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Processo n.º 548/99 ACÓRDÃO Nº 628/99 Plenário Relator - Paulo Mota Pinto
Acordam em Plenário no Tribunal Constitucional: I. Relatório
1. Na sequência da elaboração de auto de notícia por verificação da não prestação de contas, imposta nos termos do artigo 25º da Lei n.º 72/93, de 30 de Novembro, por parte da lista de cidadãos eleitores 'Pelo Progresso de Prozelo', concorrente à Assembleia de Freguesia de Prozelo, concelho de Amares, foi o seu primeiro proponente, J..., notificado da contra-ordenação que lhe foi, nesses termos, imputada e da sanção em que incorria. Frustrada a notificação postal, foi solicitada a intervenção da Guarda Nacional Republicana que logrou informar o ora recorrente do processo de contra-ordenação contra ele instaurado, tendo este comunicado, por escrito, que nunca se envolvera ou participara 'em qualquer acção política (mandatário)', nem nunca se inscrevera 'em qualquer lista eleitoral'. Solicitado ao Tribunal Judicial da Comarca de Amares 'fotocópia do documento de subscrição do referido proponente', foi esta junta aos autos e subsequentemente enviada ao ora recorrente para, 'no prazo de cinco dias se pronunciar sobre aquelas provas, contraditando os factos apurados ou dizendo se os aceita.' Em resposta veio o ora recorrente comunicar à Comissão Nacional de Eleições, na pessoa do seu Presidente, que 'não fazia parte da lista de candidatos da lista independente Pelo progresso de Prozelo, apenas era proponente como tantos outros, ignorando ser o primeiro proponente, e nessa qualidade ser [...] o responsável pela apresentação de contas' e que, contactados os candidatos da lista estes o informaram 'que a respectiva lista nomeou um mandatário para esse fim [prestação de contas], mas em virtude de não haver contas a prestar, não tendo havido receitas, nem despesas o mesmo pensou não ser necessário se pronunciar sobre tal assunto.' Por despacho de dia 20 de Julho de 1999, notificado por carta registada a 19 de Agosto de 1999, o Presidente da Comissão Nacional de Eleições aplicou ao ora recorrente uma coima correspondente a quatro salários mínimos nacionais (235
600$00), considerando não estarem 'apuradas circunstâncias concretas que agravem ou atenuem a sua responsabilidade', e que 'não [era] abonatória a conduta do arguido que apenas aceitou o facto depois de confrontado com a evidência dos documentos por si apresentados; e, mesmo assim, reiterando que não foi mandatário ou candidato, quando apenas estava em causa ter sido o primeiro proponente, o que até é evidente pela sua colocação na lista dos proponentes.'
2. Desta decisão trouxe o arguido recurso contencioso de anulação para o Tribunal Constitucional, concluindo desta forma:
'1 – Os factos que fundamentam o presente processo de contra-ordenação encontram-se amnistiados pela Lei n.º 29/99, de 12 de Maio
2 – Na verdade, o presente processo refere-se a factos ocorridos antes de 25 e Março de 1999 e não constituem ilícito antieconómico, fiscal, aduaneiro, ambiental ou laboral, não tendo carácter doloso
3 – Pelo que se encontram amnistiados
4 – Por outro lado, o arguido não foi candidato, mandatário ou deu autorização para ser primeiro proponente.
5 – Foi abordado por cidadãos eleitores que solicitaram a sua assinatura, a fim de apoiar a constituição de uma lista de cidadãos independentes.
6 – Esses cidadãos eram já portadores de outras assinaturas.
7 – Nunca mais teve qualquer intervenção política, apenas aparecendo no local, apenas aparecendo no local próprio para exercer o seu direito de voto.
8 – Nunca teve conhecimento de que era o primeiro proponente, nem das contas da Lista I,
9 – Pelo que não estava obrigado a apresentar as contas à CNE.
