Imprimir acórdão
Proc. nº. 227/99 TC – Plenário Relator: Consº. Artur Maurício
Acordam em plenário no Tribunal Constitucional:
1 - Por auto de 30 de Dezembro de 1998, o Secretário Judicial da Comissão Nacional de Eleições (CNE) deu notícia de que a lista de cidadãos eleitores designada 'Progresso de Penascais' não prestou as contas eleitorais a que estava obrigada, no prazo de 90 dias a contar da data da publicação dos resultados eleitorais, obrigação essa imposta pelo artigo 20º da Lei nº. 72/93, de 30 de Novembro.
Aberto processo contra-ordenacional pela CNE, foi notificada a primeira proponente da referida lista do grupo de cidadãos eleitores, A., com os sinais dos autos, para se pronunciar sobre a contra-ordenação que lhe era imputada e respectiva sanção.
Por carta dirigida ao Presidente da CNE, a arguida veio invocar o 'acaso' de ter sido a primeira proponente da lista do grupo de cidadãos eleitores, afirmando não ter sido esclarecida da necessidade de prestar contas findo o processo eleitoral, o que terá levado à não apresentação das mesmas e terminava esperando
'ver relevada aquela falta', acrescentando ainda que a candidatura não arrecadou quaisquer receitas nem efectuou quaisquer despesas.
Nos termos do artigo 26º da Lei nº. 72/93, de 30 de Novembro e julgando verificada a contra-ordenação prevista no artigo 20º daquela Lei, o Presidente da CNE aplicou à arguida Adelaide a coima no valor mínimo de um salário mínimo mensal nacional, por decisão de 3 de Março de 1999.
Desta decisão recorreu a arguida para este Tribunal, ao abrigo do artigo 26º, nº. 3 da citada lei, invocando na sua alegação:
'1. – A recorrente é pobre, não possuindo quaisquer bens ou rendimentos, vivendo do magro salário do seu marido, com o qual provê a todas as despesas do seu lar.
2. – No uso dos seus direitos de cidadania, subscreveu, como primeira proponente, a respectiva lista para apresentação da candidatura de independentes
'X – Progresso de Penascais', desconhecendo inteiramente quaisquer das consequências deste seu acto.
3. – Não sabia, nem tinha obrigação de saber que este seu contributo ao funcionamento da democracia, poder-lhe-ia acarretar prejuízos materiais e,
4. – por outro lado, desconhecia, por completo, a obrigatoriedade de apresentar contas, que inexistiram, conforme alegou já aquando do accionamento do seu direito de defesa.
5. – Na situação em mérito não resulta qualquer conduta dolosa, dada a manifesta falta de intencionalidade,
6. – nem tão pouco poderá, à recorrente, ser assacada qualquer responsabilidade em sede de negligência ou mera culpa.
7. – Inexiste, assim, qualquer ilicitude na conduta da recorrente, constituindo a aplicação da coima referida nos autos, um excesso do 'rigor legal' que afastará por certo, os cidadãos da vida participativa.
8. – É consabido que, em ilícito contra-ordenacional, a coima aplicável, deverá ser graduada tendo em consideração os seguintes parâmetros:
gravidade da conduta;
culpa
benefício económico resultante do comportamento típico.
9. – Ora, na situação 'sub judice' decorre insofismavelmente que a conduta da recorrente, por falta de consciência da ilicitude não é grave;
10. – Inexiste, como se alegou já, culpa, em sede de dolo ou de negligência, e
11. – também não decorreu para a mesma suplicante, qualquer vantagem patrimonial ou moral que viesse a enriquecer o seu domínio.
12. – É, pois, indiscutível que se não encontram preenchidos os factores para a aplicação da coima ou que fundamentam a sanção pecuniária ora em recurso.
13. – Porque no direito de mera ordenação social são subsumíveis, por força do disposto no art. 41º do Dec-Lei nº. 244/95, os preceitos reguladores do processo criminal, é intuível que pela matéria factual exposta fosse de aplicar, porque conforme ao Direito, a pena de admoestação, prescrita na lei quadro supra referida.
