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Proc. N.º 187/95
1ª Secção Cons. Vítor Nunes de Almeida
ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:
1. – E... apresentou uma reclamação do despacho do Relator do Supremo Tribunal Militar que não lhe admitiu o recurso interposto para este Tribunal Constitucional do acórdão proferido por aquele Tribunal que o condenou pelo crime de abuso de autoridade por rigor ilegítimo.
2. - Por acórdão de 11 de Junho de 1996 – Acórdão n.º
763/96 – o Tribunal Constitucional decidiu indeferir a reclamação. Pedida a aclaração do referido acórdão, foi a mesma indeferida pelo acórdão n.º 222/97, de 12 de Janeiro de 1997.
3. – O arguido, notificado deste aresto, veio arguir a sua nulidade, arguição esta indeferida por acórdão de 4 de Março de 1998, com o n.º 218/98.
4. – Notificado deste acórdão veio interpor recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional, ao abrigo do preceituado no artigo 79º-D, da Lei do Tribunal Constitucional.
Após um esclarecimento prestado pelo recorrente relativamente a qual das decisões pretendia recorrer para o Plenário, foi proferido, em 16 de Junho de 1998, um despacho a indeferir o recurso interposto para o Plenário, uma vez que o indeferimento da reclamação tinha assentado na apresentação extemporânea do recurso de constitucionalidade.
5. – Notificado desta decisão veio o recorrente apresentar um requerimento através do qual disse que pretendia reclamar de tal decisão para 'o Excelentíssimo Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional'.
Por despacho de 30 de Setembro de 1998, do relator, foi tal requerimento indeferido por a Lei do Tribunal Constitucional não prever tal reclamação, não sendo o caso de aplicação do direito subsidiário.
6. – Esgotadas todas as possíveis reclamações, o recorrente veio então apresentar um pedido de concessão de apoio judiciário.
Por despacho do relator, de 22 de Outubro de 1998, foi liminarmente indeferida a pretensão do requerente, com o fundamento que a reclamação em causa estava definitivamente resolvida e o instituto do apoio judiciário não se destina a obter uma dispensa do pagamento das custas já devidas em processo findo.
Notificado deste despacho, o recorrente veio pedir a sua aclaração, no sentido de se esclarecer se o despacho em causa tinha como base apenas a fase da reclamação – que refere estar 'inquestionavelmente já decidida'
– ou se deveria ser extensível a todo o processo.
Por despacho de 27 de Novembro de 1998, o relator esclareceu que tal despacho que indeferiu o pedido de apoio judiciário 'só pode referir-se a esse processo [de reclamação]e não a qualquer outro', que não existia neste Tribunal.
7. – Apesar deste esclarecimento, o recorrente – agora já com intentos manifestamente dilatórios - pois não pode admitir-se outra qualquer explicação – apresentou, em 7 de Dezembro de 1998, um requerimento pelo qual pretendeu interpor recurso do despacho que indeferiu o pedido de apoio judiciário.
Face a tal requerimento, foi o requerente notificado para esclarecer 'qual o Tribunal para onde pretendia recorrer e em que disposição legal e procedimental fundamentava tal recurso'.
8. – Em resposta, o recorrente veio dizer o seguinte:
'1. A regra processual ensina que deve recorrer-se sempre para o Tribunal da hierarquia superior à do Tribunal ‘a quo’.
2. No caso vertente inexiste tal hierarquia, cremos.
3. Assim entendemos que deve ser o Plenário do Tribunal Constitucional a apreciar o requerimento em apreço.
4. Ou, caso assim se não entenda, deve ser o mesmo apreciado pelo Tribunal superior e hierarquicamente tido como competente.
5. As normas processuais resultam da aplicação do Dec.-Lei n.º 387-B/87, de
29/12, mormente do seu artigo 30º'.
Sobre este requerimento recaiu um despacho pelo qual se decidiu que 'Tendo em conta que, a jurisdição constitucional não está hierarquicamente ordenada, e que o recurso para o plenário do Tribunal só é permitido nos termos expressamente previstos na respectiva Lei Orgânica (artigo
79º-D, da Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro), neles não cabendo o pretendido recurso de uma decisão do relator, decide-se não admitir o presente recurso.'
Notificado deste despacho, o requerente veio agora atravessar outro requerimento pedindo a sua aclaração, no sentido de o Tribunal esclarecer se o requerente 'tem ou não o direito de recorrer'.