10 – Violou assim a CNE e o seu presidente a lei, nomeadamente o disposto no artigo 7º alínea b) da Lei n.º 29/99 de 12 de Maio e o disposto no artigo 19º e
25º da Lei 72/93 de 30 de Novembro.' Cumpre decidir. II. Fundamentos
3. Dispõe o artigo 20º da Lei n.º 72/93, de 30 de Novembro (Financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais) que 'no prazo máximo de 90 dias a partir da data da proclamação oficial dos resultados, cada candidatura presta contas discriminadas da sua campanha eleitoral à Comissão Nacional de Eleições'. Com esta norma dá-se expressão ao imperativo constitucional (agora) constante do artigo 113º, n.º 3, alínea d), da Constituição, de fiscalização das contas eleitorais (desde a última revisão, também de transparência), sendo desiderato de tal norma, segundo Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., Coimbra, 1993, anotação XIV ao artigo 116º, pág.
522), 'não só garantir alguma moderação nos gastos eleitorais, mas também defender um mínimo de igualdade de condições financeiras nas campanhas eleitorais.'
4. O recorrente invoca a amnistia concedida pela alínea d) do artigo 7º da Lei n.º 29/99, de 12 de Maio de 1999, sendo certo que a infracção cometida tem carácter de contra-ordenação – cfr. o n.º 1 do artigo 25º da Lei n.º 72/93, de
30 de Novembro – e não constitui 'ilícito anti-económico, fiscal, aduaneiro, ambiental e laboral' (que, nos termos do proémio do referido artigo 7º da Lei de perdão genérico e amnistia de pequenas infracções estariam excluídos da amnistia). A terceira condição para a subsunção do caso na previsão da norma – limite máximo da coima aplicável não exceder 500 contos em caso de dolo e 1000 contos em caso de negligência, nos termos da alínea b) do mesmo artigo 7º – já se não afigura líquida, na medida em que a moldura sancionatória prevista para a não prestação de contas (10 salários mínimos mensais nacionais, nos termos do referido n.º 1 do artigo 25º da Lei de financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais) se situa entre os dois valores--limite fixados na
última lei da amnistia: a amnistia contemplou infracções punidas até um limite de 500 contos, quando praticadas com dolo, ou até um limite de 1000 contos quando praticadas com negligência. O que torna, portanto, relevante apurar o tipo de culpa definido ou pressuposto no artigo 25º da Lei n.º 72/93. Aliás, dada a redacção da norma da alínea b) do referido artigo 7º (que se refere 'às contra--ordenações cujo limite máximo de coima aplicável não exceda 500 contos em caso de dolo e 1000 contos em caso de negligência'), não releva que, no caso, o montante da coima aplicada se situasse abaixo do limite estabelecido para amnistia: o que esta visa é obstar à determinação da coima, pelo que é em função da moldura aplicável que se aferem os limites da amnistia. Ora, a lei nada diz expressamente quanto à possibilidade de punir a infracção cometida com negligência, como teria que fazer, face ao disposto no n.º 1 do artigo 8º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro (Regime geral das contra-ordenações e coimas) – segundo o qual 'só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência'. Pelo que pode concluir-se que, indo a moldura da coima fixada no n.º 1 do artigo 25º da Lei n.º 72/93 até 10 salários mínimos mensais nacionais, a conduta em causa se situa fora do âmbito da previsão da alínea b) do artigo 7º da Lei de amnistia. Justamente porque a infracção imputada ao recorrente e punida pelo n.º 1 do artigo 25º da Lei n.º 72/93 o foi a título de dolo, não pode valer a amnistia invocada.