14. – E tal sanção será a perfeitamente adequada, tendo em conta o princípio da justiça e da proporcionalidade.
15. – Finalmente, a confirmação da decisão, ora recorrida, terá sequelas que se repercutirão no afastamento dos cidadãos do processo eleitoral.
16. – Conclusivamente, a recorrente, reclama a revogação da sanção aplicada, convolando-a na aplicação de uma admoestação.'
Cumpre decidir.
2 - A Lei nº. 72/93, de 30 de Novembro que veio regular o financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais, tem carácter inovador no que toca
à obrigatoriedade da apresentação de contas por outros intervenientes no
'processo democrático', em especial os grupos de cidadãos eleitores, que não os partidos políticos.
Nos termos do artigo 19º, nº. 1, o primeiro proponente de cada grupo de cidadãos eleitores é responsável pela elaboração das contas da candidatura da campanha eleitoral, sendo passível de coima, prevista no artigo 25º, nº. 1, a omissão da prestação de contas, a aplicar pelo Presidente da CNE (cfr. artigo 26º, nº. 1), sendo todas as disposições mencionadas pertencentes ao diploma legal ora em apreço.
Serve isto para caracterizar o ilícito em presença como ilícito contra-ordenacional ou, se se preferir, como ilícito de mera ordenação social, em que avulta a neutralidade axiológica da conduta em si mesma considerada, a ausência de uma dimensão de censura ética da respectiva sanção e a competência punitiva de uma entidade administrativa, embora com recurso para os tribunais judiciais.
Considerando o disposto no artigo 9º do DL nº. 433/82 e o invocado pela recorrente, a questão essencial a decidir no presente recurso é a de saber se a arguida agiu em termos tais que a subtraiam a um juízo de censura, que só pode fundar-se em dolo (artigo 8º nº. 1 do citado DL nº. 433/82).
De acordo com o despacho que impôs a coima à recorrente, deixa-se claro que a CNE fez chegar ao conhecimento dos tribunais a necessidade de cumprimento do dever de os responsáveis pela elaboração de apresentação de candidaturas prestarem à CNE contas descriminadas da sua campanha eleitoral, mesmo sem movimentação de verbas, quer de receitas, quer de despesas; esse conhecimento teria sido proporcionado pelo envio de um folheto aos tribunais, com o pedido de ser entregue cópia a cada uma das candidaturas.
Não dispõe o Tribunal de elementos que desmintam esta factualidade e, considerando o normal funcionamento das instituições, não se põe em dúvida que a CNE tenha procedido da forma indicada.
Isto significa, desde logo que, mesmo admitindo que os tribunais não tivessem feito chegar ao conhecimento dos cidadãos envolvidos nas candidaturas o folheto remetido pela CNE, a recorrente poderia ser adequadamente informada – se o solicitasse – das obrigações legais que sobre ela recaíam.
E se o não fez foi porque não quis, omitindo o cumprimento de um dever em termos que a sujeitam a um juízo de reprovação.
Na verdade, ao subscrever, em primeiro lugar, a lista do grupo de cidadãos eleitores em causa, a arguida alcandorou-se à condição de titular e de defensora do interesse público, identificado este com o projecto eleitoral subjacente à constituição da lista do grupo de cidadãos eleitores 'Progresso de Penascais', situação em que se colocou voluntariamente e no exercício de um direito cívico mais exigente do que o direito de voto.
O direito de participação na vida política, traduzido na subscrição em primeiro lugar da lista do grupo de cidadãos eleitores, que a arguida quis exercer não estando a tal legalmente obrigada, exige da parte desta o esclarecimento necessário do conteúdo (mínimo) desse direito e das inerentes consequências, dado tratar-se de um acto político revestido de dignidade, solenidade e responsabilidade diferentes do mero acto de votar.