Independentemente do que vier a ser decidido quanto à matéria do pedido de aclaração, o certo é que o estado do presente processo demonstra, à saciedade, que o requerente tenta por todos os meios obstar ao trânsito da decisão condenatória.
Assim sendo, parece manifesto que se está perante uma situação de aplicação do estipulado no artigo 720º do Código de Processo Civil
(CPC), de defesa contra as demoras abusivas. Efectivamente, desde 11 de Junho de
1996, em que se decidiu indeferir a reclamação apresentada, por extemporânea, que o reclamante, primeiro através de aclaração e arguição de nulidades do referido acórdão, depois através de reclamação dos despachos proferidos e, por fim, da interposição de um recurso, do despacho do relator que indeferiu o pedido de apoio judiciário, para o Plenário do Tribunal Constitucional, tem vindo a tentar evitar o trânsito da decisão do Supremo Tribunal Militar.
Face ao indeferimento dos requerimentos, vem agora pedir a aclaração do despacho que não admitiu tal recurso, para que o Tribunal esclareça se tem ou não o direito de recorrer.
9. – Dada vista ao Ministério Público, emitiu o seguinte parecer:
'Através de um abuso, ostensivamente ilegítimo, do direito de impugnação das decisões judiciais, pretende o ora reclamante, através de sucessivos pedidos de
'aclaração', eternizar a tramitação do presente processo, recolocando, de forma persistente, a mesma questão que acabou de ser resolvida – ficcionando vias ou graus de recurso manifesta e evidentemente inexistentes no ordenamento jurídico. Tal comportamento processual integra obviamente o conceito de litigância de má fé, já que revela um uso ilegítimo e intencional dos meios processuais, desviando-os da sua típica funcionalidade, para a obtenção de finalidades descaradamente dilatórias, cumprindo, desde logo, pôr cobro à inadmissível situação dos autos através do meio previsto no artº 720º do CPC, por essa via frustrando o objectivo dilatório do arrastamento processual, pretendido pelo reclamante.'
10. – Cumpre decidir.
De acordo com o preceituado no n.º1 do artigo 720º do CPC, 'Se ao relator parecer manifesto que a parte pretende, com determinado requerimento, obstar ao cumprimento do julgado ou à baixa do processo ou à sua remessa para o tribunal competente, levará o requerimento à conferência, podendo esta ordenar, sem prejuízo do disposto no artigo 456.º que o respectivo incidente se processe em separado'. Pelo seu lado, o n.º2 do preceito estabelece que 'o disposto no número anterior é também aplicável aos casos em que a parte procure obstar ao trânsito em julgado da decisão, através da suscitação de incidentes, a ela posteriores, manifestamente infundados; neste caso, os autos prosseguirão os seus termos no tribunal recorrido, anulando-se o processado se a decisão vier a ser modificada.'
Assim, tendo em atenção o parecer do Ministério Público e, uma vez que o pedido feito no sentido de o Tribunal esclarecer se o requerente 'tem ou não o direito de recorrer' não parece poder conceber-se como uma aclaração de obscuridade ou ambiguidade, tal pedido tem intuitos manifestamente dilatórios, com vista a impedir a remessa dos autos ao tribunal reclamado e o subsequente trânsito da decisão. Pelo exposto, o Tribunal Constitucional decide que, nos termos do que se dispõe no artigo 720º do CPC, os presentes autos sejam, de imediato remetidos ao Supremo Tribunal Militar, para aí prosseguirem os termos normais do respectivo processado, determinando-se que o presente incidente de aclaração passe a processar-se em separado, ordenando-se que se extraia certidão das seguintes peças: o requerimento pedindo o apoio judiciário de fls.146 a 148; o promoção de fls. 149, verso; o despacho de fls. 150; o pedido de aclaração de fls 154 a 155; o despacho de fls. 156; o requerimento a interpor recurso do despacho do relator que indeferiu liminarmente o pedido de apoio judiciário, de fls. 161; o despacho de fls. 162; o requerimento de fls. 165; o despacho de fls. 167 a 169; o requerimento pedido a aclaração do despacho de 23 de Fevereiro de 199, de fls. 175 a 177.
Lisboa, 22 de Junho de 1999 Vítor Nunes de Almeida Paulo Mota Pinto Alberto Tavares da Costa Helena de Brito Artur Maurício Luís Nunes de Almeida