assistência dos juízes estabelecido no artigo 654º
nº. 1, do CPC, fundamento que foi julgado improcedente naquele acórdão.
Em 1/6/98 os recorrentes interpuseram recurso de revista do mesmo acórdão para
o STJ.
Por despacho de 3/6/98, notificado em 8/6/98, o recurso não foi admitido por o
acórdão impugnado ter sido proferido em causa de valor inferior à alçada da
Relação.
Em 18/6/98 os recorrentes apresentaram o requerimento documentado a fls. 22 em
que, em síntese, manifestaram discordância quanto ao decidido sobre a invocada
violação do artigo 654º nº. 1 do CPC, sustentando que a decisão do tribunal
colectivo (de 1ª instância) enfermava de nulidade prevista no artigo 201º nº.
1 do CPC.
Por despacho de 29/9/98 o requerimento a que se refere a alínea anterior foi
indeferido por se ter entendido, essencialmente, que
A situação configurada pelos requerentes não constituía nulidade processual;
Os requerentes deviam ter reclamado ou recorrido do despacho que não lhe
admitira o recurso para o STJ g) Os ora reclamantes requereram, então, que sobre o despacho de 29/9/98 recaísse acórdão h) O decidido foi confirmado por acórdão de 10/11/98, notificado em 19/11/98 i) Interpuseram, então, os reclamantes recurso para o Tribunal Constitucional por requerimento entrado em 9/12/98, nos seguintes termos:
'P... e mulher M..., por não poderem conformar-se com o acórdão de 10/11/98, que decidiu 'por se concordar inteiramente com o teor do despacho de fls. 210 vº a
211 vº, dá-se aqui o mesmo por integralmente reproduzido', e porque divergem do entendimento do mesmo, vêm interpor recurso para o Tribunal Constitucional do citado acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, que apreciando a arguição da não aplicação da norma constante do art. 654º nº. 1 do CPC – Princípio da Plenitude – julgou improcedente o recurso oportunamente interposto. O presente recurso é interposto ao abrigo da al. c) do nº. 1 do art. 70º da LTC, para apreciação da ilegalidade na interpretação do art. 654º nº. 1 do CPC, que lhe foi dada pelo acórdão recorrido. Porque está em tempo, atingida que foi a exaustão dos recursos ordinários, e a decisão é recorrível, requer-se que seja considerado interposto o presente recurso.'
j) O recurso não foi admitido por despacho de fls. 29, nos seguintes termos:
'O prazo de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional é de 8 dias
(art. 75º, nº. 1, da Lei do Tribunal Constitucional). Os recorrentes foram notificados do acórdão de fls. 214 em 19/11/98 (cfr. fls.
215). Logo, tendo apresentado recurso daquele acórdão, para o Tribunal Constitucional, em 9/12/98, fizeram-no fora do aludido prazo de 8 dias.
É certo que, nos termos do nº. 2, do citado art. 75º interposto recurso ordinário que não seja admitido com fundamento em irrecorribilidade da decisão, aquele juízo conta-se do momento em que se tornou definitiva a decisão que não admite o recurso. Só que, no caso, a decisão de fls. 207, que não admitiu o recurso, proferida em
3/6/98, há muito que se tornou definitiva, já que, notificados daquele despacho, os recorrentes nem reclamaram dele, nem o impugnaram por meio de recurso, limitando-se a invocar uma nulidade processual, que foi indeferida (cfr. o despacho de fls. 210 v. a 211 v.). Assim, ao abrigo do disposto no art. 76º, nºs. 1 e 2, da L.T.C., indefere-se o requerimento de interposição do recurso de fls. 216, por ter sido apresentado fora do prazo.'
3 – É do despacho supra transcrito em j) que vem interposta a presente reclamação com fundamento em que, sendo o prazo de recurso para o TC de 10 dias,
'após terem sido efectuadas, até à exaustão, todas as diligências que seriam possíveis', o recurso é tempestivo por o prazo só expirar em 10/12/98 (o recurso foi interposto em 9/12/98).
Antes de entrar na apreciação do fundamento invocado pelos reclamantes, cabe dizer que o Exmo Magistrado do Ministério Público tem inteira razão quando sustenta a inadmissibilidade do recurso, por se não verificarem os pressupostos do recurso previsto no artigo 70º nº. 1 alínea c) da Lei nº. 28/82, ao abrigo do qual os reclamantes interpuseram recurso para o Tribunal Constitucional.