Na verdade, se por um lado a crescente consciencialização dos direitos cívicos dos cidadãos portugueses tem levado a que estes participem mais activamente na vida política nacional e local - mormente autárquica, em que a intervenção política é mais apelativa – não pode, por outro, deixar de se reforçar a ideia dos correspondentes deveres de cidadania, em que assume especial relevo o da informação e conhecimento das consequências dos actos praticados, em especial, os de carácter político, particularmente por quem não limita a sua intervenção política ao acto de votar.
Esta, pois, a razão determinante que leva o Tribunal a censurar a conduta da recorrente, sendo certo – como se disse – que nada, de facto, inviabilizava o devido esclarecimento sobre a obrigação estabelecida no artigo 20º nº. 1, em conjugação com o artigo 19º nº. 1, da Lei nº. 72/93.
A fim de proceder ao enquadramento da responsabilidade em que a arguida incorreu. torna-se necessário ponderar ainda dois aspectos.
O primeiro é o de que, tendo a Lei nº. 72/93, de 30 de Novembro entrado em vigor nesta última data, as disposições dela constantes relativas à obrigatoriedade, por outros intervenientes que não apenas os partidos políticos, de prestar contas relativas às eleições autárquicas - em que o apelo participativo é mais premente - aplicaram-se pela primeira vez às eleições ocorridas em 1997, razão pela qual se que poderá concluir que os contornos concretos de um tal dever ainda se não encontrariam clara e profundamente enraizados na consciência dos promotores das candidaturas, o que poderá apontar para que o limite da culpa se situe na zona inferior da moldura abstracta, o mesmo é dizer, é pequena ou diminuta a culpa da omitente.
Por outro lado, impõe-se realçar a circunstância ponderada pela CNE, na aplicação da coima, em favor da arguida: não terem sido movimentadas verbas em dinheiro durante a campanha eleitoral, o que se considerou reduzir muitíssimo a ilicitude do facto.
Atendendo ao exposto e ao que foi, por último, referido, não deixando de se afirmar a censura da omissão de prestar contas pela arguida Adelaide de Jesus Rego Antunes, crê-se estarem reunidos os pressupostos para aplicar a dispensa de pena prevista no artigo 74º do Código Penal, aplicável subsidiariamente ao caso por força do artigo 32º do DL nº. 433/82, de 27 de Outubro, por se considerar que, com a circunstância de a omitente ser declarada culpada, ligada à natureza condenatória da decisão, se alcança o limiar mínimo de prevenção geral de integração.
3 - Decisão:
Pelo exposto, ponderado o disposto nos artigos 1º, 8º, nº. 1 e 9º nº 2º e 32º todos do DL nº. 433/82, de 27 de Outubro, com as alterações introduzidas pelos DL nºs. 356/89, de 17 de Outubro e 244/95, de 14 de Setembro e artigo 74º, nº.
1, do Código Penal, concede-se provimento parcial ao recurso, considerando-se a recorrente Adelaide de Jesus Rego Antunes autora do ilícito previsto e punido nas disposições conjugadas dos artigos 20º, nº. 1 e 25º, nº. 1 da Lei nº. 72/93, de 30 de Novembro, mas com dispensa de pena. Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 1 Uc.
