Imprimir acórdão
Proc. nº 330/99
1ª Secção Relatora: Maria Helena Brito
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I
1. Por sentença de 29 de Janeiro de 1996, proferida no Tribunal da Comarca de Santo Tirso, J... foi condenado na pena de dez meses de prisão, por haver cometido um crime de emissão de cheque sem provisão, previsto e punível pelos artigos 11º, nº 1, alínea a), do Decreto-Lei nº 454/91, de 28 de Dezembro, e 313º, nº 1, do Código Penal de 1982.
Na sentença, aquela pena foi declarada integralmente perdoada, nos termos do artigo 8º, nº 1, alínea d), da Lei nº 15/94, de 11 de Maio, sob a condição resolutiva a que alude o artigo 11º da mesma lei (a condição resolutiva de o beneficiário não praticar infracção dolosa nos três anos subsequentes à data da entrada em vigor da lei – o dia 12 de Maio de 1994, por força do disposto no artigo 17º).
Por despacho de 15 de Novembro de 1998, foi revogado o perdão referido, por o juiz ter entendido que se tinha verificado a condição resolutiva a que alude o mencionado artigo 11º da Lei nº 15/94.
2. Desse despacho interpôs recurso o arguido J..., alegando, em síntese, que a decisão de revogação do perdão se fundamentou na prática de uma infracção anterior (a prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, pelo qual o arguido fora condenado por sentença de 23 de Novembro de 1995).
O Tribunal da Relação do Porto considerou que, nos termos da Lei nº
15/94 (artigos 11º e 17º), obsta à concessão do perdão (nos casos em que ainda não tenha sido concedido) ou impõe a sua revogação (nos casos em que já tenha sido concedido) a prática pelo beneficiário do perdão de uma infracção dolosa entre 12 de Maio de 1994 e 12 de Maio de 1997. Tendo em conta que o crime de condução de veículo em estado de embriaguez fora praticado pelo arguido em 22 de Novembro de 1995 e que a condenação ocorrera em 23 de Novembro de 1995 – embora não constasse do certificado do registo criminal junto aos autos quando foi proferida a sentença que o condenou à pena de prisão logo perdoada (29 de Janeiro de 1996) –, o Tribunal da Relação do Porto entendeu que se o Juiz da Comarca de Santo Tirso conhecesse tal condenação no momento da sentença já não teria concedido o perdão. Nessas circunstâncias, negou provimento ao recurso e confirmou a decisão recorrida (acórdão de 13 de Janeiro de 1999, fls. 38 e seguintes dos presentes autos de reclamação).
3. Não se conformando com o assim decidido, J... interpôs recurso para o Tribunal Constitucional 'ao abrigo da alínea f) do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro' (requerimento de fls. 16 destes autos).
Notificado para pagar a multa a que se refere o artigo 145º, nº 6, do Código de Processo Civil, no seguimento do despacho do relator, J... requereu dispensa ou redução da multa, nos termos do nº 7 do mesmo artigo 145º. Tal pedido foi indeferido e o recurso para o Tribunal Constitucional não foi admitido por intempestivo (despacho de 18 de Março de 1999, fls. 22 e seguinte).
4. J... reclamou do despacho que não admitiu o recurso, nos termos do artigo 76º, nº 4, da Lei do Tribunal Constitucional.
No Tribunal Constitucional, o Ministério Público emitiu parecer, pronunciando-se no sentido do indeferimento da presente reclamação.
II
5. O fundamento invocado para a rejeição do recurso foi o não cumprimento do prazo de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional, fixado no artigo 75º, nº 1, da Lei nº 28/82 (com a redacção resultante da Lei nº
13-A/98, de 26 de Fevereiro).
Ora, independentemente da questão de saber se era ainda oportuna a notificação ao recorrente para pagar a multa fixada no artigo 145º, nº 5, do Código de Processo Civil, em consequência do indeferimento do pedido por ele formulado nos termos do artigo 145º, nº 7, do mesmo Código, certo é que não podem dar-se por verificados no caso dos autos os pressupostos processuais do recurso que o ora reclamante pretendia interpor.
Na verdade, o recurso previsto na alínea f) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82 é o recurso que cabe das decisões dos tribunais 'que apliquem norma cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo com qualquer dos fundamentos referidos nas alíneas c), d) e e)'.
6. No processo a que se reporta esta reclamação não foi suscitada a ilegalidade de qualquer norma com um dos fundamentos referidos nas alíneas c), d) ou e) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82 – mais ainda, o ora reclamante não indicou sequer no requerimento através do qual pretendia interpor o recurso de constitucionalidade qual a norma cuja apreciação pedia ao Tribunal Constitucional.
E fácil é verificar que, na decisão recorrida – o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 13 de Janeiro de 1999, que negou provimento ao recurso interposto por J... do despacho do Juiz da Comarca de Santo Tirso, de 15 de Novembro de 1998, através do qual foi revogado o perdão que lhe havia sido concedido –, não foi aplicada norma constante de acto legislativo cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo com fundamento na violação de lei com valor reforçado (alínea c)); não foi aplicada norma constante de diploma regional cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo com fundamento na violação do estatuto da região autónoma ou de lei geral da República (alínea d)); nem foi aplicada norma emanada de um órgão de soberania cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo com fundamento na violação do estatuto de uma região autónoma (alínea e)).
Não estando verificados, no caso em apreço, os pressupostos de admissibilidade do recurso previsto na alínea f) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº
28/82 – a alínea invocada pelo ora reclamante para fundar o recurso de constitucionalidade –, há que concluir pelo indeferimento da reclamação.
III
7. Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em quinze unidades de conta.
Lisboa, 13 de Julho de 1999 Maria Helena Brito Vítor Nunes de Almeida Luís Nunes de Almeida