Na verdade, não se vislumbra no acórdão de 10/11/98 qualquer recusa de aplicação de norma com fundamento em violação de lei reforçada, sendo manifesto que um eventual erro de (não) aplicação de norma do CPC não integra aquele requisito do recurso de constitucionalidade.
Tanto bastaria, como se disse, para indeferir a reclamação.
Sem prescindir, vejamos, agora, o aludido fundamento com que os reclamantes impugnam o despacho de não admissão do recurso.
4 - É de dez dias o prazo de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional nos termos do artigo 75º nº. 1 da Lei nº. 28/82.
Errava, assim, o despacho reclamado quando dizia ser de oito dias aquele prazo; mas o erro veio a ser rectificado no despacho de fls. 6, acrescentando-se que o lapso não implicava alteração do decidido quanto à não admissão do recurso.
O início do prazo do recurso conta-se, em regra, da notificação da decisão recorrida.
Simplesmente, esta regra sofre desvios em virtude de o recurso de constitucionalidade nos termos do artigo 70º nº. 1 al. b) da Lei nº. 28/82
(suposto que era este o recurso que os reclamantes pretendiam interpor) ser apenas admissível de decisões de que não cabe recurso ordinário (nº. 2 do cit. art. 70º) e de o legislador ter conferido a este pressuposto um determinado sentido.
Na verdade, com um claro objectivo de não limitar, por razões de ordem processual, o acesso ao Tribunal Constitucional, o legislador dispôs que se entendiam como 'decisões que não admitam recurso ordinário' não só aquelas de que a lei não prevê recurso, como as que são susceptíveis de recurso ordinário mas a parte a este renunciou, ou deixa extinguir o prazo para a interposição do recurso, ou, ainda, interposto o recurso, este não tem seguimento por razões de ordem processual.
Dispondo, por outro lado, o artigo 75º nº. 2 da Lei nº. 28/82 que, interposto recurso ordinário e não admitido este com fundamento em irrecorribilidade da decisão, o prazo de recurso para o Tribunal Constitucional se conta 'do momento em que se torna definitiva a decisão que não admite recurso', segue-se que é diferente, consoante as situações, o início daquele prazo.
No caso, o recurso vem interposto do acórdão de 10/11/98, supra referido em h), notificado aos recorrentes em 19/11/98.
O acórdão era insusceptível de recurso ordinário (o valor da acção era inferior
à alçada da Relação), o que significa, nos termos do artigo 70º nº. 2 da Lei nº.
28/82, que dele cabia recurso directo para o Tribunal Constitucional.
Por outro lado, dele não foi interposto recurso ordinário, nem qualquer outro meio de impugnação, o que igualmente significa que se não preenche a hipótese prevista no artigo 75º nº. 2 da Lei nº. 28/82 (interposição de recurso ordinário não admitido com fundamento em irrecorribilidade da decisão), situação em que o prazo de interposição do recurso de constitucionalidade só começa a correr depois de tornada definitiva a decisão que não admite recurso.
De igual modo, não pode aqui valer o disposto no nº. 4 do artigo 70º da Lei nº.
28/82 que não supõe a irrecorribilidade (recurso ordinário) da decisão e em que o prazo do recurso de constitucionalidade se não inicia com a notificação da mesma decisão.
Não faz, pois, qualquer sentido, no caso, sustentar que o prazo do recurso para este Tribunal se iniciara apenas depois de tornado definitivo o acórdão impugnado de 10/11/98 ou, na linguagem dos recorrentes, 'depois de terem sido efectuadas até à exaustão todas as diligências que seriam possíveis', não se vendo, aliás, dos autos qualquer uma diligência impugnatória depois de proferido e notificado aquele aresto.
E daí que o início do prazo do recurso deva obedecer à regra geral segundo a qual ele se situa no momento da notificação da decisão recorrida.
Mas sendo assim, como é, iniciado em 19/11/98 o prazo do recurso do acórdão de
10/11/98 ele se mostrasse expirado em 9/12/98, data da interposição do recurso, como bem se decidiu no despacho reclamado.
4 - Decisão:
Pelo exposto e em conclusão indefere-se a reclamação. Custas pelos reclamantes fixando-se a taxa de justiça em 15 Ucs.
Lisboa, 29 de Junho de 1999 Artur Maurício Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa