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Proc. nº 271/00
1ª Secção Consº Vítor Nunes de Almeida
ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:
1. - J... e mulher, M..., vêm reclamar para a conferência da decisão sumária do relator de 17 de Maio de 2000, que decidiu não tomar conhecimento do recurso por eles interposto, entendendo, contra o que foi afirmado naquela decisão em passagem que transcrevem, 'que suscitaram suficiente e claramente a questão da inconstitucionalidade nas suas alegações...', designadamente, conforme reiteram na conclusão do seu requerimento 'que a inconstitucionalidade das normas sobre que assentou a decisão (art.ºs 1.561º, nº
1; art.º 1562, n. 1 e art. 1563º, n.1, al.b) foi clara e suficientemente levantada nas alegações para o Tribunal da Relação', no caso da Relação do Porto, de cujo acórdão tinham interposto recurso de constitucionalidade.
2. - Não têm razão. Basta confrontar as partes relevantes da decisão sumária com os termos do processo, para concluir que as considerações que formulam no requerimento de reclamação não infirmam o resultado a que anteriormente se chegou.
Naquela decisão, salientou o relator preambularmente que
'recai sobre os recorrentes o ónus de suscitar, durante o processo, a questão de constitucionalidade das normas convocadas e aplicadas pela decisão, fazendo-o do modo directo, explícito e perceptível através da indicação das disposições legais que se consideram afectadas de inconstitucionalidade, devendo também indicar-se os fundamentos da incompatibilidade com a Lei Fundamental, pois não é exigível que os tribunais decidam questões (designadamente questões de constitucionalidade), sem que as partes lhes indiquem as razões por que entendem que elas devem ser decididas num certo sentido, e não noutro. A simples referência a que determinados preceitos são inconstitucionais ou que 'violam os artigos da Constituição' não são formas adequadas de se suscitar uma questão de constitucionalidade'.
Passando depois à análise em concreto dos termos do processo, escreveu-se o seguinte: Os recorrentes referem que foi nas alegações de recurso para a Relação que suscitaram a questão de inconstitucionalidade. Vejamos se, de facto, assim foi. Compulsadas as conclusões que os recorrentes formularam, constata-se que, depois de referirem o entendimento que defendem de 'águas particulares' (pontos 2 e 3), consideram os recorrentes que 'deve constituir-se a requerida servidão de aqueduto, desde que se verifiquem os demais requisitos exigidos pela Lei, designadamente pelo citado artº 1561º'. E, se assim se não entender, 'deve considerar-se que a licença camarária para a utilização da água da rede pública para abastecimento domiciliário, corresponde
à ‘concessão’ a que faz referência o artº 1562º do C.Civil'. E depois de uma referência à constituição da servidão de escoamento (ponto 7), os recorrentes escrevem: '8º Que quer na constituição da servidão de aqueduto, quer na de escoamento deve ter-se em conta o disposto nos artºs 65º, nº1 e 66º, nº1, da Constituição e demais legislação sobre o ambiente e utilização de águas posteriores'. Não existe nas conclusões apresentadas qualquer outra referência a normas constitucionais. E parece manifesto que daquela afirmação não pode extrair-se a conclusão de que os recorrentes suscitaram uma qualquer questão de inconstitucionalidade normativa. Com efeito, os recorrentes limitam-se a dizer que a constituição das servidões que indicam devem ter em conta (isto é, respeitar, atender a ...) o preceituado nas disposições constitucionais que citam. Em parte alguma se diz ou escreve que as normas infraconstitucionais que questiona violam ou contendem com normativos da Lei Fundamental. Mesmo que, num esforço interpretativo da posição defendida pelos recorrentes se pudesse entender que a constituição das servidões em causa era o único meio para que a situação da casa de habitação dos recorrentes obedecesse às condições de higiene e de conforto e se realizasse um ambiente humano sadio e equilibrado, conforme exige a Constituição (ponto 4, das alegações), mesmo assim não podia concluir-se pela suscitação de qualquer questão de constitucionalidade: esta, a existir, não podia deixar de se referir à situação de facto em causa, ou seja, de reportar-se à própria decisão judicial em concreto.
Em face destes elementos - a transcrição foi extensa, mas serve para mostrar a sem-razão da reclamação - é manifesto que a conclusão alcançada na decisão sumária é de manter. Efectivamente, os recorrentes não suscitaram, durante o processo e de forma minimamente adequada, qualquer inconstitucionalidade normativa: a referência a normas constitucionais vem claramente reportada à 'constituição da servidão de aqueduto e à de escoamento' que 'devem Ter em conta o disposto nos referidos preceitos da Lei Fundamental. Ora, uma tal menção não pode, de todo em todo, tomar-se como suscitação de uma inconstitucionalidade normativa.
Assim sendo, o Tribunal Constitucional decide indeferir a reclamação e, consequentemente, confirmar a decisão sumária reclamada.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 15 unidades de conta.
Lisboa, 20 de Setembro de 2000 Vítor Nunes de Almeida Maria Helena Brito Luís Nunes de Almeida