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Processo n.º 197/99
2ª Secção Relator – Bravo Serra
(Consº Paulo Mota Pinto)
1. O Ministério Público veio interpor recurso para este Tribunal Constitucional do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 19 de Janeiro de
1999, que julgou materialmente inconstitucional e recusou a aplicação do artigo
7º, n.ºs 4 e 5 do Decreto-Lei n.º 387-B/87, de 29 de Dezembro, na redacção da Lei n.º 46/96, de 3 de Setembro, 'enquanto restritivo das pessoas que podem beneficiar do patrocínio judiciário, como modalidade do apoio judiciário', revogando, consequentemente, o despacho decorrido (que havia recusado a T..., S.A., a concessão do benefício de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono), 'o qual deve ser substituído por outro em que se aprecie a condição económica da Requerente da nomeação em ordem à apreciação do respectivo pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono'. O recurso de constitucionalidade, interposto 'nos termos do art.º 75º-A e 70º, n.º 1, al. a) da Lei n.º 28/82', visa 'a apreciação da invocada inconstitucionalidade material do artigo 7º, n.ºs 4 e 5 do Decreto-Lei n.º
387-B/87, de 29 de Dezembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 46/96, de
3 de Setembro'.
O Procurador-Geral Adjunto em funções neste Tribunal, pugnando pela procedência do presente recurso, concluiu deste modo as alegações que oportunamente apresentou:
'1º - Não constitui restrição excessiva ou desproporcionada relativamente ao direito de acesso à justiça, na modalidade de protecção jurídica, a que se traduz em limitar – quanto às sociedades, aos comerciantes em nome individual nas causas ligadas ao exercício do seu comércio e aos estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada - o referido direito (de que gozam integralmente as pessoas individuais e colectivas sem fins lucrativos), de modo a não permitir que empresas que prosseguem uma actividade económica com fins lucrativos ponham a cargo da generalidade dos contribuintes o pagamento de custos que, embora ligados à administração da justiça, são inerentes ao normal
‘giro comercial’ dos requerentes e cujo montante se não mostra manifestamente desproporcionado relativamente à dimensão económica da empresa.
2º - Na verdade, tal limitação ou restrição traduz mera decorrência das finalidades constitucionalmente atribuídas ao sistema fiscal e do princípio da igualdade na repartição dos encargos públicos, bem como da regra de que devem ser prioritariamente os beneficiários de uma actividade económica, exercida com fins lucrativos, a fornecer os meios financeiros indispensáveis ao prosseguimento de tal actividade.'
A recorrida, por sua vez, concluiu assim as suas contra-alegações:
'22. Não obstante o brilho e erudição da douta alegação do Ministério Público – elogio sincero que se deixa reiterado – a verdade é que lhe não assiste razão, tal como não assiste razão aos doutos Acórdãos referidos. Por muito que custe admitir, a verdade é que não é possível em abstracto suprimir as condições de exercício de um direito fundamental, como é o de acesso aos Tribunais, fundando o juízo abstracto do legislador em considerações de normalidade, de comerciante médio, de despesas de custas e de honorários como custos de produção, do montante médio dos honorários dos advogados, a quem está vedado o sistema de quota litis, etc. Toda a argumentação carreada só contribui, na opinião da Recorrida, para fortalecer o juízo de inconstitucionalidade do douto acórdão da Relação (onde, aliás, há opinião maioritária, que permite à Recorrida juntar vários acórdãos que lhe dão razão), quanto à solução do legislador de 1996 de matar o mal pela raiz. A solução encontrada pode valer no Reino Unido ou ser aconselhada por uma prática exigente na Escandinávia, mas não resiste face ao ‘rochedo constitucional’ que resulta dos art.ºs 13º, 18º, n.ºs 2 e 3, e 20º, n.ºs 1 e 2, CRP. Esse Alto Tribunal terá certamente ocasião de, confirmando a decisão recorrida, censurar a solução legislativa de restrição de um direito fundamental através da supressão da mesma quanto a um classe de pessoas que é suposta ter à força sucesso, por estar vocacionada ex lege para o lucro... ainda quando tenha prejuízos que a tornem insolvente (antes de declarada a falência...).'
Cumpre apreciar e decidir.
2. - A questão sub iudicio foi já objecto de análise por destes Tribunal e Secção, tendo, a seu respeito, lavrado o Acórdão nº 97/99, que se encontra publicado na 2ª Série do Diário da República de 10 de Abril de 1999.
Aí, a norma ora em crise foi julgada não inconstitucional, pelas razões constantes da fundamentação carreada a tal aresto.
3. - Tais razões continuam a convencer este Tribunal e, assim, por apelo às mesmas, também no vertente caso se decide: a) julgar inconstitucional a norma ínsita no artº 7º, nº 5, do Decreto-Lei nº
387-B/87, de 29 de Dezembro, com a redacção que lhe foi dada pela Lei nº 46/96, de 3 de Setembro, na parte em que abrange as pessoas colectivas com fim lucrativo e, b) em consequência, conceder provimento ao recurso. Lisboa, 30 de Junho de 1999- Bravo Serra Fernanda Palma Paulo Mota Pinto (vencido, nos termos de declaração de voto junta ao Acórdão nº
97/99) Guilherme da Fonseca (vencido, nos termos da declaração de voto do Exmº Conselheiro Mota Pinto)