5. Alega o recorrente que desconhecia ser o primeiro proponente da lista, dizendo que:
'a ordem das assinaturas não foi da sua responsabilidade, nem ninguém falou com o arguido sobre os andamentos ou organização da referida Lista. Assinou e nada mais, tal como o faria a qualquer outro grupo de cidadãos que lhe merecessem a sua confiança ou partido de seu agrado. Na verdade, aquando da assinatura da proposta, existiam já diversas outras assinaturas, e, essa foi a sua única intervenção no dito acto eleitoral.' Semelhante desconhecimento foi já alegado, perante a Comissão Nacional de Eleições, no caso que deu origem ao recurso julgado por este Tribunal no Acórdão n.º 450/99 (inédito), não tendo, porém, sido repetida no recurso da decisão da Comissão Nacional de Eleições. Ora, perante esta alegação poderá suscitar-se a questão de saber se efectivamente o recorrente agiu dolosamente, ou se incorreu em erro sobre elementos do tipo ou sobre a proibição – em particular, a questão de saber se estamos, não perante uma situação em que 'se põe o problema de saber se pode imputar-se à culpa do agente um comportamento de cuja factualidade constitutiva ele teve consciência, quando todavia faltou a consciência da ilicitude', mas perante uma situação em que 'se põe o problema de saber se pode imputar-se à culpa do agente um comportamento de cuja factualidade constitutiva ele não teve consciência' (Jorge Figueiredo Dias, O problema da consciência da ilicitude em direito penal, Coimbra, 4ª ed., 1995, pág. 14). Na verdade, segundo o artigo 8º, n.º 2 do citado Decreto-Lei n.º 433/82, 'o erro sobre elementos do tipo, sobre a proibição ou sobre um estado de coisas que, a existir, afastaria a ilicitude do facto ou a culpa do agente exclui o dolo' (o artigo 9º, por sua vez, prevê a falta de consciência da ilicitude do facto, que exclui a culpa, se o erro não for censurável ao agente).
À Comissão Nacional de Eleições, o ora recorrente começou por responder que
'nunca me envolvi ou participei em qualquer acção política (mandatário) e nem me escrevi em qualquer lista eleitoral'. Posteriormente, porém, veio sustentar que foi proponente da lista em causa mas ignorava ser primeiro proponente. Ora, é inequívoco que a identificação e a assinatura do recorrente são de facto as primeiras de entre os proponentes da lista em questão. Por outro lado, consultando os autos verifica-se não existirem, para além da afirmação do recorrente, quaisquer elementos susceptíveis de levar à conclusão de que ele desconhecia ser o primeiro subscritor, também não tendo sido fornecida prova documental nem solicitada produção de outro meio de prova nesse sentido (cfr. artigo 102º-C, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional). Aparecendo, pois, incontestavelmente, a identificação do recorrente no lugar de primeiro proponente da lista em questão – qualidade que lhe foi atribuída também pelo Juiz do Tribunal Judicial da Comarca de Amares e pela Comissão Nacional de Eleições –, tendo o recorrente assinado a lista de proponentes por baixo da sua identificação e antes dos nomes dos restantes proponentes, e não havendo elementos que apontem em sentido contrário, há que inferir destes elementos – como o fez a Comissão Nacional de Eleições –, e dar como provado, que o recorrente conhecia aquela sua qualidade.
6. Relativamente ao dever de apresentação de contas em questão, pode ler-se no despacho de aplicação da coima sob recurso que:
