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Processo n.º 357/2000 Conselheiro Messias Bento
(Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza)
Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I. Relatório:
1. M..., notificado do acórdão n.º 383/2000, que não conheceu, em parte, do recurso que tinha interposto do acórdão da Relação de Lisboa, de 13 de Abril de
2000, e que, na parte em que dele conheceu, negou-lhe provimento, vem pedir a aclaração do mesmo.
O recorrente diz que, numa das conclusões da alegação que, oportunamente, apresentou neste Tribunal, 'insurgiu-se contra o facto de o acórdão recorrido ter aplicado doutrina fixada no assento de 5 de Novembro de 1998 a factos praticados antes da sua publicação, impugnando a dimensão normativa do mesmo'. Acrescenta :'Aliás o acórdão recorrido expressamente refere não descortinar razões para alterar a orientação fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça'. Anota, a seguir: 'E o acórdão, cujo esclarecimento se requer, acaba por admitir que o acórdão recorrido convoca o citado assento (com carácter geral e abstracto) para o aplicar à lei nova dada a similitude do texto'. E termina, interrogando: 'Interroga-se o recorrente se o Tribunal Constitucional, neste e noutros casos, em que se convocam retroactivamente doutrinas fixadas em assentos
(com o alcance que decorria da redacção inicial do Código Civil, e com o alcance que lhes foi posteriormente atribuído) pode ou não fiscalizar a constitucionalidade de normas daí resultantes?' O PROCURADOR-GERAL ADJUNTO em funções neste Tribunal respondeu nos termos seguintes:
1º. O pedido de aclaração deduzido é manifestamente improcedente.
2º. Na verdade, o acórdão reclamado procedeu a uma cuidadosa delimitação do conceito de 'inconstitucionalidade normativa', concluindo maioritariamente, em consonância com precedente jurisprudência, que a questão 'interpretativa', suscitada pelo recorrente, não integrava objecto idóneo de um recurso de fiscalização concreta.
3º. Sendo tal entendimento, expresso no acórdão reclamado, perfeitamente inteligível, não carecendo de qualquer complementar esclarecimento por parte deste Tribunal.
4º. Cumprindo ainda notar – face ao decidido a fls. 7296 – que o assento do STJ de 5/11/98 não foi sequer aplicado pelo acórdão recorrido, o que priva de sentido a questão enunciada pelo recorrente como constituindo a 'dúvida' a remover através do presente pedido de esclarecimento.
5º. O qual deverá, naturalmente, ser julgado improcedente.
2. Cumpre decidir.
II. Fundamentos:
3. Como decorre dos termos em que o pedido de aclaração está formulado, o que recorrente pede não é o esclarecimento de qualquer obscuridade ou ambiguidade que o acórdão aclarando contenha, no trecho que versa sobre a questão que ele colocou relativamente ao assento do Supremo Tribunal de Justiça, de 5 de Novembro de 1998. Pede, isso sim, que este Tribunal esclareça se, quando as decisões recorridas 'convocam retroactivamente doutrinas fixadas em assentos
(com o alcance que decorria da redacção inicial do Código Civil, e com o alcance que lhes foi posteriormente atribuído)' ele 'pode ou não fiscalizar a constitucionalidade de normas daí resultantes'.
A questão assim colocada pelo recorrente é uma questão jurídica que este Tribunal não pode aqui decidir, pois que apenas lhe cumpria esclarecer dúvidas de entendimento que o acórdão n.º 283/2000 acaso suscitasse, por conter obscuridades ou ambiguidades. Só para isso serve, na verdade, o pedido de esclarecimento formulado ao abrigo do artigo 669º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil.
Ora, o que o Tribunal disse relativamente à questão que o recorrente colocou no que concerne ao assento do Supremo Tribunal de Justiça, de 5 de Novembro de
1998, não ofereceu ao recorrente quaisquer dúvidas de interpretação. E nem seria de esperar que tal sucedesse, tão claro é o que, a esse propósito, se escreveu. Transcreve-se: Também não vai conhecer-se da invocada violação dos nºs 3 e 4 do artigo 29º da Constituição, porque não está aí em causa nenhum problema de inconstitucionalidade normativa, mas uma alegada aplicação retroactiva do assento do Supremo Tribunal de Justiça, de 5 de Novembro de 1998. Aliás, há que sublinhar que, contrariamente ao que o recorrente pretende, este assento não foi, sequer, aplicado pelo acórdão recorrido, nem tão-pouco podia tê-lo sido, pois ele foi tirado para interpretar os artigos 228º, n.º 1, alínea a), e n.º 2, e 229º, n.º 3, do Código Penal de 1982, que não eram aplicáveis no caso. O assento apenas foi convocado pelo acórdão recorrido para sublinhar que a nova lei – recte, o artigo 256º, n.º 3, do Código Penal -, no ponto considerado, acolheu a solução que já estava consagrada na lei antiga, tal como esta foi interpretada pelo mesmo assento: de facto, o aresto recorrido - depois de sublinhar que 'a redacção dos nºs 1 e 3 do artigo 256º do actual Código Penal corresponde, ponto por ponto, às dos nºs 1 e 2 do artigo 228º do Código Penal de
1982'; e que 'a definição de documento dada pela alínea a) do artigo 255º do actual Código Penal corresponde à que era dada pelo artigo 229º do Código Penal de 1982 – acrescentou que, no domínio do Código por último citado, 'foi largamente debatida a questão de saber se a chapa de matrícula automóvel, depois de nele ter sido aposta, é um documento com igual força à de um documento autêntico', sendo na sequência desse debate que surgiu o mencionado assento. E o mesmo aresto ajuntou: 'apesar de estar em causa lei nova, dada a coincidência das normas em confronto, não se descortinam razões para alterar a orientação fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça'.
O pedido de aclaração formulado pelo recorrente tem, assim, que ser desatendido. De facto – insiste-se -, o que o recorrente pretende ver esclarecido, no que concerne à por si alegada aplicação retroactiva do assento do Supremo Tribunal de Justiça, de 5 de Novembro de 1998, pelo acórdão da Relação, não é uma dúvida sobre aquilo que este Tribunal decidiu, a esse respeito, no mencionado acórdão n.º 383/2000. Ao que acresce que o recorrente também não manifesta qualquer dúvida de entendimento sobre o que o Tribunal disse para chegar à conclusão de não ser competente para sindicar o processo interpretativo que conduziu a Relação a qualificar como documento autêntico ou com igual força a chapa de matrícula de automóvel.
III. Decisão: Pelos fundamentos, expostos, decide-se:
(a). desatender a reclamação apresentada;
(b). condenar o recorrente nas custas, com dez unidades de conta de taxa de justiça.
Lisboa, 9 de Agosto de 2000 Messias Bento Alberto Tavares da Costa Maria dos Prazeres Pizarro Beleza José de Sousa e Brito Luís Nunes de Almeida