Lisboa, 8 de Julho de 1999 Artur Maurício Messias Bento José de Sousa e Brito Vítor Nunes de Almeida Alberto Tavares da Costa Paulo Mota Pinto Bravo Serra Luís Nunes de Almeida Maria Helena Brito Guilherme da Fonseca (vencido, conforme declaração de voto da Consª Maria Fernanda Palma) Maria Fernanda Palma (vencida, nos termos da declaração de voto junta). Declaração de voto Votei vencida o presente Acórdão pelos fundamentos seguintes:
A Os fundamentos da decisão recorrida e os factos provados
1. A recorrente nos presentes autos foi a primeira subscritora da lista de cidadãos eleitores Progresso de Penascais, concorrente às eleições autárquicas de 14 de Dezembro de 1997. Tendo sido condenada pela prática de uma contra-ordenação referente à não prestação de contas à Comissão Nacional de Eleições (cf. artigos 19º, nº 1, 20º, nº 1, e 25º, nº 1, da Lei nº 72/93, de 30 de Novembro), alega o desconhecimento da obrigação de prestação de contas que sobre si impendia. Na decisão recorrida afirma-se ter havido a preocupação de fazer chegar ao conhecimento de todos os intervenientes o conhecimento do dever legal de prestação de contas, através do envio para os tribunais de um folheto explicativo. Todavia, dos autos não resulta com segurança que tenha existido um efectivo conhecimento e compreensão por parte da recorrente de todos os deveres inerentes ao acto de subscrição de uma lista de cidadãos eleitores. Na verdade, os elementos constantes do processo apenas permitem concluir com segurança que foram criadas condições gerais e exteriores pela Comissão Nacional de Eleições para que os membros das listas tomassem conhecimento dos respectivos deveres legais. A subscrição da lista por parte da ora recorrente consubstanciou um primeiro acto de participação política, eventualmente isolado, já que a actividade da recorrente é a de 'doméstica'. A lista não realizou nem despesas nem receitas durante a campanha. Por último, o critério legal de determinação do responsável pela infracção (o primeiro subscritor da lista) não consubstancia, do ponto de vista racional, o único critério possível, nem mesmo um critério absolutamente previsível. Assim, trata-se de um regime novo, aplicado a uma lista de cidadãos eleitores (e não, por exemplo, a um partido, com uma organização tendencialmente mais eficaz) que não efectuou despesas nem obteve receitas (não havendo, nessa medida, contacto com questões pecuniárias), sendo responsável pela infracção o primeiro subscritor da lista (diferentemente do que acontece com os partidos). A decisão condenatória, porém, não se fundamenta na prova do efectivo conhecimento da obrigação de prestar contas por parte da arguida. Não considera, consequentemente, os elementos referidos. Todavia, todos estes elementos fundamentam a subsistência de uma dúvida plausível desde logo acerca da representação intelectual por parte da arguida das obrigações emergentes da prática do acto de subscrição de uma lista concorrente às eleições autárquicas, nomeadamente da obrigação (que impende sobre o primeiro subscritor) de realizar e de apresentar as contas da campanha à Comissão Nacional de Eleições ou pelo menos de um conhecimento preciso dos termos daquela obrigação. Finalmente, o não conhecimento efectivo ou pelo menos o não conhecimento preciso do comando legal não correspondeu a uma atitude de indiferença ou necessariamente à falta de comportamento adequado a obter a informação necessária, tendo em conta as particulares condições de participação política de arguida, a sua inexperiência e o facto de não terem existido receitas e despesas associadas à candidatura. Deste modo, ter-se-á que concluir que dos factos provados não resulta um conhecimento preciso da proibição legal no caso concreto nem uma consciência clara da prática de um acto ilícito punível com uma coima.
B A qualificação jurídica dos factos
2. Considerando não ter sido provado que a arguida conhecia rigorosamente a necessidade de prestar contas à Comissão Nacional de Eleições, no seu caso concreto, estaremos perante um mero desfasamento entre a valoração que faz de uma determinada obrigação que sobre si impende e a valoração efectivamente vigente no ordenamento jurídico, configurada no Decreto-Lei nº 433/82 (artigo
9º) e no Código Penal (artigo 17º) como um erro sobre a ilicitude? No caso concreto, o conhecimento impreciso impede uma verificação das condições de liberdade de motivação pelo Direito. Trata-se de uma situação que se coloca necessária e logicamente antes da directa falta da consciência da ilicitude, na medida em que o agente, nesta situação, não tem acesso a todos os elementos razoavelmente indispensáveis à formação da sua consciência jurídica. Consequentemente, não estará em causa a censura da deficiente formação da consciência jurídica do agente (o que Figueiredo Dias designa como erro de valoração - cf. Problema da Consciência da Ilicitude no Direito Penal, 4ª edição, 1995, p. 396 e ss), mas sim um eventual incumprimento de um dever de diligência na apreensão de todos os elementos objectivos necessários à formação dessa consciência. Teria, portanto, aplicação nos autos o disposto no artigo 8º, nº 2, do Regime Geral das Contra-Ordenações (aprovado pelo Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro). Ora, o artigo 8º, nº 1, do Decreto-Lei nº 433/82, estabelece que só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos previstos na lei, com negligência. Uma vez que o artigo 25º, nº 1, da Lei nº 72/93, de 30 de Novembro, não prevê a negligência, a contra-ordenação aí prevista é necessariamente dolosa. Desse modo, nos termos do referido artigo 8º, nº 2, haverá que concluir pela exclusão do dolo e da responsabilidade contra-ordenacional.
