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Proc. nº 649/98
3ª Secção Relator: Cons. Sousa e Brito
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório.
1. A..., notificado da Decisão Sumária, proferida ao abrigo do disposto no nº
1do artigo 78º-A, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, que decidiu não tomar conhecimento do objecto do recurso, por considerar não estarem verificados os pressupostos processuais de admissibilidade do mesmo, veio reclamar para a conferência, nos termos do artigo 78º-A, nº 3, da mesma Lei. Fundamentou assim a sua reclamação:
'1. No seu requerimento de aclaração e rectificação do Acórdão da Relação de Lisboa, ali apresentado em 16 de Janeiro de 1998, o recorrente entendeu, aliás, como já anteriormente alegara, que ao abrigo do então artigo 48º do C.Penal, a execução da sentença deveria ter ficado suspensa, atendendo especialmente à personalidade do arguido, às suas condições de vida e condutas anterior e posterior ao crime e, porque, havia confessado, pelo menos parcialmente, os factos.
2. No mesmo requerimento, o recorrente invocou também que no dito acórdão se afirmara que a graduação da pena não merecia qualquer censura, «face às circunstâncias», mas sem as ter enumerado ou identificado, o que contrariou designadamente o art. 375º do C.P.Penal onde se pode ler que «a sentença condenatória deve especificar os fundamentos que presidiram à escolha e à medida da sanção aplicada».
3. A final, o recorrente alegou que, a manter-se intacto o dito acórdão, tal não iria salvaguardar as necessárias garantias de defesa previstas no art. 32º da Constituição e no art. 11º da Declaração Universal dos Direitos do Homem.
4. Relativamente ao convite efectuado por esse Venerando Tribunal nos termos e para os efeitos do disposto no art. 75º-A da LTC, o recorrente deu-lhe efectivo cumprimento e explicitou, em 9 de Novembro de 1998, que tais disposições ali invocadas eram tidas como inconstitucionais, além do art. 410º, nº 2, alínea a), do C.P.Penal invocado pelo Tribunal da Relação no seu douto Acórdão.
5. Ora, na douta Decisão Sumária de que agora se reclama, vem afirmado ser manifesto que o recorrente não suscitara a questão de constitucionalidade ou legalidade «durante o processo», opinião com a qual e com o devido respeito, não concorda, pois a mesma foi aflorada e invocada no seu requerimento de pedido de aclaração e rectificação do Acórdão, como se viu.
6. Ainda que tal fase processual não seja considerada como possível e legal para a invocação da questão de constitucionalidade – o que não se concede – sempre se dirá, contudo, que o recorrente foi confrontado, pela primeira vez, com, pelo menos, algumas das questões tratadas e decididas desfavoravelmente pela Relação
(nomeadamente o conhecimento oficioso do nexo de causalidade, isto é, a consideração pela Relação, não provada, de ter sido a taxa de álcool, o farol a não funcionar e a falta de cuidado que constituiram tal nexo de causalidade, mas sem fundamento factual, não tendo havido sequer, como seria exigível, qualquer repetição de provas), e sem que o mesmo recorrente tenha tido possibilidade de, sobre elas, se pronunciar ou opor-se, facto que equivale a decisão surpresa e com ofensa dos direitos e garantias da igualdade de armas e de defesa, legal e constitucionalmente consagrados.
7. Assim, e pelos fundamentos expostos e pelas razões já anteriormente expendidas no requerimento de aclaração e rectificação do douto acórdão recorrido e no requerimento apresentado neste Tribunal ao abrigo do art. 75º-A da LTC, requer que sejam declaradas inconstitucionais e ilegais as referidas normas legais invocadas pela recorrente e pelo próprio Tribunal da Relação.'
2. Notificado para responder à reclamação apresentada, o representante do Ministério Público em funções neste Tribunal pronunciou-se, em síntese, no sentido da manifesta improcedência da mesma, por considerar que não se verificavam, efectivamente, os
II – Fundamentação.
3. Como se afirmou na decisão reclamada, mesmo a admitir-se que o recorrente, ora reclamante, deu cabal cumprimento ao convite do Relator para que indicasse os elementos a que se refere o artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional – designadamente que indicou, em termos que devam considerar-se suficientes, a peça processual em que suscitou durante o processo as questões de constitucionalidade que pretende ver apreciadas por este Tribunal - é efectivamente manifesto que não se podem considerar verificados os pressupostos de admissibilidade do recurso que o recorrente pretendeu interpor – o previsto nas alíneas b) e f) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional.
4. É que, como então se ponderou, pressuposto de admissibilidade do recurso que o recorrente pretendeu interpor é que o mesmo tenha suscitado, durante o processo, a questão de constitucionalidade ou legalidade que pretende agora ver apreciada, o que, manifestamente, não aconteceu na situação que é objecto dos autos. Por um lado, - como então se disse e, agora, mais uma vez se reitera - o pedido de aclaração ou rectificação da decisão recorrida não constitui, em princípio, meio idóneo para suscitar a questão da inconstitucionalidade. Por outro lado, também não se verifica na situação que é objecto dos autos – ao contrário do que sustenta o reclamante – a utilização pela decisão recorrida de uma interpretação normativa dos artigos 48º do Código Penal e 410º, nº 2 do Código de Processo Penal (normas cuja constitucionalidade se pretende que o Tribunal aprecie) de todo em todo imprevisível, em termos de se tornar desrazoável exigir ao recorrente que tivesse suscitado a sua inconstitucionalidade antes de a mesma decisão ter sido proferida. Finalmente, acresce que nem mesmo no pedido de aclaração e rectificação da decisão recorrida o ora reclamante suscitou qualquer questão de constitucionalidade ou ilegalidade das normas que agora pretende que o Tribunal aprecie em termos de permitir o recurso para o Tribunal Constitucional. Para o demonstrar basta transcrever a parte daquela peça processual em que o reclamante pretende que suscitou as referias inconstitucionalidades e ilegalidades. Aí se refere:
'8 – Ora, a manter-se intacto o douto acórdão, sem devida aclaração e rectificação, o mesmo ficará irremediavelmente ferido de invalidade, por ofensa designadamente ao referido artigo 375º do C.P.Penal, não ficando, consequentemente, salvaguardadas as necessárias garantias de defesa previstas no art. 32º da Constituição e no art. 11º da Declaração Universal dos Direitos do Homem'.
5. Assim, pelos fundamentos que constam da Decisão Sumária proferida em 11 de Fevereiro de 1999, que a presente reclamação em nada abala, e que agora, em síntese, se reafirmam, é efectivamente de considerar que não estão verificados os pressupostos processuais do recurso interposto, pelo que não se pode tomar conhecimento do seu objecto. III – Decisão. Pelo exposto, decide-se desatender a reclamação e, em consequência, confirmar a decisão reclamada, de não conhecimento do recurso. Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 unidades de conta. Lisboa, 8 de Julho de 1999- José de Sousa e Brito Messias Bento Luís Nunes de Almeida