'houve a preocupação desta Comissão de fazer chegar ao conhecimento de todos os intervenientes a necessidade de cumprimento deste dever. Antes de iniciado o prazo de apresentação de candidaturas, enviou para os tribunais onde elas se verificariam um folheto explicativo da necessidade de serem prestadas contas, ainda que não tivessem sido movimentadas verbas de receitas e despesas, com o pedido de esses tribunais entregarem a cada uma das candidaturas, cópias desse folheto. Evidentemente que mesmo que a lista ‘I – Pelo Progresso de Prozelo’ não tenha tido receitas nem tenha feito despesas, nem por isso estaria desobrigado de comunicar esse facto à Comissão Nacional de Eleições, já que a lei não fala apenas nessa obrigatoriedade para os casos de haver receitas e despesas a lançar. A obrigação de apresentação de contas tem que ser cumprida, ainda que não tenha havido verbas a lançar em coluna de receitas e em coluna de despesas; em tal caso, as contas até seriam bem simples, com o apuramento final de zero. Esta lei tem nitidamente a finalidade de permitir o controle, por órgão isento, das receitas e despesas feitas durante as campanhas eleitorais, e, por isso, mesmo a não as ter havido, é sempre necessária a comunicação do facto, para que esse controle, na forma de que não houve despesas e receitas lançadas, possa ser exercido.' E, como se escreveu no Acórdão n.º 451/99 (no mesmo sentido, para casos análogos, podem ver-se também os Acórdãos n.ºs 450/99, 452/99 e 516/99, ainda inéditos, como o primeiro):
'não dispõe o Tribunal de elementos que desmintam esta factualidade e, considerando o normal funcionamento das instituições, não se põe em dúvida que a CNE tenha procedido da forma indicada. Isto significa, desde logo que, mesmo admitindo que os tribunais não tivessem feito chegar ao conhecimento dos cidadãos envolvidos nas candidaturas o folheto remetido pela CNE, a recorrente poderia ser adequadamente informada - se o solicitasse - das obrigações legais que sobre ela recaíam. E se o não fez foi porque não quis, omitindo o cumprimento de um dever em termos que a sujeitam a um juízo de reprovação. Na verdade, ao subscrever, em primeiro lugar, a lista do grupo de cidadãos eleitores em causa, a arguida alcandorou-se à condição de titular e de defensora do interesse público, identificado este com o projecto eleitoral subjacente da lista do grupo de cidadãos eleitores ‘Progresso de Penascais’ [no caso, ‘Pelo Progresso de Prozelo’], situação em que se colocou voluntariamente e no exercício de um direito cívico mais exigente do que o direito de voto. O direito de participação na vida política, traduzido na subscrição em primeiro lugar da lista do grupo de cidadãos eleitores, que a arguida quis exercer não estando a tal legalmente obrigada, exige da parte desta o esclarecimento necessário do conteúdo (mínimo) desse direito e das inerentes consequências, dado tratar-se de um acto político revestido de dignidade, solenidade e responsabilidade diferentes do mero acto de votar. Na verdade, se por um lado a crescente consciencialização dos direitos cívicos dos cidadãos portugueses tem levado a que estes participem mais activamente na vida política nacional e local - mormente autárquica, em que a intervenção política é mais apelativa - não pode, por outro, deixar de se reforçar a ideia dos correspondentes deveres de cidadania, em que assume especial relevo o da informação e conhecimento das consequências dos actos praticados, em especial, os de carácter político, particularmente por quem não limita a sua intervenção política ao acto de votar.' Ao subscrever uma lista concorrente às eleições autárquicas, e como primeiro proponente, o recorrente destacou-se do conjunto dos eleitores pelo exercício do direito cívico de participação na vida política de uma forma mais intensa, e, portanto, exigente, incluindo-se desta forma na categoria de destinatários específicos da norma que prevê a obrigação de prestação de contas, constante de diploma publicado (artigos 19º, n.º 1 e 20º, n.º 1, da Lei n.º 72/93, de 30 de Novembro) e cuja inobservância é considerada ilícito de mera ordenação social
(artigo 25º, n.º 1, do citado diploma; sobre o erro sobre a proibição no ilícito de mera ordenação social, v. Frederico Costa Pinto, 'O ilícito de mera ordenação social', Revista portuguesa de ciência criminal, 1997, n.º 7, págs. 76-7). O alheamento pelo recorrente, nestas circunstâncias, do cumprimento de tal dever não pode, pois, deixar de incluir-se na previsão do citado artigo 25º, n.º 1.