3. Mas mesmo que não se entenda que, no caso sub judice, estamos verdadeiramente perante um erro sobre uma proibição nos termos do artigo 8º, nº
2, do Regime Geral das Contra-Ordenações, cuja natureza é o de um verdadeiro erro sobre a factualidade típica - sendo antes a situação qualificável como erro sobre a ilicitude, por o agente dispor ainda de um conhecimento, embora impreciso, de que aquela actividade esta sujeita a vários deveres legais - sempre haveria que rejeitar a censurabilidade de tal erro. Com efeito, não resulta da consciência ética geral, naturalmente, que seja necessário prestar contas numa eleição local em que não houve receitas nem despesas. A própria actividade de prestação de contas por parte dos agentes da participação política corresponde a uma exigência de uma democracia desenvolvida, pretendendo regular a isenção da actividade política (no seu desiderato de realização do interesse geral) relativamente a outros sectores do poder social e dos interesses particulares que o sustentam. Deste modo, considerando o facto de estarmos perante eleições locais e a participação de cidadãos sem grande experiência política, não poderemos considerar que esteja associada a um vago ou impreciso conhecimento da lei uma censurável falta de consciência da ilicitude. Diferentemente de hipóteses em que a consciência da ilicitude que justifica a censura do agente coincide com uma consciência ética comum ou com o mero reconhecimento de que o facto é proibido pelo Estado, neste caso é necessária uma consciência da ilicitude mais precisa, para, de acordo com o princípio da culpa, justificar a censura do facto. A punição pelo ilícito contra-ordenacional, neste caso, estaria suportada meramente pela violação do dever de conhecer as exigências legais e não directamente pela sua violação plenamente consciente e livre. Ora, não só a contra-ordenação aqui em causa não corresponde a uma mera violação de deveres de cuidado e de conhecimento como também o agente não revelou verdadeiramente menosprezo ou falta de consideração pelos deveres legais, revelando apenas inexperiência e imprecisa compreensão do Direito. Finalmente, a impregnação deste ilícito contra-ordenacional de uma elevada componente repressiva conduziria, nesta fase de implementação de um novo sistema, a uma forte inibição da actividade política por parte de cidadãos que não têm, à partida, experiência e cultura política desenvolvidas, desmotivando-os ou tornando-os meros exemplos para aprendizagem por outros das regras da participação política. A fundamentação do ilícito num dever de informação precisa compreende-se quando o agente tenha outras qualificações (nomeadamente por se tratar de partido político) e numa fase mais avançada da participação política ao nível local dos cidadãos no nosso país. Assim, também em face do disposto no artigo 9º do Decreto-Lei nº 433/82, haveria que concluir que a culpa do agente não seria suficiente para fundamentar um juízo de censurabilidade.
4. Finalmente, não será aceitável afirmar a censurabilidade e vir a dispensar a pena numa situação em que é manifesto que a razão do não sancionamento não é meramente relevante no plano preventivo. Trata-se, antes, de uma situação em que os agentes não dispuseram de todas as condições para em plena inteligência e liberdade se motivarem pelo Direito. A pena de culpa, neste caso, vem a ser justificada meramente num plano de prevenção geral o que contraria o princípio da culpa e a máxima que lhe é inerente de que cada pessoa é um fim e não um meio para o Direito.
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza (vencida, por entender que, não sendo punível a negligência - cf. o nº 1 do artº 8º do DL 433/82, 27.10 -, não foram obtidos elementos probatórios suficientes para concluir no sentido da existência de dolo, sendo certo que não pode o Tribunal presumi-lo).
José Manuel Cardoso da Costa