7. Ocorre, porém, que no presente recurso, tal como nos decididos pelos citados Acórdãos n.ºs 450/99, 451/99, 452/99 e 516/99, são correspondentemente aplicáveis os fundamentos aí invocados para concluir no sentido de que 'não deixando de se afirmar a censura da omissão de prestar contas [...], crê-se estarem reunidos os pressupostos para aplicar a dispensa de pena prevista no artigo 74º do Código Penal, aplicável subsidiariamente ao caso por força do artigo 32º do DL n.º 433/82, de 27 de Outubro' (Acórdão n.º 451/99). Tal como nesses casos, foi 'a primeira vez em que receberam aplicação as normas que impõem a obrigação de prestação de contas nas eleições para os órgãos autárquicos. Tal circunstância alguma influência terá tido no comportamento dos proponentes de candidaturas de cidadãos eleitores, que ainda não teriam apreendido na íntegra as consequências das suas omissões, e alguma relevância há-de merecer' (Acórdão n.º 452/99). Da mesma forma que nesses arestos, 'o circunstancionalismo aceite por este órgão de administração da justiça aconselha que [ ... ] lance ele mão do poder de dispensar a aplicação da pena, tal como se encontra prescrito no n.º 1 do art.º 74 do Código Penal, até porque daquele condicionalismo se extrai a concorrência das situações indicadas nas diversas alíneas da mencionada disposição.' (Acórdãos n.ºs 450/99 e 516/99). Nestes termos, pode, ao abrigo do artigo 74º, n.º 1, do Código Penal, dispensar-se o recorrente da coima correspondente ao ilícito que praticou. III. Decisão Pelo exposto, o Tribunal Constitucional decide: a) Ponderado o disposto nos artigos 1º, 8º, n.º 1, 9º, n.º 2 e 32º, todos do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro (com as alterações introduzidas pelos Decretos-Leis n.ºs 356/89, de 17 de Outubro, e 244/95, de 14 de Setembro) e no artigo 74º, n.º 1, do Código Penal, conceder provimento parcial ao recurso, considerando o recorrente J... autor do ilícito previsto e punido nas disposições conjugadas dos artigos 19º, n.º 1, 20º, n.º 1 e 25º, n.º 1, todos da Lei n.º 72/93, de 30 de Novembro, dispensando, todavia, a coima correspondente a tal ilícito; b) Condenar o recorrente em custas, com 1 unidade de conta de taxa de justiça. Lisboa, 17 de Novembro de 1999 Paulo Mota Pinto Alberto Tavares da Costa Bravo Serra Luís Nunes de Almeida Maria Helena Brito Artur Maurício Messias Bento Vítor Nunes de Almeida Maria Fernanda Palma (vencida nos termos da declaração de voto junta) Maria dos Prazeres Pizarro Beleza (vencida, por entender que, não sendo punível a negligência, não foram obtidos elementos probatórios suficientes para concluir no sentido da existência de dolo, sendo certo que não pode o Tribunal presumi-lo). Guilherme da Fonseca (vencido, conforme declaração de voto da Consª Maria Fernanda Palma) José Manuel Cardoso da Costa Declaração de voto
Votei vencida neste processo não só pelas razões que expendi nos Acórdãos do Tribunal Constitucional nºs 450/99, 451/99 e 516/99, para os quais remeto, mas, mais convictamente ainda, por não me parecer ter sido provado o próprio dolo do facto, isto é, o conhecimento e vontade de o agente ser primeiro proponente da lista, apoiando-se a aplicação da coima numa inferência duvidosa entre o facto de a assinatura do arguido ter surgido no primeiro lugar de uma folha de assinaturas e o facto de o agente ter representado que seria o primeiro proponente da lista. O problema que o Acórdão teria que resolver coloca-se, assim, a montante da qualificação como erro sobre a proibição que exclui o dolo ou mera falta de consciência da ilicitude. Neste caso, não há sequer prova razoável sobre o conhecimento pelo agente da factualidade típica, isto é, o conhecimento de que o agente estava a assumir a posição de primeiro proponente da lista e de candidato de uma lista eleitoral.
É, pois, ainda e tão-só uma questão de puro erro sobre a factualidade típica (eventualmente evitável) que aqui se coloca e que a Comissão Nacional de Eleições, como entidade que acusou, não curou de esclarecer. A dificuldade de prova não pode, por seu lado, justificar uma presunção de dolo, mas apenas a prevalência do princípio in dubio pro reo, na própria formulação de acusação e na aplicação da coima. Maria Fernanda Palma